Justiça seja feita

(Veiculado no Correio da Cidadania a partir de 04/06/11)

Estava participando de um programa de rádio do Rio de Janeiro, aliás, um dos melhores desta cidade, quando um ouvinte telefonou reclamando da minha aritmética. Eu havia dito que infelizmente o presidente Lula era o campeão na promoção de rodadas de leilões de áreas do território nacional para permitir que empresas estrangeiras se apoderassem do nosso petróleo. Ele tinha ganhado do FHC, neoliberal confesso de triste lembrança, por cinco a quatro. Havia também criticado, com toda indignação que o tema induz e meu coração suporta, a 11ª rodada que o governo Dilma começa a providenciar. O ouvinte concluiu que o escore devia estar empatado em cinco a cinco, senão a presidente Dilma não estaria promovendo a 11ª rodada de entrega do nosso petróleo.

Fiquei em dúvida se o ouvinte era um matemático precioso ou um fã fervoroso do FHC. Como o programa estava perto de terminar, dei a explicação objetiva que a oitava rodada não contava porque foi suspensa pela Justiça. Porém, se a oitava rodada tivesse acontecido, Lula faria ainda mais bonito, pois ganharia por seis a quatro de FHC. Na hipótese do ouvinte ser uma tiete do FHC, fato este de difícil probabilidade de ocorrência, dado o compromisso social do apresentador do programa (se bem que nenhum comentário é barrado), escrevo o presente artigo para restabelecer a justiça.

O FHC se esforçou muito, desde que assumiu o governo, em 1995, para destruir o que havia sido construído por brasileiros memoráveis, com muito suor e luta, a partir do final da década de 40. FHC cooptou congressistas, segundo a manchete de capa do Jornal do Brasil de 8/6/95, para poder retirar da Constituição o monopólio estatal do petróleo. Na esteira do vendaval neoliberal que varreu a América Latina nos anos 90, em 1997 ele conseguiu aprovar a lei 9.478, a das concessões, extremamente danosa para nossa sociedade. Em 1998, criou a Agência Nacional do Petróleo (ANP) e, assim, só a partir de 1999 começou a entregar o território nacional, não tendo tempo para mais do que quatro rodadas. Era sempre uma rodada por ano, aliás, periodicidade nunca explicada pelo Ministério das Minas e Energia (MME). Assim, fazendo justiça, apesar de só fazer quatro rodadas, ele trabalhou muito.

Quando a descoberta do pré-sal foi anunciada, o governo Lula suspendeu as rodadas de leilões, dando a esperança de que elas seriam sepultadas para sempre. Houve grande avanço no novo marco regulatório de Lula, que inclui o contrato de partilha, em comparação com a lei das concessões de FHC, mas infelizmente ele só vale para o pré-sal. No governo Dilma, os vampiros das empresas estrangeiras, incrustados no MME e na ANP, sugadores do sangue do nosso povo, promovem a 11ª rodada usando a lei das concessões. Tudo isto quando, em todo o mundo, os países que se desenvolveram melhor nos anos 90 e 2000 foram aqueles que não seguiram a cartilha neoliberal. A lei das concessões faz parte do entulho neoliberal que precisa ser banido, junto com seus adeptos, da prática do governo brasileiro, para aumentar o bem-estar do nosso povo.

Também deixou-me perplexo, nesses dias, a nomeação de Gerdau, Reichstul e Maciel para o Conselhão. Primeiro porque estes seriam nomes que o Serra certamente chamaria para seu governo e eu não votei nele. Aliás, todos os três devem ter votado no Serra. Se fossem simples burocratas, não teria a mínima importância em quem eles tinham votado. Mas eles podem ser enquadrados como ideólogos. Recuso-me a acreditar que não existiam, na linha progressista e nacionalista, três nomes brilhantes, obviamente muito melhores que estes.

Gerdau foi o cidadão que, em uma palestra que assisti, quando perguntado qual a recomendação dele para as universidades públicas brasileiras, respondeu: “elas devem atender ao mercado”. Fiquei pensando até que esta deve ser a única resposta que eles têm para qualquer pergunta. A resposta dele significava que o país não formaria mais sociólogos, arqueólogos e outros profissionais pouco demandados pelo mercado. Reichstul foi o presidente da Petrobrás que queria mudar seu nome para Petrobrax. Mais poderia ser dito, mas este fato já resume tudo que ele é. Resta Maciel, ex-presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás, ex-secretário do governo Collor e ex-presidente da Ford, um cidadão que, dentro do seu direito, muda de opinião. Muda muito.

Fonte: http://www.correiocidadania.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=5904