Lições da nossa história

Resolução do Comitê Central do Partido Comunista do Canadá – agosto de 2011.

Este ano comemora-se o aniversário de 90 anos do Partido Comunista do Canadá (CPC). Desde seu congresso de fundação, celebrado em uma granja em Guelph, Ontário, em 1921, até hoje, nos esforçamos para manter-nos fiéis a nossos princípios e teoria diretriz, e por nos desenvolver em nossas atividades e lutas diárias, como partido revolucionário da classe trabalhadora do Canadá, firmemente baseado no marxismo-leninismo e no internacionalismo proletário.

Ao celebrar este aniversário, recordamos as muitas contribuições e conquistas do nosso partido no decorrer desses noventa anos. Organizando os desorganizados, forjando a maior parte dos sindicatos do setor industrial e público que existem na atualidade em nosso país, criando e dirigindo os movimentos camponeses pela sobrevivência e dignidade, organizando as fileiras dos desempregados do Canadá durante a grande depressão, lançando as famosas Marchas a Otawa, mobilizando a milhares de jovens voluntários para lutar contra o fascismo na Espanha e logo em toda Europa durante a Segunda Guerra Mundial, construindo o movimento pela paz e o desarmamento nos anos de pós-guerra, liderando a luta histórica no interior do movimento trabalhista do Canadá anglófono pelo reconhecimento dos direitos nacionais de Quebec, ajudando a forjar o movimento estudantil canadense na década de 70, ajudando a criar grandes movimentos por reformas cívicas, por uma atenção sanitária universal, pela defesa da soberania do Canadá. Recordamos com orgulho todos estes e muitos outros episódios de nossa história.

E recordamos também que nossas atividades revolucionárias se desenvolveram em circunstâncias de hostilidade implacável e ataques da classe dominante capitalista do Canadá e seu Estado. Os períodos em que nosso Partido se viu obrigado a trabalhar em condições de ilegalidade; quando Tim Buck e outros dirigentes e militantes do Partido foram condenados e encarcerados, a caça às bruxas macartista dirigida contra os membros e simpatizantes e os sindicatos dirigidos por comunistas, os planos secretos ProFunc do Estado do Canadá para reunir e encarcerar aos milhares de comunistas e suas famílias; a constante propaganda ideológica e as agressões físicas contra nosso partido por negar-se a sucumbir ao anti-sovietismo – honramos todos os camaradas que suportaram aqueles tempos com valentia. Entendemos que o propósito dos ataques ideológicos e políticos não foi somente debilitar e diminuir nossas fileiras e romper os laços dos comunistas com classe trabalhadora, mas também afastar os comunistas da orientação da nossa classe e pressionar o partido a abandonar sua teoria revolucionária.

É nesse contexto que chegamos a um novo aniversário; passaram décadas desde a luta interna que quase liquidou nosso Partido. Ao final da década de 1980, George Hewison assumiu a direção do partido pouco depois um grupo de oportunistas de direita, e trotskistas foram ganhando no Comitê Central do CPC. Foram capazes de ocultar seu caráter liquidacionista e aproveitando da confusão e desorientação nas fileiras do partido causadas pela evolução do PCUS, sob direção do Gorbachov se reuniram as nuvens da contra-revolução. Em seu devido tempo, Hewison se dedicou a desmantelar nosso partido peça por peça, a partir da dissolução da união de jovens comunistas e expulsão de quadros do partido, fechamento da imprensa e editora, e livrarias progressistas por todo o país.

Conforme seu projeto tomou força, este grupo começou a romper abertamente com os princípios ideológicos e linha política do Partido. Começaram a negar a história do partido. Avançaram nas idéias reformistas sobrepondo a transformação revolucionária do capitalismo para o socialismo-comunismo. Decretou-se inadequado o conceito de imperialismo, já que “não caracteriza o capitalismo pós-industrial”. Dedicaram-se a desmantelar as instancias orgânicas. Com o tempo, suas denúncias de stalinismo passaram a ser ataques contra as idéias leninistas, e passaram a recusar os postulados do marxismo. Propuseram mudança de nome do partido, retirando a referencia comunista da nossa bandeira.

Por trás dessa facção fracionista celebraram reuniões com o objetivo de fundar um novo partido unido da esquerda socialista, utilizando as finanças do partido para o financiamento dessa nova empresa.

Depois do Congresso de 1990, a oposição ao cada vez mais evidente abandono da teoria e prática marxista pela direção Hewison cresceu em todo o país. Quando emergiu a evidencia detalhada de seus planos secretos para dissolver o partido e roubar seus bens, e começaram as expulsões de militantes, a maioria dos membros do partido exigiu um congresso de emergência em todo Canadá para resolver o problema. Porém, os liquidacionistas se negaram e se dedicaram a dissolver a oposição. Obrigaram os membros a assinar um juramento de lealdade a Hewison, ou enfrentar a negativa da renovação de membro do partido.

Em última instância, os militantes detonaram seus planos e salvaram o Partido Comunista de sua destruição, com um custo político, financeiro, organizativo.

Nosso partido não foi o único a passar por uma experiência como essa. Estes anos difíceis trouxeram provas similares a partidos de todo o mundo. As lições extraídas desse doloroso episódio da nossa história são importantes para os comunistas no Canadá, tanto para os veteranos como para os novos membros.

Mas são lições que podem ser úteis aos comunistas a nível internacional, na luta comum pela emancipação social, para por fim à exploração e opressão da classe, pelo socialismo.

É nesse contexto que agora comentamos os últimos acontecimentos e debates que aconteceram no país vizinho, o Partido Comunista dos Estados Unidos da América (CPUSA). Há vários anos, nosso comitê central recebe consultas de muitos membros preocupados com as mudanças políticas e organizativas nesse partido e a renúncia dos quadros dirigentes a conceitos tão fundamentais do marxismo como “ditadura do proletariado”, centralismo democrático, e internacionalismo proletário.

As preocupações explicitadas foram dirigidas a uma série de questões inter-relacionadas, como as diversas declarações emitidas pelo CPUSA sobre questões internacionais, especialmente a luta palestina, as guerras de ocupação dos EUA no Iraque e Afeganistão, a política sindical que muitos percebem como não suficientemente crítica para a colaboração de classes desde a direção da AFL-CIO (que tem relação direta com o Canadá, dada a grande presença de filiais da AFL-CIO no Congresso Canadense dos Trabalhadores), a avaliação da função e posição de classe da administração Obama e do Partido Democrata e a ausência de qualquer presença eleitoral independente do Partido Comunista em seu próprio nome, diversos pronunciamentos de destacadas personalidades do CPUSA favoráveis a mudar o nome do partido, a descrição dos multibilionários resgates governamentais como “uma dose de socialismo”, etc, e as decisões da organização de por fim a edição impressa do “O Mundo Popular” semanal e “Assuntos Políticos”, as expulsões de quadros da LJC, o enfoque de “portas abertas” baseando na internet o recrutamento do partido, etc.

Apesar de sua profunda preocupação por muitos desses acontecimentos, nosso Comitê Central até agora se absteve de fazer comentários. No entanto, à luz da publicação no início deste ano do artigo “Um Partido do Socialismo no Século 21”i, pelo Presidente do CPUSA, Sam Web, nosso Comitê Central se vê obrigado a aclarar o ponto de vista de nosso partido sobre algumas questões críticas que foram propostas. Apesar de que as teses apresentadas nesse artigo se referem, em primeiro lugar, a uma reorientação do próprio PCUSA, seu título e seu texto devem ser lidos como se essas idéias formassem um “padrão” para a orientação política dos partidos comunistas em geral, ou sem dúvida, ao menos de outros países capitalistas desenvolvidos, como o Canadá. Esta hipótese foi confirmada quando os comentários de outros partidos irmãos foram solicitados ativamente pelo CPUSA, uma prática altamente inusual.

Somos conscientes das respostas oficiais dadas a esse artigo pelos Partidos Comunistas da Grécia (KKE)ii e México.iii Nosso partido está de acordo em essência com as principais críticas desse documento expressadas por estes dois partidos. Consideramos que a linha política apontada em “Um Partido do Socialismo no Século 21” constitui um abandono fundamental da teoria e da prática marxista-leninista. A busca de tal enfoque dará lugar objetivamente à liquidação do CPUSA como partido revolucionário da classe trabalhadora nesse país.

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Baseado em nossos 90 anos de luta, o programa do nosso Partido “O futuro do Canadá é o socialismo”iv, nossos Estatutosv, e nas decisões tomadas no Congresso, o Partido Comunista do Canadá compreende sua natureza e papel, e leva a cabo suas atividades políticas, orientado pelas seguintes considerações e conclusões gerais (entre outras):

  • Que a principal contradição no capitalismo no Canadá hoje em dia continua sendo a contradição de classe, que reflete a luta de classes entre as duas principais classes – a classe dominante capitalista (sobretudo seu núcleo, o capital monopolista) e a classe trabalhadora de nosso país, uma contradição que somente pode ser resolvida através da transformação revolucionária da sociedade do capitalismo ao socialismo.

  • Portanto, como partido revolucionário, a principal tarefa do CPC é defender e promover os interesses em longo prazo da classe trabalhadora, na busca desse objetivo último, e “se esforça por ser o principal partido político da classe trabalhadora, de todos os que trabalham com as mãos e o cérebro… [um partido que] surge da classe trabalhadora e é um destacamento político organizado dessa classe… [e que] não tem interesses que o separe da classe trabalhadora em seu conjunto nem parte dela.”

  • Que nosso partido apóia a luta por reformas imediatas para melhorar as condições da classe trabalhadora e o povo sob o capitalismo, e busca a unidade com todas as demais forças que apóiam e lutam por estes avanços; ao mesmo tempo, nosso partido não perde de vista o objetivo final do socialismo, nem o fato de que não pode fazer outro caminho ao socialismo que não seja através do derrocamento revolucionário da ordem existente. Nesse sentido, consideramos que uma correta compreensão da relação dialética entre reforma e revolução é de suma importância;

  • Que, na busca da mais ampla unidade com outras classes e forças sociais para alcançar avanços imediatos, é absolutamente imprescindível para nosso Partido proteger cuidadosamente seu papel independente como partido revolucionário da classe trabalhadora e opor-se às tendências ou pressões – seja a partir de dentro ou de fora de nossas filas – para apagar ou submergir nosso papel independente. O CPC considera que é essencial falar diretamente, de forma visível e aberta em nome próprio, e participar na luta ideológica – a “batalha de idéias” – contra os conceitos burgueses, reformistas e de colaboração de classe que debilitam, desarmam e dividem o movimento;

  • Que a concepção de mundo do [nosso] Partido baseia-se no marxismo-leninismo, que encarna a teoria do socialismo científico desenvolvido pela primeira vez por Karl Marx, Friedrich Engels e V.I Lenin. O marxismo-leninismo não é um dogma, mas uma teoria viva e em desenvolvimento, ferramenta de análise e guia para a ação. Que incorpora a experiência concentrada de todas as lutas da classe trabalhadora, tanto no Canadá como no resto do mundo [do capítulo 8 do nosso programa: “O futuro do Canadá é o socialismo”];

  • Que o CPC está imbuído de uma perspectiva internacionalista proletária, que se reflete tanto na nossa luta por alcançar o socialismo no Canadá, como nossa ativa solidariedade com as lutas antiimperialistas e revolucionárias e os esforços para construir o socialismo em todo o mundo. Um aspecto crítico de nossa responsabilidade internacionalista é a luta ideológica contra as calunias burguesas e as distorções da história do movimento trabalhista internacional e seus esforços por forjar o socialismo, tanto no passado como nos dias atuais; e

  • Que, em termos de nossos princípios organizativos como Partido Comunista, estes “estão determinados por seus objetivos políticos… para guiar a classe trabalhadora à consecução desses objetivos, e para dirigir a luta do povo, o Partido deve basear-se em uma firme unidade ideológica, política e organizativa, e na continua atividade organizada de seus membros, em estreito contato com os trabalhadores, conhecendo suas opiniões e necessidades, e sendo capazes de explicar a política do partido. O centralismo democrático é o princípio organizativo que garante isso.” [do Estatuto de nosso Partido]

Aqui é onde estamos, e esses são os princípios que defendemos sem vacilações.

i) http://www.politicalaffairs.net/a-party-of-socialism-in-the-21st-century-what-it-looks-like-what-it-says-and-what-it-does/.

ii) http://www.solidnet.org/greece-communist-party-of-greece-/1405-cp-of-greece-position-of-kke-on-the-webbs-platform-and-the-developments-in-the-cpusa

iii) http://mltoday.com/subject-areas/opportunism-reformism-revisionism/mexican-communists-condemn-webb-article-espa-ol-english-1133.html

iv) http://www.parti-communiste.ca/?page_id=17

v) http://www.parti-communiste.ca/?page_id=42