A contenda inevitável

Recentemente afirmei que o mundo esqueceria, em breve, a tragédia que estava prestes a produzir-se, como resultado da política aplicada, durante mais de dois séculos, pela superpotência vizinha: os Estados Unidos.

Temos conhecido sua forma sinuosa e ardilosa de agir; o impetuoso crescimento econômico atingido a partir do desenvolvimento técnico e científico; as enormes riquezas acumuladas a custa da imensa maioria do seu povo trabalhador e do resto do mundo por uma exígua minoria que, nesse país e nos demais, dispõe e desfruta de riquezas sem limite.

Quem é que se queixa cada vez mais senão os trabalhadores, os profissionais, os que prestam serviços à população, os aposentados, os que carecem de emprego, as crianças de rua, as pessoas desprovidas de conhecimentos elementares, que constituem a imensa maioria dos quase sete bilhões de habitantes do planeta, cujos recursos vitais se esgotam visivelmente?

Como são tratados pelas chamadas forças da ordem que deveriam é protegê-los?

A quem golpeiam os polícias, armados com todos os instrumentos de repressão possível?

Não preciso descrever fatos que os povos em todas as partes, incluído os dos Estados Unidos, percebem através dos televisores, dos computadores e outros meios de informação em massa.

Um bocado mais difícil é desvendar os projetos sinistros daqueles que têm em suas mãos o destino da humanidade, pensando absurdamente que se pode impôr semelhante ordem mundial.

O que escrevi nas últimas cinco Reflexões com as quais ocupei o espaço do jornal Granma e do site CubaDebate, entre 30 de maio e 10 de junho de 2010?

Os elementos básicos de um futuro muito próximo foram expostos com clareza e não têm recuo possível.

Na esfera política, o caminho está prenhe de enormes riscos.

Um assunto a que me referi antes, entre os elementos básicos de um futuro muito próximo expostos por mim, que não têm mais recuo possível, é o afundamento do Cheonan, navio insígnia da marinha sul-coreana, que naufragou em 26 de março, em questão de minutos, matando 46 marinheiros e deixando dezenas de feridos.

O governo da Coreia do Sul ordenou uma investigação para saber se o fato foi em consequência de uma explosão interna ou externa. Ao comprovar que vinha do exterior, acusou o governo de Pyongyang pelo afundamento do navio. A Coreia do Norte apenas dispunha de um velho modelo de torpedo de fabricação soviética. Carecia de qualquer outro elemento, exceto a lógica mais simples. Não podia sequer imaginar outra causa.

No passado mês de março, como primeiro passo, o governo da Coreia do Sul ordenou a ativação dos alto-falantes de propaganda em 11 pontos da fronteira comum desmilitarizada que separa as duas Coreias.

O alto comando das forças armadas da República Popular Democrática da Coreia, de sua parte, declarou que destruiria os alto-falantes tão logo fosse reatada essa medida, que tinha sido suspensa no ano de 2004. A República Popular Democrática da Coreia declarou textualmente que converteria Seúl em um “mar de fogo”.

Sexta-feira passada, o exército da Coreia do Sul anunciou que a iniciaria tão logo o Conselho de Segurança anunciasse suas medidas, pelo afundamento do navio sul-coreano Cheonan. Ambas as repúblicas coreanas já estão com o dedo no gatilho.

O governo da Coreia do Sul nem sequer podia imaginar que seu estreito aliado, os Estados Unidos, tinha colocado uma mina no fundo do Cheonan, como relata em um artigo o jornalista investigador Wayne Madsen, publicado pelo Global Research, em 1º de junho de 2010, com uma explicação coerente do acontecido. Fundamenta-se no fato de que a Coreia do Norte não possui nenhum tipo de missil ou instrumento algum para afundar o Cheonan, que não pudesse ter sido detectado pelos sofisticados equipamentos do caça-submarinos.

A Coreia do Norte tinha sido acusada de uma coisa que não fez, o que determinou a viagem urgente de Kim Jong Il à China, num trem blindado.

Quando estes fatos se produzem de súbito, na mente do governo da Coreia do Sul não havia, nem há espaço, para outra causa possível.

Em meio do ambiente esportivo e alegre, o céu escurece-se cada vez mais.

As intenções dos Estados Unidos são óbvias desde há algum tempo, na medida em que seu governo age obrigado por seus próprios desígnios sem alternativas possíveis.

Seu propósito —acostumados à imposição de seus desígnios pela força—, é que Israel ataque as instalações produtoras de urânio enriquecido no Irã, utilizando os mais modernos aviões e o armamento sofisticado que, irresponsavelmente, a grande potência lhe fornece. Os Estados Unidos sugeriram a Israel, que não tem fronteiras com o Irã, que solicitasse à Arábia Saudita permissão para sobrevoar o país por um longo e estreito corredor aéreo, encurtando consideravelmente a distância entre o ponto de partida dos aviões atacantes e os objetivos a destruir.

Segundo o plano, que em suas partes essenciais foi divulgado pelos órgãos de inteligência de Israel, esquadrilhas de aviões atacarão uma e outra vez, até esmagar os objetivos.

Em 12 de junho passado, importantes órgãos da mídia ocidental publicaram a notícia acerca de um corredor aéreo concedido pela Arábia Saudita a Israel, após acordo com o Departamento de Estado norte-americano, com o objetivo de fazer testes de voo com os caça-bombardeiros israelenses para atacar de surpresa o Irã, que estes já tinham realizado no espaço aéreo saudita.

Porta-vozes de Israel nada negaram, declarando apenas que os mencionados países tinham mais medo do desenvolvimento nuclear iraniano que o próprio Israel.

Em 13 de junho, quando o Times de Londres publicou uma informação extraída de fontes de inteligência, assegurando que a Arábia Saudita divulgara um acordo que concede permissão a Israel para a passagem por um corredor aéreo sobre seu território para o ataque a Irã, o presidente Ahmadinejad declarou – ao receber as cartas credenciais do novo embaixador saudita em Teerã, Mohamad ibn Abbas al Kalabi – que havia muitos inimigos que não desejavam relações estreitas entre ambos os países.”…Mas se o Irã e a Arábia Saudita permanecem um ao lado do outro, esses inimigos abrirão mão de continuarem com a agressão… “.

Do ponto de vista iraniano, segundo a minha opinião, essas declarações eram justificadas, quaisquer que fossem as suas razões para o fazer. Possivelmente não desejava ferir no mínimo possível seus vizinhos árabes.

Os ianques não disseram uma única palavra, o que reflete mais do que nunca seu desejo fervente de varrerem o governo nacionalista que dirige o Irã.

É preciso perguntar agora quando o Conselho de Segurança examinará o tema do afundamento do Cheonan, outrora navio insígnia da armada sul-coreana; que conduta seguirá depois que os dedos nos gatilhos das armas na península coreana as façam disparar; se é verdade ou não que a Arábia Saudita, de acordo com o Departamento de Estado, autorizou um corredor aéreo para que as esquadrilhas de modernos bombardeiros israelenses ataquem as instalações iranianas, o que possibilita, inclusive, o emprego das armas nucleares fornecidas pelos Estados Unidos.

Fidel Castro Ruz (resumo)

Junho 16 de 2010