A CRISE É DO CAPITAL, MAS QUEM PAGA A CONTA SÃO OS TRABALHADORES

Uma grave crise se abate sobre a União Européia. A incapacidade de alguns dos países que a integram em honrar seu compromisso com o pagamento dos títulos públicos, sendo a Grécia sua primeira e mais notória vítima, levou as nações mais poderosas da UE (Alemanha à frente), a lançar um pacote de ajuda financeira aos países em dificuldade. O pacote não tem outro objetivo senão o de emprestar dinheiro aos países em dificuldades, para garantir que os ativos em risco de inadimplência, sejam resgatados. A soma de recursos mobilizados pode chegar à impressionante cifra de 1 trilhão de euros. Tudo para garantir que os detentores de títulos da dívida pública, em sua maioria banqueiros alemães e especuladores financeiros de todo o mundo, não vejam seu precioso dinheirinho se esfumar.

A conta dessa farra será paga pelos trabalhadores europeus. É que para ter acesso ao pacote de ajuda internacional, os países em dificuldade terão de aplicar medidas fiscais e econômicas duríssimas, com o fito de gerar um superávit capaz de pagar pelos empréstimos recebidos. O famigerado FMI, cujas receitas de ajuste econômico causam recessão econômica e atacam os interesses dos trabalhadores, cobrou dos países europeus “reformas urgentes”. Estas não passam de uma precarização do mercado de trabalho e o “saneamento” das contas públicas pelo corte de direitos e desmonte dos serviços públicos.A intenção é uma só: retirar direitos, cortar salários e reduzir o investimento público, visando garantir os lucros dos credores da dívida pública dos países europeus.

Na Grécia, o Congresso, dominado pelos social-democratas do PASOK, aprovou um corte de 20% nas aposentadorias e pensões, redução de 25% no salário dos funcionários públicos, aumento na idade da aposentadoria, diminuição do investimento nos serviços públicos, ataques às leis de proteção ao trabalho e privatização. Na Espanha, o governo socialista de José Rodríguez Zapatero anunciou um corte de 5% no salário dos funcionários públicos, congelamento no valor das aposentadorias e eliminação de uma ajuda de 2,5 mil euros que as mães recebem ao ter um filho. Outro socialista, o português José Sócrates, primeiro-ministro do governo lusitano, decidiu por cortar 5% dos salários dos funcionários públicos, além de elevar a alíquota de alguns impostos. Na Inglaterra, o novo governo anunciou corte de 7,2 bilhões de euros do orçamento, além de suspender por um ano a contratação de novos funcionários públicos. Na Alemanha o seguro desemprego será cortado em 50% e as idades para aposentadoria aumentarão de 60 para 65 anos no caso das mulheres e de 65 para 70 no caso dos homens. Na Itália, o governo neofascista de Berlusconi propõe o corte nos salários e na contratação de novos funcionários públicos, além de bloquear novos pedidos de aposentadorias. Na França, Nicolas Sarkozy quer elevar a idade para a aposentadoria mínima e o corte de benefícios extras para famílias com mais de três filhos.

Como vemos, serão os trabalhadores europeus que pagarão, com ataques aos seus direitos e até mesmo com redução salarial, a conta da crise do capital. Porém, não será nada fácil para a burguesia européia e mundial, artífices desses ataques, cobrar essa fatura. Os trabalhadores têm demonstrado disposição para resistir às investidas perpetradas pelas grandes potências capitalistas e seus governos. Na Grécia, em poucos meses, os trabalhadores já protagonizaram nove greves gerais com ampla adesão de massa. Em 29 de maio, em Lisboa, uma grande manifestação reuniu cerca de 300 mil pessoas e em outros países europeus o proletariado já principia algumas mobilizações para lutar contra as medidas de ajuste.

A reação dos trabalhadores europeus sinaliza um giro à esquerda por parte de uma classe operária com forte tradição de luta. Porém, a imposição de uma derrota à burguesia e ao seu plano de ajuste dependerá da capacidade da classe operária do Velho Continente em superar a influência ainda exercida pela ideologia e pela política social-democrata. Esta se constitui em um aparelho ideológico de Estado cuja função, na opinião de Poulantzas, é a de “inculcar a ideologia burguesa no interior da classe operária”. Um dos aspectos dessa ideologia é o de institucionalizar as lutas, encaminhando-as sempre para uma saída negociada e conciliatória entre capital e trabalho. Quiçá os termos draconianos do ajuste imposto pela burguesia européia, com apoio de governos social-democratas (casos de Portugal, Grécia e Espanha) e contando com a conivência de alguns partidos socialistas e suas centrais sindicais, levem a uma diminuição em sua base de massa. Mas para tanto, cabe aos comunistas e partidos operários uma tarefa de importância capital: ser, a exemplo dos comunistas gregos, o elemento mais ativo e decidido na organização das lutas que se anunciam e, ao mesmo tempo, através delas, ser capaz de apresentar uma saída anticapitalista e antiimperialista que pavimente o caminho para uma outra sociedade.

Campinas, junho de 2010.