Migrações, imperialismo e crises humanitárias

imagemComissão Estadual (SP) de Solidariedade Internacional da União da Juventude Comunista

Certamente muitos foram bombardeados, nos últimos meses, com notícias da situação venezuelana. A mídia burguesa trabalha intensivamente por colocar no imaginário popular de que a Venezuela vive o verdadeiro inferno na Terra graças ao governo bolivariano de Nicolás Maduro. Não tardam, igualmente, em atacar cada avanço do povo sírio e de seu governo anti-imperialista em sua luta contra o intervencionismo, contra o terrorismo e por sua autodeterminação. Não há, da mesma forma, hesitação alguma dos alicerces midiáticos do eixo EUA-UE-Japão em fabricar, repetidamente, as mais mirabolantes fantasias contra a Coreia Popular, objetivando a difamação e derrubada da nação socialista.

Pois bem, nas últimas semanas pouco se falou da Caravana Migrante, um movimento unificado de mais de cinco mil pessoas saindo de Honduras em direção aos EUA em busca de trabalho e melhores condições de vida. A caravana conseguiu atravessar a Guatemala e a fronteira sul do México, sendo recebida com forte repressão por parte das forças de segurança do país. Os EUA enviaram o secretário de Estado, Mike Pompeo, para “conversar” com o presidente Enrique Peña Nieto, que deixará o cargo em pouco mais de um mês. Esta conversa, como muito bem se sabe, foi regada de imperativos estadunidenses e extorsão econômica, de forma a pressionar o governo a reforçar as medidas para barrar a continuidade da caravana.

A repressão também já espera os migrantes nas fronteiras dos EUA. Tendo em vista as caravanas, o governo reacionário de Trump já deslocou diversas tropas da Guarda Nacional para a fronteira para impedir sua entrada, assinando um documento firmando que imigrantes “irregulares” não teriam o direito de pedir exílio no país. Além disso, diversas milícias armadas estão se dirigindo para as fronteiras.

Mas por que o que nos chega é tão impreciso e quase nada sincero? Precisamos recapitular as coisas. Em 2009 o presidente progressista hondurenho, Zelaya, sofreu um golpe orquestrado pela oposição e apoiado intimamente pela mídia e governo estadunidenses, chegando a ser levado para a Costa Rica. Desde então, os governos hondurenhos configuram-se como verdadeiros empregados dos interesses norte-americanos, inclusive utilizando-se de esquemas grotescos de fraude eleitoral para garantir a continuidade de seu projeto. A economia hondurenha sofre, hoje, grave crise: com mais da metade de seu PIB ligado diretamente aos EUA, o país tem mais de um milhão de desempregados (em uma população de cerca de 9,25 milhões), milhões de subempregados, além de ainda ter a maioria de sua população abaixo da linha da pobreza. Não apenas isso, o país se tornou notório por “disputar”, anualmente, o topo do ranking de países mais violentos do mundo. Agora, o governo dos Estados Unidos – promiscuamente envolvido na crise que hoje assola a vida de milhões de hondurenhos –  se coloca de vigília para receber com brutalidade os que buscam a mais mínima dignidade.

Qualquer similaridade com a situação brasileira não é mera coincidência. Estamos no decorrer de uma ofensiva imperialista clara no continente: com o acirramento das contradições do capitalismo no campo internacional, o “reaquecimento” da geopolítica bipolar e, especialmente, após a crise de 2008, surgiu uma irrevogável necessidade de enrijecimento dos regimes de dominação capitalista, e faz parte desta necessidade o solapamento dos governos social-liberais, progressistas e bolivarianos da América Latina. O primeiro êxito foi, exatamente, em Honduras. Sua versão tupiniquim tardou, mas não falhou.

O governo venezuelano ainda é um dos poucos que resistem bravamente aos ataques golpistas e paga o preço disso. Claramente ouviremos acerca da situação venezuelana, das realidades de sua crise interna e suas deturpações constantemente desveladas pelas mídias independentes. Mas nada sobre Honduras, Argentina, Equador. A linguagem do Império faz parte da estratégia central de como pretendem modelar e de quanto, de fato, conseguirão modelar as consciências das massas ao seu plano de continuação. Para Washington e aqueles com ambições similares, “direitos humanos” são apenas mais uma convenção retórica: quando conforta, pauta-se, quando incomoda, vela-se.

Como os sauditas em relação aos sírios e iemenitas, para os Estados Unidos da América, os hondurenhos e as outras caravanas latino-americanas que os acompanham, primeiro, não lhes servem, segundo, não lhes agradam, portanto, sem nenhuma surpresa, optam pela supressão amoral.

No reino do capitalismo, o humano é subvertido ao dinheiro. Em sua decomposição imperialista, podemos, a qualquer momento, ser os próximos hondurenhos, iemenitas, sírios e venezuelanos.

Conferir a nota do Partido Comunista do México sobre o tema: http://www.comunistas-mexicanos.org/partido-comunista-de-mexico/2192-la-lucha-de-los-migrantes-y-la-clase-obrera-de-mexico-una-sola

Foto: PC do México