O PCB, a segurança pública e o judiciário
Compilação e introdução – Lucas Silva: Membro do conselho editorial do Jornal Poder Popular e do Comitê Central do PCB
Neste 2024 completamos dez anos de operação lava-jato, com todas suas consequências nefastas para nosso país, trazendo a tona o punitivismo e seletividade corriqueiras do direito penal aplicado aos pobres, agora em patamares mais altos, afetando grandes nomes da política (inclusive figuras importantes da direita tradicional) e contribuindo decisivamente para a escalada reacionária que elegeu Jair Bolsonaro em 2018.
A recente absolvição do ex-juiz Sérgio Moro tanto no CNJ quanto no TSE voltaram a levantar polêmicas a respeito da força do lava-jatismo e da própria função do judiciário. Entendemos que para além dos problemas apresentados, o lava-jatismo também demonstra a importância e atualidade da luta antiimperialista, principalmente porque muitas perguntas ainda não foram respondidas a respeito da participação estadunidense na articulação com os promotores da operação.
Aproveitando as discussões em torno do poder judiciário, apresentamos algumas propostas do PCB a respeito do tema, coletadas do programa eleitoral de 2022 e das resoluções do XVI Congresso, centradas sobretudo na democratização do poder judiciário, sob forte controle popular e na desmilitarização da segurança pública, medidas fundamentais para combater o punitivismo e seletividade tão fortes nestas áreas. Acreditamos que pautar a discussão sobre o poder judiciário é muito importante, porém, diferentemente da agenda bolsonarista que pretende subverter o poder judiciário e a segurança pública para criar um estado de terror e exceção contra os trabalhadores (sobretudo os mais pobres), defendemos amplas reformas democratizantes que tensionem e fortaleçam a construção do poder popular, rumo a uma sociedade governada pelos trabalhadores, liberta de toda exploração e opressão.
XVI Congresso do PCB (Programa de Lutas para implementação da estratégia socialista no Brasil):
43) Na atual conjuntura, em que as questões ligadas à segurança pública vêm provocando debates e as soluções apresentadas pelos governos burgueses são a ampliação da repressão e a criminalização das comunidades proletárias, com a utilização cada vez maior de práticas de extermínio, é fundamental apresentar propostas de lutas que apontem a necessidade de uma política de segurança pública que tenha como objetivo central o apoio à população e o combate sistemático ao crime organizado em suas múltiplas formas. São elementos dessa política a oferta de empregos e de condições de vida digna para todos, o aumento dos impostos sobre a fabricação de armas, a legalização das drogas, reforma na política carcerária, o atual modelo de reclusão e abandono potencializa o crime organizado, que cresce e se ramifica nos e através dos presídios. Devemos ainda lutar pela extinção da Polícia Militar propondo uma completa desmilitarização e reestruturação da segurança pública, sob um marco civil unificado e o controle direto da população trabalhadora. Isso significa que, se por um lado somos completamente contrários às propostas de ampliação do comércio de armamentos, por outro lado, consideramos positiva a aspiração à participação popular direta, organizada e coletiva na segurança pública, como ocorrem em todas as experiências revolucionárias, desde as menos até as mais avançadas.
55) A luta em defesa do direito à cidade deve ter um caráter anticapitalista e anti-imperialista, na perspectiva de garantia das condições mínimas de vida da classe trabalhadora, em especial dos bairros e favelas, a partir de um planejamento urbano de caráter popular, bem como fortalecendo seu potencial de organização para a transformação social, denunciando a desigualdade histórica proporcionada pelo avanço do capitalismo e do imperialismo na América Latina. O racismo e a desigualdade ambientais e a distribuição desigual do acesso à cidade beneficiam grandes empresas e multinacionais, tais como empreiteiras, de transporte coletivo, de mineração, com o aumento da especulação imobiliária e da degradação ambiental, ampliando o número de famílias sem-terra e sem teto, o genocídio da população negra e dos povos originários. Nesse sentido, se faz urgente o fortalecimento da organização popular nesses espaços, proporcionado um avanço no processo de formação da consciência revolucionária.
82) Face à ofensiva reacionária contra as liberdades democráticas, não podemos nos bastar a uma luta defensiva: devemos associar a luta pelas liberdades democráticas à luta pelo Poder Popular, sem com isso cair em concepções liberais da democracia, o que significa erguer também bandeiras radicais, baseadas em nossas concepções da democracia. Neste sentido, defendemos um Congresso unicameral; a elegibilidade e revogabilidade de todos mandatos, inclusive no Judiciário; a restrição dos privilégios e vencimentos dos altos mandatários; o acesso à tribuna dos parlamentos municipais, estaduais e do Congresso Nacional a entidades sindicais e às organizações da classe trabalhadora; a realização de plebiscitos e referendos sobre todas as questões relevantes em discussão na sociedade. Articulando nossa tática ofensiva à nossa tática defensiva, permitimos que a luta pelo Poder Popular não seja secundarizada em nome da defesa das liberdades democráticas. Apenas assim podemos acumular forças, a partir da luta pelos interesses imediatos da classe trabalhadora, de modo a criar condições para a contraofensiva das forças socialistas.
Programa eleitoral presidencial de 2022:
Programa emergencial
17) Segurança pública. Fim da política de “guerra às drogas”. Descriminalização do uso de drogas, com legalização da maconha a curto prazo. Desmilitarização completa da segurança pública, com unificação das polícias e instituição do ciclo completo junto com a desvinculação das forças de segurança do exército, sob bases curriculares e formativas completamente reestruturadas numa lógica democrática, contribuindo efetivamente para o fim do genocídio da população negra. Revogação completa da lei antiterrorismo (12.850/2013). Implementação da política de cotas raciais em todos os concursos públicos federais e estaduais. Fim imediato das Unidades de Polícia Pacificadoras e políticas similares. Adoção das 16 medidas contra o encarceramento em massa do IBCCRIM.
19) Justiça, Memória e Verdade. Julgamento e punição dos responsáveis pelas torturas, assassinatos e outras violências cometidas pelos aparatos de repressão e seus agentes contra o povo brasileiro, desde a Ditadura Civil-Militar até os dias de hoje. Combate ao legado ideológico não apenas da Ditadura Civil-Militar, mas também da escravidão. Abertura total dos arquivos dos órgãos de repressão, preservando a documentação existente e ampliando do acesso ao conhecimento sobre os períodos da escravidão, das ditaduras e sobre o genocídio da população negra e dos povos indígenas ainda em curso.
Programa da Revolução Brasileira: a constituição do Poder Popular na luta
15. A democratização do sistema judiciário: O judiciário brasileiro tem sido, ao longo dos tempos, um instrumento das classes dominantes para punir os pobres e proteger os ricos. Trata-se de um sistema que tem uma lógica de atuação reacionária e antipopular, com um funcionamento corporativo sob o qual viceja a corrupção, e no qual os magistrados que cometem crimes raramente são punidos. E quando o são, em razão de ilícitos graves, a punição máxima é a aposentadoria compulsória que, somente em situações excepcionais, pode ser cassada! Os membros dos tribunais superiores são nomeados por governantes de plantão, com mandato vitalício, o que consolida os interesses corporativos, antidemocráticos e antipopulares na instituição judiciária. Para reverter essa situação propomos uma reforma estrutural profunda de todo o judiciário brasileiro (o que inclui necessariamente o Ministério Público), tanto do ponto de vista da legislação, quanto do controle social e transparência sobre a atividade da justiça e, especialmente, que os juízes nomeados para os tribunais regionais e superiores tenham mandato fixo sob controle social, ou seja: elegíveis e revogáveis pelo Poder Popular em sua respectiva jurisdição.
17. A democratização da segurança pública. Na sociedade de classes dependente, as polícias têm-se constituído em máquinas de matar a juventude e a população pobre da periferia, especialmente o povo negro – camadas sociais que são encurraladas entre a brutalidade da polícia e das milícias e o poder dos “soldados rasos” do tráfico de drogas nas favelas e periferias (cujos grandes financiadores, no entanto, não moram nas favelas, mas nos bairros nobres do Brasil e no estrangeiro). O nosso programa propõe a extinção da Polícia Militar, entendida como uma completa desmilitarização e reestruturação da segurança pública, sob um marco civil unificado e sob o controle direto da população trabalhadora, comparticipação popular direta, organizada e coletiva na segurança pública.
55. Contra a militarização da sociedade. Pelo fim da criminalização dos movimentos sociais e populares. Será implementada a reformulação da concepção e da estrutura do sistema penitenciário, com a revisão da política de encarceramento para pequenos delitos, a criação de sistemas prisionais centrados no trabalho e na educação. Legalização das drogas e fim da guerra aos pobres. Profunda reforma nos currículos e na formação das forças armadas, inserindo-as numa lógica de atendimento aos interesses populares. Combate sistemático à tutela militar, submetendo-os à justiça comum. Abertura de todos os arquivos e restituição da comissão da verdade com amplos poderes judiciais contra os torturadores. Fim das bases estadunidenses no país e do emprego de militares brasileiros em forças armadas estrangeiras.
Lutar, Criar, Poder Popular!
Referências:
Programa eleitoral de 2022: https://divulgacandcontas.tse.jus.br/candidaturas/oficial/2022/BR/BR/544/candidatos/890829/programa.pdf
Programa de lutas do XVI Congresso Nacional do PCB: https://drive.google.com/file/d/1F_5SvtoZsxCyfsp6dx1gek0kMYEoDTvX/view