Redes do império e realinhamentos do poder mundial

Os estados imperialistas constroem redes que ligam as actividades económicas, militares e políticas num sistema coerente que se reforça mutuamente. Esta tarefa é desempenhada em grande parte pelas diversas instituições do estado imperialista.

Assim, a acção imperialista nem sempre é directamente económica, já que se torna necessária uma acção militar num país ou numa região para abrir ou proteger zonas económicas. Nem todas as acções militares são decididas por interesses económicos se o sector mais influente do estado imperialista for decisivamente militarista.

Além disso, a sequência da acção imperialista pode variar consoante as condições particulares necessárias para a construção do império. Assim, a ajuda do estado pode comprar colaboradores; a intervenção militar pode assegurar regimes clientes seguidos posteriormente por investidores privados. Noutras circunstâncias, a entrada de empresas privadas pode preceder a intervenção do estado.

Na penetração, quer privada quer estatal, liderada económica e/ou militarmente, como apoio à construção do império, o objectivo estratégico é explorar as características económicas e geopolíticas especiais do país visado para criar redes em que o império é o centro. No pós mundo colonialista eurocêntrico, a posição privilegiada dos EUA na sua política centrada no império, nos seus tratados, acordos comerciais e militares, é disfarçada e justificada por uma aura ideológica, que varia com o tempo e as circunstâncias. Na guerra para fragmentar a Jugoslávia e implantar regimes clientes, tal como no Kosovo, a ideologia imperialista utilizou a retórica humanitária. Nas guerras genocidas no Médio Oriente, é central a ideologia anti-terrorismo e anti-islâmica. Contra a China, predomina a retórica dos direitos democráticos e humanos. Na América Latina, o poder imperialista vacilante apoia-se na retórica democrática e anti-autoritária dirigida contra o governo de Chavez democraticamente eleito.

A eficácia da ideologia imperialista está em relação directa com a capacidade de o império promover alternativas de evolução viáveis e dinâmicas aos países visados. Por esses critérios a ideologia tem tido pouco poder de persuasão entre as populações visadas. A retórica islamofóbica e anti-terrorista não teve qualquer impacto nos povos do Médio Oriente e alienou o mundo islâmico. As lucrativas relações comerciais da América Latina com o governo de Chavez e o declínio da economia dos EUA corroeram a campanha ideológica de Washington para isolar a Venezuela. A campanha dos EUA pelos direitos humanos contra a China tem sido completamente ignorada em toda a UE, em África, na América Latina, na Oceânia e nas 500 maiores empresas americanas (e até mesmo no Tesouro dos EUA que se esforça por vender títulos do tesouro à China para financiar o inflado défice orçamental dos EUA).

A cada vez menor influência da propaganda imperialista e o cada vez menor peso económico de Washington, significam que as redes imperialistas americanas construídas durante os últimos cinquenta anos estão a ser corroídas ou pelo menos sujeitas a forças centrífugas. As redes, outrora totalmente integradas na Ásia, são actualmente meras bases militares à medida que as economias adquirem uma maior autonomia e se orientam para a China e para mais longe ainda. Por outras palavras, as redes imperialistas estão hoje a ser transformadas em postos avançados de operações limitadas, e já não são centros da pilhagem económica imperialista.

Redes imperialistas: O papel central dos colaboradores

A construção de um império é essencialmente um processo de penetração num país ou numa região, que institui uma posição privilegiada e que garante o controlo a fim de assegurar (1) recursos lucrativos, mercados e mão-de-obra barata (2) de instituir uma plataforma militar para se expandir a países e regiões vizinhos (3) bases militares para implantar um estrangulamento sobre estradas ou canais estratégicos a fim de permitir ou negar o acesso de competidores ou adversários (4) operações secretas e clandestinas contra adversários e competidores.

A história tem demonstrado que o custo mais baixo para manter um domínio a longo prazo e à escala imperialista é através do fomento de colaboradores locais sob a forma de dirigentes políticos, económicos e/ou militares que operam a partir de regimes clientes. Um domínio imperialista político-militar aberto resulta em guerras dispendiosas e divisões, principalmente entre uma ampla panóplia de classes negativamente afectadas pela presença imperialista.

A formação de dirigentes e classes colaboracionistas resulta de várias políticas imperialistas a curto e longo prazo que vão desde actividades directas militares, eleitorais e extra-parlamentares até ao recrutamento a médio e longo prazo, à formação e à orientação de jovens dirigentes promissores através da propaganda e de programas educacionais, atractivos culturais-financeiros, promessas de apoio político e económico para acesso a cargos políticos e através de substancial apoio financeiro clandestino.

O apelo mais básico feito pelos políticos imperialistas à “nova classe dirigente” num estado cliente emergente é a oportunidade de participar num sistema económico ligado aos centros imperialistas, em que as elites locais partilham a riqueza económica com os seus benfeitores imperialistas. Para garantir o apoio das massas, as classes colaboradoras escondem as novas formas de subserviência imperialista e de exploração económica realçando a independência política, a liberdade pessoal, as oportunidades económicas e o consumismo privado.

Os mecanismos para a transferência de poder para um estado cliente emergente aliam a propaganda imperialista, o financiamento de organizações de massas e de partidos eleitoralistas, assim como de violentos golpes de ‘levantamentos populares’. Os regimes autoritários burocraticamente ossificados que se apoiam em controlos policiais para limitar ou combater a expansão imperialista são “alvos fáceis”. As campanhas selectivas em defesa dos direitos humanos tornam-se na arma organizativa mais eficaz para recrutar activistas e promover dirigentes para a nova ordem política centrada no imperialismo. Logo que ocorre a transferência de poder, os membros anteriores da elite política, económica e cultural são exilados, reprimidos, detidos e presos. Emerge uma nova cultura política homogénea de partidos rivais que aderem à nova ordem mundial de centro imperialista. A primeira palavra de ordem a nível de negócios, a seguir à purga política, é a privatização e a entrega dos postos de comando da economia às empresas imperialistas. Os regimes clientes tratam de fornecer soldados que se oferecem como mercenários pagos para guerras imperialistas e de transferir bases militares para as forças imperialistas como plataformas de intervenção. Toda esta “pantomima pela independência” é acompanhada pelo desmantelamento maciço dos programas públicos de bem-estar social (pensões, saúde e educação gratuitas), códigos de trabalho e políticas de pleno emprego. A promoção de uma estrutura de classes altamente polarizada é a consequência final de domínio do estado cliente. As economias dos regimes clientes, centradas no imperialismo, enquanto réplicas de qualquer vulgar estado sátrapa, são justificadas (ou legitimadas) em nome de um sistema eleitoral alegadamente democrático – na verdade um sistema político dominado pelas novas elites capitalistas e pelos seus meios de comunicação fortemente financiados.

Os regimes centrados no imperialismo dirigidos por elites colaboracionistas, que vão desde os estados balcânicos, Europa central e de leste até aos Balcãs, são o exemplo mais flagrante da expansão imperialista no século XX. O desmantelamento e conquista da União Soviética e do bloco de leste e a sua incorporação na aliança da NATO, liderada pelos EUA, e na União Europeia resultaram num excesso de confiança imperialista. Washington fez declarações prematuras de um mundo unipolar enquanto a Europa ocidental continuava a pilhar recursos públicos, desde fábricas a imobiliário, explorando a mão-de-obra barata, no ultramar e através da imigração, constituindo um formidável ‘exército de reserva’ para corroer os padrões de vida da força de trabalho sindicalizada no Ocidente.

A unidade de objectivos dos regimes imperialistas europeus e americano permitiu a apropriação pacífica da riqueza das novas regiões através de monopólios privados. Os estados imperialistas subsidiaram inicialmente os novos regimes clientes com transferência em grande escala e empréstimos sob a condição de eles permitirem que empresas imperialistas se apoderassem de recursos, património, terras, fábricas, sectores de serviços, meios de comunicação, etc. Pesadamente endividados os estados passaram de crises agudas no período inicial para um crescimento ‘espectacular’, até chegarem a profundas e crónicas crises sociais de desemprego de dois dígitos num período de 20 anos de construção do estado cliente. Enquanto aumentavam os protestos dos trabalhadores à medida que os salários se degradavam, o desemprego aumentou e foram cortadas as prestações de benefício social. Mas a ‘nova classe média’ embrenhada nos aparelhos políticos e de comunicação social e em empresas económicas mistas são suficientemente financiadas por instituições financeiras imperialistas para proteger o seu domínio.

Contudo, a dinâmica da expansão imperialista no leste, centro e sul da Europa não proporcionou o impulso para um avanço estratégico, por causa da ascendência do capital financeiro altamente volátil e duma poderosa casta militar nos centros políticos euro-americanos. Em aspectos importantes, a expansão militar e política deixou de estar atrelada à conquista económica. O que se verificou foi o inverso: a pilhagem económica e o domínio político serviram de instrumento para projectar o poder militar.

Sequências imperialistas: Da guerra para a exploração à exploração pela guerra

As relações entre políticas imperialistas militares e interesses económicos são complexas e mudam com o tempo e o contexto histórico. Em determinadas circunstâncias, um regime imperialista pode investir fortemente em pessoal militar e aumentar as despesas monetárias para derrubar um dirigente anti-imperialista e implantar um regime cliente muito para além de qualquer retorno económico estatal ou privado. Por exemplo, as guerras dos EUA no Iraque e no Afeganistão, as guerras por procuração na Somália e no Iémen não proporcionaram grandes lucros às empresas multinacionais americanas nem estimularam a exploração privada de matérias-primas, mão-de-obra ou mercados. Quando muito, as guerras imperialistas deram lucros a empreiteiros mercenários, a empresas de construção e a ‘indústrias de guerra’ afins que beneficiaram de transferências do Tesouro dos EUA e da exploração dos contribuintes americanos, na sua maioria assalariados e trabalhadores por conta de outrem.

Em muitos casos, especialmente depois da II Guerra Mundial, o emergente estado imperialista americano gastou muitos milhares de milhões de dólares de empréstimos num programa de ajuda à Europa ocidental. O Plano Marshall evitou levantamentos sociais anti-capitalistas e recuperou o domínio político capitalista. Isso permitiu o aparecimento da NATO (uma aliança militar liderada e dominada pelos EUA). Subsequentemente, as empresas multinacionais americanas investiram e negociaram com a Europa ocidental recolhendo receitas lucrativas, visto que o estado imperialista criara condições políticas e económicas favoráveis. Por outras palavras, a intervenção político-militar do estado imperialista precedeu a ascensão e expansão do capital multi-nacional americano. Uma análise míope a curto prazo da actividade inicial pós-guerra subestimaria a importância dos interesses económicos privados americanos enquanto força motora da política dos EUA. Alargando o período de tempo às duas décadas seguintes, a interacção entre as grandes despesas iniciais estatais, militares e económicas com os posteriores altos ganhos privados, ficamos com um exemplo perfeito de como funciona o processo do poder imperialista.

O papel do estado imperialista enquanto instrumento para abrir, proteger e expandir o mercado privado, a exploração da força de trabalho e dos recursos corresponde a uma altura em que tanto o estado como as classes dominantes estavam principalmente motivados pela construção do império industrial.

A intervenção militar directa dos EUA e os golpes no Irão (1953), na Guatemala (1954), no Chile (1973), na República Dominicana (1965) estiveram ligados a interesses económicos específicos e a empresas imperialistas específicas. Por exemplo, os EUA e as empresas petrolíferas inglesas tentaram inverter a nacionalização do petróleo no Irão. A United Fruit Company, dos EUA, opôs-se à política de reforma agrária na Guatemala. As mais importantes companhias americanas de cobre e de telecomunicações apoiaram e apelaram ao golpe no Chile, patrocinado pelos EUA.

Em contraste, as actuais intervenções militares e guerras dos EUA no Médio Oriente, no sul da Ásia e no Corno de África não são promovidas por multi-nacionais americanas. A política imperialista é promovida por militaristas e sionistas infiltrados no estado, nos meios de comunicação e nas poderosas organizações ‘civis’. Os mesmos métodos imperialistas (golpes e guerras) servem diferentes dirigentes imperialistas e seus interesses.

Regimes clientes, aliados e fantoches

As redes imperialistas envolvem garantir uma série de ‘bases de recursos’ complementares, económicas, militares e políticas, que fazem parte do sistema imperialista mas mantêm graus diversos de autonomia política e económica. Nas fases dinâmicas iniciais da construção do Império americano, por volta de 1950-1970, as empresas multinacionais americanas e a economia americana no seu conjunto dominaram a economia mundial. Os seus aliados na Europa e na Ásia estavam fortemente dependentes dos mercados, do financiamento e do desenvolvimento dos EUA. A hegemonia militar dos EUA reflectia-se numa série de pactos militares regionais que garantiam um apoio quase imediato às guerras regionais americanas, aos golpes militares e à construção de bases militares e de portos navais americanos no seu território. Os países estavam divididos em ‘especializações’ que serviam os interesses especiais do Império americano. A Europa ocidental era uma base avançada militar, um parceiro industrial e um colaborador ideológico. A Ásia, sobretudo o Japão e a Coreia do Sul, serviam de ‘postos avançados militares de primeira linha’, assim como de parceiros industriais. A Indonésia, a Malásia, as Filipinas eram essencialmente regimes clientes que forneciam matérias-primas assim como bases militares. Singapura e Hong Kong eram entrepostos financeiros e comerciais. O Paquistão era um regime militar cliente que servia de pressão na linha da frente sobre a China. A Arábia Saudita, o Irão e os mini-estados do Golfo, governados por regimes autoritários clientes, forneciam o petróleo e bases militares. O Egipto e a Jordânia e Israel asseguravam os interesses imperialistas no Médio Oriente. Beirute funcionava como centro financeiro para os banqueiros americanos, europeus e do Médio Oriente.

A África e a América Latina, que incluíam regimes clientes e nacionalistas-populistas, eram uma fonte de matérias-primas e de mercados para produtos acabados e também mão-de-obra barata. A prolongada guerra EUA-Vietname e a subsequente derrota de Washington corroeram o poder do império. A expansão industrial na Europa ocidental, no Japão e na Coreia do Sul desafiou o predomínio industrial dos EUA. A procura da América Latina de políticas nacionalistas, de substituição das importações, forçaram o investimento dos EUA a dirigir-se para a manufactura ultramarina. No Médio Oriente os movimentos nacionalistas derrubaram os clientes dos EUA no Irão e no Iraque e corroeram os postos avançados militares. As revoluções em Angola, Namíbia, Moçambique, Argélia, Nicarágua e noutros locais cortaram o acesso ‘aberto’ euro-americano a matérias-primas, pelo menos temporariamente.

O declínio do Império americano foi temporariamente suspenso pelo colapso do comunismo na União Soviética e na Europa de leste e a implantação de regimes clientes por toda a região. Do mesmo modo, a onda de regimes clientes centrados no imperialismo na América latina, entre os meados dos anos 70 e os finais dos anos 90, deu a impressão duma recuperação imperialista. Mas a década de 90 não foi o início da repetição da descolagem imperialista do início dos anos 50; foi o “último hurra” antes de um declínio irreversível a longo prazo. Todo o aparelho político imperialista, que tanto êxito teve nas suas operações clandestinas para subverter os regimes soviéticos e europeus de leste, desempenhou um papel secundário quando se tratou de capitalizar as oportunidades económicas que se seguiram. A Alemanha e outros países da UE lideraram o caminho na conquista das lucrativas empresas capitalizadas. As oligarquias russas-israelenses (sete das oito principais) apoderaram-se e pilharam indústrias estratégicas privatizadas, bancos e recursos naturais. Os principais beneficiários americanos foram os bancos e empresas de Wall Street que lavaram milhares de milhões de ganhos ilícitos e cobraram comissões lucrativas a partir de fusões, aquisições, listas de acções e outras actividades menos que transparentes. Por outras palavras, o colapso do colectivismo soviético fortaleceu o sector financeiro paradisíaco do Império americano. Pior ainda, o conceito de um “mundo unipolar” tão gabado pelos ideólogos americanos, favoreceu os militaristas, que a partir daí se convenceram de que os anteriores constrangimentos em relação aos ataques militares dos EUA aos nacionalistas e seus aliados soviéticos tinham desaparecido. Em consequência, a intervenção militar tornou-se a principal força motora na construção do império americano que descambou na primeira guerra do Iraque, na invasão da Jugoslávia e da Somália, e na expansão de bases militares americana por todo o antigo bloco soviético e Europa de leste.

As sementes da decadência e do declínio foram lançadas em pleno auge do poder político e militar global dos EUA durante os anos 90, quando todos os principais regimes latino-americanos se encontravam envolvidos na trama neo-liberal centrada no imperialismo. As crises económicas dos finais dos anos 90 levaram a grandes levantamentos e derrotas eleitorais em praticamente todos os clientes americanos na América Latina, anunciando o declínio do domínio imperialista americano. O extraordinariamente dinâmico e cumulativo crescimento da China desalojou a manufactura americana e enfraqueceu o poder negocial dos EUA perante governantes na Ásia, na África e na América Latina. A enorme transferência de recursos estatais americanos para aventuras imperialistas ultramarinas, bases militares e apoio a clientes e aliados levou ao declínio interno.

O império americano, enfrentando passivamente os competidores económicos que despojavam os EUA de mercados vitais e metendo-se em guerras prolongadas e infindáveis que esgotavam o tesouro, atraiu uma legião de políticos medíocres a que faltava uma estratégia coerente para rectificar políticas e reconstruir o estado para vitalizar uma actividade produtiva capaz de ‘reconquistar mercados’. Pelo contrário, as políticas de guerras sem fim e insustentáveis favoreceram um sub-grupo especial (sui generis) de militaristas, os sionistas americanos. Tiraram benefícios da sua infiltração em posições estratégicas do estado, reforçaram a sua influência nos meios de comunicação de massas e numa ampla rede de “grupos de pressão” organizados para reforçar a subordinação dos EUA à tendência de Israel para a supremacia do Médio Oriente.

O resultado foi o total “desequilíbrio” do aparelho imperialista americano: a acção militar foi desligada da construção do império económico. Uma casta superior altamente influente de militaristas sionistas atrelou o poder militar dos EUA a um estado economicamente marginal (Israel), numa hostilidade permanente para com 1,5 mil milhões no mundo muçulmano. Igualmente devastador, os ideólogos e políticos sionistas americanos promoveram instituições repressivas, legislação e propaganda ideológica islamofóbica destinada a aterrorizar a população americana. Uma ideologia islamofóbica igualmente importante serviu para justificar a guerra permanente no sul da Ásia e no Médio Oriente e os exorbitantes orçamentos militares, numa altura de aguda deterioração das condições sócio-económicas internas. Gastaram-se centenas de milhares de milhões de dólares improdutivamente na “Segurança Interna” que tentou por todos os meios recrutar, treinar, enquadrar e prender muçulmanos afro-americanos como “terroristas”. Milhares de agências secretas, com centenas de milhares de funcionários a nível local, estatal e nacional, espiaram os cidadãos americanos que, em qualquer altura, pudessem ter tentado falar ou agir para corrigir ou reformar as políticas militaristas-financeiras-sionistas centradas no imperialismo.

No final da primeira década do século XXI, o império dos EUA só conseguiu destruir adversários (Iraque, Paquistão e Afeganistão), provocar tensões militares (península da Coreia, Mar da China) e corroer as relações com parceiros comerciais potencialmente lucrativos (Irão, Venezuela). Um autoritarismo galopante fundiu-se com a quinta coluna do militarismo sionista para fomentar a ideologia islamofóbica. A convergência de mediocridades autoritárias, vigaristas em ascensão e lealistas tribais da quinta coluna no regime de Obama impediu qualquer recuo previsível da decadência imperialista.

A crescente rede económica global da China e o avanço dinâmico na modernização da tecnologia aplicada em tudo, desde as energias alternativas aos comboios de alta velocidade, contrastam com o império americano, infestado de militaristas-sionistas. As exigências dos EUA aos governantes do Paquistão cliente para esgotar o seu tesouro em apoio de guerras islâmicas americanas no Afeganistão e no Paquistão, contrastam com os 30 mil milhões de dólares de investimentos chineses em infra-estruturas, energia e electricidade e os aumentos de muitos milhares de milhões de dólares no comércio.

Os subsídios militares de 3 mil milhões de dólares dos EUA a Israel contrastam com os investimentos de muitos milhares de milhões de dólares em petróleo iraniano e acordos comerciais. O financiamento dos EUA das guerras contra os países islâmicos no sul e centro da Ásia contrasta com a expansão do comércio económico da Turquia e os acordos de investimento na mesma região. A China substituiu os EUA enquanto parceiro comercial chave em importantes países da América do sul, enquanto que os desiguais acordos “de comércio livre” (NAFTA) empobrecem o México. O comércio entre a União Europeia e a China ultrapassa o dos EUA.

Em África, os EUA subsidiam as guerras na Somália e no Corno de África, enquanto a China assina um investimento de muitos milhares de milhões de dólares e acordos comerciais, construindo infra-estruturas africanas em troca do acesso a matérias-primas. Ninguém tem dúvidas de que o futuro económico de África cada vez está mais ligado à China.

O Império dos EUA, em contraste, está num abraço mortal com um insignificante estado militarista colonialista (Israel), com estados falidos no Iémen e na Somália, com regimes clientes estagnados e corruptos na Jordânia e no Egipto e com os decadentes estados petrolíferos absolutistas e cobradores de rendas da Arábia Saudita e do Golfo. Todos eles fazem parte duma coligação atávica improdutiva apostada em manter o poder através da supremacia militar. No entanto, os Impérios do século XXI constroem-se na base de economias produtivas com redes globais ligadas a parceiros comerciais dinâmicos. Reconhecendo a supremacia económica e as oportunidades de mercados que começam a fazer parte da rede global chinesa, antigos ou actuais clientes dos EUA e até mesmo governantes fantoches começaram a desviar-se da submissão aos ditames americanos. Ocorreram por toda a América Latina viragens fundamentais nas relações económicas e nos alinhamentos políticos. O Brasil, a Venezuela, a Bolívia e outros países apoiam o programa nuclear não militar do Irão desafiando a agressão de Washington liderada pelos sionistas. Vários países desafiaram os políticos de Israel-EUA reconhecendo a Palestina enquanto estado. O comércio com a China ultrapassa o comércio com os EUA nos maiores países da região.

Os regimes fantoches no Iraque, no Afeganistão e no Paquistão assinaram importantes acordos económicos com a China, o Irão e a Turquia apesar de os EUA injectarem milhares de milhões de dólares para reforçar a sua posição militar. A Turquia, um antigo cliente militar do comando EUA-NATO alarga a sua procura de hegemonia capitalista expandindo laços económicos com o Irão, a Ásia central e o mundo árabe-muçulmano, desafiando a hegemonia militar EUA-Israel.

O Império americano ainda mantém importantes clientes e perto de um milhar de bases militares em todo o mundo. À medida que os regimes clientes e fantoches diminuem, Washington aumenta o papel e o âmbito das operações de esquadrões de morte extra-territoriais de 50 para 80 países. A crescente independência de regimes no mundo em desenvolvimento é alimentada sobretudo por um cálculo económico: a China oferece maiores retornos económicos e menor interferência político-militar do que os EUA.

A rede imperialista de Washington cada vez se baseia mais em ligações militares com aliados: com a Austrália, o Japão, a Coreia do Sul, Formosa no Extremo Oriente e na Oceânia; com a União Europeia no ocidente; e com um pequeno conjunto de países na América central e do sul. Mesmo assim, os aliados militares já não são dependências económicas: os principais mercados de exportação da Austrália e da Nova Zelândia estão na Ásia (China). O comércio UE-China está a crescer exponencialmente. O Japão, a Coreia do Sul e Taiwan estão cada vez mais ligados à China, através do comércio e dos investimentos… tal como o Paquistão e a Índia.

Estão a desenvolver-se na América Latina e na Ásia novas redes regionais igualmente importantes, que excluem os EUA, criando potencial para novos blocos económicos. Por outras palavras, a rede económica imperialista americana, construída após a II Guerra Mundial e amplificada pelo colapso da URSS, está num processo de decadência, apesar de as bases militares e tratados se manterem como uma ‘plataforma’ formidável para novas intervenções militares.

O que é claro é que os ganhos militares, políticos e ideológicos na construção da rede dos EUA em todo o mundo, obtidos com o colapso da URSS e as guerras pós-soviéticas, não são sustentáveis. Pelo contrário o exagerado desenvolvimento do aparelho ideológico-militar-segurança suscitou expectativas económicas e esgotou recursos económicos o que resultou na incapacidade de explorar oportunidades económicas ou consolidar redes económicas. Os “levantamentos populares” na Ucrânia, financiados pelos EUA, levaram a regimes clientes incapazes de promoverem o crescimento. No caso da Geórgia, o regime meteu-se numa guerra aventureira com a Rússia que resultou em prejuízos comerciais e territoriais. É uma questão de tempo até que os regimes clientes no Egipto, na Jordânia, na Arábia Saudita, nas Filipinas e no México enfrentem importantes revoltas, devido às bases precárias de governos de dirigentes corruptos, estagnados e repressivos.

O processo de decadência do Império americano é causa e consequência do desafio das potências económicas emergentes que estabelecem centros alternativos de crescimento e desenvolvimento. As mudanças no interior de países na periferia do império e o crescente endividamento e défices comerciais no ‘centro’ do império estão a corroer o império. A actual classe governante dos EUA, tanto na variante financeira como militarista, não mostra nem vontade nem interesse em enfrentar as causas da decadência. Pelo contrário, apoiam-se mutuamente uma à outra: o sector financeiro baixa os impostos afundando a dívida pública e pilha o tesouro. A casta militar esgota o tesouro na manutenção de guerras e bases avançadas militares e aumenta o défice comercial sabotando as iniciativas comerciais e investimentos.

02/Janeiro/2011 O original encontra-se em http://petras.lahaine.org/articulo.php?p=1834&more=1&c=1.

Tradução de Margarida Ferreira.

Fonte: http://www.resistir.info/petras/petras_02jan11_p.html