A lucrativa atividade de ser oposição na Venezuela
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ODiário.info – 9-5-2017
A situação venezuelana é muito complexa, mas há nela uma coisa absolutamente clara para quem queira ver com objetividade: por detrás da oposição interna está uma larga coligação nacional e internacional cujos recursos financeiros são aparentemente inesgotáveis. O grande capital e o imperialismo estão apostando na destruição do processo bolivariano.
Uma verdade mil vezes repetida também pode parecer mentira. Esse poderá ser o caso da denúncia do financiamento dos EUA e dos grupos econômicos nacionais à oposição venezuelana e, claro, de organizações internacionais interessadas em destruir a Revolução Bolivariana.
Será verdade? A pergunta repete-se com a mesma frequência das denúncias do governo do presidente Nicolas Maduro sobre as fontes de financiamento da oposição venezuelana.
No entanto, Maduro não é o precursor. Antes dele a denúncia foi feita – e reiterada – pelo falecido presidente Hugo Chávez, que foi vítima de um golpe de Estado em 2002 e, desde então, o assédio ao seu governo foi sempre em escalada. Mas do que é que se trata? De onde provêm os vultosos recursos que foram destinados à direita venezuelana, ao longo de quase duas décadas ininterruptamente? A resposta é longa.
Desde contribuições diretas do departamento de Estado para porta-vozes da oposição até injecção de divisas em organizações de fachada que actuam no país, passando pelas contribuições do empresariado local, sem descurar o «apoio» recebido por parte dos partidos políticos e fundações da Europa, o que tem sobrado à direita são receitas. E quase sempre em moeda estrangeira.
Washington, mon amour
A advogada estadunidense Eva Golinger foi uma das vozes que mais referiu os recursos que chegam à oposição venezuelana, via Washington. Em 2009, por exemplo, a investigadora – apoiada em pesquisas de documentos desclassificados do Departamento de Estado – calculava em 6,4 milhões de dólares as contribuições do Fundo Nacional para a Democracia (NED na sua sigla inglesa) aos grupos políticos que se opõem à Revolução Bolivariana. Os números não são exagerados.
Em 2014, a justificação orçamental do Congresso norte-americano (página 126) detalhou que para a Venezuela foram destinados 5 milhões de dólares para «apoiar os esforços políticos de construção de concorrências» com o propósito de «proteger» o espaço democrático através do financiamento à sociedade civil». Apesar dos EUA terem vários programas de «cooperação» em áreas como a saúde, a cultura ou a educação, todos os recursos para o país sul-americano foram enviados origem: o Fundo de Apoio Econômico (ESF na sua sigla inglesa).
No entanto, a mudança de inquilino na Casa Branca ameaça cortar o fluxo notas verdes. O presidente Donald Trump, anunciou que fará um corte de mais de um terço nos programas de «cooperação» com a América Latina feitos através da USAID (a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional), segundo a Foreign Policy. A direita venezuelana, que foi financiada no ano passado com 6,5 milhões de dólares não receberá nem um cêntimo. Será que essa tesourada no financiamento, a primeira em dezoito anos, empurra a oposição para uma mais rápida atuação para forçar por um caminho antidemocrático a saída de Maduro?
O instrumento ONGs
O poder brando que encobre o rosto rude dos seus financiadores tem também o seu lugar na Venezuela, sob a forma de ONGs. Estes setores, aparentemente independentes do Estado e dos partidos políticos, converteram-se na principal fachada para receber financiamento de terceiros países, com os EUA à cabeça.
Apesar de, em 2010, a Venezuela ter aprovado uma lei que proíbe às organizações receberem financiamento externo para programas que «possam atentar contra a estabilidade e o funcionamento das instituições da República», isso não impediu que, entre 2013 e 2014, tivessem entrado no país mais de 14 milhões de dólares provenientes dos EUA enviados para o financiamento de ONGs ligadas à oposição, precisamente o período em que recrudesceram as las manifestações violentas da direita que custaram a vida de 43 venezuelanos. Agora, o panorama é idêntico.
Enquanto a direita recrudesceu os focos de violência nas ruas com ataques a militantes chavistas, destruição de patrimônio público, incêndio de hospitais, atos de violência bárbara, bloqueios de estradas principais e até saques em zonas populares, que tiveram um saldo de 26 mortos e mais de 500 feridos, organizações como a Foro Penal – financiada por Freedom House e dirigida por Gonzalo Himiob – convocaram uma manifestação no dia 29 de abril contra o governo do presidente Maduro, a quem, paradoxalmente, responsabilizam por «provocar» este ambiente.
Para o presidente venezuelano o plano dos seus adversários políticos é transparente: provocar um estado de comoção nacional que lhes permita perpetrar um golpe de Estado com o aval dos EUA e a bênção da Organização dos Estados Americanos (OEA). Daí, Caracas ter anunciado a sua saída desta organização.
Empresários em guerra
Mas o apoio que a oposição recebe não é apenas internacional. Os seus financiadores estão também na Venezuela e são, essencialmente, parte do poder fático mais importante: o poder econômico. Empresários, banqueiros e investidores figuram entre os patrocinadores preferidos (e subreptícios) da direita do país. A única coisa que mudou foram os métodos de colaboração.
Se em 2002 e 2003, durante o golpe de Estado e a sabotagem patronal contra Chávez, os empresários se uniram a uma estratégia de paralisação das suas indústrias para pressionar a saída do líder bolivariano, com Maduro escolheram um caminho diferente. Hoje, esses mesmos monopólios optaram por «lutar» sem sacrifício dos seus vultuosos lucros.
Lorenzo Mendoza, um milionário com lugar cativo na revista Forbes, é um deles. Numa gravação áudio difundida em outubro de 2015, o empresário admitiu, em conversa com um amigo muito chegado que estava «em guerra»: Ricardo Haussmann, um ex-ministro da Economia responsável pela implementação do pacote neoliberal que culminou na explosão social de 27 de fevereiro de 1989 na Venezuela, conhecido como «O Caracazo».
Perante essa gravação, Maduro chamou «hipócrita» e «feijão de duas caras» a Lorenzo Mendoza por conspirar contra o país, ao mesmo tempo que recebia mais de 5 bilhões de dólares do Estado para os seus negócios em território nacional. Mas o poder económico nunca abandona os seus. E em março deste ano, o dono do grupo Polar foi galardoado pela sua “audácia empresarial” num dos círculos mais restritos da elite corporativa, que já tenta colar o seu nome aos eventuais «presidenciáveis» da direita.
Da mesma família é também uma das figuras da ultradireita venezuelana: Leopoldo López Mendoza, sobrinho-neto de um poderoso empresário, dono de bancos, um dos que se encheram as suas chorudas fortunas antes da chegada de Chávez ao poder.
As viagens de Lilian Tintori, casada com Leopoldo López e a tentativa do lobby político nas mais altas instâncias internacionais a pedir a libertação do marido, condenado na Venezuela pela sua responsabilidade em actos terroristas que causaram a morte a 43 venezuelanos, mostram bem quão poderosa é esta família.
Outdoors com a foto de Leopoldo López veem-se em Caracas, mas também os há noutros países como Espanha e França. O mesmo sucede com a propaganda política da oposição que invade os visores dos aparelhos com acesso à internet, e quando se utilizam as redes sociais ou se descarrega um jogo a mensagem a mensagem da direita é quase onipresente. E nada disto é grátis, claro.
Este texto foi inicialmente publicado em 29 de Abril de 2017 em:
https://actualidad.rt.com/
Tradução de José Paulo Gascão