“A resposta oficial aos ataques na França é simplesmente mais repressão e mais restrição às liberdades”
Entrevista com James Petras, sábado, 14 de novembro de 2015
“ É uma tragédia para o povo francês. É algo repudiável o que atacaram, pois não atacaram militares, mas alvos civis, em shows de música, comendo em restaurantes em uma sexta-feira à noite, depois de uma semana de trabalho. Essa é a tragédia. Porém, a resposta me parece, serão coisas piores”, disse o sociólogo norte-americano, professor James Petras, ao ser consultado pela CX36, na manhã de sábado, 14 de novembro, a respeito dos ataques na França. Transcrevemos a entrevista, que pode voltar a ser escutada em:
http://www.ivoox.com/contacto-james-petras-a-raiz-los-audios-mp3_rf_9385911_1.html
María de los Ángeles Balparda: Quais são suas primeiras reflexões sobre isto?
JP: Devemos entender que a internacionalização das guerras ocidentais nos países muçulmanos tem um efeito bumerangue. Não podemos pensar que o que passou em Paris não está conectado com os ataques militares no Iraque, Iêmen, Afeganistão, Líbia, Síria e todos os outros países árabes. Podemos analisar brevemente a cadeia: Os países ocidentais bombardeiam e destroem toda a sociedade iraquiana deixando mais de dois milhões de pessoas refugiadas. Esses refugiados do Iraque, Afeganistão, Líbia, etc., começam a sair para a Europa cada vez piores, pois ficam na memória os efeitos dos ataques militares ocidentais. Talvez a segunda geração, os filhos dos refugiados, esteja agora atuando em função dos conflitos atuais em outros países.
É uma cadeia de causa-efeito: quantas mais bombas nos países muçulmanos, mais rancor, mais raiva, entre os filhos, os descendentes, dos afetados em seus países de origem.
Agora, a ideia que estão analisando aqui é a técnica. Não analisam a política, o contexto, mas que falam da sofisticação do ISIS, falam da capacidade de montar ataques bem planejados e sofisticados. E isso tem implicâncias porque a mentalidade das autoridades acerca do que necessitam, é não retificar sua política exterior, mas aumentar a repressão interna. Estão preparando uma repressão severa às liberdades, à infiltração, à espionagem, ao encarceramento de qualquer suspeito.
Então, deveriam refletir e dizer quais são as causas destes atos terroristas, entender que não devem invadir e usar a violência nestes países para evitar estes efeitos. Porém, não pensam assim. Ao invés disso, vão aumentar os ataques. Estão planejando e discutindo agora mandar tropas da Europa e dos Estados Unidos aos países onde está presente a ISIS. Ou seja, vão multiplicar as guerras. Além dos ataques aéreos vão colocar tropas no território e aumentar os conflitos.
Internamente, a discussão é como poderíamos aumentar a repressão, como poderíamos controlar os movimentos de qualquer pessoa, como aumentar o número de pessoas sob a vigilância.
Em todo caso, é uma tragédia para o povo francês. É algo repudiável o que atacaram, pois não atacaram militares, mas alvos civis, em shows de música, comendo em restaurantes em uma sexta-feira à noite, depois de uma semana de trabalho. Essa é a tragédia. Porém, a resposta me parece, serão coisas piores.
MAB: Inclusive, na madrugada, foi incendiado um edifício de refugiados, o que se entende como uma resposta.
JP: Sim, faz tempo que estão perseguindo os imigrantes e os refugiados.
Isso é como colocar lenha na fogueira. Acredito que estejam preparando um assalto generalizado contra qualquer muçulmano, de qualquer cor, em qualquer parte do mundo.
MAB: Você dizia que preparam uma operação para limitar a liberdade dos cidadãos.
JP: Sim, os EUA, a França, a Europa toda está pensando que não existe espionagem, infiltração, controle dos cidadãos, atuação policial suficiente. Vão restringir qualquer expressão e suspeitar de qualquer pessoa que critica o governo. Vão dizer que está colaborando com os terroristas.
Esta resposta oficial é simplesmente mais repressão e as liberdades já restritas que temos, vão diminuir ainda mais.
MAB: Por estas horas começa a reunião do G20 na Turquia e Angela Merkel já anunciou que a resposta será coletiva.
JP: Faz tempo está anunciando medidas restritivas e isso vai limitar a entrada dos refugiados e aumentar o castigo àqueles que já estão dentro destes países. Além disso, fomentam a ira da população não muçulmana em todas as partes. Estão demonizando qualquer imigrante como um suspeito, como uma pessoa que deve ser vigiada.
MAB: Há gente que se pergunta se não será um auto-atentado, como o 11 de setembro.
JP: Bom, existe alguma especulação, porém o ISIS assumiu a responsabilidade.
O que pode ser suspeito é como permitiram que dezenas de pessoas planejassem isso. Isso sim é algo que dá para suspeitar. Como as autoridades que se infiltraram em tantos grupos muçulmanos, que têm controle de telefones, internet, câmeras, arquivos, como podem ser uma surpresa? É possível que tenham permitido esta ação para, depois, aumentar a repressão, o orçamento militar e policial e as restrições sobre a liberdade. Isso é como o 11/9: permitir que algo ocorra para aproveitar e aumentar os poderes repressivos do Estado.
MAB: Agora, diz-se que identificaram dois dos supostos terroristas, um com passaporte francês e outro com passaporte sírio. E também se fala da quantidade de franceses que integram o ISIS.
JP: Bom, é o que digo. Os filhos de imigrantes refugiados se sentem ofendidos pelo que aconteceu com seus pais. E é a segunda geração que está promovendo essas ações.
As famílias quando chegam simplesmente buscam sobreviver, porém os filhos, os descendentes, têm implantado na memória o que aconteceu e estão se vingando. Creio que essa é a geração explosiva.
MAB: Claro que sim, Petras. Você quer acrescentar mais alguma coisa?
JP: Não. Acredito que devemos resistir à tentação de simplesmente tomar respostas repressivas. Devemos buscar soluções políticas porque o que termina na França começou de fora. Devemos retificar a política intervencionista. Porém, temo que, pelo contrário, as autoridades vão aumentar sua presença e a resposta militar. Esse é o perigo. Além disso, a América Latina não deve se meter nem se apresentar como candidato a apoiar ações militares. Deve ficar de fora deste conflito entre os poderes imperiais e os países muçulmanos.
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