O populismo penal e a resposta dos socialistas

imagemDaniel Buarque – Militante da UJC

Depois da aprovação do chamado “Pacote Anticrime”, dentre as mudanças significativas que ocorreram na legislação penal brasileira, uma que se destaca foi a transformação do artigo 316 do Código de Processo Penal. Ficou estabelecido que, quando um juiz decreta uma prisão preventiva, ou seja, uma prisão provisória antes de a pessoa acusada ter uma condenação definitiva, ele precisa revisar esse caso a cada 90 dias e justificar a necessidade de manter essa pessoa presa. A justificativa para essa alteração seria um maior controle sobre prisões provisórias, dado que de 30% a 40% dos centenas de milhares de presos no Brasil são pessoas em prisão provisória.

Em números absolutos o Brasil conta com a terceira maior população prisional do planeta. Tendo em vista que a ampla maioria da população prisional brasileira responde por crimes contra a propriedade ou por tráfico de drogas, que é só mais um mecanismo de criminalização da pobreza, essa alteração até poderia ser interessante do ponto de vista da redução da violência penal do Estado burguês.

Ocorre que, na prática, a mudança tem pouca eficácia. Ao invés de uma redução das prisões preventivas, o que se criou em inúmeros casos foi uma pequena burocracia para dar ares de “legitimidade” às prisões provisórias. Agora os juízes são obrigados a redigir novas decisões a cada 90 dias para justificar as prisões preventivas que decretaram.

Se, por algum acaso, o juiz responsável pelo caso deixa de redigir essa decisão com uma justificativa para manter a prisão preventiva, pelos próprios termos do Pacote Anticrime (que nada tem de democrático) o acusado deve ser solto. Nos termos da Lei, a acusação pela qual ele responde é irrelevante; se a prisão é provisória (ou seja uma prisão para uma pessoa que não teve condenação definitiva) o acusado precisa ser libertado.

Quando, nessas circunstâncias, o Ministro Marco Aurélio concede um Habeas Corpus para uma pessoa que é acusada de ser uma liderança do PCC, de ter furtado um pedaço de pão ou até mesmo de ter cometido um homicídio, ele não está fazendo nem mais nem menos do que cumprindo seu papel nos termos da Lei (burguesa). Nos termos da legislação, se havia um bom motivo para essa pessoa permanecer presa provisoriamente, a responsabilidade sobre isso era do juiz que avaliava a prisão preventiva.

Em contrapartida, neste mesmo caso, quando o Ministro Fux suspende a decisão de outro membro do STF, inicia uma disputa para deliberar quais membros do STF poderiam individualmente cassar decisões uns dos outros, e ainda acaba promovendo um debate sobre a suposta inconstitucionalidade do artigo 316 do CPP. Aí só há oportunismo em cima do pânico moral (que é tradição da mídia brasileira) para endurecer ainda mais as regras do direito penal.

Nisso não há nada de novo. Representantes da burguesia pegam um caso “modelo” de uma pessoa com influência ou que é acusada de um crime que causa grande aversão na sociedade e se utilizam da situação para justificar um endurecimento dos mecanismos repressivos do Estado burguês. Os dados sobre a situação prisional do país não deixam margem para engano: o foco dos mecanismos repressivos da justiça criminal é mirado nos setores mais precarizados da classe trabalhadora, em especial a juventude negra e periférica. Os dados sobre a permanência de altíssimas taxas de homicídio, concentradas nos mesmos setores da sociedade, também são prova de que a justiça criminal burguesa traz pouca ou nenhuma segurança para a classe trabalhadora.

A classe trabalhadora não tem nada a ganhar com a expansão da justiça criminal burguesa, em especial quando ela se justifica com o “pânico moral” e o “populismo penal” que é incentivado reiteradamente pela grande mídia brasileira.

A saída para a classe trabalhadora se encontra no horizonte da luta revolucionária, na superação da justiça burguesa e na construção de uma justiça popular, que paute formas coletivas de resolução de conflitos, que coloque a reparação de danos acima da sanha punitivista da justiça burguesa.

Num cenário em que cada vez mais a burguesia expande seu aparato repressivo, em que a América Latina tem continuamente convulsionado em uma crescente ofensiva burguesa, é preciso afirmar que o único rumo para lidar com a violência e injustiça que permeia a periferia do capitalismo se encontra na luta pelo poder popular e pelo socialismo.