Comissão da Verdade decide pela exumação do corpo de João Goulart
Ainda está em discussão a forma como a medida será concretizada
FLÁVIO ILHA
Publicado:2/05/13 – 19h59
Enterro de João Goulart em São Borja (RS) – 07/12/1976 Arquivo O Globo
PORTO ALEGRE – A Comissão Nacional da Verdade (CNV) e o Ministério Público Federal no Rio Grande do Sul decidiram exumar o corpo do ex-presidente João Goulart, que morreu supostamente vítima de um ataque cardíaco no dia 6 de dezembro de 1976 durante exílio na Argentina. A exumação, que terá o acompanhamento de peritos argentinos e uruguaios, deverá ser realizada nos próximos três meses.
A decisão, tomada em uma reunião ocorrida em Brasília no último dia 24 de abril, foi confirmada nesta quinta-feira pela coordenadora do grupo de Relações com a Sociedade Civil e Instituições da Comissão, Rosa Cardoso. No âmbito da CNV, ainda está em discussão a forma como a medida será concretizada – um inquérito civil público tramita desde 2007 na Procuradoria da República pedindo investigação sobre as causas da morte de João Goulart. A dúvida da Comissão é sobre a necessidade ou não de uma medida judicial para garantir a exumação.
– Tudo terá de ser feito com muito cuidado e cautela, já que se trata de um assunto bastante delicado. Haverá muita pesquisa antes de concretizarmos (a exumação). Mas a decisão está tomada – disse.
A Comissão de Mortos e Desaparecidos já realizou um levantamento para rastrear os laboratórios capazes de fazer a melhor análise toxicológica do material que será colhido do corpo do ex-presidente. Esse resultado não foi informado pela Comissão. A expectativa é de que os componentes químicos utilizados num suposto envenenamento de Jango tenham se depositado nos ossos do ex-presidente, o que seria possível detectar com a tecnologia atual.
Mas, segundo uma fonte da CNV ouvida por O GLOBO, não há garantia de que as condições em que João Goulart tenha sido sepultado viabilizem esse processo. Nesse caso, a análise toxicológica seria inconclusiva. O ex-presidente está sepultado no cemitério municipal de São Borja (RS).
Outra preocupação da CNV é com a divulgação dos resultados. A exumação, segundo a mesma fonte, é a etapa mais tranquila do processo, cuja análise de laboratório pode demorar muito tempo – meses, talvez mais de um ano. O objetivo, contudo, é elucidar a morte de Jango da maneira mais precisa possível.
A procuradora federal Suzete Bragagnolo, que cuida do inquérito movido pela família do ex-presidente, disse que o próximo passo será reunir o corpo técnico que fará a perícia nos restos mortais de Jango para acertar detalhes do procedimento. Suzete foi mais cautelosa com relação a prazo, dizendo que a exumação poderá se realizar “até o final do ano”.
– Queremos fazer no prazo mais curto possível, mas não gostaríamos de fixar uma data neste momento. Mas posso assegurar que não é nossa intenção enrolar com o procedimento – afirmou a procuradora.
Em março, durante audiência pública da CNV em Porto Alegre, a família do ex-presidente fez um pedido formal para que o corpo fosse exumado. Desde então, o processo passou a ser analisado pela Comissão. A hipótese é que Jango tenha sido assassinado mediante a adição de um cápsula com três tipos de veneno no frasco de medicamentos que ele tomava diariamente para combater problemas cardíacos. O ex-agente da ditadura uruguaia Mário Barreiro, preso no Rio Grande do Sul por crimes comuns, confirmou em depoimento à Polícia Federal, em 2008, que participou da operação para matar João Goulart. O envenenamento teria sido planejado e executado pela ditadura uruguaia a pedido do governo militar brasileiro, já que Jango havia recuperado seus direitos políticos e planejava voltar ao país.
O neto do ex-presidente e diretor de Acervo do Instituo João Goulart, Chistopher Goulart, comemorou a decisão.
– É muito importante. Temos defendido esse procedimento há bastante tempo, para que possamos restaurar uma versão oficial mentirosa sobre a morte de Jango. Como os indícios de assassinato são fortíssimos, esperamos que a perícia traga provas científicas – avaliou.
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