A França cerca a Argélia pelo Sul*
Para os comunistas argelinos, o Ocidente apoia-se em movimentos reaccionários que se camuflam sob a religião para contrariar a vontade de emancipação dos povos e abater os dirigentes que lhe fazem frente. Com a nova aventura militar africana, o imperialismo francês «mata dois coelhos com uma cajadada»: coloca tropas no Mali e esconde com esta intervenção «o seu plano de cerco à Argélia pelo Sul», tendo em vista reforçar as pressões sobre os seus governantes «para os empurrar ainda mais na via do compromisso e da ruptura com as suas orientações anti-imperialistas tradicionais.»
Prossegue a intervenção militar da França no Mali, a pretexto do combate a «terroristas» islâmicos armados e da defesa da integridade territorial daquele país da África Ocidental.
Desembarcada há um mês na antiga colónia, com forte apoio da aviação, a legião francesa avançou rapidamente na zona Norte do Mali, dominada desde meados de 2012 primeiro por independentistas tuaregues e depois por «islamitas radicais». Reconquistaram nas margens do Níger as cidades estratégicas de Gao e Tumbuktu, a um milhar de quilómetros de Bamako, a capital, e chegaram às portas de Kidal, perto da fronteira com a Argélia. Os rebeldes retiraram-se quase sem dar combate e acantonaram-se numa zona montanhosa do extremo Nordeste do Mali.
A operação «Serval», ordenada por François Hollande em resposta a um «pedido de ajuda» urgente do desacreditado presidente interino maliano, Dioncounda Traoré, para travar o avanço jihadista para Sul, envolve cerca de 4000 efectivos franceses, aos quais se junta o mal preparado exército maliano. Estados Unidos, Grã-Bretanha e outros países ocidentais apoiam a intervenção com logística e informações e Londres anunciou também o envio de duas centenas de «instrutores militares» para a região.
Uma força Oeste-africana, a Missão Internacional de Apoio ao Mali (Misma), com 6000 soldados de países da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (Cedeao), está a preparar lentamente as primeiras unidades.
Na semana passada, o presidente Hollande efectuou uma visita-relâmpago a Bamako e à histórica Tumbucku. «Já fizemos muito trabalho mas ainda não acabámos», afirmou. E garantiu que as tropas francesas permanecerão o tempo que for necessário até serem substituídas por forças africanas, sendo o objectivo recuperar a integridade territorial do Mali.
No plano político, a União Africana, cuja 20.ª conferência de chefes de Estado e de governo se reuniu em Addis-Abeba, deu o seu apoio à intervenção militar francesa no Mali.
Também na capital etíope, sede da organização pan-africana, realizou-se uma conferência internacional visando financiar a força militar africana para o Mali e a «reestruturação» do exército maliano. A par dos países africanos, participaram União Europeia, Estados Unidos e Japão.
O presidente da Costa do Marfim e da Cedeao, Alassane Ouattara, estimou em 950 milhões de dólares a verba necessária para «a reconstrução do Mali». Para este fiel aliado de Paris que chegou ao poder em tanques franceses, «a guerra contra o terrorismo internacional é um inimigo comum e diz respeito a todos».
Opinião diferente tem o Partido Argelino para a Democracia e o Socialismo (PADS), para quem os imperialistas franceses pretendem «implantar permanentemente as suas tropas no Mali e transformar este país em posto avançado de controlo das riquezas do Sahel». Com a pretensa legitimidade conferida à sua intervenção pelas Nações Unidas, «o imperialismo francês obteve o aval da Cedeao, o seu instrumento neocolonialista, para assumir o papel de gendarme da África francófona e fazer e desfazer os regimes africanos ao sabor dos seus interesses», acrescenta.
Para os comunistas argelinos, o Ocidente apoia-se em movimentos reaccionários que se camuflam sob a religião para contrariar a vontade de emancipação dos povos e abater os dirigentes que lhe fazem frente. Com a nova aventura militar africana, o imperialismo francês «mata dois coelhos com uma cajadada»: coloca tropas no Mali e esconde com esta intervenção «o seu plano de cerco à Argélia pelo Sul», tendo em vista reforçar as pressões sobre os seus governantes «para os empurrar ainda mais na via do compromisso e da ruptura com as suas orientações anti-imperialistas tradicionais.»
O PADS denuncia as mentiras da propaganda ocidental: «O imperialismo engana o povo maliano, ao qual quer fazer acreditar que procura protegê-lo das hordas obscurantistas. É necessário ser ingénuo ou cego ou estar de má-fé para esquecer ou não perceber que durante dezenas de anos estes grupos e os seus regimes são e foram os melhores auxiliares do imperialismo: no Afeganistão, na Bósnia, no Kosovo, na Líbia e agora na Síria.»
Lembrando que o imperialismo está confrontado com a mais grave crise estrutural da sua história e que, por isso, precisa de dividir os povos para intensificar a pilhagem das suas riquezas, o partido dos comunistas argelinos insiste que são as potências ocidentais que «organizam a insegurança generalizada na região para justificar as suas ingerências».
*Este artigo foi publicado no “Avante!” nº 2045, 6.02.2013