Um purê de sonhos esfacelados chamado Espanha
Até um ou dois anos atrás, seria impensável. Mas aconteceu, no domingo 10 de fevereiro. Na final do torneio nacional de basquete espanhol, a Copa del Rey, o rei em pessoa foi vaiado. E muito vaiado. O Barcelona derrotou o Valencia por 85 a 69. Mas o jogo não será lembrado por esse resultado: será lembrado pela primeira vaia pública ao monarca que foi considerado, por décadas, uma espécie de guardião da democracia reconquistada após a morte do sinistro Francisco Franco, ‘caudillo de España por la gracia de Dios’, em 1975.
Vaiar um rei não é comum nos países que têm reis e rainhas. Questão de educação, de boa conduta. Na Espanha, nunca tinha acontecido. Agora aconteceu, e não por um súbito surto de má educação dos súditos de sua majestade real (que, aliás, gastam milhões de euros por ano para manter a família do monarca). Aconteceu numa demonstração cabal de que o desencanto e a desesperança alcançaram seu limite máximo no país de Pablo Picasso e de Joan Miró.
Há dois anos, quando explodiu em seu esplendor na Espanha o movimento dos ‘indignados’, o país tinha quatro milhões de desempregados e todos diziam que estavam vivendo uma crise tremenda. Pois bem: hoje, os desempregados superam a marca dos seis milhões. Isso quer dizer que 26% da força de trabalho do país estão desempregados. Entre os jovens com menos de 30 anos, o panorama é ainda mais desolador: 55% deles não têm esperança alguma de conseguir um emprego. Jovens recém formados em universidades falsificam a própria condição para disputar um posto de lixeiro ou entregador de correios. Dizem ter educação secundária. É que o que restou da legislação trabalhista, dizimada pelo governo direitista do Partido Popular, ainda prevê certas regalias para quem tem curso superior – progredir na carreira, por exemplo.
A saúde pública, que já foi considerada uma das melhores da Europa, foi para o brejo. Médicos da rede pública pedem demissão e buscam emprego em outros países. Eles se negam a restringir a atenção à população, conforme determina o governo.
A educação pública está virando mingau. As famílias passaram a vender o que têm ou tinham: a quantidade de ouro, joias familiares passadas de geração a geração, que a Espanha exporta para mercadores internacionais ganhou vulto em 2012, a ponto de chamar a atenção dos especuladores do mundo. E como se tudo isso fosse pouco, pipocam, com intensidade cada vez maior, as denúncias de corrupção.
O rei Juan Carlos I foi vaiado pelo que fez e pelo que fizeram membros da família real. Seu genro Iñaki Urdangarín, por exemplo, está sendo acusado de ter desviado pelo menos oito milhões de euros de recursos públicos. O próprio rei foi pilhado numa viagem clandestina (dizem as leis que quando quiser sair do país o monarca tem que pedir autorização aos parlamentares) para caçar elefantes na África, em companhia de sua jovem amiga alemã. Pois o desastrado rei caiu, quebrou a bacia, e foi um deus-nos-acuda, já que, formalmente, ele estava em casa e não num safári ilegal. A rainha Sofia fechou a cara, os súditos espanhóis abriram sorrisos: afinal, não é todo dia que se pega um rei safado numa escapadela conjugal – e matando elefantes, justo ele, que presidia várias organizações de defesa da natureza e do reino animal.
O esfacelamento maior da Espanha, porém, se dá na descoberta de um sistema de compra de parlamentares, por grandes empreiteiras, grandes empresas e pela banca, que atinge, entre outros, o puritano galego Mariano Rajoy, primeiro-ministro e estrela até agora fulgurante do Partido Popular, de direita.
Na verdade, e pensando bem, Rajoy até que era baratinho: 25 mil euros anuais. Uns 6 mil reais por mês. Para tentar se defender e negar a lambança, ele divulgou suas declarações de renda dos últimos dez anos. Pior a emenda que o péssimo soneto: ficou claro que ele não pagava a devida contribuição da previdência social. E mais: que ganhou 30% de aumento enquanto os salários do funcionalismo público eram recortados em 25%.
Conforme crescem as denúncias contra o Partido Popular, fica mais claro que os instrumentos de fiscalização e controle da Espanha são de uma ineficácia formidável. E assim, o que agora caiu em descrédito foi a própria Justiça espanhola.
Enquanto isso, os espanhóis desassossegados se perguntam quando e como tudo aquilo que havia sido conquistado e consolidado desde o fim da ditadura franquista começou a virar purê. Considerada, por anos, como exemplo de uma transição entre ditadura cruel e democracia promissora, a Espanha de hoje é o pálido reflexo de uma imagem que se esfumou.
Capital financeiro e mudança climática
SinPermiso
As forças do capital financeiro dificultarão muito o enfrentamento das mudanças climáticas. Alguns dizem que a estrutura do setor financeiro não facilitará a transição para uma economia de baixo nível de carbono. O problema é mais grave: o sistema financeiro é um potente obstáculo para prevenir uma catástrofe derivada do aquecimento global.
Para avaliar a dimensão do perigo, é importante recordar alguns dados. Na atualidade, a concentração de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera alcança as 394 partes por milhão (ppm). O CO2 é o gás de efeito estufa mais comum (não é o único, nem o mais potente). Os modelos mais desenvolvidos sobre mudança climática indicam que só abaixo das 450 ppm de CO2 se tem uma probabilidade de manter o aumento de temperatura dentro da classe dos graus centígrados. Os cientistas consideram que esse patamar não deve ser rebaixado caso se queira evitar uma mudança climática catastrófica.
Estudos científicos consideram que para aumentar significativamente a probabilidade de permanecer abaixo deste patamar a economia mundial deveria limitar suas emissões para o período 2000-2050 a 886 gigatoneladas de dióxido de carbono (GtCO2). Na primeira década do século se emitiram 321 GtCO2, de modo que só nos resta um volume disponível de 565 gigatoneladas para o período 2010-2050.
Dados da organização Carbontracker Initiative revelam que se se extraíssem e queimassem as reservas mundiais conhecidas de combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás) teríamos emissões superiores as 2.795 GtCO2. Ou seja, essas reservas contém cinco vezes mais carbono do que o teto acima mencionado de 565 GtCO2. Extrair e usar essas reservas poderia levar à concentração de CO2 na atmosfera para as 700 ppm, o que mudaria o planeta tal como o conhecemos.
Agora, as reservas de combustíveis fósseis das 200 empresas mais importantes de carvão, petróleo e gás no mundo (empresas cotizadas em bolsas de valores) tem reservas com um potencial de carbono de 745 GtCO2. Isso quer dizer que se estas empresas extraírem e queimarem suas reservas estaremos rebaixando para 180 GtCO2 o volume que nos resta disponível para o período 2010-2050 (as 565 GtCO2 acima mencionadas). O problema é ainda mais sério porque estas cifras não incluem as empresas estatais e tampouco levam em conta as gigantescas reservas de gás natural que existem no xisto nos Estados Unidos e em vários outros países.
O problema é que as reservas nas mãos destas companhias já estão anotadas em seus balanços com um enorme valor monetário. Uma avaliação destas empresas admite que essas reservas serão efetivamente realizadas, o que significa que serão extraídas e utilizadas. Do ponto de vista contábil, ninguém está preocupado se a utilização dessas reservas é suficiente para ultrapassar o perigoso patamar dos graus centígrados. A mudança climática não é um conceito contábil.
Para dizê-lo de outro modo, se existisse uma autoridade capaz de aplicar a restrição das 565 GTCO2 para os próximos quarenta anos, estas empresas somente poderiam queimar umas 150 GtCO2. O restante, carbono não injetado na atmosfera, seria de ativos sem valor e se traduziria em perdas colossais para os investidores que comprometeram recursos nessas empresas.
Essas 200 empresas do mundo da energia fóssil têm um valor em bolsa equivalente a 7,4 trilhões de dólares. Os países com maior potencial de gases de efeito estufa nas reservas de empresas que operam em bolsas são Rússia, Estados Unidos e Reino Unido. E nas bolsas de valores de Londres, São Paulo, Moscou, Toronto e do mercado australiano até 30% da capitalização de mercado está vinculada a combustíveis fósseis.
Estamos na presença de um conflito de dimensões históricas: de um lado está a comunidade científica advertindo para não se queimar essas reservas de combustíveis fósseis e do outro estão as empresas e investidores que tem interesse em realizar seus ativos (extrair e usar essas reservas). Quem prevalecerá? Nos últimos 30 anos, o setor financeiro do mundo foi capaz de dominar a política macroeconômica. Com efeito, as prioridades da política monetária e fiscal do mundo inteiro respondem hoje (inclusive em meio à crise) às necessidades do capital financeiro. Por que seria diferente no que diz respeito às políticas sobre mudanças climáticas?
Hoje carecemos de um regime regulatório internacional que permita pensar que a economia mundial poderá reduzir sua pegada de carbono na atmosfera na velocidade exigida. O Protocolo de Kioto é uma ficção e a única coisa que resta é um “compromisso” para se chegar a um acordo em 2015 que deverá entrar em vigor em 2020. No setor financeiro estão concentradas forças que se oporão com tudo a um acordo que evite o perigo da mudança climática catastrófica.
Agitação global no médio prazo
Esquerda.net
Fazer previsões no curto prazo (os próximos um ou dois anos) é um jogo de doidos. Há demasiadas reviravoltas imprevisíveis no mundo real político/cultural/económico. Mas podemos tentar fazer afirmações plausíveis para o médio prazo (uma década ou mais), baseados num quadro teórico viável, combinado com uma sólida análise empírica de tendências e de condicionamentos.
Que sabemos do sistema-mundo no qual vivemos? Em primeiro lugar, sabemos que é uma economia-mundo capitalista, cujo princípio básico é a incessante acumulação de capital. Em segundo lugar, sabemos que é um sistema histórico, o qual, como todos os sistemas (desde o universo como um todo aos menores nano-sistemas) tem uma vida. Começa a existir, vive a sua vida “normal” de acordo com regras e estruturas que cria, até que, em determinado ponto, o sistema fica demasiado longe do equilíbrio e entra numa crise estrutural. Em terceiro lugar, sabemos que o nosso presente sistema-mundo tem sido um sistema polarizado, no qual houve um crescimento constante da brecha entre os Estados e dentro dos Estados.
Estamos numa destas crises estruturais atualmente, que já decorre há 40 anos. Vamos continuar a estar durante outros 20 a 40 anos. Esta é a duração média para uma crise estrutural de um sistema social histórico. O que acontece numa crise estrutural é que o sistema se bifurca, o que significa essencialmente que emergem duas formas alternativas de pôr fim à crise estrutural “escolhendo” coletivamente uma de duas alternativas.
A característica principal de uma crise estrutural é a série de flutuações caóticas e selvagens que atinge tudo – os mercados, as alianças geopolíticas, a estabilidade das fronteiras dos Estados, o emprego, as dívidas, os impostos. A incerteza, mesmo no curto prazo, torna-se crónica. E a incerteza tende a congelar a decisão económica, o que, evidentemente, torna tudo pior.
Eis algumas coisas que podemos esperar no médio prazo. A maioria dos Estados enfrentam, e vão continuar a enfrentar, um aperto entre a redução da arrecadação e os gastos crescentes. O que a maioria dos Estados tem feito é reduzir os gastos de duas formas. Uma é cortar (até mesmo eliminar) uma grande quantidade de redes de segurança que foram construídas no passado para ajudar as pessoas comuns a enfrentar as múltiplas contingências com que se deparam. Mas há também uma segunda forma. Muitos Estados estão a cortar as transferências de dinheiro para entidades estatais subordinadas – estruturas federadas, se o Estado é uma federação, e governos locais. O que isto faz é apenas transferir para estas unidades subordinadas a necessidade de aumentar impostos. Se consideram isto impossível, podem ir à bancarrota, o que elimina outras partes das redes de segurança (nomeadamente as pensões).
Isto tem um impacto imediato sobre os Estados. Por um lado, enfraquece-os, na medida em que mais e mais unidades procuram separar-se, se o consideram economicamente vantajoso. Mas, por outro lado, os Estados são mais importantes que nunca, na medida em que as populações procuram refúgio nas políticas de proteção estatais (mantenha o meu emprego, não o teu). As fronteiras estatais sempre mudaram. Mas prometem mudar com mais frequência agora. Ao mesmo tempo, novas estruturas regionais ligando Estados existentes (ou as suas subunidades) – tais como a União Europeia (UE) e a nova estrutura sul-americana (UNASUR) – vão continuar a florescer e a desempenhar um papel geopolítico crescente.
As relações entre os múltiplos atores do poder geopolítico tornar-se-ão ainda mais instáveis numa situação na qual nenhum destes atores estará em posição de ditar as regras entre os Estados. Os Estados Unidos são um antigo poder hegemónico com pés de barro, mas ainda com poder suficiente para causar danos ao dar passos em falso. A China parece ter a posição económica emergente mais forte, mas é menos forte do que a própria e outros pensam. O grau em que a Europa ocidental e a Rússia se vão aproximar ainda é uma questão em aberto, e tem muita importância na agenda de ambos os lados. A Índia ainda mantém a indecisão sobre como vai jogar as suas cartas. O que isto significa para guerras civis como a da Síria, no momento, é que os intervenientes externos anulam-se uns aos outros e os conflitos internos tornam-se ainda mais organizados em torno de grupos identitários fratricidas.
Vou reiterar a posição que defendo há muito. No fim de uma década, veremos alguns realinhamentos muito importantes. Um é a criação de uma estrutura confederal ligando o Japão, a (reunificada) China, e a (reunificada) Coreia. O segundo é uma aliança geopolítica entre esta estrutura confederal e os Estados Unidos. O terceiro é uma aliança de facto entre a UE e a Rússia. O quarto é a proliferação nuclear numa escala significativa. O quinto é o protecionismo generalizado. O sexto é uma deflação mundial generalizada, que pode tomar uma de duas formas – ou uma redução nominal de preços, ou inflações galopantes que têm a mesma consequência.
Obviamente, não são desenlaces felizes para a maioria das pessoas. O desemprego mundial vai subir, não cair. E as pessoas comuns vão sentir o aperto de forma muito aguda. Já demonstraram que estão prontos a reagir em múltiplas formas, e esta resistência popular vai crescer. Encontrar-nos-emos no meio de uma vasta batalha política para determinar o futuro do mundo.
Os que gozam hoje de riqueza e privilégios não vão ficar parados. Contudo, vai-se tornar crescentemente evidente para eles que não podem garantir o futuro no sistema capitalista existente. Vão procurar implementar um sistema baseado não no papel central do mercado mas antes numa combinação da força bruta e de engano. O objetivo chave é assegurar que no novo sistema permaneçam três elementos chave do presente – hierarquia, exploração e polarização.
No outro lado, haverá forças populares, em todo o mundo, que vão procurar criar um novo tipo de sistema histórico, que nunca existiu até agora, baseado na democracia relativa e na relativa igualdade. É quase impossível prever o que isto significa em termos de instituições que o mundo criará. Vamos aprender na décadas futuras a construir este sistema.
Quem vai ganhar esta batalha? Ninguém pode prever. Será o resultado de uma infinidade de nano-ações por uma infinidade de nano-atores numa infinidade de nano-momentos. Nalgum ponto, a tensão entre as duas soluções alternativas vai inclinar-se definitivamente a favor de uma ou de outra. É isto que nos dá esperança. O que cada um de nós faz em cada momento acerca de cada questão imediata é de grande importância. Alguns chamam-lhe o “efeito borboleta”. A vibração das asas de uma borboleta afeta o clima do outro lado do mundo. Neste sentido, somos todos, hoje, pequenas borboletas.
Indústria em 2012: Crise na Produção e no Emprego
Iedi
Com relação à produção industrial, com exceção de 1992 e 2009, anos em que o PIB brasileiro caiu, a retração de 2,7% registrada em 2012 é o pior resultado observado na série histórica do IBGE, iniciada em 1992. Ou seja, desconsiderando aqueles dois anos de recessão da economia brasileira, a indústria não amargava, nos últimos vinte anos, uma queda de sua produção da dimensão e da natureza (retração generalizada) como a vista no ano passado.
A indústria fechou 2012 com retração da produção em nove dos catorze locais pesquisados pelo IBGE. Em São Paulo, a queda da produção (–3,9%) foi generalizada (atingindo treze dos vinte segmentos industriais pesquisados) e maior que a da média nacional (–2,7%). No Rio de Janeiro, outro estado com grande participação na indústria nacional, o recuo da produção industrial foi mais acentuado (–5,6%) e representou o pior resultado da sua série histórica dos últimos vinte anos.
Ainda no sudeste, a produção industrial encolheu 6,3% no Espírito Santo no ano passado, em decorrência das quedas nas atividades da indústria extrativa (–1,6%) e, sobretudo, da metalurgia básica (–39,5%). Por sua vez, a produção industrial de Minas Gerais andou em sentido contrário e colaborou para que os resultados não fossem ainda mais desfavoráveis. Valendo-se dos segmentos de outros produtos químicos (16,6%), de veículos automotores (5,4%) e de refino de petróleo e produção de álcool (8,1%), a produção industrial mineira cresceu de 1,4% em 2012.
No sul, a produção industrial também caiu fortemente em seus três estados: Paraná (–4,8%), Santa Catarina (–2,7%) e Rio Grande do Sul (–4,6%). Nos estados do Norte, a produção industrial caiu 7,0% no Amazonas e 1,1% no Pará. Por sua vez, ao crescer 1,7% em 2012, a indústria no Nordeste se saiu melhor, devido principalmente ao desempenho dos segmentos de produtos químicos (8,0%), refino de petróleo e produção de álcool (3,6%), minerais não–metálicos (4,6%).
No que diz respeito ao emprego, três pontos podem ser destacados a partir dos dados do IBGE para 2012. Primeiro, a retração de 1,4% do número de ocupados em 2012 com relação a 2011 foi relativamente pequena se comparada com o desempenho da produção industrial no mesmo período (–2,7%, como supracitado). Isso significa que os empresários industriais, por conta da escassez da mão-de-obra, sobretudo a qualificada, ainda estão mantendo os postos de trabalho das suas empresas, na expectativa de que seus negócios melhorem. Evidentemente, não se está dizendo aqui que a queda de 1,4% é desprezível – com exceção de 2009, essa é a pior taxa de variação do emprego industrial da série histórica do IBGE, iniciada em 1992. O que se está dizendo é que, dada a magnitude da retração da produção industrial, poder-se-ia esperar que o emprego industrial apresentasse resultados mais desfavoráveis em 2012.
Segundo, os dados do IBGE deixam claro que a queda do emprego industrial é geral e não é consequência de um processo fortuito, ligado ao mau desempenho de um setor ou de uma região do País. Ao contrário, taxas negativas de emprego foram registradas em 12 dos 14 locais e em 14 dos 18 setores investigados pelo IBGE em todo o Brasil no ano de 2012. Portanto, juntamente com os dados da produção industrial, esse desempenho negativo do emprego industrial confirma o cenário de crise vivido pela indústria brasileira em 2012.
Terceiro, os resultados do final do ano passado não trazem boas perspectivas para o emprego industrial neste início de 2013. Nos últimos três meses de 2012, o número de ocupados apresentou a seguinte evolução: 0,4%, 0,1% e –0,2%, respectivamente, em outubro, novembro e dezembro (taxas calculadas com relação ao mês imediatamente anterior, com ajuste sazonal). Ou seja, além de desacelerar, o emprego industrial fechou 2012 em queda. Na comparação de dezembro de 2012 com o mesmo mês de 2011, a taxa de variação dos ocupados na indústria também foi negativa, de –1,3%. O número de horas pagas registrado em dezembro de 2012 também não traz nenhum sinal mais alentador: variação de 0,0% frente a novembro (com ajuste sazonal) e de –1,2% frente a dezembro de 2011.
Vale também anotar a queda do emprego industrial em São Paulo: –2,6%. Esse resultado negativo é o pior desempenho registrado na série histórica do IBGE para o estado paulista, com exceção de 2009; com um agravante: em 2011, o número de ocupados na indústria em São Paulo havia caído 1,0%. Ou seja, 2012 foi o segundo ano consecutivo de queda (e mais expressiva!) do emprego no principal parque da indústria brasileira.
Escassez pauta a nova geopolítica dos alimentos
IPS
Os alimentos são o novo petróleo. A terra é o novo ouro. Esta nova era se caracteriza pela carestia dos alimentos e propagação da fome.
Do lado da demanda, o aumento demográfico, uma crescente prosperidade e a conversão de alimentos em combustível para automóveis elevam o consumo a um grau sem precedentes.
Do lado da oferta, a extrema erosão do solo, o aumento da escassez hídrica e temperaturas cada vez mais altas tornam mais difícil expandir a produção. A não ser que seja possível reverter essas tendências, os preços dos alimentos continuarão subindo, e a fome continuará se propagando, derrubando o atual sistema social. É possível reverter estas tendências a tempo? Ou acaso os alimentos são o elo frágil da civilização de inícios do século XXI, em boa medida como foi em tantas civilizações anteriores, cujos vestígios arqueológicos são estudados agora? Esta redução das provisões alimentares do mundo contrasta drasticamente com a segunda metade do século XX, quando os problemas dominantes na agricultura eram a superprodução, os enormes excedentes de grãos e o acesso aos mercados por parte dos exportadores desses produtos.
Nesse tempo, o mundo tinha duas reservas estratégicas: grandes sobras de grãos (indo uma quantidade para o lixo ao se iniciar a nova colheita) e uma ampla superfície de terras de cultivo sem ser utilizadas, no marco de programas agrícolas estadunidenses para evitar a superprodução.
Quando as colheitas mundiais eram boas, os Estados Unidos faziam com que mais terras ficassem ociosas. Ao contrário, quando eram inferiores ao esperado, voltava a colocar as terras para produzir.
A capacidade de produção excessiva foi usada para manter a estabilidade nos mercados mundiais de grãos. As grandes reservas de grãos amortizaram a escassez de cultivos no planeta.
Quando as monções não chegaram à Índia, em 1965, por exemplo, os Estados Unidos enviaram a quinta parte de sua colheita de trigo ao país asiático para evitar uma fome de potencial catastrófico. E graças às abundantes reservas, isto teve pouco impacto sobre o preço mundial dos grãos.
Quando iniciou este período de abundância alimentar, o mundo tinha 2,5 bilhões de pessoas. Atualmente tem 7 bilhões. Entre 1950 e 2000, houve ocasionais altas no preço dos grãos em razão de eventos como uma seca severa na Rússia ou uma intensa onda de calor no Médio Oeste dos Estados Unidos. Entretanto, seus efeitos sobre o preço tiveram vida curta. No prazo de um ano, as coisas voltaram à normalidade. A combinação entre reservas abundantes e terras de cultivo ociosas converteu esse período num dos que se gozou de maior segurança alimentar na história.
No entanto, isso não duraria. Em 1986, o constante aumento da demanda mundial de grãos e os custos orçamentários, inaceitavelmente altos, fizeram que se eliminasse o programa estadunidense de reserva de terras agrícolas. Atualmente, os Estados Unidos têm algumas terras ociosas, no marco de seu Programa de Reserva para a Conservação, mas, tratam-se de solos muito susceptíveis à erosão. Acabaram-se os dias em que se contava com áreas, com potencial produtivo, prontas para produzirem rapidamente, caso fosse apresentada uma necessidade.
Agora o mundo vive apenas mirando no ano seguinte, sempre esperando produzir o suficiente para cobrir o aumento da demanda. Os agricultores de todas as partes realizam denodados esforços para cadenciar esse acelerado crescimento da demanda, mas possuem dificuldades para isto.
A escassez de alimentos conspirou contra civilizações anteriores. A dos sumérios e dos maias foram apenas duas entre as muitas cujo declive, aparentemente, deveu-se à incursão numa vereda agrícola que era ambientalmente insustentável.
No caso dos sumérios, o aumento da salinidade do solo, em consequência de um defeito em seu sistema de irrigação, que a não ser por isso era bem planejado, terminou devastando seu sistema alimentar e, por conseguinte, sua civilização. Em relação aos maias, a erosão do solo foi uma das chaves de seu desmoronamento, como também foi para tantas outras civilizações antigas.
A nossa também está nesse caminho. Porém, diferente dos sumérios, a agricultura moderna sofre o aumento dos níveis de dióxido de carbono na atmosfera. E, como os maias, também está lidando mal com a terra, gerando perdas sem precedentes do solo, a partir da erosão.
Na atualidade, também enfrentamos tendências mais novas, como o esgotamento dos aquíferos, o estancamento nos rendimentos dos grãos, em países mais avançados, a partir do ponto de vista agrícola e do aumento da temperatura.
Neste contexto, não surpreende o fato da Organização das Nações Unidas apontar, agora, que os preços dos alimentos dobraram em relação ao período 2002-2004.
Para a maioria dos cidadãos dos Estados Unidos, que gastam em média 9% de suas receitas em alimentos, isto não é o maior problema. Contudo, para os consumidores que gastam entre 50 e 70% de suas receitas em comida, o fato dos preços dos alimentos dobrarem é um assunto muito sério. A propagação da fome está estreitamente ligada com a redução das reservas de grãos e aumento no preço dos alimentos.
Nas últimas décadas do século passado, a quantidade de pessoas famintas no mundo foi reduzida, caindo para 792 milhões em 1997. Depois começou a aumentar, chegando a 1 bilhão. Lamentavelmente, caso continuem fazendo as coisas como de costume, o número de pessoas que passam fome continuará crescendo.
O resultado é que para os agricultores do mundo está se tornando cada vez mais difícil cadenciar a produção, diante da crescente demanda de grãos. Os estoques mundiais de grãos diminuíram há uma década e não foi possível reverter a situação. Caso não se consiga mudar isto, o que se espera é que, com a próxima má colheita, os alimentos se encareçam, a fome se intensifique e os distúrbios vinculados à alimentação sejam propagados.
O mundo está ingressando numa era de escassez alimentar crônica, que conduz a uma intensa concorrência pelo controle da terra e dos recursos hídricos. Em outras palavras, está começando uma nova geopolítica dos alimentos.
Construtora de Belo Monte descumpre condicionantes socioambientais e Ibama não pune
Agência Repórter Brasil
Mais caro projeto de infraestrutura do país em andamento, a hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu (PA), tem sido alvo nos últimos anos de uma série de ações na Justiça em função dos problemas sociais e ambientais da obra – levantamento do Movimento Xingu Vivo para Sempre, sediado em Altamira (PA), aponta que tramitam atualmente 56 processos contra Belo Monte. Apesar dos problemas, porém, as ações de mitigação e compensação dos impactos – as chamadas condicionantes e o Plano Básico Ambiental (PBA) –, previstas no licenciamento ambiental, têm sido negligenciadas pelo Consórcio Norte Energia, responsável pela usina.
Publicada na última semana, uma análise do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) sobre o status do cumprimento das condicionantes da Licença de Instalação e do PBA de Belo Monte mostra um quadro grave de irregularidades na implantação tanto das medidas antecipatórias (que deviam ter sido realizadas antes das obras para evitar a ocorrência de impactos) quanto de mitigação (compensação de danos sofridos).
De acordo com o documento do Ibama, passados quase três anos do leilão da obra, a Norte Energia ainda não concluiu o Cadastro Socioeconômico (CSE) das famílias afetadas pelo empreendimento – não sabendo, portanto, quantos e quem são os atingidos por Belo Monte –, não implantou os aterros sanitários em Altamira e Vitória do Xingu, não fez as obras de saneamento básico nesses municípios e nas comunidades afetadas por Belo Monte, não construiu hospitais e não implantou equipamentos de saúde e educação, não reassentou famílias de comunidades desapropriadas, não fez a recomposição das atividades produtivas de áreas remanescentes, não terminou o sistema de transposição de embarcações no local onde o barramento do Xingu impede a navegação do rio, não informou a população como se dará esse processo, e não implementou os projetos de recomposição da infraestrutura viária como previsto, entre inúmeras outras irregularidades.
Grosso modo, apenas 9,7% das obrigações da Licença de Instalação foram devidamente cumpridas, avalia o corpo de advogados do Instituto Socioambiental (ISA), que tem monitorado o andamento das condicionantes das licenças prévia e de instalação de Belo Monte desde o início das obras. Muitas delas tiveram seus prazos renegociados e, de acordo com o relatório do Ibama, outras foram postergadas pela Norte Energia sem prévio conhecimento ou concordância do órgão ambiental, o que é grave tendo em vista as consequências sobre a população afetada.
Ou seja, como as condicionantes foram estipuladas como medidas prévias às obras justamente para evitar impactos mais graves, explica a advogada Biviany Garzón, do ISA, estender prazos deixa os afetados pela usina numa situação de extrema vulnerabilidade. “O Ibama deveria embargar a obra até o cumprimento das condicionantes e do Plano Básico Ambiental. Não terem cumprido as ações referentes ao saneamento, por exemplo, afeta diretamente a saúde da população”, afirma a advogada.
Na área rural, as principais vítimas da negligência são famílias que, desapropriadas, não foram reassentadas ou indenizadas devidamente. Em um trecho do documento, os técnicos do Ibama chegam a considerar a situação de uma das comunidades desapropriadas – Santo Antônio, localizada no epicentro das obras do sítio Belo Monte – como “traumática”. “O processo por que passa a comunidade da Vila Santo Antônio é traumático. A demora em proceder ao reassentamento deixa as famílias em meio a casas demolidas, terrenos antes cuidados pelos antigos moradores que agora estão tomados por mato, e trânsito de caminhões e pessoas estranhas à comunidade, que tornam mais dolorida a mudança de vida nesta fase”.
De acordo com a Defensoria Pública de Altamira, correm atualmente 67 ações contra a Norte Energia por problemas referentes a Santo Antônio. Algumas famílias, explica a defensora Andréia Barreto, chegaram a receber apenas R$ 3,1 mil pelas suas casas e terras, valor com o qual claramente não puderam recompor a vida em outra localidade, sobretudo diante da especulação imobiliária nos municípios afetados pela hidrelétrica.
Já outros atingidos sequer foram reconhecidos como tal. “É o caso do seu Amadeu. Um dos moradores mais antigos de Santo Antônio, o pescador não tinha título de propriedade e a Norte Energia se negou a indenizá-lo até que entramos com um processo. Ele finalmente foi incluído no Plano de Atendimento à População Atingida e hoje vive de aluguel em uma casinha paga pela empresa”, conta a defensora. Segundo ela, foram impetradas sete ações somente envolvendo casos de famílias agroextrativistas excluídas do Plano de Atendimento, mas, no total, até dezembro de 2012 estavam correndo 20 processos por reparação de danos a famílias ribeirinhas ajuizados pela Defensoria. A maioria pede revisão dos valores pagos a título de indenização.
Responsabilidade do Ibama
Procurado pela reportagem, o Ibama não quis comentar os atrasos e não cumprimentos das condicionantes de Belo Monte. Segundo a assessoria de imprensa, o órgão apenas “encaminhou ofício notificando o empreendedor a resolver as pendências apontadas no parecer técnico 168/2012, estabelecendo prazos para que sejam atendidas”, mas não estipulou nenhuma penalidade à Norte Energia.
Além de não aplicar medidas cabíveis previstas por lei, como o embargo das obras da usina, o Ibama sinaliza que considera fato consumado a instalação de outro projeto que deve multiplicar os impactos socioambientais da região afetada por Belo Monte: a mineradora Belo Sun, que pleiteia licença de lavra de ouro por 12 anos na Volta Grande do Xingu, exatamente a região mais impactada pela usina. No documento sobre as condicionantes, o órgão recomenda à Norte Energia atenção “à influência que o empreendimento de mineração da Belo Sun pode causar à região da Transassurini, evitando que famílias que optem por carta de crédito adquiram suas novas propriedades em área que possa ser diretamente afetada pela Belo Sun”.
A mineradora está em fase de licenciamento pela Secretaria de Meio Ambiente do Estado, mas já foi alvo de duas recomendações contrárias por parte do Ministério Público Federal e de um pedido de declaração de inviabilidade por parte do ISA.
Segundo o procurador do Ministério Publico Federal no Pará, Ubiratan Cazetta, o MPF ainda está estudando o documento do Ibama, mas a princípio a conclusão cabível é que condicionantes e licenciamentos ambientais têm sido tratados como mera formalidade pelo Consórcio Norte Energia e pelo órgão ambiental, afirma o procurador. “Parece que temos dois mundos aqui: o teórico, onde as condicionantes resolveriam todos os problemas da obra, e o concreto, onde não se cumpre as condicionantes e, mesmo se cumprisse, os problemas persistiriam.”
Segundo Cazetta, o MPF pode responsabilizar e requerer punição tanto ao empreendedor, que falha no cumprimento das condicionantes, quanto ao Ibama, que falha na fiscalização e autuação das irregularidades. “A postura leniente do Ibama não apenas enfraquece a instituição da condicionante, como também deixa os afetados sem nenhuma defesa em seus direitos”, afirma o procurador.
Procurada pela reportagem, a Norte Energia, através de sua assessoria, comunicou que a diretoria da empresa está em planejamento e incomunicável.
O declínio do Império Americano
Imprensa Popular – PCB
Os números do Comércio Internacional mostram que, em 2012, a China ultrapassou, pela primeira vez, os EUA na esfera comercial e é, agora a maior potência mundial nesse setor. Os dados referentes ao fluxo comercial (soma de exportações e importações de bens) contabilizaram US$ 3,82 trilhões para os Estados Unidos, de acordo com o Departamento de Comércio daquele país), ao passo que, para a China, o fluxo comercial foi de US$ 3,87 trilhões. Ainda superavitário em serviços (US$ 195 bilhões em 2012), os EUA são deficitários no comércio de bens (cerca de US 700 bilhões, no mesmo ano). O superávit chinês, no comércio de bens, somou US$ 231,1 bilhões, no mesmo ano.
Os EUA são, ainda, a maior economia do mundo, como confirma o PIB alcançado em 2011, de US& 15 trilhões, contra os US$ 8,3 trilhões da China. Entretanto, dadas as tendências significativas apresentadas nas taxas de crescimento do dois países, tudo indica quem, em poucos anos, a China será a maior economia do mundo, pondo abaixo a posição de domínio dos EUA no plano financeiro e comercial internacional conquistada após a Segunda Guerra Mundial.