Corte no orçamento e a crise na Educação brasileira: A greve educadora
Henrique Oliveira*
Patrício Freitas**
As greves nas universidades públicas brasileiras se arrastam por mais de dois meses. Os segmentos da comunidade universitária se aliam para barrar a precarização que está imposta atualmente à educação pública.
Mas, para compreendermos todo esse movimento de ataque ao setor educacional público, é preciso ter clareza da realidade econômica mundial, do projeto político do governo petista e o papel que assume nesse momento conflituoso.
A greve nacional se coloca contra as medidas da política econômica do Governo Federal, sobretudo contra o ajuste fiscal, que realizou um corte de 69 bilhões no orçamento federal[i], onde a Educação perdeu mais de 9 bilhões[ii]. O corte de verbas acabou atingindo programas educacionais e de pesquisa, desmascarando a farsa da “Pátria Educadora”.
Nesse momento de crise estrutural do capitalismo, onde o capital parasitário entra em colapso, algumas ferramentas de coerção são intensificadas no sentido de garantir a reestruturação do capitalismo mundial. Um dos mecanismos mais eficazes nesse momento é a intensificação da dívida pública. Basta observarmos como as políticas de austeridades estão presentes em todos os cantos do globo, como na crise do Euro e a pressão dos setores financeiros sobre Grécia, Espanha, Portugal e o alto nível de pauperização que tem sido marcante em toda história do capital.
No Brasil, as ações não tem sido distintas, através de juros abusivos, no ano de 2014, foram escoados mais de 42% do PIB para o pagamento da dívida pública, movimento que vem se intensificando cada vez mais[iii].
Na necessidade de garantir o Superávit Primário, o Ministro da Fazenda, Joaquim Levy, afirma a necessidade de fazer contenções de gastos para pagar as parcelas de juros e amortizações da dívida brasileira. Porém, essas contenções, que transferem dinheiro público para salvar os bancos da crise mundial e ao mesmo tempo tentam reorganizar o modelo de acumulação do capitalismo global, refletem em pastas importantes para toda a classe trabalhadora. A PL da terceirização, os pacotes de austeridade em que se apresentam as MP 664 e 665 foram o início da política de governo em conlúio com o capital financeiro. Foram realizados cortes significativos no orçamento, reduzindo os investimentos públicos nas áreas sociais como Saúde, Educação e Moradia. O Governo através do Banco Central aumentou seguidamente os juros até chegar o patamar de 13,25%[iv], o que vai gerar um gasto corrente de 60 bilhões de reais ao tesouro público[v], 9 bilhões apenas a menos do que foi retirado com o ajuste fiscal. Se o Governo Federal queria realmente reduzir o gasto público, poderia começar não aumentando a taxa de juros da Selic, que é taxa que remunera os títulos da dívida pública, beneficiando apenas banqueiros e rentistas nacionais e internacionais.
Na esteira do corte de orçamento na educação pública, o Governo Federal aumentou os repasses de verba pública para as instituições privadas de ensino superior através do PROUNI e do FIES, reafirmando o seu compromisso com o monopólio de educação privado através das empresas Kroton e Anhanguera, que foram associadas e hoje possuem a 17ª posição da Bovespa em termos de mercado, e que recebe sozinha 2 bilhões de reais[vi]. Nesse ano o gasto do Governo com o FIES é de 13 bilhões de reais, uma fatia superior ao corte realizado na educação pública[vii]. O Governo também autorizou que o Tesouro Nacional emitisse 1,4 bilhões de reais em títulos para o FIES, isso significa que o Governo está se endividando com os juros mais altos do mundo, para repassar mais dinheiro público ao setor privado[viii]. Além disso, o ProUni desde a sua institucionalização em 2005, tinha isentado as faculdades particulares até 2013 em 4 bilhões[ix], enquanto uma auditória do Tribunal de Contas da União mostra que cerca de 260 mil vagas não foram ocupadas entre os anos de 2005 a 2009[x].
Segundo o novo reitor da UFRJ, Robero Leher, com os 13 bilhões de reais destinados ao FIES, poderia se criar o dobro de vagas nas Universidades Federais, em relação às faculdades particulares. Investimento que poderia ser revestido nas universidades públicas, abrindo o número de vagas nas federais, assim como o valor gasto no ProUni podendo reverter a precarização das instituições públicas de educação superior[xi].
Os ataques do Governo Federal a Educação Pública Superior resultou no anúncio de um corte de 90% no PIBID – Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – que auxilia na formação dos futuros professores da Educação Básica, daqueles cursos de Licenciatura[xii]. Os cortes também refletiram no Programa Ciências Sem Fronteiras.
O ajuste fiscal tem fragilizado mais ainda o tripé Ensino – Pesquisa – Extensão, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) reduziu 75% dos seus custeios. No caso da UFBA, por exemplo, o corte de 75% representa uma redução de 4 para 1 milhão de reais para os custeios da Pós Graduação[xiii]. A UFRJ anuncia que no final de 2015 o seu déficit deve chegar a cerca de 300 milhões de reais[xiv]. Essa política de sucção da educação pública está ligado ao projeto de sucateamento dos setores públicos para ampliação da atuação privada – como já tem sido mais presente na área de saúde.
No caso das greves estaduais a desculpa utilizada pelo governo vem sendo a mesma. Porém, a situação econômica reflete um movimento singular. Em 2010, após a retração em 2009, o PIB baiano já demonstrou crescimento de 6,6%, garantindo a sexta posição no âmbito nacional. O crescimento se manteve constante em 2011 totalizando 159,9 bilhões, em 2012 com 167 bilhões. Em 2014 a Bahia teve o Superávit de 1, 13 bilhões, o ano findou com a relação entre a Dívida Consolidada Líquida e a Receita Corrente Líquida em 0,40, o mais baixo patamar desde o histórico de 1,02 em 2006. Em números mais exatos, a Bahia teve crescimento do PIB em 1,5% em 2014, comparado ao ano anterior, e tem previsão de 1% depois do fechamento das contas em 2015. Então, se a dívida baiana não está na mesma condição da dívida nacional e seu crescimento econômico vem sendo constante, qual o verdadeiro motivo para essa política de descaso com as universidades estaduais? A raiz da questão continua sendo a mesma.
Mesmo com o governo cumprindo o pagamento das parcelas estaduais da dívida pública, o superávit é escoado para o pagamento da dívida federal. Em mesa de negociação veio da própria representação do governo o argumento que até o orçamento estadual deve passar pela aprovação do Joaquim Levy. O resultado dessa equação é a crise que a educação baiana vem sofrendo, na Universidade do Estado da Bahia não há sequer um restaurante universitário, creche, residências próprias ou qualquer política efetiva de permanência estudantil. A intransigência do governador Rui Costa, do Secretário de Educação, Osvaldo Barreto, do Secretário da Secretária de Relações Institucionais e demais representantes nas negociações por parte do Estado, inviabilizam de qualquer maneira a pauta orçamentária reivindicada pelo movimento grevista.
As greves que hoje repercutem nas federais e nas universidades estaduais são reflexos dessas medidas que transformam a educação em um verdadeiro escombro. Enquanto os banqueiros continuam lucrando, é a classe trabalhadora e o setor de serviço estatal que paga as contas da crise dos capitalistas. Dessa forma, só através das lutas a comunidade acadêmica pode resistir a essa sufocante condição. Dessa forma, é importante frizar que nessa conjuntura o governo tende acirrar suas ações repressivas sobre as greves, como aconteceu no fatídico caso do Paraná, e recentemente na ocupação da Secretária de Educação da Bahia pelo movimento grevista das quatro estaduais baianas, onde o governador Rui Costa mandou a Rondesp[xv] (polícia especial) para desocupar os professores e estudantes que reivindicavam por orçamento e autonomia universitária.
Entretanto, é fundamental que essa reivindicação ultrapasse os muros das universidades e possa ecoar a toda sociedade. Pois sabemos que as greves na educação costumam se alongar por não estarem ligadas diretamente a produção de riqueza material, sendo a política de desgaste prática recorrente dos governos. É, portanto, preciso ir além das salas de aula e laboratórios, pois essas políticas de austeridades refletem em toda classe trabalhadora e não serão findadas enquanto o capitalismo não se reoxigenar dessa crise estrutural. Esse sistema apodrecido revela a contradição essencial entre o capital e a educação, onde a construção de uma alternativa emancipatória só pode ser dada na superação dessa ordem mundana existente.
Henrique Oliveira* é militante da União da Juventude Comunista e estudante de História da Universidade Federal da Bahia.
Patrício Freitas** é militante da União da Juventude Comunista e estudante de Ciências Sociais da Universidade Estadual da Bahia.
[i] http://oglobo.globo.com/brasil/governo-anuncia-corte-de-699-bilhoes-no-orcamento-de-2015-16234657
[iv] http://g1.globo.com/economia/noticia/2015/06/veja-repercussao-do-aumento-dos-juros-para-ao-ano.html
[v] http://www.brasildefato.com.br/node/31998
[xv] http://www.adusb.org.br/web/page?slug=news&id=7844&pslug=#.VbgWzvlViko
https://bahiaujc.wordpress.com/2015/07/29/corte-no-orcamento-e-a-crise-na-educacao-brasileira-a-greve-educadora/