100 Anos da Primeira Greve Geral no Brasil

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Por Fábio Bezerra*

Há exatos cem anos, a classe operária brasileira realizava a sua primeira experiência de Greve Geral. Em um contexto de extrema exploração, com jornadas de trabalho que chegavam a 16 horas diárias, ausência de direitos básicos como intervalo para o almoço, férias e assistência médica, salários defasados, além da exposição a humilhações morais, castigos físicos e assédio sexual às operárias, trabalhadores(as) do setor têxtil em São Paulo, em sua maioria mulheres, iniciaram uma greve no início do mês de junho (09/06) na Fábrica Cotonofício Crespi, localizada na Mooca, que foi duramente reprimida pela polícia. Nos dias que se seguiram, outras unidades fabris aderiram ao movimento, muitas em solidariedade, expandindo-se para outros setores (mobiliário, panificação, condutores, construção civíl, bebidas entre outros).

A reação das elites oscilou entre a intransigência dos patrões, a  criminalização dos jornais da época até as batalhas sangrentas, entre operários e a polícia, que se seguiram nas ruas de São Paulo, principalmente nos bairros operários da Mooca e do Brás. O ponto culminante se deu entre os dias 9 e 12 de julho, quando o governo municipal se retirou da cidade devido à escalada de violência e aos confrontos que levaram à morte, contabilizada oficialmente, de dois operários, uma criança e um policial (mas as estimativas são de dezenas de operários mortos).

Após o enterro do ativista espanhol e anarquista José Gimenez Martinez, a Greve Geral ganhou a adesão em outras cidades da federação, tais como: Rio de Janeiro, Porto Alegre, Juiz de Fora e diversas cidades do interior paulista, atingindo, em julho, a participação de mais de 50 mil trabalhadores(as).

O grau de organização proletária e solidariedade alcançou um ponto de amadurecimento nunca antes visto na recente e ainda jovem trajetória de greves operárias. Foi criado o Comitê de Defesa Proletária, que reunia lideranças anarcossindicalistas e socialistas de diversas categorias e que assumiu as negociações em torno de uma pauta de reivindicações intermediada, junto ao governo paulista e ao patronato, por uma comitiva de jornalistas.

Durante cerca de trinta dias intensos de manifestações e batalhas de rua, ocupações de fábricas, barricadas, prisões e a instauração de estado de sítio na cidade de São Paulo, a maioria das reivindicações foi acatada. Mas a repressão que se seguiu às lideranças libertárias e aos líderes fabris foi avassaladora.

Ainda em 1917, dezenas de ativistas libertários, em sua maioria italianos e espanhóis, foram extraditados. Ativistas brasileiros foram presos e deportados para o Amapá, de onde não se poderia retornar, um verdadeiro degredo. As gráficas onde funcionavam os jornais anarquistas foram desmontadas e muitos dos acordos firmados, em fins de julho de 1917, assim que se arrefeceu o movimento, foram descumpridos.

Apesar de toda a violenta repressão e do ódio da classe burguesa, que saltou aos olhos nas páginas da imprensa oficial, assim como nas medidas que se seguiram para coibir o movimento operário, entre elas, a criação da  Delegacia de Ordem Política e Social (órgão antecessor do DOPS), estava destravado um novo capítulo da História da Resistência e das Lutas Sociais da classe trabalhadora brasileira. A burguesia, a partir desse momento, estava diante de um operariado – ainda incipiente e em formação -, mas que amadurecia rapidamente, na mesma intensidade e proporção que avançava a exploração e aumentava a carestia, conquistando sua consciência de classe e organização política enquanto vanguarda das lutas que viriam a acontecer.

Mais do que o resplandecer da luta de classes no Brasil num novo estágio de enfrentamento entre o capital e o trabalho, prelúdio de outras tantas lutas e desdobramentos que determinaram, entre outras coisas, a constituição da CLT nos anos 1940, a movimentação espontânea, pujante e firme da classe operária nas jornadas de junho e julho de 1917, também possibilitaram o amadurecimento das análises sobre a tática e os caminhos a se seguir contra o capital e o domínio burguês.

A questão de um partido revolucionário que pudesse assumir as tarefas da organização do proletariado frente às limitações táticas e organizativas do pensamento anarquista à época, foi colocada para as principais lideranças do movimento de 1917, influenciadas pela repercussão e simbolismo da Vitoriosa Revolução Russa de Outubro daquele ano, precipitando, em 1919, a possibilidade de constituição de um Partido Comunista, que somente, em 25 de março de 1922 seria fundado. Não é por coincidência que, dos nove membros fundadores do PCB, seis eram de origem libertária.

Passados cem anos, o legado histórico da ousadia e da resistência contra a barbárie capitalista se mantém mais vivo do que nunca em nossa existência, ainda mais frente aos ataques da burguesia e seus governos neoliberais, justamente contra os direitos trabalhistas e a aposentadoria, conquistados com sangue, suor e lágrimas de milhares de trabalhadores ao longo do tempo.

Seguimos firmes lutando sob novas jornadas de GREVE GERAL, resistindo e intensificando nossa luta não apenas em memória daqueles que ousaram lutar e enfrentar o jugo do capital, mas em defesa de nossos direitos e conquistas, os quais, se usurpados, nos colocarão em um patamar histórico igual ou pior ao que a classe trabalhadora vivia no início do seculo XX!

Só a luta muda a vida!
Viva a Heróica Greve Geral de 1917!
E que venha a Greve Geral de 30 de junho de 2017!
Nenhum passo atrás, Nenhum Direito a Menos!

*Membro do Comitê Central do PCB