Política educacional e conjuntura

Por Elza Peixoto

O MOMENTO – PCB da Bahia

Os censos da educação básica e superior foram divulgados e evidenciam que o volume da demanda pela educação e a importância das escolas para a penetração na vida das comunidades não são desprezados pelos capitalistas de várias cepas, pelo mercado da fé e pelos militares que avançam com unhas e dentes sobre a educação da classe trabalhadora. Só um erro importante de avaliação, portanto, poderia levar os comunistas a desprezarem este movimento!
Nexos entre políticas de emprego e políticas educacionais.

O conjunto das reformas educacionais em curso (Reforma do Ensino Médio, Reforma da formação de professores) e a reforma administrativa (PEC 32, cujo desfecho avizinha-se) são a ponta do Iceberg no agravamento da concentração e centralização das riquezas a serviço do interesse dos capitalistas, e da expulsão da classe trabalhadora em relação ao acesso aos meios de vida (em relações capitalistas, determinadas pelo acesso ao emprego como condição de existência).

O mascaramento dos dados no Brasil dificulta a obtenção de números exatos acerca da precariedade das condições em que a classe trabalhadora acessa o emprego e a renda. No relatório do IPEA (3º Trimestre de 2023) refere-se a uma força de trabalho de 108,6 milhões, com uma taxa de ocupação de 100,3 milhões. O documento anota uma “população em idade ativa, mas que se encontra fora da força de trabalho” que abarca 66,3 milhões de pessoas, sendo 16,6% desta desocupação entre os jovens! Os dados de desemprego do IBGE, entretanto, registram como desempregados (pessoas com mais de 14 anos que estão disponíveis e tentam encontrar trabalho e não conseguem) 8,6 milhões de pessoas, e de desalentados 3,7 milhões, em um total de 12 milhões e 300 mil pessoas.

Os dados sobre os setores que geraram vagas novas durante o período de agosto de 2022 e julho de 2023 evidenciam que a indústria de transformação e a construção civil geraram apenas 289.600 vagas novas, enquanto o setor de comércio, reparação de veículos automotores e motocicletas gerou 302, 6 mil vagas novas no período. A indústria extrativista empregou 14,9 mil trabalhadores. As atividades profissionais, científicas e técnicas, a saúde humana/serviços sociais e a educação empregaram juntas 243,1 mil pessoas.

Estes dados gerais visam despertar a atenção para os nexos entre o tipo de emprego que está sendo gerado na formação social brasileira em relação ao tipo de escolaridade que estas vagas estão demandando. A decisão política sobre o tempo de escolarização responde efetivamente à demanda pela ocupação dos qualificados. Se esta demanda não é significativa, (i) dirige as políticas educacionais em direção à redução das vagas e (ii) pressiona imediatamente o interesse pela educação escolar básica e superior. Por outro lado, os capitalistas sempre disputaram a educação com vistas a uma qualificação pragmática dirigida às funções imediatas esperadas de cada segmento de trabalho.

O tipo de demanda de força de trabalho própria da formação social brasileira (que gera apenas 85.200 mil vagas em atividades profissionais, científicas e técnicas em um período de quase 01 ano), evidencia a decadência da demanda pela força de trabalho qualificada, e a tendência à formação para o trabalho simples já exigida pelo FMI nos anos 1990. O que estamos acompanhando é o desmonte da educação pública de massas e o aprofundamento do dualismo: segmentos de trabalhadores serão formados para parca demanda de trabalho qualificado existente e a massa de trabalhadoras receberá qualificação mínima para o trânsito nas vagas precárias, provisórias, de tempo curto e com remuneração muito baixa.

A base objetiva que está movendo este conjunto de transformações é perceptível na balança comercial. Exportamos o que produzimos, e o que produzimos (e como produzimos) explica onde estamos empregando e qual o tipo de trabalho está sendo exigido. Exportamos majoritariamente (i) produtos agropecuários e extrativistas (não beneficiados) marcados no Brasil pela produção com alto índice de mecanização e de robótica; (ii) e produtos agropecuários e extrativistas beneficiários (do tipo açúcares e melaços, óleos combustíveis ou de minerais betuminosos, produtos de ferro ou aço semiacabados, farelos de soja e alimentos para animais, carnes de aves e bovina, ferro gusa e relacionados, celulose, etc.).

Evidencia-se a contradição entre a campanha pela demanda por educação (Todos pela Educação, BNC Formação, BNC Formação de professores) e a educação efetivamente demandada no desenvolvimento das forças produtivas na formação social brasileira. Ocorrendo em um país profundamente dependente de uma divisão internacional do trabalho que nos lega a posição de celeiro do mundo, a batalha travada pelos trabalhadores da educação (pelos estudantes e por famílias de trabalhadores que dela dependem) em defesa da educação pública ocorre em meio de uma campanha difamatória perversa que inclui: estatísticas que apontam o “fracasso” escolar imputado aos professores; expansão do uso das escolas como UPPs, por meio da militarização; campanha pelo controle da capacidade de formação política dos professores; pressão sobre os professores em direção à responsabilização sobre as verbas que as escolas podem conquistar (via editais – no caso das Universidades; via subordinação ao treinamento para bons resultados na avaliação – como os professores da educação básica).

A concentração e a centralização da riqueza agravam-se com a financeirização da economia. A redução de investimentos em setores produtivos associada à crescente inserção da IA, da informática e da robótica reduzem os postos de trabalho. Políticas de emprego geridas conforme a lógica neoliberal aprofundam a intermitência dos contratos de trabalho e a reforma trabalhista retira direitos e rebaixa os salários. Para toda a classe trabalhadora, (i) há dificuldades na venda força de trabalho, devido à escassez de empregos, e, (ii) quando esses trabalhadores encontram postos para trabalhar, recebem salários baixos; (iii) pagam caro pelos meios de vida e ao fim, devem (iv) arcar com os custos de sua qualificação. A situação de retirada de direitos é gravíssima, num processo em que a educação vai sendo transformada em supérfluo e a massa de servidores públicos vê-se espremida pela reforma administrativa que efetivamente avança. A pressão é particularmente importante sobre os trabalhadores da educação em geral e os professores em particular.

Está em curso o desaparecimento de uma categoria profissional que vai sendo substituída por processos de concentração do conhecimento em nuvens controladas pelos grandes capitais que decidem quem terá acesso a que. O desenvolvimento da IA já permite regular a distribuição do conhecimento e controlar a informação (e a formação) que chega a grupos de consumidores. O período da pandemia aprofundou o desenvolvimento de TICs e de IAs pensadas para o ensino e, da mesma forma, de tecnologias de avaliação do conhecimento. Esta estrutura dispensa a escola como aparelho ideológico e move cada vez mais a escola em direção ao aparelho repressivo (a militarização completa um ciclo crescente de encarceramento dos estudantes). Com isso, avoluma-se a violência interna nas escolas, o que justifica a militarização.
Sindicatos, partidos e a mobilização contra o ataque à educação pública:

A vitoriosa campanha do capital para o enfraquecimento dos organismos organizativos da classe trabalhadora (na forma do ataque à estabilidade no emprego, do rebaixamento salarial e do endividamento, que impactou na redução das filiações e por fim, na campanha de difamação dos organismos de esquerda associada à cooptação do organismo a serviço dos interesses do capital) dificulta a mobilização dos trabalhadores. Pressionados em seus locais de trabalho, os professores não encontram o apoio necessário para a organização desta categoria contra os ataques do capital à educação da classe trabalhadora.

O ciclo de apassivamento (2003-2015) não só conteve as lutas dos trabalhadores da educação, como também dividiu as organizações sindicais e as correntes políticas em relação à melhor estratégia a adotar na atual conjuntura. No meio de todo o debate, encontra-se um certo desprezo pela educação e pela escola. Com isso, as organizações que trabalham pela reorganização da classe trabalhadora brasileira encontram-se desafiadas a ultrapassar a tese do papel secundário da educação para o processo revolucionário.