Evo Morales à Jornada Continental de Solidariedade com a Bolívia
Para preservar seu poder e seus privilégios e escapar do processo de mudança, as oligarquias latifundiárias da chamada Meia Lua se encobrem nas autonomias departamentais e na divisão da unidade nacional, servindo aos interesses ianques de acabar com a nova organização da Bolívia.
No entanto, no referendo revogatório de 10 de agosto, recebemos o mandato de dois terços do povo boliviano para consolidar este processo de mudança, para seguir avançando na recuperação de nossos recursos naturais, para garantir o Viver Bem para todas as bolivianas e bolivianos, e unir os distintos setores do campo e da cidade, do oriente e do ocidente.
Irmãs e irmãos, o que ocorreu no referendo revogatório na Bolívia é algo importante não só para os bolivianos, mas para todos os latino-americanos. Dedicamos isso a todos os revolucionários da América Latina e do mundo, reivindicando a luta de todos os processos de mudanças.
Venho para expressar a forma de como recuperar a vida dos nossos povos, o chamado Viver Bem, para recuperar nossa visão sobre a mãe terra, que para nós é vida, porque não é possível que um modelo capitalista converta a mãe terra em mercadoria. Cada vez mais, vemos profundas coincidências entre o movimento indígena e as organizações dos movimentos sociais, que também situam-se pelo Viver Bem. Nossas saudações a eles para que, de maneira conjunta, possamos buscar um certo equilíbrio no mundo.
E nesses marcos, quero compartilhar e propor para debate 10 mandamentos para salvar o planeta, a humanidade e a vida, não apenas a este nível, mas também para debater com nossas comunidades, com nossas organizações.
Primeiro, se queremos salvar o planeta Terra para salvar a vida e a humanidade, temos a obrigação de acabar com o sistema capitalista. Os graves efeitos da mudança climática, das crises energéticas, alimentares e financeiras, não são produto dos seres humanos em geral, mas do sistema capitalista vigente, desumano, com seu desenvolvimento industrial ilimitado.
Segundo: renunciar à guerra, porque nas guerras não ganham os povos, só ganham os impérios, não ganham as nações, ganham as transnacionais. As guerras beneficiam as pequenas famílias, e não os povos. Os milhões de trilhões que se destinam à guerra devem ser destinados para reparar e curar a mãe terra, que está ferida pela mudança climática.
Terceira proposta para o debate: um mundo sem imperialismo nem colonialismo, onde as relações devem estar orientadas no âmbito da complementaridade, levando em conta as profundas assimetrias que existem de familia para familia, de país para país, e de continente para continente.
O quarto ponto está destinado ao tema da água, que deve ser garantida como um direito humano e deve-se evitar sua privatização em poucas mãos, já que a água é vida.
Como um quinto ponto, quero dizer-lhes que devemos buscar como acabar com o desperdício de energia. Em 100 anos estamos acabando com a energia fóssil criada durante milhões de anos. Como alguns presidentes reservam terras para automóveis de luxo e não para o ser humano, devemos implementar políticas para frear os agrocombustíveis, e desta maneira evitar a fome e a miséria para nossos povos.
Como sexto ponto: respeito à Mãe Terra. O sistema capitalista trata a Mãe Terra como uma matéria-prima, porém a terra não pode ser entendida como uma mercadoria, quem poderia privatizar, alugar ou fretar sua mãe? Proponho que organizemos um movimento internacional em defesa da Mãe Natureza, para recuperar a saúde da Mãe Terra e restabelecer com ela a vida harmônica e responsável.
Um tema central, como sétimo ponto para o debate, é que os serviços básicos, ou seja água, luz, educação, saúde, devem ser levados em conta como um direito humano.
Como oitavo ponto, consumir o necessário, priorizar o que produzimos e consumimos localmente, acabar com o consumismo, o desperdício e o luxo. Devemos priorizar a produção local para o consumo local, estimulando a autosustentabilidade e a soberania das comunidades dentro dos limites que a saúde e os escassos recursos do planeta permitam.
Como nono ponto, promover a diversidade de culturas e economias. Viver em unidade respeitando nossas diferenças, não só fisionômicas, mas também econômicas, economias manejadas pelas comunidades e associações.
Irmãs e irmãos, como décimo ponto, apresentamos o Viver Bem, não viver melhor às custas do outro, um Viver Bem baseado na experiência dos nossos povos, as riquezas das nossas comunidades, terras férteis, água e ar limpos. Fala-se muito do socialismo, mas deve-se melhorar esse socialismo do século XXI, construindo um socialismo comunitário ou simplesmente o Viver Bem, em harmonia com a Mãe Terra, respeitando as formas de vida da comunidade.
Finalmente, irmãs e irmãos, com certeza vocês estão dando prosseguimento sobre os problemas que existem. Chego à conclusão de que sempre haverá problemas, porém quero lhes dizer que estou muito contente, não decepcionado e nem preocupado porque esses grupos que permanentemente escravizaram nossas famílias durante a colônia, a república e na época do neoliberalismo, continuam agrupados em algumas famílias, resistindo a mim.
É nossa luta enfrentar esses grupos que vivem no luxo e não querem perdê-lo, perder suas terras. É uma luta histórica e esta luta continua. Irmãs e irmãos, na esperança de que esta Jornada Continental do III Fórum Social Américas culmine com fortes laços de unidade entre todos vocês e com um firme Plano de Ação a favor do povo da Bolívia e de todos os nossos povos, reitero minha fraternal saudação.
Evo Morales Ayma Presidente da República da Bolívia
Nota do Secretariado do PCB: apesar de diferenças que possamos ter com relação ao chamado “socialismo do século XXI” e do necessário debate que deve ser feito a respeito, esta mensagem de Evo Morales é da maior importância para entendermos seu pensamento e os rumos da revolução democrática e cultural que se dá na Bolívia.