A MINUSTAH NÃO É UMA MISSÃO HUMANITÁRIA. ESTÁ PRESENTE NO HAITI NO PROCESSO DE RECOLONIZAÇÃO DE TODA A REGIÃO

imagemEntrevista com Camille Chalmers, secretário da Plataforma Haitiana pela Defensa de um Desenvolvimento Alternativo (PHADA) e integrante do Jubileu Sul.

Mario Hernandez / Resumen Latinoamericano/ 11 de abril de 2016

M.H.: Em comunicação com Montevidéu, com o ativista haitiano pelos direitos humanos, Camille Chalmers. Gostaria que você comentasse qual é a situação pela qual passa seu país e quais são os motivos para você se encontrar na capital da República Oriental do Uruguai.

C.Ch.: Estamos vivendo uma situação sumamente difícil no Haiti, que é o resultado de doze anos de ocupação das forças da Minustah, que é supostamente uma força para manter a paz , porém que teve um resultado sumamente negativo.

Nesta conjuntura, estamos vivendo uma crise eleitoral muito profunda que significou um protesto global dos movimentos populares no Haiti frente às tentativas de manipular a eleição e dificultar a expressão do voto popular.

Durante o ano de 2015, se produziram duas eleições, a última em 9 de outubro, onde a maioria do setor democrático e os informes e avaliações realizadas mostram que foram eleições totalmente fraudulentas com manipulações grosseiras, inclusive chegando ao cúmulo de querer criar uma cédula com um só candidato, porque o segundo colocado se negou a ir às urnas acreditando ter sido uma farsa eleitoral total.

Assim, chegamos à situação institucional que é resultado de uma visão política de parte da oligarquia que nunca aceitou as conquistas democráticas conseguidas após o período da ditadura de Duvalier.

O governo de Martelly tentou restabelecer a ditadura, porém não pode fazê-lo graças à resistência do povo. Durante 5 anos não organizou eleições, portanto, chegamos a um ponto onde existe um vazio e muitas dificuldades para restabelecer as eleições republicanas.

O interessante é que o povo aprendeu muito entre 2010 e 2015, e não puderam repetir o que fizeram em 2010, quando impuseram Martelly como presidente ainda que não correspondesse ao voto popular. Em 2015 ocorreu uma resistência muito ampla dos setores políticos, dos setores populares e das organizações sociais que obrigaram a parar o processo eleitoral de 22 de janeiro.

M.H.: Existirá uma próxima eleição em seu país? Como você vê o futuro do ponto de vista institucional?

C.Ch.: O dilema atual é que o imperialismo quer acelerar o processo para chegar às eleições e estabelecer um novo presidente antes de 14 de maio. Querem que se faça uma cédula aceitando os resultados do primeiro turno. Os setores democráticos no Haiti decidiram que isso é inaceitável porque terão resultados eleitorais muito repudiados, que não vão construir decisões legítimas e respeitadas. É muito importante aproveitarmos esta crise para repensar o sistema eleitoral e estabelecermos um que seja soberano, controlado pelos atores sociais e políticos, e que esteja em relação com os problemas do país. Temos um sistema totalmente colonial na atualidade, controlado por forças externas, um sistema muito custoso e que não corresponde ao exercício cívico de construção institucional.

M.H.: Que atividade você foi desenvolver em Montevidéu?

C.Ch.: Estou no contexto de uma campanha para conseguir a retirada das tropas da Minustah. Estamos preparando um grande dia de mobilização continental, que será em 1° de junho, onde vamos reclamar sua retirada. No entanto, também será um dia de mobilização contra a militarização, contra as bases militares estadunidenses no Caribe e estamos aqui para dizer que não só precisam se retirar, como se deve lançar um processo de reparação, justiça e indenização de tudo o que se fez durante estes 12 anos. O exemplo mais cruel é a instalação do cólera, quando as tropas das Nações Unidas em junho de 2010 introduziram uma enfermidade no Haiti que não existia anteriormente e até hoje matou 9.000 cidadãos e cidadãs haitianas e infectaram quase 170.000 pessoas.

É indignante ver que as Nações Unidas não estão investindo em recursos técnicos e financeiros para erradicar o cólera enquanto o povo está morrendo no Haiti. É preciso indenizar os familiares das vítimas, construir um sistema que permita o acesso universal à água potável e indenizar o país pelos danos sofridos pela introdução desta enfermidade.

M.H.: Você pode fazer alguma declaração com relação à retirada das tropas uruguaias a nível governamental, já que é um dos países que mais tropas envia à Minustah?

C.C.: Em visitas anteriores, tivemos conversações com a presidência, com o ministério das Relações Exteriores e com o Parlamento. Porém, desta vez nos concentramos mais na opinião pública, nas redes sociais, porque creio que hoje muita gente tem uma clara consciência do fracasso dessa missão, do resultado totalmente negativo contemplando os objetivos postulados em 2004 e a necessidade de terminar com esta experiência, lançando processos reais de solidariedade com o povo do Haiti à imagem, por exemplo, da cooperação que temos com Cuba, com a presença de mais de 800 médicos cubanos divididos nas comunidades rurais mais distantes, e que estão fazendo um trabalho maravilhoso, estando totalmente integrados às comunidades. É uma cooperação solidária que não gera dívida e que se faz com respeito à cultura e à história haitiana.

M.H.: Você quer acrescentar algo mais?

C.Ch.: Acredito que é importante que se difunda a informação necessária para expor o papel da Minustah, que não é uma missão humanitária, está inserida dentro do projeto da militarização integral do Caribe e é uma força que está presente no Haiti no processo de recolonização de toda a região.

A Minustah participou diretamente na repressão das manifestações populares quando estávamos reclamando o aumento do salario mínimo, esteve presente no processo de privatização da telefonia pública, quando expulsaram 3.000 trabalhadores ilegalmente, a Minustah esteve presente para torna-lo possível.

Existe uma aliança muito clara entre a Minustah e as forças antidemocráticas, conservadoras e retrógradas no Haiti, através da qual nos parece que é sumamente urgente que se reconheça esse fracasso e que, ao mesmo tempo, pensemos quais são as ações solidárias que podemos construir diretamente de povo em povo.

Quando nasceu a nação haitiana, ela se deu com uma convicção internacionalista e contribuiu para o reforço das lutas independentistas do continente. Assim, me parece natural que agora tenhamos esta construção internacionalista que necessitamos frente à nova agressividade do imperialismo.

Fonte: http://www.resumenlatinoamericano.org/2016/04/11/entrevista-a-camille-chalmers-secretario-de-la-plataforma-haitiana-por-la-defensa-de-un-desarrollo-alternativo-phada-e-integrante-de-jubileo-sur-la-minustah-no-es-una-mision-humanitaria-esta-pres/

Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)

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