Venezuela, nós e a democracia
Por Fidel Díaz Castro (periodista) / Resumen Latinoamericano/ 7 de dezembro de 2015 – A Venezuela demonstrou ontem – ao contrário do que se canonizou – que a democracia com economia e meios de comunicação nas mãos privadas não existe. É lamentável, porém não é possível uma revolução social avançar com o poder real nas mãos da oligarquia.
Com as mídias e os poderes econômicos contrários é impossível manter um governo que favoreça o povo. Já passou o tempo em que conseguimos surpreender a direita e, em especial, o império ianque, que tinha seu quintal latino-americano à deriva; obviamente já estão reforçando seu cerco contra o Sul.
O pior do revés da Revolução bolivariana ontem não está sequer na derrota nas urnas, tão esmagadora, a qual vinha se cantando, se não no discurso da esquerda que segue o jogo dos conceitos impostos pelos grandes circuitos globais, entre eles o alardear da democracia tal como a entende o império.
Alardeiam que a democracia ganhou quando, na realidade, o que ficou claro é que se torna impossível exercer a democracia. A democracia eleitoreira serve apenas à direita. A esquerda não pode governar com ela em meio a um mar de poderes fáticos econômicos e midiáticos nas mãos de uma minoria antidemocrática.
Em nosso noticiário, nosso repórter em Caracas disse que o povo promoveu um voto de castigo contra a gestão econômica de Maduro. Até mesmo Maduro se vê pressionado por essas ideias, que impõem o reconhecimento de que não foi efetivo, quando a realidade é que não se pode ser efetivo quando os poderes econômicos lançam uma guerra aberta e a responsabilidade recai sobre os afetados. Como governar contra a oligarquia nacional e internacional (unida, como sonhou Marx para os proletários do mundo)?
O voto não foi de castigo contra uma deficiente gestão, mas um voto de suposta salvação, de alívio, ante uma prolongada angústia na vida cotidiana do venezuelano. Maduro não teve uma gestão deficiente, mas impossível.
A máquina midiática internacional coloca a culpa sobre Maduro, sobre este governo, inclusive o contrapõe ao de Chávez; tentando nos fazer acreditar que isto é outra coisa e que Maduro é o vilão, ou incapaz, quando na realidade a luta foi titânica.
Não estou certo de que, com Chávez, os resultados teriam sido diferentes; se não formos muito radicais nas medidas, o que se torna difícil com as regras do jogo impostas, como impedir algumas mídias ferozes de distorcer, desinformar, caluniar, sem piedade nem ética? Como controlar uma economia que está em poder das oligarquias? Como poder fazer frente a essa situação econômica se, por outro lado, os organismos econômicos internacionais são parte desse jogo?
Queríamos nos alegrar de que as eleições transcorreram em plena calma, sem violência e, para mim, não era mais que – lamentavelmente – um sintoma muito ruim. As eleições se desenrolavam em paz porque a oposição sabia que tinha grandes possibilidades de ganhar. A campanha de não reconhecer os resultados e de sair a armar confrontos nas ruas, imperou para cumprir seu objetivo, o medo. Salvo os de maior consciência, qualquer cidadão que leva meses enfrentando filas infinitas, vendo os preços dispararem astronomicamente e desaparecem inclusive os alimentos, sendo ameaçados com dias de grande violência caso ganhe o chavismo, vota contra, para ver se chega um pouco de paz em sua vida.
Isso é a democracia? Ter que votar não por um projeto, mas por medo do que vem ocorrendo desde a guerra da oposição? Na Telesur, durante a plena incerteza da espera dos resultados, uma socióloga equatoriana começou a questionar as revoluções que estamos fazendo no continente, apontando-as como desgastadas, obrigadas ao replanejamento, o que me pareceu bom como princípio; mas o que, quando escutava seus argumentos, não pareceu de nenhuma maneira com a ingovernabilidade de que estão acusadas as esquerdas, com uma campanha muito melhor orquestrada a nível continental; e essa sinfonia já sabemos quem a dirige: os mestres do Norte.
Tudo faz parecer que os governos de esquerda é que estão estagnados, que supostamente têm que planejar novas metas e uma viabilidade econômica. Não excluo os erros, nem os planos protelados ou a necessidade de buscar novas vias, porém a essência do problema não está nos defeitos da esquerda, mas em aceitar as regras do jogo das direitas – nacionais e globais – que fecharam o cerco, o que não permite avançar nos projetos e obriga a dedicar a maior parte do tempo a apagar os incêndios impostos em sua aliança com os Estados Unidos.
O Rusia Today denunciava o orçamento de 18 milhões de dólares de financiamento dos Estados Unidos para a guerra contra a Venezuela, 3 deles especificamente para as eleições, junto a sabotagem econômica e à guerra midiática. E nós chamamos o efeito de tudo isso de democracia.
Fonte: http://www.resumenlatinoamericano.org/2015/12/09/venezuela-nosotros-y-la-democracia/
Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)