JOVENS DE ISRAEL RECUSAM EXÉRCITO: “MELHOR IR PARA A PRISÃO”
É A PRIMEIRA GRANDE ONDA DE RECUSA AO SERVIÇO MILITAR DESDE 2001; OS JOVENS NÃO QUEREM SERVIR AO “EXÉRCITO QUE COMETE CRIMES”
Dafna Rothstein, em mobilização de jovens, em Tel Aviv (Foto: arquivo pessoal / Divulgação)
Guila Flint Direto de Tel Aviv reblogado
Em uma carta endereçada ao primeiro ministro Binyamin Netanyahu e ao público israelense, 60 jovens de ambos os sexos, de 16 a 19 anos, afirmam que pretendem se recusar a prestar serviço militar pois se opõem à ocupação dos territórios palestinos.
Esta é a primeira grande onda de recusa ao serviço militar desde 2001, quando centenas de soldados da reserva se negaram a participar das ações militares de Israel na Cisjordânia e na Faixa de Gaza, durante a segunda Intifada (levante palestino).
A iniciativa, denominada Recusa 2014 (Seruv 2014), foi publicada neste domingo, 9, e, segundo integrantes do grupo, nas ultimas 24 horas o número de assinantes vem aumentando.
“Nos territórios ocupados são cometidos diariamente atos definidos pela lei internacional como crimes de guerra “, declaram os jovens, “inclusive execuções extrajudiciais, construção de assentamentos em terras ocupadas, prisões sem julgamento, tortura, punição coletiva e distribuição desigual de recursos como eletricidade e água”.
Polêmica
A declaração dos jovens gera uma intensa polêmica na sociedade israelense, onde o serviço militar é obrigatório tanto para homens como para mulheres, depois de completarem 18 anos.
Muitas vezes a polêmica adquire caráter violento e vários jovens entrevistados pelo Terra disseram que as reações que estão enfrentando “dão mêdo”.
“Desde a publicação da nossa carta começamos a receber todos os tipos de insultos e até ameaças de morte por intermédio das redes sociais”, disse Itai Aknin, de 19 anos. Segundo ele, os integrantes do grupo “estão decididos” a não prestar serviço militar, apesar das pressões que estão sofrendo.
Como porta-voz do grupo, Aknin é um dos jovens que mais se expõem. Nesta segunda feira ele foi entrevistado tanto no canal 2 da TV israelense como na radio Galei Israel.
Em ambos os programas, ficou bem evidente o antagonismo e quase ódio de outros participantes contra a iniciativa. Um apresentador da rádio chamou o porta-voz de “moleque” durante a entrevista ao vivo. Na televisão, um dos participantes afirmou que a TV “nem deveria dar espaço para essa iniciativa desprezível”.
Não queremos participar dos abusos que o Exército comete contra os palestinos, queremos acabar com a ocupação.
Itai AkninIsraelense de 19 anos e um dos porta-vozes do movimento
“Não queremos participar dos abusos que o Exército comete contra os palestinos, queremos acabar com a ocupação”, disse Aknin. Ele acredita que a iniciativa pode influenciar outros jovens israelenses que estão prestes a se alistar no Exército.
“Ao lerem a nossa carta, tenho certeza de que muitos jovens pensarão duas vezes antes de prestar serviço militar”, disse.
“A guerra em Gaza, em 2008, foi o momento em que percebi que algo de muito errado estava acontecendo aqui”, contou, “naquela época, eu tinha 14 anos e me lembro que fiquei muito chocado quando descobri que o meu país estava bombardeando civis e matando inclusive crianças”.
“Arrastei minha mãe para uma manifestação contra a guerra, em Tel Aviv”, disse. Aos 17 anos, ele começou a participar de manifestações conjuntas, de ativistas palestinos e israelenses, contra a construção do Muro na Cisjordânia.
“Comecei a ir às manifestações em Bilin (aldeia palestina na Cisjordânia) e quando vi o que acontece lá ficou claro para mim que não posso, de maneira nenhuma, fazer parte do Exército”.
“Melhor ir para a prisão”
“Não tenho dúvida alguma de que é melhor ir para a prisão do que prestar serviço militar”, disse Udi Segal, de 18 anos.
Segal, que mora em um kibutz (comunidade agricola) no norte de Israel, já recebeu a convocação para se alistar em julho deste ano.
Muitos jovens são liberados do serviço militar por razões de saúde fisica ou mental.
Segundo avaliações de especialistas, vários deles alegam problemas de saúde mental como estratégia para serem liberados do Exército.
No entanto, Segal afirma que não pretende utilizar essa estratégia. “Quando chegar a hora de me alistar, pretendo dizer claramente que me recuso a prestar serviço militar por razões politicas, que sou contra a ocupação”, disse.
“Não quero ajudar o Exército a tachar todos aqueles que se recusam como doentes mentais. Não sou doente mental. Não quero participar da repressão, da violência e da violação total de direitos humanos praticadas pelo Exército nos territórios ocupados”.
“Pessoalmente acho que sou uma pessoa sã”, acrescentou.
Não quero ajudar o Exército a tachar todos aqueles que se recusam como doentes mentais. Não sou doente mental. Não quero participar da repressão, da violência e da violação total de direitos humanos praticadas pelo Exército nos territórios ocupados
Udi SegalIsraelense de 18 anos
Militarismo
Dafna Rothstein Landman, de 17 anos, está cursando o terceiro colegial em Tel Aviv e já recebeu a convocação para iniciar o serviço militar no próximo verão.
“Eu não poderia olhar para mim mesma se concordasse em servir o Exército”, disse.
“Nós, os assinantes da carta, nos recusamos a prestar o serviço militar não só por sermos contra a ocupação mas também porque achamos que o Exército agrava o militarismo, o chauvinismo e a violência dentro da própria sociedade israelense”.
“Até a educação que recebemos nas escolas é influenciada pelo Exército. Muitas vezes somos orientados a escolher matérias que podem nos garantir ‘um bom posto’ durante o serviço militar”, afirmou Landman.
Seus pais ficaram preocupados com sua decisão. “Eles não gostaram da ideia pois temem que isso prejudique o meu futuro, mas sei que posso contar com o apoio deles”, concluiu.
Nos recusamos a prestar o serviço militar não só por sermos contra a ocupação, mas também porque achamos que o Exército agrava o militarismo, o chauvinismo e a violência dentro da própria sociedade israelense.