Caso Assange: a imprensa e o silêncio dos cúmplices
Por Antônio Lima Júnior, jornalista, diretor da Associação Cearense de Imprensa (ACI) e membro do Comitê Central do PCB
Em fins de setembro do ano passado, repercutiu de forma bastante tímida, nos veículos de comunicação mundo afora, a reportagem do Yahoo News sobre a guerra da CIA contra o site WikiLeaks, em especial os planos para sequestro e assassinato do seu fundador, o jornalista australiano Julian Assange. Ao ouvir 30 ex-agentes da CIA, o portal mostrou que um plano circulava entre os funcionários da agência em 2017, onde havia a intenção de sequestro, envenenamento e assassinato do jornalista.
A reportagem afirma que o plano fora ordenado pelo ex-diretor da agência e ex-secretário de Estado Mike Pompeo. Apesar de circular dentro do alto escalão do governo Trump, as fontes afirmaram que o plano de sequestro já havia sido arquitetado ainda na administração de Barack Obama. Agentes da CIA também discutiram planos para assassinar outros membros do WikiLeaks baseados na Europa.
A agência norte-americana declarou guerra contra o empreendimento WikiLeaks, que há quinze anos tem contribuição fundamental na exposição da hipócrita democracia norte-americana, a exemplo do caso de maior destaque, quando o mundo teve conhecimento da frieza como as tropas estadunidenses invadiram o Iraque e matavam pessoas como se jogassem videogame, exposto no vazamento do vídeo intitulado ‘collateral murder’.
Refugiado na embaixada equatoriana desde 2012, Assange encontra-se hoje sob custódia da Polícia Metropolitana de Londres, quando fora preso em abril de 2019, uma clara demonstração de privação das liberdades políticas e democráticas. A perseguição contra Assange começou de forma mais abrupta a partir de 2010, quando o governo sueco emitiu um mandado de prisão contra o jornalista, sob suspeita de estupro contra uma mulher na Suécia, acusação que fora posteriormente arquivada pela justiça sueca, mostrando ser apenas um pretexto para prender Assange e extraditá-lo para os EUA.
Na época, Assange se entregou para a polícia e pagou a fiança, mas num jogo de perseguição constante, se viu obrigado a fugir, adquirindo asilo político na embaixada do Equador em Londres, a partir de 2012, até 2019, quando o governo equatoriano de Lenin Moreno realizou a grande traição de remover o asilo político concedido ao jornalista, permitindo assim que Assange fosse preso e permanecendo assim, desde então, sob custódia da Polícia Metropolitana de Londres.
Nesse período, a militância de Assange e do WikiLeaks não pararam, ao continuar expondo as manobras do imperialismo através de vazamento de documentos sigilosos, a exemplo dos e-mails da candidata Hilary Clinton, durante as eleições dos EUA em 2016, mostrando a sua atividade conspirativa durante o período em que esteve na condição de Secretária de Estado do governo Obama.
As denúncias dos planos de assassinar o jornalista, orquestrados pela CIA, pouco tiveram a devida repercussão na imprensa brasileira, mostrando a sua debilidade e subserviência aos critérios de noticiabilidade das grandes agências internacionais, que buscam calar as vozes opositivas aos grandes conglomerados de comunicação que estão alinhados aos interesses geopolíticos norte-americanos.
Chega a ser uma grande contradição, quando vemos diversos dos grandes jornais nacionais estamparem em seus editorais e capas a defesa da democracia e da liberdade de imprensa. Infelizmente, a democracia e a liberdade de imprensa que esses veículos apregoam é a versão liberal, ou seja, total liberdade para promover e defender os interesses da classe dominante e nada para ouvir e ecoar as demandas reais do povo e da classe trabalhadora. Assim, a outrora contradição se transforma em real afinidade com os interesses hegemônicos daqueles que controlam a imprensa.
Recentemente, o governo norte-americano solicitou a extradição do jornalista, com o interesse de levá-lo à justiça dos EUA e assim terminar de silenciar sua voz opositora, com a possibilidade de prisão perpétua. Assange tenta apelar nas instâncias legais britânicas para evitar tal destino. Até então, nada da imprensa internacional se manifestar, tampouco a brasileira. Qualquer iniciativa de denúncia é taxada como ‘manifestação apoiada por esquerdistas’, caracterização que ignora, por exemplo, a última carta aberta promovida por Christine Ann Assange, mãe do jornalista.
Antes que o pior aconteça, é preciso denunciar o papel da imprensa burguesa, cúmplice diante de tamanha calamidade, através do seu silenciamento, aquela velha teoria jornalística da espiral do silêncio, mas que aqui oculta o real caráter de classe da imprensa. Precisamos, sim, continuar lutando pela vida de Assange e também pelo seu grande legado, o da batalha pela verdadeira liberdade democrática de combater e denunciar as ingerências do imperialismo.