Teses à Conferência Nacional do PCB
Comitê Central do PCB convoca Conferência Política Nacional!
A Conferência terá sua etapa nacional nos dias 12 e 13 de novembro deste ano, no Rio de Janeiro. O objetivo principal do evento, que será precedido por seminários e conferências regionais, é ajustar a tática dos comunistas brasileiros à estratégia socialista definida pelo XIV Congresso do Partido (2009), com destaque para a ação política no campo dos movimentos de massas e em outras esferas e espaços de luta, debatendo os caminhos para o avanço da construção da contra-hegemonia revolucionária socialista.
Está aberta uma Tribuna de Debates em torno das Teses elaboradas pelo Comitê Central. Os debates contarão também com a colaboração de amigos do PCB convidados.
A Conferência Política é uma instância intermediária entre o Comitê Central e o Congresso do Partido, reunindo-se entre um e outro Congresso. Publicamos aqui a primeira parte das Teses do CC à Conferência. Vamos ao debate!
Teses à Conferência Política Nacional (13 e 14 de novembro de 2011)
PRIMEIRA PARTE
Uma Estratégia Socialista
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O PCB, em seu XIV Congresso Nacional, em 2009, definiu sua estratégia como uma estratégia socialista. Isso significa que afirmamos que o desenvolvimento do capitalismo, no mundo e no Brasil, se encontra em um estágio que define a burguesia monopolista como classe econômica e politicamente dominante em uma ordem capitalista madura na qual as contradições centrais são entre os interesses do capital e os do trabalho.
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A burguesia não luta mais para impor seu domínio contra nenhuma classe ou fragmento de classe pré-capitalista, da mesma forma que o seu domínio há muito tempo perdeu o caráter progressista, tornando-se um poderoso entrave ao desenvolvimento das forças produtivas e à produção social da vida. O modo de produção capitalista tornou-se destrutivo e seu desenvolvimento aprofunda as contradições que lhes são próprias, na medida em que socializa radicalmente a produção envolvendo todos os povos do mundo numa rede mundial de produção, circulação e consumo, ao mesmo tempo em que acumula privadamente a riqueza nas mãos de cada vez menos grupos monopolistas internacionalizados como principais sujeitos do capital imperialista.
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O Brasil se insere no sistema capitalista/imperialista com uma economia completa do ponto de vista das necessidades da acumulação de capitais, subordinando todas as esferas da vida a estas necessidades, mercantilizando tudo em escala nunca antes vista. Todos os grandes problemas da formação social brasileira, as desigualdades regionais e sociais, a falta de acesso a bens e serviços essenciais como educação, saúde, moradia, saneamento básico, transporte, segurança e outros não são causados pela carência de recursos e baixo desenvolvimento econômico, mas pelo próprio desenvolvimento do capitalismo como modo de produção e distribuição e sua inevitável mercantilização da vida.
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Desta forma, o PCB defende que as diferentes lutas que se confrontam com as mais diversas manifestações da injustiça e a desigualdade se chocam hoje com a forma capitalista, seja na luta pelo acesso à terra, seja pelo choque entre as formas de produção camponesa contemporânea próprias da pequena propriedade ou do trabalho associado nos assentamentos da reforma agrária incompleta e insuficientemente realizada com a economia capitalista monopolista, que desenvolveu uma estrutura agrária plenamente capitalista e monopolizada; seja nas lutas sociais por moradia, emprego, saúde, educação, segurança, diversas opressões específicas (sobre os jovens, mulheres, negros, populações originárias e outras), que enfrentam a ordem capitalista chocando-se com suas manifestações mais aparentes através de uma particular forma de ordenamento do espaço urbano e de uma particular lógica opressiva e negadora da vida em sua plenitude humana.
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Reafirmamos que a acumulação ampliada de capitais e suas renovadas necessidades se fundamentam na exploração do trabalho assalariado, na extração de mais valia no setor produtivo da economia, o que impõe um aprofundamento da intensificação do trabalho com sérias consequências para a classe trabalhadora. Sua aparente passividade não deve obscurecer o grave aprofundamento da exploração, assim como a fragmentação e precarização dos trabalhadores não significa que, neste novo perfil e composição, estes deixem de ser não apenas a classe fundamental para a reprodução da acumulação de capitais, como o grupo social que pode se opor, de maneira mais decisiva, à ordem do capital, representando os interesses de todos aqueles que se encontram oprimidos pela manutenção da forma capitalista de organização societária.
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Os problemas específicos do proletariado, entendido por nós como o conjunto daqueles que são obrigados a viver da venda de sua força de trabalho, seja produtiva ou improdutivamente, não se resolverão pelo mero desenvolvimento econômico ideologicamente apresentado como neutro ou adjetivado de “social”, “inclusivo” ou “sustentável”. Os ganhos parciais, momentâneos e insuficientes que o proletariado pode vir a auferir nos momentos de crescimento são violentamente cobrados nos momentos de crise, recaindo sobre seus ombros, novamente, o preço de salvação do capital ciclicamente em crise. O mais grave é que o apassivamento do proletariado e seu tenso e precário amoldamento à ordem do capital desarmam não apenas os trabalhadores assalariados mais ligados ao núcleo central da acumulação de capital, mas toda a sociedade que se fragmenta em lutas específicas pontuais, normalmente restritas às demandas imediatas e econômicas, perdendo sua força para se contrapor à ordem do capital.
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Desta maneira, para nós, além de ser o principal interessado na luta anticapitalista, o proletariado segue sendo a única classe que, através de sua particularidade, pode expressar os interesses de toda a sociedade por sua emancipação. Assim, o PCB define que a revolução brasileira é, pelo seu caráter, pela época histórica em que se insere, pela classe que se apresenta como sujeito histórico e contra as classes que formam o bloco dominante e hegemônico contra o qual ela se opõe, uma revolução socialista.
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A construção dessa estratégia depende, em primeiro lugar, de uma análise rigorosa e profunda da realidade brasileira contemporânea, do processo mundial e local de desenvolvimento das relações capitalistas, das articulações do capitalismo brasileiro com o imperialismo e do entendimento de como se dá a afirmação da hegemonia burguesa em nosso país. A partir de tais reflexões e da crítica às demais visões estratégicas que disputam conosco a hegemonia no campo da luta socialista, será possível desenvolver propostas de mediação tática consoantes às necessidades e possibilidades concretas de pavimentação do caminho revolucionário no Brasil.
II – O capitalismo brasileiro
A necessidade da discussão – implicações estratégicas e táticas para a Revolução brasileira
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O correto entendimento das mediações é de fundamental importância para garantir a aplicação da formulação estratégica do Partido na perspectiva de realização dos objetivos da revolução socialista no Brasil. O entendimento dos diversos eixos táticos, em sua natureza interna, sua dinâmica e seu peso relativo no conjunto das ações do Partido, deve levar em conta a avaliação do quadro atual de desenvolvimento das forças produtivas e das possibilidades concretas de aprofundamento das relações capitalistas no Brasil.
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No campo das esquerdas, alguns grupos acreditam que ainda há espaço para um significativo crescimento econômico, para uma forte expansão do mercado interno e para o fortalecimento da democracia burguesa capaz de atingir a um padrão de desenvolvimento semelhante ao dos atuais países capitalistas desenvolvidos. Para estas correntes reformistas, importantes segmentos da burguesia brasileira teriam interesse real, também, no oferecimento de mais garantias sociais para a classe trabalhadora. No extremo oposto, alguns grupamentos esquerdistas apontam para o esgotamento desta possibilidade, baseando-se na constatação de que o capitalismo brasileiro teria atingido o seu “teto” e que, assim, não haveria espaço para um processo de acomodação da classe trabalhadora via reformas ou concessões no campo da capacidade de consumo e condições de vida e trabalho, chegando a acreditar que uma crise econômica do capitalismo levaria à imediata crise de suas instituições e à possibilidade de uma ruptura revolucionária.
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As principais implicações estratégicas e táticas desses dois entendimentos opostos são, por um lado, a proposta de alianças interclasses e pactos sociais, fundada na crença da existência de um pensamento “nacional” voltado para a construção de justiça social e democracia tendo por base um certo tipo de neodesenvolvimentismo social, liderado por parte de importantes segmentos burgueses e, por outro, a convocação da classe trabalhadora para o confronto aberto e imediato, sem mediações de nenhuma natureza, para a insurgência revolucionária e a derrota final do capitalismo e da democracia burguesa.
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O PCB, pensando a revolução brasileira, não compartilha de nenhuma dessas duas análises e vem buscando construir, nos últimos anos, um caminho político balizado na perspectiva estratégica da revolução socialista, rompendo, pois, com a alternativa nacional libertadora (ou democrático-burguesa), assim como evita cair nas armadilhas do esquerdismo. Daí a convocação de toda a militância para o aprofundamento da discussão sobre as mediações táticas necessárias à concretização do caminho revolucionário, pois, ao afirmarmos que a estratégia no Brasil é socialista, não pretendemos com isso dizer que a revolução está à vista.
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A formulação da “revolução burguesa” ou democrático-burguesa como uma necessidade histórica presente em todas as formações sociais tem origem em leituras mecânicas e atemporais dos clássicos do marxismo, em transposições igualmente mecânicas dos processos europeus e norte-americano dos séculos XVIII e XIX, estimulando as visões e proposições “etapistas” para o processo revolucionário. A partir do pós-guerra, esta formulação ganha o reforço de simplificações manualísticas do processo revolucionário, vindas do PCUS e voltadas, em especial, para os países do então denominado terceiro mundo, onde assumia também o caráter “nacional”.
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Um dos problemas desta generalização é que havia grande diversidade entre os países do chamado “terceiro mundo”, em que se incluía desde a Argentina, o México e o Brasil até o país menos desenvolvido. Na imensa maioria dos países da África, da Ásia e do Oriente Médio, foi correto os comunistas fazerem da luta anticolonial, portanto anti-imperialista, o aspecto mais importante do caminho revolucionário, com a decisiva solidariedade da União Soviética. Até porque, em muitos deles não existia “burguesia nacional” ou esta não tinha peso significativo. Em alguns destes países, este aspecto ainda continua atual. Mas no caso do Brasil, por exemplo, a contradição capital x trabalho já se evidenciava a partir dos anos 1950. Portanto, a questão nacional não poderia ter sido entendida pelos comunistas como apenas uma “etapa”, na qual a unidade com setores da burguesia, na maioria das vezes sem autonomia e identidade, acabava por tornar secundárias a luta de classes e a agitação do socialismo.
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No PCB e na esquerda brasileira em geral, a luta anti-imperialista era entendida como o aspecto mais importante da estratégia revolucionária em que, numa franca distorção da teoria marxista, a contradição fundamental, no caso brasileiro, deixava de ser capital x trabalho, para se fixar na fórmula imperialismo x nação, pela qual se estabelecia, como questão central, a oposição entre os interesses dos capitais estrangeiros aos interesses nacionais. Como consequência desta visão, era proposta a aliança da classe trabalhadora com a ”burguesia nacional” para o enfrentamento do inimigo imediato: o imperialismo, identificado na presença das empresas estrangeiras no país. O segundo entrave era relacionado ao latifúndio, símbolo maior do atraso (por representar a sobrevivência de “restos feudais” em nossa formação social). Criava-se, assim, a falsa expectativa de que a “burguesia nacional” viesse a comandar um processo de modernização do capitalismo, com a realização da reforma agrária, do fortalecimento da democracia e a garantia de mais direitos sociais para os trabalhadores, ou seja, as chamadas “tarefas inconclusas”, que caberiam à burguesia.
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Esta visão predominou no PCB nos anos 1950, tendo estado presente no Partido, ainda que com outras denominações e ênfases, até 1992, quando os reformistas e liquidacionistas criaram um novo partido. Esta análise influiu, assim, na política de alianças e nas ações dos comunistas do PCB no contexto da fase final da ditadura e nos anos que se seguiram. Mas trata-se de um debate que passou a envolver grande parte da esquerda brasileira, principalmente a partir dos últimos anos do regime implantado pelo golpe de 1964, quando se discutiu o caráter da “redemocratização” do Brasil e os rumos desejados para a transformação socialista. Hoje, depois da vitória eleitoral de um PT já desfigurado de seu conteúdo socialista dos primeiros anos, setores que ainda se afirmam como de esquerda voltam a apresentar formulações “desenvolvimentistas” ou “neodesenvolvimentistas”, para justificar a ampla aliança de classes voltada à sustentação de um governo “progressista”, inaugurado por Lula e, agora, continuado por Dilma.
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O caráter socialista da Revolução brasileira vem sendo afirmado pelo PCB desde o X Congresso, em 1992, e se consolida majoritariamente no XIV Congresso, em 2009. As principais razões apontadas para esta definição são as contradições intrínsecas ao modo capitalista de produção, associadas ao processo crescente de mundialização do capital: a tendência por gerar mais e mais concentração de capital, desvalorização contínua da força de trabalho, desemprego ou subemprego e depreciação das condições de vida da imensa maioria da população, havendo sempre o acirramento dessas contradições pela introdução maciça de novas tecnologias na produção. Estas condições eliminam, praticamente, em muitos países e no Brasil, em particular, a possibilidade de uma aliança interclasses envolvendo uma suposta burguesia nacional, dona de um projeto de desenvolvimento que, centrado nas empresas nacionais, pudesse, ao se contrapor aos interesses estrangeiros presentes no país, oferecer melhores condições de vida e trabalho à classe trabalhadora.
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O PCB reafirma que o capitalismo brasileiro é monopolista e completo (dotado de todos os segmentos da produção, com uma estrutura monopolista em todos os setores e dispondo de todas as instituições do capitalismo desenvolvido). O capitalismo brasileiro, ainda que possa vir a crescer bastante, não passará por “etapas naturais” em seu desenvolvimento e não chegará ao patamar idealizado e “prometido” de uma sociedade cujos problemas serão resolvidos através da ampliação do consumo de massas. Esta é a crença presente na política de Estado praticada hoje pelo PT, cuja lógica é a de que as desigualdades sociais serão resolvidas com o pleno desenvolvimento do capitalismo e o consequente crescimento da capacidade de consumo das massas no mercado formal, ao passo que, para os mais miseráveis, são reservadas políticas compensatórias e focalizadas.
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O PCB, pelo contrário, reafirma que as contradições sociais presentes na sociedade brasileira, ou seja, as condições precárias de vida da maioria da população e o padrão historicamente desigual do desenvolvimento brasileiro são, exatamente, os resultados do processo de aprofundamento das relações capitalistas em nosso país. Conforme afirmamos nas resoluções do XIV Congresso (Livro das Resoluções, página 44, § 46): “As contradições objetivas que estão na base das demandas imediatas das massas trabalhadoras não se devem ao baixo desenvolvimento de forças produtivas capitalistas, mas exatamente pelo próprio desenvolvimento e natureza de uma sociedade hegemonizada pelo capital”.
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Ao adotar a formulação da revolução de caráter socialista para o caso brasileiro, no entanto, o PCB não deixa de reconhecer a complexidade da nossa formação social. O PCB tampouco desconhece a presença de interesses capitalistas no Brasil que, dinamizando a economia, acabam por, de forma direta ou associada ao Estado, incidindo sobre a qualidade de vida e oferta de trabalho para parte da população, qualificando a força de trabalho, ampliando os mercados de consumo, em função do próprio crescimento da demanda. Tais investimentos, entretanto, requerem e induzem sempre à criação de condições cada vez mais favoráveis para a reprodução do capital, sobretudo pela via da “flexibilização” de entraves (gastos previdenciários, encargos sociais, garantias trabalhistas e outros), voltada para a maior extração de mais-valia, não estando excluída a possibilidade de a burguesia utilizar-se do aparelho de Estado para este fim, em especial dos bancos públicos.
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A burguesia pensa, se articula e atua organizadamente. Por isso, devemos buscar a compreensão acerca de todo o seu repertório de ações e iniciativas na perseguição de seu objetivo, que é a garantia da reprodução do capital. Assim, é fundamental indagarmos se, no Brasil, há espaço para uma aliança entre a burguesia, a pequena burguesia e setores do proletariado no sentido de promover um tipo de desenvolvimento socialmente mais justo?
O capitalismo tardio e / ou periférico: o caso brasileiro
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A partir das mudanças na estrutura da sociedade e do Estado brasileiro advindas da chamada Revolução de 1930, com a chegada ao poder político de grupos da então incipiente burguesia industrial, e impulsionadas pelo novo contexto do pós II Guerra, desenvolveram-se, nas décadas de 1950, 60 e 70, na ótica dos interesses burgueses, teorias sobre a possibilidade e o caráter do desenvolvimento capitalista no chamado terceiro mundo, ao qual o Brasil supostamente pertencia. Muitos pensadores e grupamentos políticos nacionalistas e de esquerda participaram ativamente deste debate.
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No período JK e nos anos seguintes, entre outras discussões presentes, destacaram-se as polêmicas em torno da participação ou partilha do poder de Estado entre as classes sociais nos arranjos desenvolvimentistas e a questão das relações (de parceria, complemento ou subordinação) entre o capital nacional e o capital estrangeiro. Unidos pela busca de um modelo de desenvolvimento autônomo para o Brasil, intelectuais de diversos matizes teóricos, reunidos em torno do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), realizaram discussões e debates dos quais resultaram proposições aproximadas à formulação da “revolução democrático-burguesa.”
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As posições variavam entre a defesa da liberdade total para a entrada do capital estrangeiro, defendida pelos liberais, à oposição total à entrada de investimentos externos (defendida pelo PCB e outros grupos à esquerda, numa postura de nacionalismo radical), passando pelos que defendiam esta possibilidade, desde que devidamente controlada. A aliança de classes entre a burguesia e os trabalhadores era defendida por diversas forças políticas e por inúmeros intelectuais, que visavam à maior participação do proletariado nas decisões políticas e nos frutos do desenvolvimento, com uma melhor distribuição da renda.
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O que acabou prevalecendo na política econômica então adotada pelo Estado brasileiro – e que se consolidou com a ditadura empresarial-militar instalada em 1964 – foi a abertura ao capital estrangeiro, eliminando, na prática, a possibilidade histórica do nacionaldesenvolvimentismo, e a exclusão dos trabalhadores do processo decisório e dos frutos do desenvolvimento econômico. A burguesia brasileira (ou, ao menos, o setor mais dinâmico da classe, formado pelos grandes grupos empresariais), a partir de então, abria mão de seu possível caráter nacional e associava-se, como parceiro subordinado, ao capital internacional.
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Para além do período de JK, nos anos 1950, foram colocadas em prática algumas das formulações desenvolvimentistas, a seguir, nos governos militares. Sob intensa repressão política, com o amordaçamento da vanguarda operária e dos movimentos sociais, os governos militares abriram de vez a economia aos capitais externos, criando as condições para a maior extração de mais-valia para as empresas. No período chamado de “milagre econômico” pela ditadura burguesa, foram criadas grandes empresas privadas nacionais, o Estado se fez fortemente presente na produção direta, com as grandes empresas estatais, a serviço do capital; o crescimento econômico teve caráter mais planejado. Cresceu a indústria de base e de bens de capital e o sistema financeiro – levando à ascensão política os respectivos segmentos burgueses –, fortaleceu-se a indústria de bens de consumo duráveis, expandiram-se a infraestrutura produtiva e a urbanização, formou-se um novo proletariado industrial e novas camadas médias assalariadas, forjando-se uma imagem de modernidade e construção nacional. No entanto, manteve-se, desde os anos 1950, o perfil de distribuição de renda caracterizado pela elevada concentração.
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No terreno social, houve ampliação da escola pública no ensino fundamental, do sistema de saúde pública e de uma assistência previdenciária abrangente (inclusive no campo, com o Funrural), fortemente marcada pela concepção contributiva e não universal. Mas, além de alguns poucos outros exemplos, praticamente não se alterou o quadro geral de desenvolvimento social no Brasil. A ditadura acabou com a estabilidade no emprego e implantou o arrocho salarial, indexando os reajustes salariais aos índices de inflação do ano anterior, em alguns casos manipulados.
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O final dos anos 1970 e a primeira metade dos anos 1980 marcaram a retomada da ofensiva dos movimentos sociais em luta pela redemocratização, por salários e melhores condições de vida. Houve uma tentativa de impulsionar um padrão de desenvolvimento econômico voltado para o aumento da produção interna e baseado na conquista da estabilidade da economia, materializada no Plano Cruzado. No entanto, a derrota deste plano, na segunda metade dos anos 1980, abriria o caminho para uma fase de estagnação econômica e a entrada do neoliberalismo no Brasil, que levaria, na década seguinte, ao desmonte da estrutura produtiva e do aparelho de Estado até então construída.
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A eleição do Congresso Constituinte, ocorrida em um período de grande mobilização popular, geraria a expectativa de avanços democráticos e de promoção de justiça social. O texto constitucional produzido refletiu, de fato, a relativa hegemonia dos grupos de centro-esquerda, em vários temas, com base nas pressões populares havidas, que convergiam na proposição de um Estado de Direito, com amplas liberdades democráticas, com a presença de diversas estruturas estatais e públicas para o provimento de direitos sociais. Manteve-se também a presença do Estado na condução da economia e na produção direta. Avançou-se, assim, no texto, para um arranjo inspirado nas experiências socialdemocratas, com a sinalização de que as tarefas inconclusas para o desenvolvimento do capitalismo seriam enfim concretizadas, com a única exceção da reforma agrária, cuja proposta não obteve a maioria dos votos, ainda que fosse amplamente apoiada no conjunto da sociedade.
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No entanto, a correlação de forças expressa naquele momento revelava não apenas o auge das mobilizações sociais abertas no final da década de 1970, mas também o início de seu refluxo, ao mesmo tempo em que acabava por demonstrar que o poder burguês não estava tão na defensiva, como alguns imaginavam. O resultado foi um texto constitucional que revelava intenções reformadoras de caráter social, mas, no essencial, mantinham os interesses burgueses, fazendo com que a possibilidade da socialdemocracia e do sistema de bem-estar social se esgotasse antes mesmo de ser implementada.
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Nos anos de 1990 – em função da queda da URSS e de diversos outros fatores -, acelerou-se a mundialização do capitalismo, o que veio a fortalecer a plena hegemonia do pensamento chamado neoliberal, levando à eleição de governos de direita e à desarticulação e cooptação da organização dos trabalhadores e do movimento de massas em geral, além das crises e divisões no movimento comunista internacional. Passou, então, a predominar a visão de que o desenvolvimento é uma possibilidade que depende do “ambiente”, da ausência do Estado na economia e da liberação de todos os “entraves” ao livre movimento do capital, da competitividade das empresas, da plena liberdade de comércio internacional. Estabelece-se o império do mercado. No Brasil, a busca da “estabilidade” econômica a qualquer preço, a partir da introdução do Real, com a maior autonomia do Banco Central, a abertura da economia ao comércio exterior, as privatizações de empresas estatais, o desmonte dos sistemas públicos de seguridade social e a retirada de direitos dos trabalhadores foram os grandes eixos de ação econômica e política deste período.
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Desde então, o tripé de sustentação da política econômica do Estado burguês no Brasil baseia-se no câmbio flutuante, nos superávits primários e nos juros elevados, para garantir o pretenso controle da inflação. Esta política foi responsável pela maior concentração da renda, pelo desaparecimento de inúmeras pequenas e médias empresas e pelo consequente avanço do poder dos oligopólios, que passaram a dominar cadeias inteiras do processo produtivo. Outro aspecto importante do período foi a incorporação de investidores individuais ao mercado financeiro, por meio de uma agressiva campanha de estímulo à compra de ações, a qual, apoiada pela mídia burguesa, levou setores de camadas médias e trabalhadores com maior poder aquisitivo a buscarem ganhos nas bolsas de valores. Isso representou de fato um forte elemento de convencimento ideológico às práticas neoliberais.
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Nos anos 2000, os dois governos Lula mantiveram os eixos básicos da política neoliberal, realizando também pequenas ações compensatórias, como os programas de auxílios à população de baixa renda, como o “bolsa-família”. No entanto, retomou-se, em caráter bastante rebaixado, principalmente a partir do segundo mandato, a discussão sobre a necessidade de um processo ordenado de desenvolvimento, de um possível “neodesenvolvimentismo” no Brasil. Algumas poucas ações foram tomadas, nesse sentido, como no caso do Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC, que se centra no provimento de infraestrutura para a acumulação de capital.
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Hoje, o capitalismo está plenamente mundializado, em todas as esferas, com a predominância das grandes empresas e dos grandes grupos conglomerados internacionais. A mundialização já se estende, para além do comércio e das finanças, às cadeias produtivas. O capitalismo brasileiro é completo em sua estrutura e integrado ao imperialismo. Está em fase de consolidação no plano interno e de plena integração internacional, com a criação de grandes empresas multinacionais de matriz brasileira, a compra de ativos no exterior, a consolidação dos grupos financeiros e a adequação dos aparelhos de Estado e das leis a este fim.
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A conjuntura brasileira atual é marcada pelapresença e forte tendência de permanência de uma hegemonia conservadora, com uma base material definida, gerada, na economia, pela entrada de capitais e pela realização de mais investimentos e pela expansão das camadas médias de baixa renda; na esfera política, reforçam esta hegemonia a identificação de um padrão de melhoria das condições de vida como possível para as camadas médias e de renda mais baixa, a permanência, ainda que mitigada em relação aos anos FHC, das ideias do Estado mínimo (apenas um indutor do desenvolvimento), da supremacia do mercado e da privatização como soluções “naturais”.
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O relativo recuo dos movimentos sociais e a continuidade do processo de cooptação de seus militantes e lideranças, pelo bloco do poder, comprovam esta hegemonia. Mas há, também, no interior dos movimentos sociais, atitudes que indicam uma retomada da resistência e contraposição à ordem, assim como há fissuras e desgastes no bloco do poder, inclusive no campo da pequena burguesia política, oriunda da esquerda.
O processo de monopolização e de internacionalização do capitalismo brasileiro
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A sociedade brasileira viveu um período de crescimento econômico virtuoso nas décadas de 1950, 60 e 70, cujos resultados provocaram grandes transformações na sociedade brasileira. A intensidade, o ritmo e a grandeza do desenvolvimento registrado nesse período podem mesmo ser considerados os mais expressivos da história econômica brasileira. O país desenvolveu-se a taxas de crescimento anuais médias acima de 7%, com um aumento também acentuado do produto per capita. Nesses 30 anos, o Brasil saiu da condição de uma nação onde a agricultura era responsável pela maior parte do emprego e da renda, para outra onde a indústria de transformação passou a comandar a dinâmica da economia, inclusive na área da exportação.
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Nessas três décadas construiu-se uma industrialização integrada e dinâmica, realizada a um ritmo superior ao da maioria dos países capitalistas, o que transformou quantitativamente a economia brasileira na oitava economia do mundo e no país de maior produção industrial do antigo Terceiro Mundo. Formaram-se, nesse período, grandes conglomerados industriais nas áreas de metalurgia, eletro-eletrônica, siderúrgica, química, plásticos, entre outros.
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Construiu-se, paralelamente, um setor de serviço moderno e dinâmico, cuja expressão mais significativa são os grandes grupos bancários e comerciais. Mesmo sem cumprir sua função clássica de alavancagem do setor industrial, os bancos contam hoje com redes nacionais de agências (alguns, internacionais) e um nível de informatização semelhante aos países centrais. Na área estritamente comercial, formou-se um conjunto de oligopólios que são responsáveis pela maior parte do abastecimento dos produtos do setor moderno da economia. Desenvolveu-se ainda uma poderosa estrutura de telecomunicações e comunicação social, que alterou profundamente os hábitos e a cultura de várias regiões, e cujas expressões mais significativas são as redes nacionais de rádio e TV.
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As relações capitalistas modernas avançaram em expressivas áreas do campo, destruindo velhas relações sociais de produção e modernizando as grandes propriedades, que se especializaram na produção de commodities principalmente para o mercado externo. Mesmo nas médias propriedades e até nas pequenas (que funcionam em sistemas de concessão ou cooperativas) ocorreu um intenso processo de modernização, mediante o uso de insumos industriais que garantiram elevados ganhos de produtividade. Essa modernização promoveu a expulsão de milhares de camponeses de suas terras e a destruição de grande parte da pequena propriedade isolada, fazendo com que, hoje, a agricultura brasileira esteja incorporada ao processo de desenvolvimento capitalista. A relação capital x trabalho é hoje predominante no campo brasileiro.
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As modificações precedentemente elencadas alteraram profundamente a fisionomia do país. Verificou-se uma crescente urbanização: em 1980 mais de 70% da população já viviam em áreas urbanas, das quais mais de 40% em cidades com mais de 250 mil habitantes. Aumentou ainda extraordinariamente o número de trabalhadores industriais e de serviços em função do ritmo do crescimento econômico. O crescimento econômico verificado no período resultou em elevada concentração de renda e na ampliação das desigualdades sociais e dos níveis de pobreza urbana e rural.
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A performance da economia brasileira mudou radicalmente com a crise da década de 1980. Esta crise teve seu epicentro nas políticas tipicamente imperialistas desenvolvidas pelos países centrais, especialmente os Estados Unidos, e trouxe em seu bojo a imposição de ajustes econômicos predatórios que desorganizaram a estrutura econômica brasileira, resultando na mais grave e continuada crise da história contemporânea. Esta fase, caracterizada pela implantação de políticas ortodoxas, significou um profundo retrocesso para a economia brasileira e a ampliação das dificuldades para os trabalhadores, expresso numa violenta recessão entre os anos de 1981 e 1983, queda no crescimento econômico, aumento do desemprego, redução da renda e das condições de vida da população.
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A economia brasileira acompanhou o movimento de “financeirização” do capitalismo e, por conta das “crises do petróleo” da década anterior e por razões internas, enredou-se com o pagamento de juros da dívida pública – externa e interna – e estagnou-se economicamente. No campo burguês, o grande beneficiado foi o setor financeiro, que acumulou um volume de lucros extremamente elevado, dado o quadro de altas taxas de inflação.
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Essa política reduziu o nível da atividade econômica, aumentou o desemprego, sucateou vários ramos industriais, resultando numa deterioração da qualidade de vida da população, especialmente entre seus setores mais pobres. A economia brasileira, pelo seu porte, e os trabalhadores, pela extensão do arrocho, foram os mais prejudicados nesse processo. O país regrediu no processo de inserção internacional, tornou obsoletos vários ramos da economia, reduziu o poder de compra dos salários e, consequentemente, o seu já relativamente reduzido mercado interno, e ampliou a barbárie social.
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No entanto, as políticas neoliberais propriamente ditas não puderam ser implementadas nos anos ‘80 em função de algumas características especiais da conjuntura brasileira: a retomada das mobilizações políticas contra a ditadura, que encontrava-se nos seus estertores, e em torno das discussões sobre a Assembleia Nacional Constituinte funcionaram como um anteparo à imposição das políticas neoliberais orientadas pelos governos Reagan e Thatcher, pois não existia clima política para medidas dessa ordem.
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Os ajustes neoliberais propriamente ditos só começaram a ser realizados na década de 1990, fase que marca uma mudança de qualidade no processo de acumulação de capital no Brasil e uma nova forma de relacionamento entre o grande capital internacional, a grande burguesia associada e o Estado. Consolida-se, no plano internacional, o poder dos blocos de forças sociais mais ligados ao capital financeiro. Esses setores, hegemônicos na economia mundial, foram os principais impulsionadores da globalização financeira e da especulação mundial.
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A privatização de empresas públicas, o desmonte das estruturas estatais de seguridade social e a retirada de direitos e garantias trabalhistas, entre outros elementos, somados à internacionalização da economia, favoreceram sobremaneira as grandes empresas financeiras e industriais e os setores exportadores, com destaque para os segmentos extrativista e agroexportador, e fortaleceu-se o processo de internacionalização da economia brasileira. Nesse período, aumentou a entrada de capital estrangeiro, seja na forma direta – com a instalação de empresas –, seja na forma de investimento financeiro em ações nas bolsas de valores e na compra de títulos públicos e privados. Com empregos mais precarizados, reduziram-se, mais uma vez, os ganhos da classe trabalhadora.
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Nos anos 2000 (dois anos de FHC e oito de Lula), novos ajustes foram feitos, e um novo padrão de acumulação consolidou-se, nos marcos do neoliberalismo, com a manutenção do grande peso, na composição do PIB, dos setores financeiro, de extração mineral e agroexportador. Outro elemento importante foi a expansão, para o exterior, da ação das grandes empresas brasileiras, juntamente com a internacionalização de seu capital.
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Mesmo mantendo os privilégios do capital financeiro nacional e internacional, o primeiro governo Lula incorporou ao bloco de poder setores burgueses que antes estavam sem condições de influir na política econômica do país, como o capital industrial e o agronegócio. Se antes esses grupos tinham as empresas públicas como âncora e ferramenta para o processo de acumulação de capital, com a privatização das estatais, foram obrigados a buscar novas opções de sobrevivência, num ambiente de acirrada concorrência, com competidores ávidos para incorporá-los aos seus portfólios societários.
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No segundo mandato de Lula, o setor produtivo da economia passou a exercer maior influência na gestão da política industrial do país. A maior expressão política dessa nova fase é a ação agressiva do BNDES, voltada a fortalecer os grandes grupos privados brasileiros, com sucessivos aportes de capital tanto para operar um ambicioso processo de fusões e aquisições, de forma a criar “as campeãs nacionais”, quanto para estruturar a internacionalização dos grupos mais fortes (as chamadas multinacionais verde-amarelas), com vistas a torná-los competitivos no mercado mundial. A política de Estado adotada visava não só estabelecer uma parceria entre as várias frações das classes dominantes, com um aumento expressivo da participação dos grandes grupos do setor produtivo industrial e do agronegócio nas decisões econômicas do governo, muito embora o setor financeiro continuasse obtendo lucros extraordinários e com largas parcelas de poder na formulação das políticas econômicas, especialmente no Banco Central.
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Do ponto de vista internacional, o governo também acentuou sua política de autonomia relativa em relação à economia norte-americana, buscando uma atuação que, ao mesmo tempo em que não contrariava os interesses estratégicos dos EUA, tentava estabelecer áreas de influências, especialmente em zonas da periferia, como a América Latina e a África, visando conquistar mercados para os grandes grupos brasileiros nestas regiões.
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O governo Lula, conscientemente, buscou estabelecer um novo posicionamento do Brasil no cenário internacional, apostando, para tanto, numa diplomacia mais ativa (inclusive no que se refere à prospecção de mercados) e no fortalecimento de um conjunto de grandes grupos econômicos para atuar nas novas áreas de influência. Para realizar esses objetivos, o governo Lula desenvolveu uma estratégia forte no sentido de capacitar instituições, empresas e bancos do Estado para tornar realidade o novo papel do Brasil no cenário internacional. Esta estratégia pode ser expressa nas seguintes ações:
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Um ativo papel do Estado, através dos bancos públicos (especialmente o BNDES), dos fundos de pensões paraestatais e das empresas públicas, com especial ênfase para a Petros (Petrobras) e o Previ (Banco do Brasil), no sentido de coordenar, financiar, articular e reunir condições para a formação de grandes conglomerados nacionais, com o objetivo de influir num novo patamar de inserção do Brasil nas relações econômicas internacionais;
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A reorganização societária dos grandes grupos, mediante concentração e centralização de capitais, expressos em um acelerado processo de fusões e aquisições, criando as chamadas empresas “campeãs nacionais”, com capacidade de acumular sinergias e economias de escala, de forma a que esses grandes grupos unificados pudessem enfrentar em melhores condições a concorrência das empresas maduras do capital internacional.
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Estímulo à internacionalização dos grandes grupos unificados do país, tanto do setor público quanto privado, visando a ocupar espaços em aberto em áreas da periferia nas quais o Brasil exerce influência econômica e política;
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Esses vetores estratégicos foram coadjuvados por uma política externa com certo grau de autonomia relativa que buscou, de um lado, realizar um conjunto de iniciativas com certo grau de autonomia (apoio a Chávez na Venezuela, busca de acordo sobre a crise Irã-EUA, criação da Unasul, do G-20, entre outros), mas que não entraram em choque aberto com os interesses dos países centrais, especialmente os Estados Unidos.
Os números da monopolização e internacionalização da economia brasileira
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O faturamento bruto dos 100 maiores grupos econômicos que atuam no Brasil correspondeu, em 2009, a cerca de 60% do Produto Interno Bruto (PIB). Levando-se em conta o universo de seis milhões de empresas formais no Brasil, pode-se dizer que a economia brasileira é altamente concentrada. Analisando apenas os 20 maiores grupos, a monopolização da economia brasileira fica mais evidente: apenas duas dúzias destes grandes conglomerados econômicos obtiveram, em 2009, um faturamento que correspondeu a cerca de 37% do PIB brasileiro do período, o que torna ainda mais impressionante o grau de monopolização da economia brasileira.
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Se estendermos a mesma investigação para os 10 maiores grupos, chegaremos a uma constatação ainda mais surpreendente: esses conglomerados registraram um faturamento em 2009 de 26% do PIB, mais de um quarto de todo o resultado da atividade econômica do Brasil em 2009. Avaliando um universo ainda mais reduzido, a constatação é chocante: os cinco maiores grupos econômicos que atuam no Brasil registraram um faturamento de 19% do PIB. Ou seja, a Petrobrás, Itaúsa, Bradesco, Banco do Brasil e JBS Friboi registraram um faturamento anual em 2009 que corresponde a cerca de um quinto do PIB brasileiro no mesmo período.
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Trata-se, portanto, de um capitalismo completo, desenvolvido, integrado e com elevado grau de monopolização em praticamente todos os setores da economia. Um sistema com capacidade de suprir de bens e serviços todas as necessidades do mercado, com uma infraestrutura e uma logística à altura da acumulação do capital. Além disso, o capitalismo brasileiro possui uma agricultura desenvolvida, com elevado grau de produção utilizando intensa tecnologia e grande parte dela voltada para a exportação de commodities. O trabalho assalariado é hegemônico no campo e a pequena propriedade familiar e as economias de subsistência estão integradas no circuito do grande capital monopolista no campo.
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O capitalismo monopolista brasileiro vem também avançando crescentemente no exterior. Levantamento realizado por publicações especializadas indicam que pelo menos 50 grandes empresas brasileiras podem ser consideradas como multinacionais, ou seja, têm parcelas expressivas de seus negócios no exterior. Esse movimento do capitalismo brasileiro foi realizado de maneira bastante acelerado. Até 1982 os investimentos brasileiros no exterior eram de pequeno porte: o estoque de capitais no exterior correspondia a apenas U$ 900 milhões. Atualmente esse estoque é de U$ 170,4 bilhões (Tabela).
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As 10 maiores empresas multinacionais brasileiras apresentam um conjunto de características típicas de um capitalismo monopolista desenvolvido. Parcelas expressivas de seus ativos e receitas são oriundas do exterior, bem como parte substantivas dos seus empregados trabalham no exterior. Três dessas empresas, a Odebrecht, JBS Friboi e Coteminas, têm respectivamente 70,9%, 85% e 90,3% de suas receitas obtidas no estrangeiro. (Tabela).
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Outro dado relevante para compreendermos a atuação do capitalismo brasileiro no exterior é o fato de as multinacionais brasileiras estarem presentes em praticamente todos os continentes. Vejamos a performance dos cinco maiores grupos: a Vale está presente em 33 países; a Petrobrás em 25; a WEG em 22; a Camargo Corrêa em 17 e a Ordebrecht em 16, ressaltando-se que a presença majoritária desses grupos se dá na América Latina, com um índice de regionalização de 46,2, seguido da Europa com 20,6% e da América do Norte com 17,3% (Tabela).
Para onde vai o capitalismo brasileiro?
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Assim, a evolução do quadro recente da economia brasileira confirma a consolidação de um novo modo de acumulação do capitalismo brasileiro, centrado na internacionalização da economia, no crescimento dos segmentos agro e mineroexportadores, do setor financeiro e das grandes indústrias, de capital internacionalizado. Este padrão é sustentado pela elevada taxa de exploração da força de trabalho hoje vigente – refletida nos baixos salários e na precarização das relações de trabalho – e na dependência da entrada de capitais externos para o seu equilíbrio.
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A manutenção, por quase uma década, de taxas moderadas de expansão do mercado interno demonstra existência de um componente de autossustentação do processo de crescimento econômico, capaz de expandir o mercado interno e promover uma pequena elevação da parcela de renda destinada para as camadas de renda média baixa. No entanto, há que se reafirmar que esta tímida melhoria na distribuição da renda não tem sido acompanhada de qualquer alteração significativa no que diz respeito ao acesso aos direitos sociais básicos ou a melhores condições de habitação, transporte público e a outros componentes do bem-estar social.
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O quadro atual da economia demonstra que a classe dominante brasileira tem sabido tirar proveito da crise mundial do capitalismo contemporâneo, cujos efeitos mais explosivos incidiram diretamente, até agora, sobre setores da economia estadunidense e de países europeus menos desenvolvidos, como Portugal, Espanha, Grécia, Itália e Irlanda. O Brasil tem aproveitado os espaços deixados em aberto pelas economias em crise, principalmente no que concerne à expansão dos capitais de empresas monopolistas brasileiras plenamente integradas ao capitalismo internacional em áreas periféricas, como a própria América Latina e a África.
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A crescente integração com a economia internacional também abre espaço para a produção interna e para ganhos financeiros importantes. O campo de crescimento do capitalismo brasileiro pode ser confirmado na existência de segmentos sociais não atendidos pela oferta de bens de consumo duráveis e não duráveis, de áreas geográficas inexploradas pelo capital, além de um grande “estoque” de possibilidades de investimento que correspondem às limitações e incompletudes no desenvolvimento do país. Nas áreas sociais, exemplos são a insuficiência de emprego qualificado, a precariedade da moradia e das condições de vida na cidade, os serviços urbanos, a saúde, a cultura, a pequena dimensão e o caráter excludente dos sistemas sociais públicos, como os de seguridade social – saúde, previdência, assistência social –, o caráter limitado do sistema educacional e muitos outros.
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Assim, podemos apontar que há, efetivamente, um componente interno de crescimento autossustentado, suportado pelo crescimento populacional, pela atividade de exploração e produção de petróleo e pela expansão das cadeias produtivas internas dos setores exportadores, entre outros segmentos, que demandam máquinas e equipamentos, pela resposta dada pelo sistema produtivo às demandas de bens de consumo duráveis e não duráveis (que, por sua vez, gera empregos e renda), pelo surgimento de novas regiões a serem exploradas – como os antigos territórios (Acre, Amapá, Rondônia e Rodônia), áreas do Nordeste e do Centroeste. Os efeitos da aposentadoria dos trabalhadores rurais, dos programas sociais como o Bolsa-família e dos aumentos reais do salário mínimo oferecidos nos últimos anos vêm produzindo certa expansão da renda nas camadas menos favorecidas, gerando novos contingentes de consumo de primeira necessidade.
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Conjunturalmente, a economia brasileira tem recebido aportes de capital externo, seja na forma financeira ou de investimento produtivo direto, e, para enfrentar a crise internacional, o governo vem recorrendo a políticas de crédito e renúncias fiscais, que estimulam o consumo. No entanto, a maior parte das ações do Estado vem se dando na adaptação às demandas do mercado, tendo havido poucas iniciativas de planejamento econômico. O mesmo se pode dizer das políticas sociais, que vêm se restringindo àquelas de caráter emergencial ou “compensatório”, focalizado e fragmentário.
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Para dar suporte a esta expansão e à reprodução do capital, em geral, o capitalismo brasileiro necessita, em certa medida, de mais trabalhadores qualificados, mais técnicos de nível médio e profissionais de nível superior em muitas áreas. Necessita de infraestrutura – estradas, portos, geração e distribuição de energia, de energia, comunicações e dispõe de grupos econômicos interessados nestas obras e também em áreas como saneamento, habitação, infraestrutura urbana. Como elemento ordenador, o sistema precisa de uma estrutura política estável e de bases fortes de sustentação financeira. Mas em que medida estas necessidades serão atendidas e em que medida este atendimento corresponderá à realização, pela burguesia, hoje no poder, das tarefas voltadas à modernização e ao aprofundamento das relações capitalistas no Brasil?
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No que diz respeito à formação de trabalhadores, é possível que prevaleça a tendência de universalização do ensino fundamental e que aconteça uma expansão significativa dos sistemas de ensino médio e superior, pois já é notória a falta de trabalhadores qualificados no país. O ensino público deverá receber mais investimentos e deverá crescer mais. No entanto, é pouco provável que esta expansão seja acompanhada de uma valorização dos profissionais da Educação ou na elevação da qualidade geral do sistema, com a manutenção da clara assimetria, hoje existente, entre as escolas da “elite” (públicas e privadas) e as instituições voltadas para a maioria da população.
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Como o campo brasileiro está plenamente integrado ao capitalismo, com o amplo predomínio do trabalho assalariado, ainda que permaneçam resistentes setores do campesinato reatualizados na forma de uma nova produção camponesa contemporânea, isto é, integrada e associada ao mercado e à produção industrial, não parece provável que qualquer processo significativo de reforma agrária seja empreendido, por iniciativa da burguesia.
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Deverá seguir expandindo o atual padrão de consumo, com a extensão das camadas médias e a entrada de novos contingentes de consumidores no mercado. Não haverá, no entanto, nenhuma alteração significativa do perfil da distribuição da renda, no que depender das iniciativas da burguesia. Neste cenário uma redução na pobreza absoluta pode significar, inclusive, um aumento na pobreza relativa, ou seja, a diferença entre a parte da riqueza nacional destinada ao fundo de consumo da força de trabalho e aquela acumulada privadamente como capital, como, aliás, já aconteceu nos anos 50 e no ciclo ditatorial.
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Nos setores de infraestutura em geral e, em particular, nos segmentos ligados à construção civil, é provável que o interesse das grandes empresas construtoras se traduza em investimentos em saneamento, provimento de água encanada e mesmo em programas habitacionais mais abrangentes; nos transportes, pouco ou nada deverá se alterar quanto ao predomínio do modo rodoviário.
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No plano democrático, ainda que possam surgir avanços como nos direitos civis, na estrutura da Justiça ou na transparência da gestão do Estado, o interesse burguês se concentra na restrição à organização e à ação partidária, principalmente da esquerda, apontando para a “americanização” do processo eleitoral e da vida política. No plano dos direitos trabalhistas e previdenciários, nada aponta, a manter-se o padrão atual de desenvolvimento, para uma retomada dos direitos retirados ou apara a oferta de novas garantias aos trabalhadores.
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Nas demais áreas sociais, como na saúde e cultura, tende a prevalecer o modelo privado, reservando-se as redes públicas para o atendimento dos mais carentes em sistemas precários, além de se intensificarem as práticas privatistas, diretas e indiretas, através da ação das organizações sociais e fundações públicas de direito privado como forma de atendimento. No plano das políticas urbanas, é pouco provável que haja mudanças nos padrões atuais, com exceção das áreas de segurança, no que diz respeito ao controle dos territórios.
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A exceção, nas áreas sociais, deverá ser a educação, cuja expansão é necessária para a sustentação do processo de crescimento e modernização capitalista. No entanto, não se pode esperar que este crescimento aponte para a estatização e a universalização do acesso a todos os níveis, tampouco para o provimento de alta qualidade a todo o sistema. A saúde, a previdência, a cultura e outras áreas não deverão tornar-se públicas / estatais ou receber maior atenção ou prioridade por parte da burguesia, devendo manter-se, assim seu caráter excludente.
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É importante frisar que o crescimento econômico, mesmo limitado, pode trazer algumas melhorias na qualidade de vida da população, pelo acesso à renda e ao consumo, além de promover o apoio ao governo e a reprodução da hegemonia capitalista. No entanto, no que diz respeito às possíveis iniciativas da burguesia para o provimento de melhores condições de vida para os trabalhadores, é muito provável que estas se restrinjam a alguns programas de habitação, á expansão das redes de água e de saneamento, e a grandes obras viárias.
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Há que se ressaltar, também, que a maior parte das conquistas e melhorias obtidas pela classe trabalhadora, em todos os contextos, no capitalismo, se deu pela luta, pela ação organizada dos sindicatos, dos grandes movimentos de massa. Na atual conjuntura, entretanto, há pouco espaço para o crescimento das demandas sociais organizadas, para a retomada dos direitos dos trabalhadores e para o avanço da democracia no sentido da participação direta de todos no processo decisório. Pelo contrário, estamos numa fase de mais ataques aos direitos trabalhistas, previdenciários e sociais em geral, à democracia participativa e ao direito de organização. O Brasil não é uma ilha imune à crise sistêmica do capitalismo. Assim, entendemos que devemos promover e organizar as lutas do proletariado e dos trabalhadores em geral, apontando para a inequívoca necessidade de superar os limites do capitalismo e ultrapassá-lo, construindo, revolucionariamente, o Socialismo.
III – Hegemonia e contra-hegemonia
A Hegemonia Burguesa
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As transformações ocorridas no capitalismo contemporâneo exigem de nós uma análise acurada sobre o fenômeno, com o propósito de, em primeiro lugar, compreender os mecanismos de reprodução e expansão do capitalismo no mundo e, em particular, no Brasil, associados à construção e manutenção da hegemonia burguesa; em segundo lugar, projetar a ação revolucionária do PCB, para o que será necessária a organização da contra-hegemonia proletária.
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Sob a égide do capital financeiro, intensifica-se a ocupação capitalista do planeta, introduzindo novas formas de exploração do proletariado e de dominação de classe. Ao contrário do que pensam certos analistas de esquerda, a financeirização do capital não representa o seu descolamento da cadeia produtiva e a dedicação apenas a atividades especulativas, como se fosse possível reproduzir mais dinheiro do próprio dinheiro. O capital, como já havia explicado Marx, é uma relação de exploração. De fato, a expansão do capital monetário contemporâneo corresponde a um processo agudo de expropriação dos trabalhadores em todo o mundo.
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A expropriação fundamental corresponde à contínua produção social de trabalhadores disponíveis para o capital. Cada vez mais, os imperativos do mercado forçam a que os trabalhadores não encontrem alternativa para se manterem vivos a não ser vendendo a sua força de trabalho. Portanto, a ação do capital será sempre no sentido de formar novos e amplos contingentes de trabalhadores “livres”, ou seja, liberados da capacidade de sobreviverem fora da venda da força de trabalho ou recorrendo a ela apenas de forma eventual.
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A expropriação original – a que Marx se referiu como “a chamada acumulação primitiva”, quando analisou o processo de formação do capitalismo agrário na Inglaterra – permanece incidindo sobre enormes massas camponesas em todo mundo. Essa expropriação prossegue ativa e pressiona enormes massas camponesas na América Latina, África, Índia e China, que se sustentam reproduzindo formas de trabalho as mais variadas, dedicadas à produção agrícola de subsistência. Certo é que prevalece, no capitalismo contemporâneo, a tendência à destruição de tais formas de economia familiar ou doméstica pela grande propriedade voltada ao agronegócio. Mas o campesinato e os trabalhadores rurais constituem, ainda hoje, grande parcela da população mundial a ser “liberada” para o trabalho assalariado.
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Mas o fenômeno mais característico do capitalismo contemporâneo é a incidência de novas formas de expropriação no interior das populações cuja expropriação original já foi concluída, isto é, nos países e regiões onde o capitalismo já se desenvolveu plenamente, como é o caso dos países centrais e mesmo de nações em que as relações capitalistas consolidaram-se tardiamente, a exemplo do Brasil. Nestes espaços, amplas massas de trabalhadores são compulsoriamente reduzidas à condição de plena disponibilidade – “liberdade” – para o mercado de força de trabalho, como consequência da destruição sistemática de todos os anteparos que puderam (ou possam) atuar como redutores dessa disponibilidade.
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Como resultado da generalização das práticas neoliberais implementadas, com maior virulência, a partir dos anos 1990, várias formas de intensificar a extração do valor passaram a ser utilizadas pelo capital. Uma das formas que mais incidiram e incidem diretamente sobre a capacidade de organização e de resistência do proletariado à exploração é a que promove a fragmentação do espaço produtivo e a separação dos trabalhadores em inúmeras unidades fabris. Trata-se da expropriação da resistência operária por proximidade no local de trabalho, decorrente da introdução de novas tecnologias produtivas (telemática, informática, robótica, entre outras) e de outros mecanismos que permitem aprofundar a cooperação entre os trabalhadores dispensando sua reunião física.
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Outras formas de expropriação estão ligadas à retirada dos anteparos legais que, como resultado histórico da luta de classes, funcionam como garantia social para impedir a ilimitada exploração da força de trabalho. A expropriação e a precarização contratuais consistem na eliminação, em escala internacional, dos direitos ligados ao contrato de trabalho. Com ela são introduzidos diferentes formatos jurídicos criados para disciplinar a relação de trabalho em favor de sua plena utilização pelo capital: subcontratações, terceirizações, formação de “cooperativas”, trabalho “informal” ou até mesmo sobre a pura e simples ausência de contrato formal. Há também o chamado trabalho “voluntário”, cuja remuneração decorre de formas precárias, também sem direitos, como “bolsas” ou “projetos” ou, ainda, o trabalhador “pessoa jurídica”, que, mobilizado pela falácia do “empreendedorismo”, se converte individualmente numa empresa fictícia para vender sua força de trabalho, sem os direitos associados legalmente à contratação tradicional.
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Tais exemplos de “reestruturação produtiva” e de “desregulamentação do mercado de trabalho”, com vistas à plena “empregabilidade” ou “trabalhabilidade” (para usar termos recorrentes no jargão burguês pós-moderno) do sujeito obrigado a vender sua força de trabalho para sobreviver, nada mais são do que formas atualizadas de dominação, com o duplo sentido de disponibilizar grandes contingentes de pessoas para o trabalho assalariado e de fazer valer a hegemonia do capital, por meio de um processo alienante de difusão da ideologia burguesa. Isto porque tais mecanismos de expropriação do trabalho vêm acompanhados de intensa campanha ideológica voltada a convencer a todos de que se trata da conquista da liberdade individual perante a opressão do trabalho (não do proprietário dos meios de produção). Propala-se a conquista da iniciativa individual e da possibilidade de que cada um possa ser “patrão de si mesmo”.
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O novo consenso burguês traveste a feroz concorrência entre os trabalhadores de uma subjetividade “pós-moderna”: deve-se desvencilhar das identidades coletivas, entendidas como “opressivas” e “ultrapassadas”, tais como “classe operária”, sindicato, partido político, buscando alcançar a mais pura “mobilidade” e “liberdade”. A ideologia dominante investe na ótica meramente individualista, ao depreciar a luta pelos direitos coletivos, associada às “burocracias” sindicais, à legislação e ao conjunto de normas controladas pelo Estado, direitos duramente conquistados que passam a ser vistos como obstáculos à plena afirmação do indivíduo.
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A hegemonia do capital se constrói a partir mesmo das relações de produção e busca envolver a totalidade social. Ao mercantilizar tudo e todos à sua volta, o capital expande seus domínios para o conjunto das relações sociais: as expropriações avançam sobre diversas formas de solidariedade comunitária e cultural, sobre conquistas sociais tais como a saúde e a educação públicas (direitos sociais que se transformam, cada vez mais, em produtos e serviços disponíveis no mercado, como quaisquer mercadorias), sobre os movimentos sociais, que sofrem renovados processos de criminalização, sobre os direitos políticos, com a redução das conquistas democráticas ao mero jogo eleitoral.
A hegemonia burguesa no Brasil
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Como afirmamos nas Resoluções do XIV Congresso (outubro de 2009), “sob todos os aspectos, o ciclo burguês consolidou-se plenamente no Brasil. A economia capitalista desenvolveu-se até o estágio monopolista, tendo se constituído uma sociedade civil-burguesa e um Estado de Direito” (Livro das Resoluções, página 44, § 45). O período da ditadura empresarial-militar imposta pelo golpe de 1964 marcou a consolidação do bloco dominante, formado pela aliança de classes entre a burguesia monopolista, o latifúndio tradicional e o imperialismo, bloco este responsável pelo aprofundamento do processo de construção do Estado burguês no Brasil.
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O auge deste processo ocorreu com a abertura política nos anos 1980 e com a incorporação das amplas massas urbanas ao ordenamento jurídico-político burguês, de que são expressões significativas a afirmação de um conjunto de regras democráticas e, em especial, a ampliação do direito ao voto, sacramentadas na Constituição de 1988. Formou-se, portanto, uma sociedade civil-burguesa com um conjunto de normas e instituições próprias de um regime formalmente democrático. A consolidação da hegemonia liberal burguesa completou-se com o estabelecimento de um poderoso monopólio capitalista nos meios de comunicação de massa e na organização e difusão da cultura, aprimorando e fortalecendo a dominação ideológica a serviço do capital.
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Este processo não se deu sem conflitos. Nos estertores da ditadura empresarial-militar, travou-se uma luta entre os grupos burgueses dominantes e o bloco de forças políticas e sociais formado pelos trabalhadores e setores das camadas médias, capitaneados à época pelo PT e outros setores de esquerda, à frente das entidades de massas e dos movimentos reivindicatórios que se destacaram na resistência ao regime ditatorial e nas lutas democráticas do período anterior. Mas o resultado final deste embate, em meio a um contexto internacional de crise do movimento socialista e de ofensiva neoliberal, foi o amoldamento das instituições forjadas na luta democrática à ordem liberal burguesa.
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A progressiva inflexão das principais organizações de esquerda do período (à frente o PT e a CUT) a uma postura de abandono das propostas socialistas e de limitação da luta dos trabalhadores aos marcos impostos pela ordem dominante, num claro processo de transformismo, representou, na esfera política, a sanção ao movimento de consolidação da hegemonia burguesa, culminando, na década de 1990, com a franca afirmação de uma democracia reduzida às estratégias ditadas pelo capital. Esta situação se explica em parte pela cooptação das direções sindicais e partidárias, pela burocratização e acomodação das organizações representativas dos trabalhadores e da juventude (vide UNE) e, por outra, pela tendência a considerar a participação em espaços institucionais e no interior do Estado burguês (em cargos nas esferas de governo e do parlamento) um fim em si mesmo.
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O processo de institucionalização da democracia burguesa transformou, ao longo dos últimos trinta anos, a legitimidade conquistada através das lutas democráticas e sociais contra a ditadura em formas de apassivamento das massas trabalhadoras às regras de um jogo eleitoral calcado nos velhos vícios fisiológicos, na corrupção, na manipulação ideológica, no mercado de votos e no marketing elaborado por grandes empresas de publicidade, que passam a vender candidatos como produtos ligados à competência administrativa e à capacidade de melhor gerenciar a crise produzida pelo capital. Para além dos períodos dedicados às campanhas eleitorais, a participação política restringe-se ao modelo de cidadania incapaz de abalar as estruturas do sistema, pois dedicado à administração de problemas de maneira não conflituosa, por meio de mecanismos institucionais, iniciativas legislativas e ações judiciais.
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O apassivamento das lutas sociais ocorre com o amplo espaço dado às chamadas organizações não governamentais (ONGs), que visa a estimular um ativismo cidadão, desprovido de qualquer horizonte de transformação consequente da realidade existente. Transformam-se em verdadeiros aparelhos privados de hegemonia, a serviço da ordem dominante. De acordo com a visão de mundo liberal, a “sociedade civil” ou “terceiro setor”, onde se concentram as chamadas ONGs, seria o espaço reservado às atividades sociais, para promoção da participação comunitária e cidadã. Faria o contraponto ao Estado (lugar, por excelência, da política) e ao mercado (espaço reservado às relações econômicas).
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A esse terceiro setor caberia implementar as “políticas públicas”, já que tanto o Estado (pesado, burocrático, ineficiente), quanto o mercado (sem qualquer tipo de regulação) falharam na resolução dos problemas vivenciados pela população em seu dia-a-dia. Aí devem atuar instituições filantrópicas, fundações empresariais e associações comunitárias, organismos voltados a praticar o altruísmo e a solidariedade em nome do “interesse público”, da eficácia das ações e da modernidade. O termo “sociedade civil” é apropriado ideologicamente, passando a designar um espaço harmonioso, distante das disputas políticas e ideológicas (próprias das lutas pela conquista do poder e do aparelho de Estado) e dos interesses particulares (afeitos à concorrência econômica no mercado).
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Essa nova estratégia de dominação, seguindo as diretrizes do FMI e do Banco Mundial, aliada a todo o processo de internacionalização da economia, das privatizações, de precarização das condições de trabalho e de retirada de direitos sociais nos anos 1990, foi implantada a partir de uma violenta propaganda ideológica voltada a desqualificar a atividade política, os políticos em geral e o sindicalismo autônomo dos trabalhadores, movimentos e práticas identificados com a defesa de interesses meramente corporativos e particulares. Passam então a proliferar os “novos movimentos sociais”, articulados não mais às reivindicações envolvendo as relações de trabalho, muito menos às lutas políticas atadas a projetos globais de transformação da sociedade.
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Os dois governos de Fernando Henrique Cardoso deram início à viabilização de programas com o objetivo de desenvolver estratégias governamentais de coesão social e de educação para uma nova cidadania “ativa e responsável”, baseada na prestação de “serviços sociais” por indivíduos e entidades associativas (as ONGs). O Programa Comunidade Solidária, criado com o intuito de promover o combate a “situações agudas ou extremas de pobreza”, cumpriu importante papel de difusor das ideias e práticas neoliberais e de “fortalecimento da sociedade civil”, no sentido do estímulo ao associativismo prestador de serviços de “interesse público”, em oposição à militância política e social dos anos 1980, reivindicativa de direitos e de contestação à ordem.
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A ascensão do PT ao poder e os governos de Lula não modificaram o quadro. Pelo contrário, só fizeram avançar a proposta de realização de um “pacto nacional”, ou seja, de submissão consentida do conjunto da sociedade à hegemonia burguesa, por meio de programas como o Fome Zero e outros, que deveriam mobilizar ONGs, empresas, instituições religiosas, sindicatos e escolas num mutirão de combate à fome, instituindo a parceria da “sociedade civil organizada” com o Estado. O apelo ao tratamento compensatório à fome e à miséria de parte da população integrava a estratégia de construção do consenso em torno do projeto de transformação do Brasil em um país de capitalismo avançado com “face humana”. Deste projeto, passaram a participar grandes grupos empresariais, o monopólio das telecomunicações, bancos e inúmeras fundações, que, que, por meio de programas como o Ação Global, Telecurso 2000, Canal Futura, etc, da produção de cartilhas e de projetos pedagógicos nas escolas, contribuem para difundir a “nova pedagogia da hegemonia”.
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Todo o discurso produzido no sentido da difusão de uma nova “cultura cívica” e de uma “cidadania responsável” não passa de uma grande cortina de fumaça para encobrir, de um lado, o processo avançado de privatização dos serviços públicos e de transferência da responsabilidade do Estado para a esfera privada (através de contratos com Organizações Sociais – OSs, por exemplo), acompanhado da retirada dos direitos sociais. De outro, percebe-se a tentativa de evitar o acirramento da luta de classes, criando espaços institucionais de participação dos indivíduos e entidades associativas para o encaminhamento de reivindicações e a resolução de problemas de forma pragmática, na lógica da colaboração e sem resvalar para o campo da contestação ao status quo. Estimula-se ainda que os movimentos sociais articulem-se em torno de lutas fragmentadas, isoladas, ligadas ao atendimento a demandas específicas, como as de gênero, etnia, opção sexual, culturais, etc., desvinculadas das lutas gerais contra a exploração capitalista. Estas bandeiras têm sua importância, inclusive para os comunistas, que devem atuar nelas combatendo o corporativismo e buscando contextualizá-las na luta contra o capital.
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O “novo consenso pragmático”, expressão utilizada pelo Banco Mundial para designar as renovadas estratégias de conformação social em países como o Brasil, com a difusão de um “novo individualismo” e o estímulo a formas despolitizadas de associativismo, predomina hoje nas ações desenvolvidas por entidades e organizações de caráter comunitário. Conforme texto publicado pelo Banco Mundial: “as ONGs vêm vivenciando transformações profundas em seus paradigmas conceituais e estruturas organizativas, transformando-se em entidades mais propositivas, especializadas e voltadas para a obtenção de resultados”.
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O sindicalismo oficial cutista também foi e continua sendo profundamente influenciado por esta lógica “pragmática”, voltada essencialmente à obtenção de resultados através não mais de ações contestatórias de massa, greves ou protestos abertos, mas pelo caminho da negociação e dos acordos de cúpula. É o velho peleguismo revestido de uma roupagem pós-moderna, sob a forma de “sindicalismo cidadão”. Esses dirigentes sindicais passaram mesmo a se comportar como sócios minoritários do capital, difundindo e defendendo teses como a PLR e o banco de horas, assim como disputando verbas públicas para cursos de “requalificação” do trabalhador. De igual modo, os fundos de pensão, comandados pela alta direção dos conciliadores de classe, participam ativamente do processo de convencimento ideológico, incutindo a ideia de que é possível “se dar bem” jogando o jogo do capital. O consenso burguês é reforçado ainda pelas máquinas patronais assistencialistas gestadas pelo sistema “S” (SESC/SENAC, SESI/SENAI, SEST/SESNAT).
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A burguesia também organiza seu poder combinando instrumentos de participação política – pelos quais busca, essencialmente, exercer o consenso – com a coerção, fazendo uso da violência aberta, sempre que necessário para evitar que seus interesses sejam contestados. A criminalização dos movimentos sociais é o primeiro passo para, por intermédio de uma campanha insidiosa de desmoralização dos lutadores sociais através do aparato midiático, justificar em seguida a ação repressora do Estado.
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A burguesia articula, portanto, coerção e consenso para garantir o exercício da dominação capitalista. O Estado burguês contemporâneo não se apresenta apenas como um aparato político-militar pelo qual a classe dominante organiza a coerção sobre o conjunto dos indivíduos, mas como um instrumento ampliado da dominação de classe que, além de dispor do monopólio da repressão e da violência, é capaz de fazer valer os interesses da classe dominante através do convencimento, da manipulação, da cooptação, da persuasão, da conquista do consentimento por parte dos dominados, para o que muito contribuem organismos não estatais, como as escolas, as igrejas, os sindicatos, os meios de comunicação de massa, etc – na elaboração e difusão da ideologia burguesa.
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No entanto, tais aparelhos privados ou paraestatais não podem ser identificados apenas como reprodutores do discurso dominante, pois em seu seio dá-se, mesmo que em escala reduzida, a mesma luta ideológica que se trava no conjunto da sociedade, podendo, portanto, haver tanto a difusão da ideologia dos “de cima” quanto a circulação de idéias e projetos que apostem em uma alternativa para os “de baixo”.
A construção da contra-hegemonia proletária
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A superação revolucionária do capitalismo, no sentido da construção da sociedade socialista no rumo do comunismo dependerá de uma ação permanente dos comunistas e revolucionários para intensificar a luta política e ideológica na sociedade atual e fazer avançar o projeto contra-hegemônico do proletariado. Este projeto será construído no calor da luta de classes, em meio aos embates sociais e ao processo de conscientização das massas populares em torno de uma nova visão de mundo que se contraponha ao consenso conservador burguês.
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No entanto, a luta pela hegemonia jamais será vitoriosa se encarada apenas como uma batalha no campo das ideias, ou ainda se redundar numa operação restrita ao campo institucional e à luta política no parlamento burguês, onde é extremamente limitada a ação do operariado e dos trabalhadores em geral. A luta de classes tende a ser amortecida pelas discussões em torno de negociações, que, no máximo, são capazes de obter alguns ganhos pontuais e reformas em favor dos trabalhadores, cada vez mais difíceis e improváveis em razão da crise sistêmica do capitalismo que, longe de admitir conquistas novas, atua para retirar as antigas.
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Não descartamos os campos institucional e eleitoral como espaços a serem também ocupados pelos comunistas na luta de classes, mas sabemos das suas limitações e precisamos determinar com clareza como ocupá-los. Consideramos prioritária a ação da militância comunista nos espaços onde seja possível fazer avançar a organização dos trabalhadores e da juventude na luta por seus interesses e necessidades, contribuindo efetivamente para a formação e aprofundamento da consciência de classe contra a dominação imposta pelo capital. Para isto, é preciso estar colado com as massas, participando ativamente dos embates diários da classe trabalhadora, seja por dentro dos sindicatos, no interior das empresas e das escolas, nos bairros, por meio dos movimentos sociais e comunitários, nas lutas políticas gerais, etc.
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No longo prazo, é preciso pensar a construção da hegemonia proletária como a formação de um modo de produção alternativo sob controle dos trabalhadores, o que significa dizer que ela se assenta no mundo da produção, não ficando restrita à sua dimensão política e cultural. Daí a necessidade de se projetar o Bloco Histórico alternativo ao bloco conservador burguês. Conforme apontam as Resoluções de Estratégia e Tática do XIV Congresso do PCB (parágrafos 63 e 64): “o conceito de Bloco Histórico nos remete à compreensão da sociedade como unidade orgânica entre a estrutura econômica e a superestrutura, cimentada por uma determinada hegemonia, na qual ocupam papel fundamental os intelectuais, artistas e organizadores da cultura. (…) Os trabalhadores, em sua luta contra a ordem do capital, devem apresentar-se como classe capaz de contrapor à atual sociedade, desde formas de produção social da vida anticapitalistas, base para novas relações sociais de produção, até formas políticas que correspondam à profunda socialização da produção e da vida social.”
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Contra o bloco histórico capitalista, devemos lutar pela construção do Bloco Revolucionário do Proletariado, ou seja: “o conjunto de ações e transformações econômicas, políticas, jurídicas e formas de consciência que apontem para a superação do capitalismo” e para a construção da sociedade socialista no rumo do comunismo. Isto exige a formação de um bloco de classes e setores sociais e suas representações político-organizativas, que, nas lutas concretas – específicas ou gerais – contra a ordem do capital, vá se constituindo como um poderoso instrumento de luta e de organização dos trabalhadores, com uma ação que extrapole o campo dos interesses econômicos para se apresentar como o contraponto unitário de forças político-ideológicas à hegemonia burguesa. A construção do bloco contra-hegemônico, portanto, pressupõe a articulação das dimensões econômicas e políticas na conformação da proposta emancipadora, capacitando o proletariado ao exercício do poder político e da direção cultural de toda a sociedade.
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Este será o momento mesmo da hegemonia, conceito que expressa a capacidade de uma classe social unificar em torno de seu programa político e seu projeto de sociedade um bloco de forças não homogêneas, marcado por contradições no interior da classe. O grupo ou classe que lidera este bloco é hegemônico porque consegue ir além de seus interesses corporativos imediatos, para manter articuladas forças contraditórias (expressões políticas e sociais das diferentes frações de classe), numa ação essencialmente política, que impeça a irrupção dos contrastes existentes entre elas. Logo, a hegemonia é algo que se conquista, fundamentalmente, por meio da direção política e do consenso. Para além da unidade em torno de objetivos econômicos e políticos, busca-se construir a unidade ideológica, para se atingir a efetiva direção do grupo social fundamental sobre grupos afins subordinados.
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O PCB precisa aprofundar a sua organização interna e dar um enorme salto qualitativo no seu trabalho de inserção no interior dos movimentos dos trabalhadores e da juventude, para poder assumir como perspectiva futura um importante protagonismo na direção do bloco contra-hegemônico. Não se trata de fazermos a autoproclamação do Partido como organização revolucionária da classe, mas de nos apresentarmos como uma vanguarda que, no interior de um bloco amplo de forças políticas e sociais, seja capaz de jogar todas as energias na direção da construção do projeto revolucionário e na contraposição às saídas reformistas, “nacional desenvolvimentistas”, “democrático-populares” ou outras, que não levem às últimas consequências a ruptura com a ordem capitalista. Todavia, tal objetivo somente será alcançado se, na condição de parte integrante do proletariado e respaldado pelas condições objetivas, soubermos agir no sentido de conquistar o reconhecimento e o apoio das massas ao nosso Partido e ao projeto revolucionário.
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O Partido será capaz de participar da direção da classe trabalhadora se penetrar nas organizações nas quais a massa trabalhadora se agrupa, realizando nelas e através delas uma sistemática mobilização de energias segundo um programa de lutas anticapitalistas e anti-imperialistas. Lênin deixava claro não existir uma única forma de luta capaz de conduzir à vitória do socialismo, que pudesse ser copiada pelos movimentos revolucionários em todo o mundo, “na base de regras táticas de luta estereotipadas, mecanicamente niveladas e idênticas”. Tampouco basta a ação isolada da vanguarda ou um trabalho voltado apenas à agitação e à propaganda, pois somente através da própria experiência política das massas será possível desenvolver formas de abordagem da revolução proletária, ou seja, formas de luta eficazes na mobilização popular e no enfrentamento às classes dominantes.
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É necessário recorrer a Marx para explorar o pensamento segundo o qual “a teoria transforma-se em poder material logo que se apodera das massas”, isto é, uma idéia só se realiza plenamente se é apoderada pelo movimento social concreto e se a transforma em ação prática. Na luta hegemônica, o partido revolucionário é o principal organismo social responsável pela organização da consciência de classe pretendida, pois configura-se como o núcleo ideológico em torno do qual se aglomeram os sujeitos individuais (os trabalhadores) e coletivos (as organizações populares) da transformação social a ser conquistada. Neste processo, a vontade coletiva, dirigida pelo partido, atua como a consciência prática da necessidade histórica, galvanizando a vontade transformadora de amplos setores sociais.
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O papel básico do partido proletário é contribuir para a elevação da consciência de classe, superando os marcos dos interesses puramente imediatos, economicistas, corporativos, para o nível da visão global da realidade, forjando, por outro lado, uma “vontade coletiva” capaz de hegemonizar um projeto político nacional de construção da sociedade socialista no rumo do comunismo. O trabalho de construção revolucionária somente será efetivo se atuarmos no seio das massas, pois é desta interação que os militantes partidários podem extrair a fonte dos problemas a serem estudados e resolvidos, impedindo que o partido descole-se da vida prática e caia em um intelectualismo estéril e de gabinete.
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Como diz Gramsci, trata-se de “inovar e tornar ‘crítica’ uma atividade já existente”, produzindo-se uma nova concepção de mundo que, por estar ligada à vida dos trabalhadores, tem maiores possibilidades de difusão, tornando-se uma ideologia renovada por uma concepção teórica que visa à ruptura radical com a ordem dominante. Portanto, não nos interessa um Partido sem bases ligadas efetivamente aos movimentos populares, que apenas se reúnam para discussões no campo teórico e filosófico, ou apenas sobre questões práticas ou corporativas, sem participar das lutas dos trabalhadores e da juventude. Conforme afirmamos em nossas resoluções de organização:
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“A Base não é um organismo voltado para si próprio. Pelo contrário, tem a finalidade de ligar o Partido às massas, num sentido de mão dupla. De um lado, devem participar da vida das massas, procurando levá-las a conhecer, assimilar e por em prática a linha política do Partido. De outro lado, devem recolher delas suas experiências, reivindicações e tendências, para capacitar o Partido a elaborar propostas políticas justas. O grande desafio de uma Base é como levar a política do Partido às massas em sua área de atuação. Se não cumprir minimamente este papel, este conjunto de pessoas não é uma Base do Partido: pode tratar-se apenas de um grupo de amigos, um clube de debates ou uma organização que existe apenas para influir em alguma outra instituição.”
IV – As Mediações Táticas da Estratégia Socialista
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A luta que o proletariado deve desenvolver contra a ordem burguesa se dá num terreno histórico concreto e em um momento da luta de classes historicamente determinado em nosso país. É deste terreno concreto que brotam as determinações do desenho estratégico e tático da revolução brasileira. Tanto os princípios estratégicos mais gerais, como a definição das linhas táticas principais e suas ações operativas, devem responder às determinações da realidade brasileira e da dinâmica da luta de classes tal como se expressam em uma determinada conjuntura histórica e numa certa correlação de forças entre as classes e blocos de classes existentes.
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Sinteticamente, podemos descrever os fundamentos da conjuntura e da correlação de forças estabelecida através das seguintes características:
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O Brasil é um país capitalista completo e maduro integrado na ordem do capitalismo imperialista, com uma burguesia monopolista e seus diferentes segmentos assumindo o posto de uma poderosa classe econômica e politicamente dominante.
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Os problemas da dominação burguesa no Brasil se resolveram em uma aliança de classes entre a burguesia monopolista e uma pequena burguesa política que emerge de setores do proletariado e de suas lutas e que transitou para uma política de centro fundada no pacto social para um desenvolvimento econômico supostamente inclusivo, via políticas sociais focalizadas, manutenção ou crescimento dos postos de trabalho com precarização de direitos e incentivo ao consumo de massas via programas assistenciais, crédito e acesso a fontes de renda alternativas ou informais.
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Esta aliança de classes se funda na aceitação da economia capitalista de mercado como forma insuperável e a aceitação das condições gerais para seu funcionamento, inclusive no que diz respeito ao papel do Estado como gestor de uma macroeconomia para o capital fundada na produção de superávits primários, política fiscal e monetária, controle da inflação, desoneração do capital, subsídios à lucratividade do capital, mercantilização e financeirização de serviços, infraestrutura e logística para a acumulação ampliada de capitais.
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O vínculo da pequena burguesia política com as lutas proletárias das décadas de 1980 e 1990 cerca de legitimidade as ações governamentais fundadas na aliança com o grande capital em seus diferentes setores, ações estas reforçadas pelo intenso trabalho de cooptação e desarticulação de organizações e lideranças da luta proletária e popular, levando a um processo de apassivamento.
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O conjunto destas características produz um cenário conjuntural no qual forma-se um bloco conservador (no sentido da defesa, garantia e reprodução das relações sociais de produção capitalistas e da acumulação ampliada do capital) não apenas dominante, mas hegemônico; ao mesmo tempo em que a própria continuidade da forma capitalista produz tensões que colocam os trabalhadores em conflito com a ordem, ainda que estes não expressem tal descontentamento numa forma política mais clara de contestação.
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Esta característica implica em uma hegemonia necessariamente passiva, isto é, o proletariado não respalda as ações do governo ativamente e é obrigado mesmo, por vezes, a se mover na defesa de seus interesses imediatos atacados pela perpetuação da ordem do capital e suas exigências, situação agravada no momento de crise.
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O resultado direto deste cenário é um isolamento da esquerda revolucionária, que expressa o momento de desarticulação da própria classe através de uma profunda fragmentação política. Entretanto, as contradições do amoldamento momentâneo da classe em uma ordem que se fundamenta na intensificação do trabalho, na retirada de direitos, na precarização das condições de trabalho, no vínculo do crescimento do consumo via endividamento, na desmontagem das políticas públicas e sua privatização direta ou indireta, geram, ao mesmo tempo, as bases da necessária resistência e posterior ofensiva dos trabalhadores.
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O conjunto destas características impõe o desenho geral de nossos eixos táticos:
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Estamos em um momento de defensiva da classe trabalhadora diante de uma sólida hegemonia do bloco conservador, o que torna essencial a ação política organizativa dos trabalhadores na luta por seus interesses imediatos, ainda que estes, neste momento, não estejam vendo a real vinculação destes problemas específicos com as determinações mais gerais da ordem burguesa capitalista.
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O isolamento e a fragmentação da esquerda revolucionária não devem ser encarados como problemas de ordem moral, de carência de formulação ou de falta de entendimento político entre aqueles que hoje enfrentam a ordem burguesa e aqueles que hoje a personificam. Tais problemas têm raízes objetivas na própria fragmentação da classe trabalhadora, o que nos impõe um esforço de aglutinação e unidade no máximo que for possível e através da ação concreta de enfrentamento contra os aspectos que vão se tornando mais evidentes, derivados da contradição da ordem capitalista e do caminho político trilhado pela aliança de classes de centro-direita hoje hegemônica.
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Uma vez que o domínio do bloco conservador construiu uma hegemonia, ainda que passiva, que se expressa em todos os níveis da sociedade (na aceitação da economia capitalista de mercado; no limite das políticas sociais focalizadas como maneira possível de enfrentamento das manifestações da questão social; na privatização dos serviços e desmonte das políticas públicas, etc.) torna-se necessário um intenso trabalho de formação política e de ação cultural, no sentido de desvelar os reais fundamentos da ordem do capital, apostando no desenvolvimento de valores de resistência e de luta que resgatem a história de nossa classe e seus objetivos históricos com autonomia e independência.
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O isolamento quantitativo e qualitativo da esquerda impõe a necessidade de definir estrategicamente campos de atuação e organização para que possa incidir qualitativamente em ações políticas que não se diluam na dimensão continental do país e no contexto de apassivamento da classe. Desta forma, é urgente a definição de eixos centrais táticos onde concentrar o trabalho partidário, não apenas na dimensão regional, mas no que diz respeito aos setores da classe trabalhadora que se tornam essenciais organizar.
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Dada a natureza da hegemonia burguesa hoje consolidada, a correlação de forças presente na luta de classes e o caráter geral de nossa estratégia como socialista, torna-se fundamental a vinculação das lutas específicas e seus impasses e demandas próprios às determinações mais profundas que as ligam à ordem capitalista, colocando a necessidade de sua superação. Neste sentido é fundamental a propaganda e intensa ação política na defesa da alternativa socialista, sua atualidade e necessidade nacional e internacional.
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Este aspecto implica, ainda, na prioridade de procurar dar uma dimensão política às lutas populares e sindicais que se chocam com as manifestações mais aparentes da contradição da ordem capitalista, seja na qualidade da ação sindical e popular, seja nas disputas político-eleitorais.
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O caráter integrado do capitalismo brasileiro à ordem internacional do capital imperialista implica numa interdependência da luta contra-hegemônica. Este aspecto leva à tática de aprofundar os laços de solidariedade internacional diferenciando aquelas forças que atuam na perspectiva anticapitalista e anti-imperialista e, ainda mais sólida e profundamente, àquelas forças socialistas e comunistas.
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A consolidação da hegemonia burguesa implica numa institucionalização da luta de classes e na definição de espaços “aceitáveis” e controlados de manifestação do dissenso, não apenas no que diz respeito ao limitado jogo eleitoral, mas também de uma ordem instituída e em grande parte burocratizada de movimentos sociais, sindicatos e centrais, associações diversas da sociedade civil burguesa. Um dos maiores desafios de nossa tática é que, ao mesmo tempo em que estamos obrigados a agir neste terreno, pois a ordem burguesa organiza seu domínio instituindo uma sociedade civil burguesa que acaba por perpassar praticamente todas as esferas da vida, exatamente aquelas onde procuraremos atuar em nossa expectativa de organizar a classe e operar a resistência, não podemos nos ater aos limites da permissividade concedida pela ordem. Esta constatação impõe a necessidade de organização autônoma e independente para que a ação no interior da ordem seja elemento de contra-hegemonia e não de reforço da hegemonia conservadora.
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Estes diferentes princípios táticos se articulam na formação do BLOCO REVOLUCIONÁRIO DO PROLETARIADIO e na FRENTE ANTICAPITALISTA E ANTI-IMPERIALISTA, sendo que o primeiro é a expressão política e o segundo a expressão prática de nossa ação contra-hegemônica.
O Bloco Revolucionário do Proletariado
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O Bloco Revolucionário do Proletariado consiste em um eixo estratégico de nossa tática porque para ele conflui uma série de ações: organização dos trabalhadores através de suas demandas específicas, o trabalho de formação política e propaganda socialista, o trabalho de organização partidária, as ações políticas institucionais – sindicais, eleitorais, nos diferentes campos de atuação dos militantes e quadros partidários.
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Ele não pode ser confundido com uma aliança de classes e muito menos com uma conformação de forças políticas aliadas, mas é a meta de colocar em movimento a classe trabalhadora numa perspectiva de autonomia e independência de classe para que possa lutar por seus próprios interesses imediatos e históricos. Não é uma instituição, uma frente ou uma associação política, é a necessidade de contrapor à hegemonia burguesa uma contra-hegemonia que apresente a necessidade de ir além da ordem do capital, na perspectiva de uma sociedade socialista.
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Assim, o Bloco Revolucionário do Proletariado não é uma ação, mas a confluência de ações táticas diversas que não se restringem e não podem se restringir ao PCB. A hegemonia conservadora, ao capturar parte do proletariado e produzir o apassivamento, impede a formação do Bloco do Proletariado. Nossas ações de classe, mesmo aquelas limitadas e contraditórias, como os efêmeros momentos de unidade de esquerda (na luta eleitoral, na luta sindical ou de massas) são germes desta contra-hegemonia e de constituição do Bloco Revolucionário do Proletariado, tal como se manifestam na Frente contra a Privatização da Saúde e na defesa do SUS, na luta em defesa da educação pública, na luta por nenhum direito a menos para os trabalhadores, na luta pela Reforma Agrária, na luta pela redução da jornada de trabalho para 40 horas, na luta pelo aumento do salário mínimo.
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Assim como expresso no Manifesto Comunista de Marx e Engels, devemos reafirmar que os comunistas do PCB não lutam para criar um partido à parte do proletariado, mas devem apresentar, no conjunto da luta dos trabalhadores, ali onde ela se expressar, os interesses gerais da classe. Esta representação se associa à necessária compreensão da sociedade capitalista e suas determinações mais profundas, assim como se articula à dimensão internacional da luta e do horizonte socialista e comunista de nossa proposta.
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A principal ferramenta, portanto, da constituição do Bloco Revolucionário do Proletariado, para os comunistas, é a organização de nosso Partido, pois é ele que permite agir no interior da luta de classes com uma perspectiva política que vá além das reivindicações imediatas e necessárias de nossa classe. Da mesma forma, a organização do PCB só tem sentido se for ao mesmo tempo organização de um setor da classe trabalhadora profunda e organicamente ligado às lutas reais do proletariado.
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Desta maneira, respondemos da seguinte forma a principal questão tática: como organizar o Bloco Revolucionário do Proletariado? Organizando os trabalhadores e suas lutas imediatas, ao mesmo tempo em que organizamos o PCB como expressão de um setor dos trabalhadores organizados que, compreendendo as determinações mais profundas da sociedade capitalista, se dispõe a lutar pelo socialismo como transição para uma sociedade sem classes e sem Estado: o comunismo.
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Assim, afirmamos que o eixo tático/estratégico de constituição do Bloco Revolucionário do Proletariado e a organização do PCB são elementos indissociáveis, uma vez que não faz sentido organizar nosso partido fora do processo de constituição da classe trabalhadora como um sujeito histórico da revolução socialista. Não basta organizar os trabalhadores sem que isso se vincule à radical negação da ordem capitalista e à apresentação da necessidade e atualidade da alternativa socialista.
O Poder Popular
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Um dos principais instrumentos para se realizar as transformações econômicas, sociais e políticas no Brasil é a construção do Poder Popular. Construir o poder popular significa instituir a democracia direta, de forma a que os trabalhadores e as massas passem a exercer a direção política da sociedade, através dos Conselhos Populares. A construção do Poder Popular não acontecerá do dia para a noite: trata-se de um longo percurso, no qual os trabalhadores devem ir construindo no interior da velha ordem os elementos constitutivos e organizativos da nova ordem. As lutas populares no âmbito do poder local, que constituem o núcleo do Poder Popular, não serão realizadas plenamente sem alteração das formas de propriedade e das relações capitalistas de produção, mas a construção deste instrumento funda-se na necessidade de colocar na ordem dia o protagonismo dos trabalhadores e das massas populares e de criar meios institucionais para que seus interesses sejam defendidos com independência e autonomia, não se prendendo aos limites da atual ordem institucional, mas inovando e criando novas formas de poder político, no sentido da democracia direta.
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Tendo como horizonte estratégico a Revolução Socialista e, para a efetivação desta estratégia, a construção do Bloco Revolucionário do Proletariado, é preciso ter claro que tal construção somente será concretizada através de um processo histórico que exige a permanente disposição da militância comunista para desenvolver, desde já, a configuração de um duplo poder, forjado na luta de classes, na perspectiva dos interesses e necessidades dos trabalhadores e conformador de uma nova cultura proletária e popular. Como afirmamos nas Resoluções do XIV Congresso (parágrafo 80 em diante), será necessário ocupar ativamente “todos os poros da institucionalidade atual”, criando novas formas de “associação e sociabilidade através das manifestações de resistência da classe trabalhadora”. Para tal, ainda que possua um caráter estratégico, mas já fazendo parte das mediações táticas necessárias à realização do projeto revolucionário, está a proposta de construção do Poder Popular.
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“Propomos a construção de órgãos de poder proletário e popular que, atuando na forma de conselhos autônomos da classe trabalhadora, exercitem o processo de gestão e deliberação sobre os assuntos que dizem respeito diretamente às massas trabalhadoras, além de ações diretas para solucioná-los. Em todas as instâncias da sociedade, é necessário organizar a resistência dos trabalhadores: por locais de trabalho, para fazer frente à arbitrariedade do capital; nos locais de moradia, para garantir a segurança e melhores condições de vida; onde for preciso, tomar iniciativas de trabalho e produção cooperativadas, lutar por acesso à saúde, educação e serviços fundamentais, não apenas como ampliação de serviços públicos, mas pelo controle do processo e da qualidade da execução das políticas públicas.
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Será preciso organizar formas de abastecimento e controle popular de distribuição, potencializar as formas autônomas de trabalho e vida e vinculá-las aos trabalhadores de diferentes campos e profissões, desenvolver uma solidariedade ativa entre as categorias e setores sociais, fomentar interesses comuns e a necessidade de uma nova forma de organização da produção social da vida para além do mercado e da lógica do capital. E ainda: organizar a cultura proletária e popular como acesso e produção universal de bens culturais, formação política, conhecimento da história, do funcionamento da sociedade e da luta internacional dos trabalhadores, e como capacitação técnica e profissional.”
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A construção do Poder Popular será efetuada através de um longo percurso, ditado pela correlação de forças na sociedade e outros fatores. Desta construção faz parte a participação no movimento sindical, associativo urbano, nas instâncias de poder local institucionais, onde for possível e recomendável, em construções diretas do movimento popular, de caráter regional, local ou setorial, podendo evoluir para os planos estadual e mesmo nacional, através de redes de entidades do movimento popular. Nesses espaços, os comunistas devem buscar o reconhecimento cada vez maior dos trabalhadores e da população que representam, tornar efetiva a representação popular, lutar pelas reivindicações reais dos trabalhadores e da população, buscando dar-lhes um caráter político e educativo.
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Estes instrumentos de hegemonia proletária, que deverão atuar no sentido de fazer avançar a construção do poder popular alternativo à ordem capitalista, nascerão das experiências concretas de lutas dos trabalhadores, partindo mesmo de organismos já existentes, como associações de moradores, conselhos comunitários nos bairros, sindicatos, organizações nos locais de trabalho, comitês da juventude, movimentos de moradia, luta contra o desemprego, contra privatizações, luta pela terra, fóruns comuns de mobilização envolvendo bandeiras gerais como a saúde, a educação, os transportes, a defesa do meio ambiente etc). Cabe aos militantes comunistas a intervenção organizada nestes espaços, promovendo sempre a denúncia da ação do capital em todas as esferas da sociedade e da vida e apontando para a solução radical dos problemas vividos pelos trabalhadores.
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Os limites da institucionalidade liberal burguesa com certeza impedirão a plena afirmação dos reclamos populares, o que, dependendo da capacidade de organização e de unidade dos movimentos, forçará a radicalização da luta. Daí ser necessário ter como norte a difusão de experiências de ação que já ocorrem em várias cidades do país, mas que hoje ainda possuem um alcance localizado e disperso: a ocupação de fábricas e empresas, com a formação de comitês voltados à organização da produção sob o controle dos trabalhadores; a invasão de espaços ociosos (a serviço da especulação imobiliária) para a moradia popular; a ocupação dos latifúndios, com o propósito de organizar a produção cooperativada, sob a direção dos trabalhadores rurais, rompendo-se gradativamente com a ilusão de que será possível – no estágio atual de pleno desenvolvimento das relações capitalistas no campo, com hegemonia do agronegócio – implementar um programa de distribuição e expansão da pequena propriedade. Diante dos problemas concretos que surgirem será preciso radicalizar as ações, com o poder popular assumindo para si a tarefa de enfrentar tais problemas, denunciando a omissão criminosa do Estado burguês e buscando construir outra institucionalidade.
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O grande desafio será costurar nacionalmente a organização do conjunto de iniciativas desenvolvidas no âmbito local, municipal, regional e estadual, superando as divergências entre as diversas forças políticas e organizações que abraçam a perspectiva da luta anticapitalista, para que, então, seja criado um Poder Popular que tenha caráter de um duplo poder alternativo ao bloco liberal burguês. Depende de muita luta e organização a possibilidade de se constituir tal realidade, em que sejam colocadas frente a frente as alternativas antagônicas de ordenamento da sociedade: de um lado, o Estado burguês e os diversos mecanismos e aparelhos responsáveis pela reprodução e manutenção da ordem capitalista; de outro, as forças políticas e organizações sociais e populares, reunidas em torno do Poder Popular, defendendo uma nova ordem socialista. É preciso criar as condições para que o debate político se dê em torno das questões programáticas e do conteúdo histórico e ideológico, superando qualquer tentativa de conduzir a luta por caminhos reformistas ou pelo pragmatismo oportunista.
A Frente Anticapitalista e Anti-imperialista
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O XIV Congresso aprovou que é papel do PCB incentivar a elaboração de um calendário nacional de lutas centrado na resistência dos trabalhadores à ofensiva do capital. Paralelamente, devemos lutar pela criação de comitês e organismos de mobilização que se transformem em germes do Poder Popular e que, ao mesmo tempo, contribuam para a construção da Frente Anticapitalista e Anti-imperialista, com a constituição de uma plataforma política capaz de dar unidade à ação contra-hegemônica como base para uma alternativa real de poder dos trabalhadores.
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A Frente não pode ser confundida com uma frente eleitoral. A vitória eleitoral e as possibilidades de governabilidade de forças de esquerda somente ocorrerão se estiver fincada sobre um forte movimento de massas. Portanto, o projeto de constituição da Frente Anticapitalista e Anti-imperialista depende da formação de um amplo movimento de caráter permanente, estruturado por partidos políticos, organizações de massa e movimentos populares reunidos em torno do programa contra-hegemônico, no qual esteja prevista a ruptura com o capitalismo. O grande objetivo é criar as condições para a disputa pelo poder na perspectiva do socialismo, incorporando amplos setores de massa desgarrados tanto do projeto conciliador que hoje propõe um pacto com o capital, quanto do projeto reformista. Para a conformação desta Frente, devemos priorizar o diálogo com as forças políticas e sociais que têm se posicionado, nas inúmeras frentes de luta, em franca oposição ao Estado burguês e sua opressão de classe, mesmo aquelas que hoje ainda se mantêm reticentes a abraçar a ideia de um movimento com caráter anticapitalista.
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Temos encontrado dificuldades para convencer determinados setores da esquerda acerca da necessidade de formação da Frente Anticapitalista e Anti-imperialista. Alguns se opõem à ideia porque acham que farão sozinhos a revolução socialista. Outros, por entendimento de que ainda há “tarefas nacionais” a cumprir no Brasil, e que estaríamos (nós, do PCB) nos adiantando ao processo histórico, propondo a luta anticapitalista como central. Estes grupos partem do princípio de que é preciso, primeiro, desenvolver a luta antilatifúndio e antimonopólio e que, portanto, o atual estágio da luta de classes no Brasil demandaria um movimento primordialmente anti-imperialista. Trata-se, de fato, de uma concepção “etapista” disfarçada. Entendemos que todas as lutas populares no Brasil, seja contra a exploração, seja contra o poder do latifúndio ou contra os monopólios, são lutas anticapitalistas, pois o capital exerce seu domínio em todas as esferas da vida social, assim como a hegemonia burguesa é acachapante. Qualquer “tarefa nacional” ou “popular-democrática” a ser cumprida será uma tarefa anticapitalista. Hoje todo e qualquer movimento popular encontra do outro lado da trincheira a organização do capital, tentando obstaculizar as conquistas por parte dos trabalhadores.
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Para nós, as lutas sociais e a resistência dos trabalhadores na defesa de seus direitos mais imediatos, como o salário, as condições de trabalho, a aposentadoria, a assistência, os direitos previdenciários, assim como a luta pela qualidade de vida e pelo direito a uma educação pública de qualidade, ao atendimento de saúde, à moradia digna, ao acesso aos bens culturais e ao lazer se chocam hoje com a lógica privatista e de mercado, que vê todos estes bens e serviços como mercadorias a ser adquiridas prioritariamente no mercado privado, gerando lucros enormes para as grandes corporações e, secundária e supletivamente, pelo Estado, na forma de políticas públicas.
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Mas não contrapomos a luta anticapitalista à luta contra o imperialismo. No caso do Brasil, as duas lutas se unem no mesmo processo de enfrentamento à ordem imposta pelo grande capital e pela burguesia. Pois sabemos que o desenvolvimento do capitalismo brasileiro está, de forma profunda e incontornável, associado ao capitalismo internacional, sendo impossível separar onde começa e onde acaba o capital “nacional” e aquele ligado à internacionalização das grandes empresas transnacionais. O desenvolvimento dos monopólios, das fusões, da concentração e centralização dos principais meios de produção nas mãos de grandes corporações monopolistas, nos setores industrial, bancário e comercial, torna impossível separar o capital de origem brasileira ou estrangeira, assim como o chamado capital produtivo do especulativo, já que, nesta fase, o capital financeiro funde seus investimentos tanto na produção direta como no chamado capital portador de juros e flui de um campo para outro de acordo com as necessidades e interesses da acumulação privada, sendo avesso a qualquer tipo de planejamento e controle. Por isso a luta anticapitalista hoje é, necessariamente, uma luta anti-imperialista.
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A afirmação do caráter anti-imperialista não advém de nenhuma afirmação de um capitalismo nacional em contraposição à dominação estrangeira de potências desenvolvidas, o que poderia nos levar a reapresentar um elemento essencial da estratégia das etapas ou do desenho mais geral de uma estratégia democrático nacional ou popular. O caráter anti-imperialista da frente proposta, pelo contrário, parte da constatação do caráter internacional do capitalismo monopolista e daí seu caráter imperialista, de forma que as lutas anti-capitalistas que se desenvolvem no Brasil, na América Latina e no mundo se chocam necessariamente com a ordem capitalista/imperialista mundial o que aumenta a necessidade de articulação política ativa e solidariedade internacionalista.
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A hegemonia burguesa só pode se impor e se prolongar no Brasil pela divisão das forças socialistas, populares e revolucionárias. É hora, pois, de dar um salto de qualidade na busca pela unidade de ação dos movimentos populares, das forças de esquerda e entidades representativas dos trabalhadores, no interior e para além do mundo sindical corporativo, promovendo iniciativas práticas e conjuntas de resistência e de confrontação que sejam os passos necessários para a constituição de um bloco proletário capaz de contrapor à hegemonia conservadora uma real alternativa de poder popular e socialista em nosso país. Nosso papel é continuar insistindo, junto a todas as forças políticas e organizações sociais que se contraponham ao poder do capital, sobre a necessidade de conformação da Frente Anticapitalista e Anti-imperialista, que não necessariamente terá este nome, mas que tenha, em essência, o caráter de um amplo movimento político permanente de lutas, voltado a enfrentar os ditames do capital e da ordem burguesa em nosso país, preparando o caminho para a disputa pelo poder e a construção da sociedade socialista.
V – Operações Táticas
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É necessário primeiramente distinguir formalmente entre a tática e a operação tática. No corpo de nossa elaboração estratégica definimos linhas táticas gerais, que acabamos de expor, para orientar nossa ação com vistas ao desenvolvimento de atividades e iniciativas que possam resultar nas metas propostas e na implementação de nossa estratégia.
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Assim, o trabalho partidário deve incluir a análise sobre as diversas realidades locais, para detectar os caminhos e meios que nos permitam efetivar as linhas táticas definidas através de ações práticas. No campo da análise da realidade e da conjuntura, por exemplo, é tarefa das diferentes instâncias do PCB avaliar como o capitalismo se expressa concretamente nas áreas de atuação da militância, que setores de classe ali se expressam como dominantes e determinantes, como se produz na realidade dada a aliança de classes do bloco hegemônico, que forças políticas regionais ou locais expressam a grande burguesia monopolista e seus aliados da pequena burguesia política, assim como as forças de esquerda e os diferentes movimentos e organizações dos trabalhadores.
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Desta análise, deriva a necessidade de identificar as contradições que marcam a forma particular de acumulação do capital que ali se expressa (pode ser no acesso precário aos serviços educacionais, de saúde ou outros; na contradição entre a agricultura familiar ou outra forma de produção camponesa contemporânea e o agronegócio, ou na contradição explícita entre capital e trabalho numa região industrial, etc.).
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É preciso definir os setores de classe e segmentos estratégicos a se organizar, desenvolver políticas de arregimentação, organização e formação inseridas no fortalecimento das ações e lutas sociais. Deve-se fazer presente na vida da classe nos espaços de atuação profissional ou de moradia de nossos militantes, traduzindo a política do PCB para propostas concretas de organização da luta sindical na especificidade de cada inserção, nas lutas populares e sociais, nos movimentos de resistência da classe trabalhadora. Este trabalho de diagnóstico e organização é a base para passar à ação, integrando as lutas existentes e tomando iniciativa daquelas que se vejam como necessárias, mas que ainda não se transformaram em iniciativas práticas.
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Tais iniciativas práticas devem se articular aos nossos eixos táticos e estratégicos, ou seja, devemos permanentemente avaliar se nossa prática política está de fato contribuindo para ações unitárias e contra-hegemônicas que contribuam para a ação independente da classe na constituição da Frente Anticapitalista e Anti-imperialista e do Bloco Revolucionário do Proletariado, colocando sempre acima das pequenas divergências e problemas imediatos nossas tarefas políticas mais amplas de organização e politização dos trabalhadores.
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O mais importante em nossa operação tática é a postura de nossos militantes. De nada adianta termos uma formulação política consistente e correta se nossos militantes se portam de maneira desqualificada, em contradição com os valores revolucionários, ou seja, sem disciplina, sem formação política capaz de compreender nossa estratégia, nossas táticas e a realidade em sua complexidade. Além disso, que não é senão o dever de todo o militante comunista, a postura deve também se pautar pelo respeito às divergências, uma postura pela unidade naquilo que for essencial, sem mascarar divergências de concepções e princípios, expondo seus pontos de vista com firmeza e serenidade.
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Devemos guardar os combates para nossos inimigos de classe e seus aliados, preservando o debate para nossos aliados e para o conjunto dos trabalhadores, mesmo aqueles submetidos à hegemonia apassivadora do bloco dominante. A operação tática implica no trabalho coletivo e, portanto, em disciplina e organização na condução das tarefas estabelecidas e na aplicação consequente do centralismo democrático, enfatizando que ele só pode ser de fato centralismo se for construído pelo debate profundo e o conhecimento crítico de nossas formulações e não pela imposição burocrática e administrativa.
Pontos centrais da operação tática
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A Conferência sobre Tática não poderia ter a pretensão de traçar o conjunto das ações que construirão nossa intervenção na realidade da luta de classes pois, como dissemos, isso depende de um diagnóstico local, regional e setorial (sindical, da juventude, político-eleitoral, etc.). No entanto, é fundamental que apontemos alguns pontos centrais de nossa operação tática:
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Dada a nossa prioridade na organização da classe trabalhadora, torna-se essencial a identificação dos segmentos principais da classe nos diferentes contextos regionais e locais para definir formas de aproximação e organização nos próprios locais de trabalho. Não nos basta desenvolver uma política para os trabalhadores, é essencial desenvolver uma ação com os trabalhadores.
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Este ponto coloca a ação e iniciativas de intervenção no cotidiano da classe trabalhadora como prática central do trabalho partidário, de onde deriva a prioridade tática de intervir nas instituições onde trabalhamos, detectando problemas e formulando ações práticas, assim como na tarefa de organização sindical, se for o caso, ou formas de associação adequadas à realidade local ou setorial.
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É fundamental manter autonomia desta ação associativa ou sindical evitando a tentação de partidarizá-las. O PCB não deve partidarizar as ações de organização e luta da classe; seus militantes devem se destacar pela sua firme e coerente atuação, compromisso, seriedade e clareza, deixando que a ação partidária por excelência se desenvolva nos âmbitos que lhes são próprios, num consistente trabalho de arregimentação.
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Dada a prioridade de articular e politizar as lutas imediatas, a operação tática do PCB deve dar especial atenção aos espaços de generalização das lutas imediatas e das organizações que daí derivam. Daí a importância de fortalecer a Unidade Classista como ferramenta de organização sindical, da mesma forma que a UJC no caso da juventude trabalhadora e os estudantes.
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Neste mesmo sentido, deve-se buscar qualificar e fortalecer nossa ação na construção da INTERSINDICAL, respeitando os ritmos e diferentes concepções que hoje nela se abrigam e apontando sincera e claramente a intenção de construí-la como um espaço amplo de organização e luta sindical, evitando, ao mesmo tempo, os sectarismos que tendem a isolá-la em torno de uma unidade abstrata, amarrada numa casca institucional que tende a se burocratizar antes mesmo de nascer. O PCB dará o melhor de seus esforços no sentido de contribuir para a recomposição do campo original da Intersindical, pondo fim à atual duplicidade de representação, e sua ampliação com os demais setores sindicais que têm a centralidade do trabalho como norte.
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Diante da complexidade da conjuntura e da força de atração e cooptação do bloco conservador no poder, enfrentaremos, cada vez mais, a subordinação de segmentos da luta social que, por diferentes motivos, tendem a ser capturados pela hegemonia conservadora. Considerando as características da hegemonia passiva, devemos desenvolver uma política cautelosa e coerente com estes setores, nunca disfarçando nossas divergências e a clara apreciação do equívoco de tal aproximação, mas evitando a sectarização que tende a jogar estes setores na vala comum da conciliação, desprezando as mediações e contradições importantes na tentativa de construção de uma contra-hegemonia.
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A luta contra-hegemônica é, fundamentalmente, uma luta de classes e, neste sentido, envolve necessariamente o campo da luta das ideias, ainda que não possa se restringir a ele. Isso implica que, sem ilusões com o trabalho educativo e seus limites, afirmamos como essencial o trabalho de formação política. Trata-se de uma exigência no que diz respeito à formação de nossos militantes e quadros, e de uma necessidade quanto ao trabalho junto aos setores mais amplos da classe trabalhadora, sempre em uma perspectiva de unidade, sem dogmatismos e sectarismos que buscam instrumentalizar a formação como instrumento de divulgação de uma linha ou da política partidária. Seu papel central é fornecer aos trabalhadores instrumentos teóricos necessários à constituição de sua consciência de classe e da compreensão crítica da realidade, para além das aparências. Para isso, a divulgação e o estudo do marxismo são essenciais.
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A tarefa de constituir a classe como sujeito implica em uma postura diante do atual perfil da classe trabalhadora e das forças que atuam objetivamente em sua fragmentação. A lógica pós-moderna pulveriza o pertencimento de classe em diversas identidades (mulheres, negros, jovens, opções sexuais, etc.), como se estes aspectos pairassem acima das determinações de uma sociedade capitalista cindida por interesses antagônicos de classe. Nossa postura não deve ser a negação da diversidade de identidades e da especificidade das diferentes demandas que tal diversidade permite manifestar, pois são manifestações legitimas. Cabe compreendê-las à luz, também, de suas determinações sociais e históricas e da funcionalidade das opressões específicas constituintes da ordem capitalista/burguesa.
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Nas diversas frentes táticas em que atua, o PCB deve buscar o campo de alianças correspondente à possível e necessária composição da Frente Anticapitalista e Anti-imperialista e da Intersindical, esta entendida pelo PCB como um espaço comum às correntes que a reivindicam; no caso de impossibilidade, inviabilidade ou inexistência de aliados deste campo atuando em determinada frente, PCB pode participar de outras composições que representem setores mais moderados da esquerda, desde que a nossa participação nas eventuais gestões das organizações sindicais e populares possa ser claramente diferenciada, que permita a efetiva ocupação de espaços e a realização de ações concretas que apontem para o desenvolvimento da luta de classes. No espaço político de alianças aqui definido, o PCB procurará estreitar relações mais consistentes com as forças comunistas que se contrapõem ao reformismo e ao etapismo.
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