“No se puede confiar en el imperialismo, ni tantito así… Nada!”

A famosa frase do Comandante Che Guevara em seu discurso na Organização das Nações Unidas (ONU) segue sendo um alerta, cada vez mais atual, que não podemos desprezar.

Serve tanto para as ilusões de Muamar Kadafi de que sua aproximação do império poderia poupá-lo do mesmo destino do Iraque, quanto para os governos dos países que integram o Conselho de Segurança da ONU e acreditaram que os Estados Unidos apenas iriam “assegurar o controle do espaço aéreo da Líbia”.

A trajetória histórica do regime de Muamar Kadafi é a prova do perigo em se confiar no imperialismo. Kadafi chegou ao poder em 1969, com um projeto nacionalista inspirado na liderança do egípcio Gamal Abdel Nasser (1918-1970), disposto a unificar os países árabes em torno de um projeto autônomo, nacional e terceiro-mundista. Com a derrubada do Rei Idris I que era extremamente vinculado às empresas estadunidenses de petróleo, substitui a monarquia por uma república, determina a retirada da base aérea dos Estados Unidos de Wheelus, território líbio, e inicia um intenso programa de nacionalizações.

A nova correlação de forças inaugurada pelo fim da União Soviética demarca o início das ilusões de Kadafi de que uma aproximação com o império poderia poupá-lo de um destino semelhante ao do Iraque. A partir de outubro de 2002, iniciou-se uma maratona de visitas a Trípoli: Berlusconi (Itália), em outubro de 2002; Aznar (Espanha), em setembro de 2003; Berlusconi de novo em fevereiro, agosto e outubro de 2004; Blair (Inglaterra), em março de 2004; Schröeder (Alemanha), em outubro de 2004; Chirac (França), em novembro de 2004. Em 2003, anuncia sua intenção de aliar-se à guerra ao terror. Abre a economia para as grandes transnacionais do petróleo. A British Petroleum, Exxon, Halliburton, Chevron, Conoco e Marathon Oil associam-se aos gigantes da industria bélica Raytheon e Nortroph Grumman e com a Dow Chemical para formar a US-Libia Business Association, em 2005.

Desde então, declara-se um colaborador dos Estados Unidos – os quais ele ajudou em sua “guerra ao terror” – e da Itália, com quem ele colaborou na deportação de imigrantes que tentavam chegar à Europa a partir da África. Tal “guinada política” de aproximação do imperialismo abalou sua base social, retirando-lhe o discurso de defesa dos interesses nacionais e colocando seu regime como um aliado do império que havia combatido por tanto tempo.

Muamar Kadafi está pagando caro o preço desta ilusão. Ao enfrentar uma revolta social com bases legítimas, seus aliados imperialistas o abandonaram sem qualquer vacilação e prontamente aproveitam-se da situação para abocanhar as riquezas naturais da Líbia.

Já não resta qualquer dúvida. Os Estados Unidos estão usando o pretexto da intervenção humanitária para proteção dos civis, com o objetivo claro de tomar o controle dos recursos energéticos do país e impor um novo regime, de acordo com seus interesses. Indagada pelos bombardeios efetuados pelos aviões da OTAN, a Secretária de Estado Hillary Clinton justificou os ataques através da “legalidade” das Resoluções 1970 e 1973 do Conselho de Segurança da ONU, que “autorizaram todas as medidas necessárias” para proteger os civis líbios da repressão do regime comandado por Kadafi.

Aqui nos deparamos com outra grave “ilusão” ante o imperialismo. Ao aprovar ou se abster na reunião do Conselho de Segurança da ONU, os países, inclusive o Brasil, permitiram aos Estados Unidos manipular a resolução e promover uma intervenção militar onde claramente pretendem consolidar suas posições e aliados em território líbio.

Jamais houve qualquer intenção humanitária na proposta dos EUA. Basta comparar com a situação do Bahrein, onde recentemente 160 blindados e mais de mil soldados da chamada Liga Árabe, em especial da Arábia Saudita, invadiram o pequeno emirado, sufocando com mortes e feridos a revolta popular, ante o silêncio das grandes agências internacionais de informação e total cumplicidade dos Estados Unidos. Neste caso, a preocupação estadunidense é assegurar o regime que lhe permite sediar a estratégica 5ª Frota Naval, que controla a passagem pelo golfo pérsico.

É preciso mobilizar-se contra a intervenção dos EUA e seus aliados da OTAN na Líbia. A presença militar imperialista manipula a legítima revolta popular, fortalecendo representantes e líderes tribais aliados. Mais uma vez o alerta de Che Guevara se confirma: “Não se pode confiar no imperialismo…”

Fonte: http://www.brasildefato.com.br/node/5987