A Ofensiva Brasileira
No dia 6 de Abril do corrente ano, uma delegação de Brasília apresentou em La Paz um plano de desenvolvimento binacional, que abrange a instalação de um pólo gás-químico na fronteira, a industrialização do lítio e do potássio, a construção de aeroportos, ferrovias e auto-estradas, bem como projetos de eletrificação, exploração em áreas petrolíferas e pesquisa de plantas tropicais. Semelhante generosidade se deve ao fato que as potências emergentes: Brasil, Rússia, Índia e China (BRIC), não tendo fronteiras comuns, estão obrigados, de maneira prioritária, a acentuar seu domínio em seu entorno geográfico.
A instalação do pólo gás-químico é mencionado desde 1972, primeiro ano da assinatura do contrato de venda de gás ao Brasil, que começou em 1999. O anzol de Lula oculta o interesse da Vale do Rio Doce, a segunda maior mineradora do mundo, transferida aos operadores privados no país vizinho, para impedir que as 100 milhões de toneladas de reservas de lítio e 2.000 milhões de toneladas de reservas de potássio do salar de Uyuni sejam exploradas por companhias norte-americanas, japonesas, russas, chinesas, coreanas ou francesas, sem a participação decisiva do Brasil.
A Vale do Rio Doce, privatizada por Fernando Henrique Cardoso, exporta US $ 150 bilhões por ano, uma quantidade 30 vezes maior que de todas as exportações bolivianas. Lula, por sua vez, consolidou a aliança Estado-Burguesia com a concessão a madeireiros, fazendeiros de soja industrial e agroindustriais brasileiros de um terço das florestas amazônicas no Brasil. Confirmou a sua capacidade em semanas recentes, ao ser elogiada por Obama e Fidel Castro, Chavez e Uribe, Irã e Israel, assim como quase toda a esquerda latino-americana depois de ter enterrado o Banco do Sul, ao transformar o Brasil em credor do FMI e anunciar a criação do Banco de investimentos do BRIC.
A delegação era chefiada por Marco Aurélio Garcia, “o Maquiavel brasileiro” (o “conselheiro do príncipe”). Quatro anos atrás, revelou-se sua influência decisiva sobre o governo do MAS para conseguir, através de um simples telefonema, que o vice-presidente Alvaro Garcia Linera impedisse uma resolução do ministro da Energia, Andrés Soliz Rada, que tentou fazer valer o decreto de nacionalização dos hidrocarbonetos nas refinarias controladas pela Petrobrás, o que precipitou a sua demissão.
No entanto, Marco Aurélio não voltou satisfeito, uma vez que não obteve nenhuma resposta positiva com a velocidade que ele desejava. Aparentemente, a transição institucional que ocorre na Bolívia dificulta encontrar altos funcionários com a capacidade de decisão, enquanto Evo Morales está aprisionado entre as suas ofertas com os operários, com as quais conseguiu sua reeleição, e as demandas indígenas que exigem que ele cumpra a sua proclamada defesa do meio ambiente.
O interesse brasileiro, não só para as causas presentes, mas também para o futuro (anúncio de exploração conjunta de petróleo a longo prazo) ocasiona a susceptibilidade daqueles que se lembram dos 38 anos da “negligência” ao projeto gás-químico, que está associado com a promessa de instalação de 24 usinas termelétricas na Bolívia como parte do gás de San Pablo, agravada pela exportação fraudulenta de gás através da parceria com a Repsol, e o não pagamento pelo gás úmido, durante os primeiros oito anos de vigência do contrato boliviano-brasileiro. Na situação atual, a Bolívia parece um doente muito grave que, de acordo com Lula e Marco Aurélio, poderia sobreviver com soro gota a gota administrado pelo Brasil, desde que não se desenvolva por si mesma.