Tombamento do DOI-Codi é vitória da democracia, da verdade e da justiça
O Núcleo de Preservação da Memória Política divide com todos os resistentes e democratas em geral a satisfação pelo tombamento das edificações do centro clandestino de detenção, tortura e extermínio conhecido como DOI-Codi, ex-Operação Bandeirantes (Oban), em São Paulo.
Criada em 1969, com ajuda financeira de empresários, a Oban/DOI-Codi desempenhou papel decisivo na estratégia de terrorismo de Estado da ditadura civil-militar de 1964-1985. Por ali, estima-se que passaram cerca de 8 mil opositores do regime – detidos ilegalmente e levados com os olhos vendados, ou encapuzados –, que foram submetidos a interrogatórios sob tortura física e psicológica.
A Comissão Nacional da Verdade apurou até o momento que ao menos 51 pessoas foram mortas no DOI-Codi paulista, entre eles Joaquim Alencar Seixas, Luiz Eduardo da Rocha Merlino, José Ferreira de Almeida, Vladimir Herzog e Manuel Fiel Filho. Novos testemunhos de atingidos e familiares têm sido feito nas diversas Comissões da Verdade e Clínicas do Testemunho criadas pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, em São Paulo, permitindo aprofundar a apuração sobre os crimes praticados pela ditadura.
A aprovação histórica do tombamento pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat) das edificações do antigo DOI-Codi, no dia 27 de janeiro, foi resultado de um longo processo iniciado em 2010 com o pedido apresentado pelo jornalista e ex-preso político Ivan Akselrud Seixas, com o apoio do Fórum de ex-presos, do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CONDEPE), da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos, e também pelo Grupo Tortura Nunca Mais-SP.
Em 25 de setembro de 2012, diretores do Núcleo Memória e do Memorial da Resistência de São Paulo participaram da inspeção realizada pelo Condephaat nas edificações do antigo DOI Codi, ocasião em que todas as dependências foram fotografadas e ex-presos políticos reconheceram locais em que foram praticadas torturas. Esse material foi juntado ao processo de tombamento e será divulgado proximamente no site do Núcleo Memória.
Nos últimos meses, a Comissões Nacional da Verdade, a Comissão da Verdade Estadual “Rubens Paiva” da Assembleia Legislativa de São Paulo e a Comissão da Verdade Municipal Vladimir Herzog da Câmara Municipal de São Paulo, assim como outras organizações de resgate da memória e direitos humanos, realizaram visitas ao local, acompanhadas da imprensa, com o objetivo de ouvir relatos de testemunhas sobre as atrocidades cometidas naquele centro clandestino da ditadura. Todas essas visitas foram de extrema importância não só para formar a convicção sobre a necessidade do tombamento, como para as apurações realizadas pelas Comissões da Verdade.
O Núcleo Memória lembra, finalmente, que os moradores vizinhos a esse centro clandestino da repressão política devem ser considerados igualmente atingidos por tortura psicológica, por terem sido obrigados a conviver, como testemunhas involuntárias, com a violência emanada daquele local. O bairro do Paraíso, onde funcionou a Oban/DOI-Codi, poderá finalmente superar o inferno daquela época – o que se fará quando conhecermos as atrocidades ali cometidas em toda a sua extensão.
O tombamento abre espaço para a criação de um novo lugar de memória na cidade de São Paulo, que se somará ao antigo Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo (Deops/SP) – onde ergueu-se o Memorial da Resistência de São Paulo – e da antiga Auditoria Militar de São Paulo – que deu lugar ao Memorial da Luta pela Justiça da Ordem dos Advogados do Brasil Secção São Paulo (OAB/SP), gerido conjuntamente pela entidade e pelo Núcleo Memória.
Conhecer o passado é a única forma de entender o presente. E de construir o futuro democrático que queremos.
Núcleo de Preservação da Memória Política
29 de janeiro de 2014