Brasil e Washington decidem o destino da América Latina
2. Setembro: hora da verdade para os governos desenvolvimentistas A decisão de que a batalha decisiva se dê em setembro foi tomada na reunião da UNASUR em Bariloche, quando os presidentes decidiram resolver o conflito mediante negociações entre seus embaixadores e ministros de defesa, nas primeiras duas semanas de setembro. Nestas negociações Obama-Bush-Uribe não vão ceder nada e então chegará a hora da verdade aos governos desenvolvimentistas. Estes só têm duas maneiras possíveis de reagir: aceitar a usurpação militar do espaço andino por Washington, com alguma racionalização propagandística, ou enfrentar em bloco tal usurpação. Caso aceitem a usurpação militar, ficam sem credibilidade em seu discurso bolivariano e tornam-se cúmplices de sua futura submissão militar imperialista; caso não a aceitem, terão que assumir a atitude dos Libertadores. Esta é a disjuntiva que têm que resolver na primeira quinzena de setembro, para irem preparados às negociações com Uribe; e, depois, nas últimas duas semanas de setembro, para ganhar a batalha pela essência moral de seu projeto e por sua credibilidade pública.
3. O significado político-militar de Bariloche A transcendental data de setembro fica mais transparente quando se a ilustra com o seguinte cenário bélico. Dois exércitos, o imperial-colonialista e o patriótico-libertador, se alistam para definir pelas armas qual dos dois projetos históricos que representam prevalecerá. Antes do choque dos dois corpos armados, as suas vanguardas se encontram e decidem negociar (Bariloche). Dado que nenhuma parte cede, resolvem adiar a batalha decisiva para o mês de setembro. As primeiras duas semanas são de “guerra fria”, caracterizadas pela reunião dos ministros. Dado que essas reuniões, como todo mundo sabe, não vão resolver nada, porque os dois projetos são antagônicos, o conflito passa à fase “quente” na segunda parte de setembro; na qual cada governo ficará publicamente definido como proimperialista ou probolivariano.
4. Os definidores da guerra: Washington e Brasil A transcendental decisão que determinará se a Pátria Grande seguirá sendo neocolônia monroeista [referência à Doutrina Monroe, política dos EUA para os outros países americanos, de 1823], ou se converterá em sujeito da política mundial, será resultado essencialmente entre os dois gestores preponderantes da geopolítica hemisférica: Estados Unidos e Brasil. A posição de Washington nas futuras reuniões, executada por um personagem interposto, o seu peão Uribe, não implica mistério algum. Não fará nenhuma concessão real em seu modus operandi imperial, a expansão e agressão militarmidiática, porque é o único modo de imposição mundial que lhe resta, depois de seu colapso financeiro e seu enfraquecimento político. O peso da decisão recai, então, sobre o Brasil, única força efetiva capaz de dar corpo aos três elementos da contenção que se requer para frear o projeto monroeista no curto tempo que resta: a Doutrina Militar Anti Monroe, o Bloco Militar de Defesa Sulamericana (BMDS) e o isolamento político-econômico hemisférico de Uribe. Tal posição de vanguarda seria objetivamente possível para o Brasil, pela debilidade estadunidense na Eurásia e na sua economia; mas é duvidoso que a classe dominante brasileira aceite-a, ou que Lula se atreva a implementá-la sem o respectivo apoio da elite. Existe uma alta probabilidade, então, de que Brasília preferirá manter a absurda ficção legalista das “garantias jurídicas” de Uribe, sustentada em Bariloche, junto com um padrão de appeasement [contemporização, adaptação ao gosto dos outros por respeito ou interesse] ante a troika Uribe-Bush-Obama.
5. Obrigação moral-política dos presidentes progressistas Nessa fase decisiva da política latinoamericana é obrigação política e moral dos presidentes latinoamericanos Rafael Correa, Hugo Chávez, Raúl Castro, Evo Morales e Daniel Ortega, tratar de criar:
a) uma Frente Unificada de Rechaço contra o projeto Uribe-Bush-Obama entre eles e os presidentes latinoamericanos vacilantes (Lula), invisíveis (Tabaré Vásquez) e débeis (Cristina Kirchner, Fernando Lugo), e,
b) aproximar-se aos movimentos de massas para conscientizá-los e mobilizá-los sobre esta conjuntura particularmente perigosa da luta de libertação. 6. A incompreensível ausência de Hugo Chávez Nesta acelerada dinâmica de acumulação de forças antagônicas entre monroeistas e bolivarianos é incompreensível que o Presidente Hugo Chávez se ausente da América Latina de 31 de agosto a 11 de setembro, em lugar de jogar um papel protagônico na mobilização das massas e dos governos críticos antes da reunião dos ministros de defesa e embaixadores da UNASUR. Não recorda o Presidente a lição do referendo de dezembro de 2007, quando encarregou a mobilização deste a uma equipe escolhida por ele, para ausentar-se, ficando na Eurásia, com o resultado de ter perdido o referendo? Nem está consciente do que dizem os seus ministros entre si? De que a contrarrevolução elaborou longas listas com dezenas de milhares de bolivarianos que querem matar e fazer desaparecer caso regressem ao poder.
7. O papel dos povos e intelectuais O papel dos movimentos sociais, políticos e intelectuais da América Latina, nesta conjuntura, é de suma importância. Teriam que pressionar publicamente aos governos locais vacilantes, em primeiro lugar o governo brasileiro, para enfrentar o perigo oligárquico-imperial com um programa concreto de patriotismo e dignidade latinoamericana. Dado que as bases militares na Colômbia e a ditadura militar em Honduras são uma questão de vida ou morte para os povos, que oferecerão os mortos se triunfar a contrarrevolução, e dado também que a política não se faz por amor e mediante o humanismo, mas sim por interesses e poder, os movimentos sociais devem usar a sua força frente aos governos desenvolvimentistas. De que forma? Fazendo-os entender que o seu futuro apoio a estes governos depende do papel que virão a assumir nesta batalha sulamericana do ano de 2009. Que os movimentos assumam esta posição de sujeitos políticos solidários, porém autônomos, não será fácil, porque as ilusões de um triunfalismo bruto promovido com grande força por alguns governos locais e seus intelectuais cortesãos – tanto individuais como coletivos (jornais, tv, portais de Internet) – e a falta de formação política sistemática das organizações de massas, assim como a simbiose entre movimentos de massas e intelectuais do Estado com os governos desenvolvimentistas, têm atrasado o nascimento de uma vanguarda latinoamericana que possa assumir essa tarefa vital nesse vital mês de setembro.
“Dos esforços de hoje depende a sorte da América do Sul”, dizia o Grande Marechal Antonio José de Sucre às suas tropas em Ayacucho, no dia 9 de dezembro de 1824. Hoje, ante o Ayacucho de 2009, é tão vigente esta consigna como há dois séculos.