Venezuelanos imigrantes: um problema e os seus espelhos

imagemAna Cristina Bracho

ODiario.info

Nota da redação de Misión Verdad:

O fenômeno da migração venezuelana tem vindo progressivamente a ganhar uma maior presença nos meios de comunicação internacionais e na propaganda política antivenezuelana no estrangeiro, o que a partir de um tratamento cartelizado e utilizando o recurso propagandístico do exagero (marca Goebbels), o converteu num mecanismo de incremento das pressões contra o país e o prejuízo da sua imagem. Depois das medidas econômicas anunciadas pelo presidente Nicolás Maduro, este tema foi projetado interesseiramente como «prova material» de que, supostamente, decorre na Venezuela uma situação de «Estado falido», código utilizado noutros países do mundo para vender como «urgentes» as intervenções denominadas «humanitárias». Os meios de comunicação opositores trabalham o princípio da orquestração para unir esforços e converter o fenômeno migratório venezuelano na desculpa para um novo cenário de agressão internacional; perante isto publicamos o trabalho especial da investigadora e colaboradora permanente deste portal, Ana Cristina Bracho, que analisa com profundidade o fenômeno migratório geral na Venezuela e as suas implicações na Colômbia. Não é preciso acrescentar nada, pois os dados transcritos a seguir falam por si:

A humanidade nasceu na África e daí se foi movimentando pelo mundo através de explorações, nomadismos, invasões, peregrinações, expedições comerciais e colonizações. Dizem que a partir do Sul, cálido e rico, os bípedes seguiram para a Ásia e depois para a Europa. Depois, supostamente há uns 15 mil anos, através do estreito de Bering, chegaram os humanos à América.

Na altura da Colônia existia uma população americana que alguns consideram que, pelos seus traços, deve ser de origem asiática e que foi calculada por Dobbyns, Borah e Sulmich de 90 a 150 milhões de pessoas, enquanto para Sapper, Rivet e Denevan só atingiam os 60 milhões de pessoas, no máximo, no momento em que Cristóvão Colombo pisou o continente.

Tendo tudo isto em conta, a história da humanidade é a história do movimento, independentemente do que digam as autoridades, e da existência de fronteiras naturais ou imaginárias. Foi também a sucessão de atos que tem devastado os povos, em forma de lei ou não, que conseguem ou impedem que outras pessoas se aproximem dos seus povoamentos, autoridades, e que existam fronteiras naturais ou imaginárias. Foi também a sucessão de atos, sob a forma de lei ou não, que arrasaram os povos que conseguiram ou que impediram que ouras pessoas se aproximem dos seus povos, dividindo os humanos em cidadãos e estrangeiros.

É a partir desta ideia, no quadro do momento mais crítico em temas migratórios do mundo desde o fim da Segunda Guerra Mundial, que nos propomos analisar a emigração venezuelana, os seus promotores e causas, bem como os que beneficiam com ela. Para o fazer partimos do coração de um «país portátil», um país escala, onde muitos cidadãos têm outras nacionalidades e que a sua história tem sido exemplo de uma terra aberta a todos os que queiram pisá-la.

Venezuela país de imigrantes

Ao despertar da Guerra da Independência, a Venezuela era um país com uma população bastante reduzida, calculada em 1839 por Agustin Codazzi em 945 mil 348 habitantes e, na mesma data, por Juan Manuel Cajigal, em 1 milhão, 147 mil 760 habitantes. A qual se reduziria novamente no calor da Guerra Federal e que, juntamente com o crescimento natural, se viu completada por grandes ondas de imigrantes chegados ao país em busca de fortuna, para se protegerem da Segunda Guerra Mundial, ou pelas promessas da exploração petrolífera.

Por isso, o século XX foi para a Venezuela um período de intensa imigração, o qual os estudiosos foram dividindo em função da sua intensidade ou pela origem dos que chegaram à Pátria. Assim, a partir daqueles programas do século XIX que trouxeram uma população maioritariamente europeia que convidaram a produzir, deixando provas vivas como a Colônia Tovar, sucederam-lhe períodos de grande intensidade como os anos que se seguiram à morte de Juan Vicente Gomez, ou o final dos anos sessenta.

O espírito nacional era tão favorável à imigração que, em 1999, o país reduziu através de uma norma constitucional os requisitos para adquirirem a nacionalidade venezuelana os estrangeiros que, estabelecendo-se no país, possuíssem algumas das nacionalidades de origem das principais colônias formadas na Venezuela.

Com estes dados presentes queremos adiantar-nos no tema da emigração venezuelana que ocupa os diários de todo o mundo pois, no âmbito jurídico, existem diferentes categorias cuja realidade está claramente diferenciada. Por exemplo, a facilidade e a naturalidade com que os cidadãos venezuelanos com outra nacionalidade podem estabelecer-se pela primeira vez ou regressar aos seus países de origem perante duas categorias próprias do direito dos migrantes em que veremos refugiados, asilados ou migrantes econômicos, cada um com as suas próprias prerrogativas a dificuldades.

Quantos venezuelanos partiram?

Segundo o Instituto Nacional de Estadísticas, a República Bolivariana da Venezuela tinha em 30 de outubro de 2011 uma população 28 milhões, 946 mil 101 habitantes. Como na Venezuela não se fizeram declarações oficiais que determinem o número de pessoas que emigraram, as estimativas que podem fazer-se são as publicadas pelas agências internacionais ou organizações não governamentais.

Para as compreender, temos de considerar que apesar desse silêncio houve ações do Estado que permitem visualizar que existe uma população emigrante que tem dimensão suficiente para ser parte da agenda nacional. Assim, pelo menos temos de valorizar as declarações do presidente da República Nicolás Maduro Moros de abril do corrente ano, onde anunciou o Plano de Regresso à Pátria. Assim como observar que não podem fazer-se estimativas que fixem a população emigrante com uma indicação simples do número de pessoas que saíram do país, por exemplo, das que cruzaram a ponte internacional Simón Bolívar entre tantos que não se radicam na nação neogranadina.

Por isso é importante ter em conta que nem todas as pessoas que saem do território são imigrantes, porque podem ser turistas ou pessoas que praticam o comércio ou que tem a sua vida cotidiana nos territórios fronteiriços. Há também que considerar que nem todas as pessoas que emigram têm o mesmo estatuto.

Segundo a Organização das Nações Unidas, um migrante é alguém que «residiu num país estrangeiro durante mais de um ano, independentemente das causas da sua mudança, voluntária ou involuntária, ou dos meios utilizados serem legais ou outros». São, entre todos os migrantes, pessoas com características jurídicas relevantes para o Direito Internacional, sejam refugiados ou asilados.

Um refugiado é «uma pessoa fora do seu país de origem por temor à perseguição, ao conflito, à violência generalizada, ou outras circunstâncias que tenham perturbado gravemente a ordem pública e, consequentemente requerem proteção internacional. A definição de refugiado pode encontrar-se na Convenção de 1951 e nos instrumentos regionais relativos aos refugiados, assim como no Estatuto de ACNUR». Enquanto um asilado é «uma pessoa que solicita a proteção, o amparo e a assistência de um segundo país por se ter visto obrigada a fugir do seu país de origem por diversas razões, normalmente relacionadas com a violação de um ou mais direitos fundamentais».

Sem entrar em nenhuma destas categorias, que são as que interessam ao Direito Internacional Humanitário, ficam os migrantes econômicos. A Organização Internacional para as Migrações (OIM) qualifica como tal «todas as pessoas que se movimentam dos seus países por conveniência pessoal e como resultado de uma decisão livremente tomada». A sua recepção vai estar condicionada por não se considerar que a sua vida esteja em perigo, que a pessoa cumpra os requisitos que ponham o país de destino ou que este queira, por convenção ou graça, relaxar as exigências para que os estrangeiros possam entrar, permanecer, desenvolver atividades, residir no seu território ou obter a sua nacionalidade.

De acordo com uma publicação do jornal The Economist, de 20 de agosto deste ano, a emigração venezuelana poderia ultrapassar o êxodo provocado pela guerra da Síria, considerando que, só no ano de 2017, emigraram 1 milhão 642 mil 442 pessoas do país. O que, em traços largos, coincide com o que foi publicado em julho de 2018 pelo Panam Post em julho de 2018, pelo que se referiu que a OIM estima que entre 2015 e 2017 a quantidade de venezuelanos no exterior passou de 700 mil pessoas, para além de 1,5 milhões espalhados pelo mundo.

Se bem que importantes, estes números devem ser lidos no seu contexto, onde aparecem em primeiro lugar como bastante inferiores às declarações proferidas por alguns porta-vozes da oposição que estimaram em milhões, umas vezes afirmando que foram 2 milhões, outras 4 milhões de pessoas as que emigraram. A situação é diferente depois de observar os números de emigrantes de alguns outros países da região.

Por exemplo, de acordo com dados publicados em 2013, o número de pessoas de origem mexicana nos Estados Unidos ascende a 33,6 milhões de pessoas, incluídos os 11,6 milhões que nasceram no México, de acordo com as estatísticas divulgadas pelo Organismo do Censo estado-unidense. Enquanto, segundo declarações do Presidente da República, em 2015 havia 5 milhões 600 mil colombianos estabelecidos na Venezuela.

À falta de declarações, salvo as estimativas da OIM antes referidas, que coincidem com a recolhidas na imprensa que indicam que a ONU (sem precisar que agência) estimou em 1,6 milhões de venezuelanos saíram do país. Pelo que podemos evidenciar que existe uma saída de venezuelanos que tem importância em relação à nossa população total, que incide nas novas configurações da economia e que, além disso, mostraram a existência de venezuelano que, encontrando-se à procura de novas oportunidades, ficaram expostos a riscos que antes não conheceram como as deportações da Nos Estados Unidos da América ou a redes que se desenvolvem principalmente a partir da Colômbia, ou a tratamentos cruéis e degradantes em muitos país do continente.

Espelhos para emigrantes: da Pátria Grande ao problema venezuelano

Olhando a partir de Espanha o tratamento dos imigrantes na Europa, Adela Cortina inventou uma palavra que agora ocupa uma boa parte dos títulos dos seus estudos sociais. Para ela, a rejeição dos imigrantes nos seus países de trânsito ou destino não uma demonstração de «xenofobia» ou «racismo», mas que são odiados porque são pobres. A isto ela chamou «aporofobia».

Gosto, a partir desta ideia, porque nós vimos como a chegada de venezuelanos ao Panamá, por exemplo, não provocou problemas nos tempos de grande bonança econômica, quando os nossos co-nacionais iam estabelecer investimentos ou negócios, ou sucursais de centros comerciais e restaurantes. O problema vem aparecendo na medida em que nas últimas horas do cadivismo [N. d. T.: uma política cambial fustigada por Nicolas Maduro], os venezuelanos chegavam sem ânimo para consumir mas para guardar o dinheiro da viagem e começara, a instalar-se para trabalhar no que conseguiram.

Por isso, se nós olhamos o tempo que hoje a esquerda chama a «década ganha» nós vemos que a relação dos governos progressistas teceu um sistema normativo que acreditava na Pátria Grande, que conseguia no Mercosul os espaços que procuravam estabelecer o direito dos latino-americanos viverem nos territórios dos diferentes países sem requisitos de maior. Este dado não é desprezível porque nos traz à mente coisas que não costumam associar-se, como por exemplo a razão pela qual devia excluir-se a Venezuela daquele espaço de integração.

Esse era o passo internacional prévio que permitiria evitar a entrada ou a permanência de venezuelanos noutros Estados membros.

Colômbia

Segundo informação publicada no The Economist, a Colômbia é o principal destino dos venezuelanos que emigram. Esta informação aparece sem que se distingam as diferentes causas pelas quais os venezuelanos podem estar na Colômbia como, por exemplo, se se trata de populações que estavam refugiadas na Venezuela que regressaram no quadro do tão publicitado processo de paz, ou se se trata de guajiros [camponeses] que possuem a dupla nacionalidade, ou de pessoas que não se estabelecem o tempo suficiente para serem considerados imigrantes.

A Colômbia é o país que protagoniza, solicita e recebe ajuda internacional para «atender» os imigrantes venezuelanos. Assim o expressou Juan Manuel Santos em 13 de Fevereiro deste ano: «O presidente Juan Manuel Santos reconheceu esta terça-feira que a situação continuará a agravar-se e que o país necessita da ajuda de outros Estados para poder acudir à crise social e econômica que, inevitavelmente produzirá a elevada migração venezuelana».

Juan Manuel Santos, durante uma saudação ao corpo diplomático acreditado na Colômbia (na Casa Narino), assegurando que o seu governo está aberto a aceitar «as ofertas de ajuda econômica e de outra índole da comunidade internacional, estamos na total disposição de as receber, já que precisamos delas pois desafortunadamente este problema agrava-se dia-a-dia». Não obstante, ainda não se tornaram públicas as quantias necessárias.

O que aconteceu pouco depois, porque em 20 de março, segundo o jornal Tal Cual, que «os Estados Unidos enviam ajuda econômica para receber os migrantes venezuelanos», através de um compromisso inicial e imediato de 2,5 milhões de dólares que fornecerá alimentação de emergência e cuidados de saúde para venezuelanos vulneráveis e as comunidades colombianas que já estão a receber.

Há que ler isto com muita prudência pois, em 19 de abril, o ministro da Fazenda da Colômbia, Maurício Cárdenas anunciou uma proposta do FMI de resgate financeiro à Venezuela de 60 mil milhões de dólares para «estabilização macroeconômica», que seria aplicado quando houvesse um governo disposto a tomar as «políticas econômicas corretas». Como o que temos observado é que os programas de atenção aos venezuelanos se estão a fazer na base do acordo entre os Estados Unidos e a Colômbia de que os mesmos serão cobrados ao hipotético futuro governo que, nos seus planos, substituirá o de Nicolas Maduro.

Por sua vez, a cobertura, a cobertura mediática do tema da emigração venezuelana tem estado fixada nesta zona, particularmente na Ponte Internacional Simón Bolívar, chegando inclusivamente a radicarem-se alguns programas internacionais de apoio aos emigrantes. Assim, em junho do corrente ano foi noticiado que tinham chegado à Colômbia «capacetes brancos» argentinos, com a intenção de realizarem em Cucutá um plano de ajuda aos venezuelanos

No entanto, estas ajudas não significaram que aos venezuelanos sejam garantidas boas condições de acolhimento na Colômbia, visto que continuam a ser rejeitados, a abrir ficha na polícia e maltratados como reportava Madelein García para Telesur em 15 de abril deste ano. Também a partir deste portal temos acompanhado o tratamento que se tem dado às venezuelanas a partir da Colômbia.

Em relação a maus tratos, em finais do ano de 2017 foram feitas várias denúncias, inclusive em meios da oposição sobre alguns casos que tinham sido referidos nas redes, precisando de antemão que isto deriva «das más atitudes de alguns venezuelanos que cometem delitos fora das nossas fronteiras, tais como: roubos, tráfico de drogas, e outros, foi o detonante para que cresça a xenofobia contra os seus compatriotas».

O que pretendeu apresentar-se como uma situação isolada perante uma atitude de máxima abertura por parte de Estado e da população colombiana, usando como prova disso, entre outras, uma sentença do Tribunal Constitucional lavrada em 12 de junho de 2018, na qual se exorta as autoridades neogranadinas a terem em conta a situação dos venezuelanos que entraram no país vizinho, que foi estimada pela imprensa venezuelana como uma mostra de humanidade.

No entanto, ao rever a sentença o que no caso particular o julgador considerou ser desumano porque estas pessoas são migrantes econômicos que alegam por demais que não podem ser ajudadas na Venezuela por falta de gêneros. Por isso, O Tribunal Constitucional ordenou que fossem atendidos mas não de forma plena e gratuita mas «progressiva já que se exige esforços complexos por parte do Estado e da disponibilidade de recursos suficientes que não ponham em risco o sistema».

Em termos claros, há que dar atenção prioritária aos colombianos, e na medida em que os recursos para atender os primeiros não se vejam comprometidos, devem atender-se os venezuelanos que se encontrem na Colômbia.

As agências internacionais intervêm

Foi em março de 2018 que se configurou como uma linha recorrente das agências da ONU falar da crise migratória venezuelana. Este é um tema que paulatinamente tem vindo a deslocar das primeiras páginas o tema da suposta crise humanitária no território nacional, elaborado pelas mesmas centrais, O primeiro foi um documento do Alto Comissário da ONU para os Refugiados (ACNUR) divulgado pelo deputado à Assembleia Nacional pelo partido Primeiro Justiça, Miguel Pizarro, acompanhado pelo comentário seguinte: «Pela primeira vez na nossa história, migrantes venezuelanos são oficialmente reconhecidos pelo ACNUR como refugiados. Este regime encarregou-se de acabar com os sonhos e as oportunidades de milhares de pessoas».

Isto levou de imediato a um esclarecimento feito por Roberto Meier na sua condição de porta-voz da ACNUR, onde sublinhou que nunca se tinha colocado que se reconhecesse aos venezuelanos a condição de refugiados, como tinha afirmado Navarro, mas que se exigia aos restantes países (e não ao Estado venezuelano) que respeitassem os termos dos acordos internacionais e que se abstivessem de atos discriminatórios e políticas de deportação massiva de venezuelanos. Política que alguns Estados, entre eles o Panamá vem aplicando. O que, como foi afirmado nesse mesmo mês numa decisão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos que solicitou que fosse permitida a entrada, sem exame de casos particulares, aos venezuelanos que saíam do país.

Igualmente, em agosto de 2018, o Alto-comissário da ONU para os Refugiados (ACNUR), Filipo Grandi, e o diretor-geral da OIM, William Lacy Swing, num documento revisto pela NTN24, sublinhou o tratamento contrário aos direitos humanos que vêm a receber os venezuelanos, indicando especificamente que «a Colômbia que recebeu mais de um milhão de venezuelanos nos últimos 16 meses, e que regularizou temporariamente 820 mil deles, denunciou a medida tomada pelos seus vizinhos, alegando que isso favorece as migrações clandestinas». Isto, em relação a uma exortação que os departamentos dos restantes países fizeram para melhorar o tratamento que vinham dando aos venezuelanos.

Anúncio de uma segunda parte

Pensar estes temas é recordar que para poder intervir num país, primeiro é necessário convencer a opinião pública de que é um Estado falhado, que as suas agências são terríveis agências do mal e que as pessoas sofrem. Com este roteiro pré-estabelecido desenvolveu-se um importante número de ações que consolidaram uma ordem mundial em que não pudemos contar com um só ano em que tenha existido paz e estabilidade.

Presentemente, a Venezuela está no coração das ditas ações e para isso sucedem simultaneamente muitas coisas: contamos movimentos estranhos de exércitos pelas nossas fronteiras, um bloqueio cujo propósito foi aclarado em 25 de abril por Marco Rubio, que declarou que o «objetivo [das intervenções] é maximizar a dor» e pôr as câmaras num ângulo que permitem demonstrar que existe «uma diáspora» ocasionada pela violação de todos os direitos humanos na Venezuela, agora, especialmente dos direitos econômicos, sociais e culturais da população.

É também necessário que as pessoas percam a noção de existência e valor, que sejam perseguidas pela desgraça no seu país e que se lhes recomenda que partam antes que as fronteiras se fechem, os vistos subam de preço ou as autorizações de permanência sejam cada vez mais caras. Falta-nos falar de muitas coisas: Trinidad e Tobago, Equador, Brasil, Argentina e Peru ocuparam-nos parte deste tempo, onde aumenta a distância entres o discurso e os fatos.

Capítulo II – América Latina: mitos e realidades

Nota da redacção [de Misión Verdad): apresentamos a segunda parte do trabalho especial de Ana Cristina Bracho sobre o fenômeno migratório venezuelano, um texto onde aborda os mitos construídos à volta desta situação, o seu uso político, as suas comparações com outros cenários similares do passado recente e, sobretudo, a análise a como se têm comportado os países receptores, na sua totalidade adstritos às plataformas de intervenção internacional contra a Venezuela. Tal como na primeira parte, a continuação deste trabalho especial comenta com rigor e exatidão a que corresponde a migração venezuelana, bem como a sua instrumentalização para fazer avançar agendas bélicas contra territórios adversos aos Estados Unidos. A migração vem-se constituindo como um aspecto central na ordenação do cenário de conflitualidade contra a Venezuela. São estas as referências e as coordenadas desse novamente perigoso momento em que nos encontramos.

Na primeira parte deste estudo caracterizamos algumas noções que consideramos básicas. Tais como que a Venezuela é um país onde existe uma população imigrante considerável e as diferenças relativas ao que o Direito confere às pessoas que se encontram em território estrangeiro.

Também referimos alguns dados para contextualizar nos quais incluímos as alterações das políticas regionais que derivam da destruição dos fóruns multilaterais latino-americanos ou da exclusão da Venezuela deles, bem como a dimensão econômica que a situação tem.

Prometemos que complementaríamos o referido texto com uma segunda parte onde veríamos a situação em alguns países para onde se têm dirigido venezuelanos e venezuelanas, o que cumpriremos em seguida.

Brasil

A República Federativa do Brasil, com 202 milhões de habitantes, é o sexto país mais povoado do mundo, embora o seu grande território tenha um baixo índice de densidade populacional. Segundo informado por El País, de Espanha, em 2015, “o Brasil é um país extremamente fechado para os imigrantes… os estrangeiros representam apenas 0,3% da população, um número historicamente insignificante. A média mundial está em 3%”.

Uma das causas pela qual esse país não se torna atrativo é a dificuldade que os estrangeiros têm em conseguir trabalho e a visão dos nacionais sobre a imigração; assim, segundo a mesma fonte, “73,7% dos brasileiros estão a favor da vinda de estrangeiros com alta qualificação profissional, enquanto 74,3% não querem que cheguem imigrantes sem documentação”.

A Venezuela tem uma ampla fronteira terrestre que não tem significativas separações naturais com o Brasil, segundo o disposto no Tratado de limites e navegação fluvial de 5 de maio de 1859, ratificado pelo Protocolo de 1929. No presente é possível atravessá-la através do acesso viário que une as populações d nossa Santa Elena de Uairén com a brasileira Pacaraima (Roraima, Brasil).

Tal como no caso da fronteira com a Colômbia, Santa Elena de Uairén e as zonas aldeãs são um dos pontos nos quais se pratica o contrabando de extração de gasolina, agravado pela realidade mineira e seus próprios contrabandos que marcam a vida no estado Bolívar. De igual modo, existem na zona fronteiriça comunidades originárias que preexistem à demarcação e se deslocam continuamente entre os dois territórios. É este o status dos Geral (ñengatú), dos cinco subgrupos que conformam o povo pemón, os xiarian, aritamis, yanami, arawakos, yekuana, curripaco, baniva e baré.

Em termos políticos, o Brasil é um dos países latino-americanos que sofreu uma violenta viragem à direita quando, mediante o uso do lawfare, se depôs uma presidente constitucional e se instalou uma ditadura que responde aos interesses de Washington. Uma vez ocorrido isto, as relações entre os dois Estados mudaram radicalmente, sendo o governo de Michel Temer um dos integrantes do Grupo de Lima e um dos promotores da saída da Venezuela do Mercosul.

Neste quadro desapareceram da realidade os acordos Chávez-Lula que contemplavam ideias de desenvolvimento conjunto da região fronteiriça, com investimentos binacionais para a exploração petroleira, a energia elétrica e promovendo a relação fraterna entre o estado venezuelano de Bolívar e o brasileiro de Roraima.

Segundo informação do jornal El Mundo, datada de 25 de agosto de 2018, “entre 2017 e o que vai de 2018 chegaram ao Brasil algo mais de 127 mil migrantes, mas 69 mil já se foram em busca de outros destinos”, referindo o sítio que o papel do Brasil na crise é secundário porque referem que não é um “destino prioritário” para os venezuelanos.

A presença de venezuelanos no Brasil, especificamente no estado de Roraima, tem sido objecto de uma grande campanha mediática. Na qual organismos como o ACNUR destacam a instalação de campos de refugiados e surgiram personagens que capitalizam o espaço de solidariedade que não foi manifestado pelos brasileiros. É este o caso do “padre Jesús”, cuja ação servindo comida aos venezuelanos tem sido referida pela imprensa.

Os migrantes econômicos encontram-se focalizados em Roraima, o que gerou um conflito jurídico de cada vez que “as autoridades locais criticam que Governo destine mais esforços a receber os venezuelanos do que a cuidar da gente de Roraima, e atribuem aos imigrantes o aumento da criminalidade, uma retórica que alimenta a tensão nas ruas”. O que se traduziu numa solicitação judicial para fechar a fronteira que não vingou e à qual a administração brasileira respondeu assegurando que as Forças Armadas estão à disposição do governo local para garantir a paz nas ruas.

A associação finalmente realizada entre os venezuelanos e a delinquência, ou que a sua presença dificulta que o estado de Roraima atenda devidamente a população brasileira, serviu de caldo de cultura para que se verificassem atos violentos de rejeição aos venezuelanos, despojando-os dos seus haveres quando foram expulsos e queimando os seus bens, em 18 de agosto de 2018.

Um ato muito similar tinha-se produzido no mês de março de 2018, quando “pelo menos 300 pessoas entraram na escola onde estavam a viver os 50 venezuelanos para destruir alguns pertences, deitando fogo a outros e os expulsaram, deixando atrás os seus haveres e alimentos entre os que se encontravam vários pacotes de farinha que foram rasgados e espalhados pelo local”.

Referindo um dos brasileiros entrevistados depois do sucedido que “não aguentamos mais a sua presença (dos venezuelanos), queremos que as autoridades façam algo, há muitos roubos na nossa cidade”.
No quadro desta tensão, o mandatário brasileiro de facto, Michel Temer, prestou declarações à imprensa em 26 de agosto de 2018, referindo que se opõe à possibilidade de que as fronteiras sejam fechadas aos venezuelanos, e recordou que o Brasil é apenas um país de passagem da população emigrante.

Tal como referiu Europa Press: “Temer explicou que 60% dos 127 mil venezuelanos que cruzaram a fronteira já saíram de território brasileiro em direção a outros países, e destacou as ações realizadas pelo governo federal para enviar para outros estados os milhares de venezuelanos que se encontram em Roraima”, referindo finalmente que fizeram chegar a Roraima bens para assegurar a alimentação e os serviços de que necessitam os venezuelanos que se encontram na referida zona.

Chile

De acordo com os resultados do Censo Nacional de 2017, Chile tem uma população de pouco mais de 17 milhões de habitantes. Ao contrário do Brasil, as relações da Revolução Bolivariana com o Chile não superaram, mesmo nos seus melhores momentos, o limiar da cortesia. Desde os conflitos do ano 2002, existe uma população de venezuelanos politicamente identificados como contrários ao governo no Chile, sem que tenhamos uma estimativa da sua dimensão naquela época.

Um dado que resulta de interesse é que a Venezuela figurou, depois de México e Cuba, entre os destinos prediletos dos chilenos que saíram do seu país no quadro da ditadura militar, chegando a estabelecer na Venezuela uma colonia de 80 mil pessoas, a que há que agregar os profissionais que tinham chegado antes com a esperança de trabalhar para as petroleiras.

Segundo uma nota de janeiro deste ano, reside no Chile um total de 30 mil venezuelanos. A Policia de Investigações reportou que em 2017 ingressaram 164 mil 866 cidadãos desse país, um aumento de 90% relativamente a 2016. Segundo o Departamento de Estrangeiros e Migração (DEM) do Ministério do Interior, entre 2005 e 2017 foram outorgados um total de 20 mil 362 permanências definitivas e 111 mil 339 visas temporários a estrangeiros provenientes da Venezuela. O que não elucida com segurança sobre a dimensão real da comunidade já que, segundo a mesma fonte, mais de 56 mil venezuelanos saíram do Chile ou regressaram à Venezuela.

Ao visitar portais dedicados a promover o Chile como destino, alguns deles administrados por venezuelanos, observa-se que mostram o país como uma economia estável, com um sistema de transporte aceitável e um sector terciário amplamente desenvolvido.

Outros sítios da web asseguram que Santiago é a cidade “mais habitável da América Latina depois da capital da Argentina, Buenos Aires. Por seu lado, a revista International Living integrou o Chile no Índice de Qualidade de Vida do ano 2011, colocando o país no lugar 60 entre 192 países e na terceira posição entre países da América do Sul”.

Com estas afirmações e uma presença tão importante na publicidade que recebe, via televisão “pay-per-view” na Venezuela, parece que o Chile é um país que se apresenta como um dos destinos que a população que emigra seleciona.

Visto do Chile, mantém-se a informação de que o país austral se converteu num lugar atraente para a imigração de pessoas provenientes da Argentina, Equador, Colômbia, Bolívia, Uruguai e Venezuela, referindo-se além disso que num recente relatório denominado “Conjuntura Económica en América Latina y el Caribe”, da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT), assinalam que o Chile emergiu como o país em que mais cresceu proporcionalmente a imigração na América Latina.

Neste contexto, desde agosto de 2017, surgiu no Chile a iniciativa de criar um registo nacional de estrangeiros, fixar um catálogo de motivos que impeçam o seu ingresso e um estrito controlo de licenças de trabalho, com o fim de evitar o afluxo de pessoas. Sendo que nesta data, o departamento de Estrangeiros estimava que nos primeiros seis meses daquele ano tinham ingressado no país mais de 44 mil haitianos.

Do mesmo modo, verificou-se um forte incremento de imigração dominicana, colombiana e venezuelana, somando-se à histórica vinda de pessoas de Bolívia e Peru. Isto indicava que no momento Chile contava oficialmente com meio milhão de residentes estrangeiros, cerca de 3% da sua população.

Como medida desta natureza, o presidente do Chile, Sebastián Piñera, anunciou em 9 de abril a criação de um Visto de Responsabilidade Democrática para os venezuelanos que desejem permanecer neste país. Esta medida foi criticada por alguns sectores chilenos que consideraram tratar-se de uma medida discriminatória que evidenciava a pouca solidariedade do governo em relação aos que se deslocavam para o Chile em busca de uma oportunidade.

A este respeito, ao lado desse país próspero que é promovido, existe uma realidade com a qual se deparam os imigrantes que entram num país onde a educação está privatizada, existem diferentes escalões salariais para homens e mulheres, e que não se caracteriza pela abertura para com os estrangeiros.

Um grupo deles nunca consegue ingressar no Chile; assim. Por serem considerados pelas referidas autoridades como migrantes econômicos e não como refugiados ou asilados foram devolvidas 8.425 pessoas que tentaram ingressar no Chile nos primeiros dez meses de 2017. A maior parte dos rejeitados eram colombianos, e o segundo grupo mais numeroso era de venezuelanos, que atingiu um total de 1.838 cidadãos que não puderam ingressar no Chile.

Relativamente às condições daqueles que ingressaram, nem sempre foram as que esperavam. Isto ficou refletido num estudo realizado em 2017 pela Fundación Nuevas Contingencias Sociales (Chile), que determinou que 41% dos migrantes inquiridos declarou ter sofrido discriminação “sem motivo aparente”, com destaque para comentários acerca de que “vêm a tirar-nos o trabalho”, e serem apontados como delinquentes ou pela cor da sua pele.

Por seu lado, os chilenos inquiridos revelaram que 47% pensa que a população imigrante traz “doenças novas ou algumas já erradicadas”, enquanto 35% opina que a população “vem tirar o emprego aos chilenos” e outros 35% aponta que os imigrantes “são sujos e não cuidam do meio ambiente”.

Neste mesmo espírito, cujas características correspondem ao que temos referido como “aporofobia”, devemos incorporar a mais recente postura assumida pelo presidente chileno, que twiteou em 23 de agosto de 2018, que “em matéria de Migração a nossa política é clara: receber aqueles que respeitam as nossas leis e vêm iniciar uma melhor vida contribuindo honestamente. E não deixar entrar ou expulsar aqueles que entram ilegalmente e têm antecedentes criminais ou cometem delito no nosso país”.

Equador

Com 16 milhões de habitantes em apenas uma área de 283 561 km², trata-se do quarto país mais pequeno do subcontinente. A sua economia dolarizada bem como as fluidas relações diplomáticas que até há muito pouco manteve com a Venezuela, fixaram o Equador no imaginário dos emigrantes. De igual forma, o seu governo vinha executando programas de captação de profissionais, principalmente professores, para fortalecer as suas universidades, e era um dos destinos que exigiam menos requisitos para ingressar, permanecer e trabalhar.

Do mesmo modo, no quadro da cooperação que caracterizou as relações que a Revolução Cidadã manteve com a Revolução Bolivariana, no Equador estava vigente um sistema especial para os bolivarianos, denominado Estatuto permanente Equador Venezuela (12 XI) que outorgava um visa de um ano, renovável uma vez, contabilizados desde a sua emissão se o outorgou uma Coordinación Zonal ou se foi outorgado num consulado equatoriano a partir do ingresso do estrangeiro no Equador. Este regime, menos gravoso e destinado a aumentar as relações entre os países, foi acordado pelos então chanceleres Ricardo Patiño e Nicolás Maduro Moros, em 2010.

Segundo o disposto na página web do Ministério do Interior equatoriano, aos sul-americanos não é requerido terem passaporte para entrar no Equador mas apenas apresentar a sua cédula ou documento nacional de identidade. Este regime foi objeto de controvérsias, todas as vezes em que nos últimos meses o governo equatoriano quis agravar as condições de ingresso dos venezuelanos no seu território, ordenando num primeiro momento a apresentação do passaporte, o que foi revogado por um tribunal de Quito por o considerar uma violação dos direitos humanos.

Esta decisão, tornada pública em 25 de agosto de 2018, vai coincidir com a declaração presidencial de que a sua decisão de abandonar a Alianza Bolivariana para los Pueblos de Nuestra América (ALBA) foi motivada pela existência de fluxos migratórios originados na Venezuela, e significa que não se voltará a aplicar o regime de cooperação entre os dois Estados e que aos venezuelanos se exigirá, em lugar do passaporte, a apresentação.

Enquanto estas controvérsias jurídicas ocorriam, as câmaras de televisão centraram-se nas fronteiras com Equador, onde foi reportado que havia venezuelanos encalhados esperando que uma decisão diferente, que lhes seria favorável, fosse adotada. Ao mesmo tempo que na Venezuela se tornou viral um vídeo que documentava um abuso policial cometido contra um venezuelano no Equador.

Peru

A República de Peru é o terceiro maior país da América do Sul. Segundo o último censo, datado de 2016, o país tem 31,77 milhões de habitantes. Com uma história política marcada pela instabilidade e a violência, é um dos países com maior número de emigrantes da região, que foi estimado num estudo do INEI, referido por El Comercio, segundo o qual entre 1990 e 2012 mais de 2 milhões e 500 mil peruanos emigraram do país.

Nesse período, 31,4% dos emigrantes peruanos viveram nos Estados Unidos, 15,4% em Espanha, 14,3% na Argentina, 10,2% em Itália, 9,5% no Chile, 4,1% no Japão e 3,7% na Venezuela; 11,5% em outros países.

Segundo títulos do mesmo portal, mais de 100 mil pessoas pediram refúgio no Peru, e praticamente todas elas provêm da Venezuela. Devendo destacar-se que no conteúdo da nota se precisa que nem todas essas solicitações são de refúgio em sentido jurídico, mas que muitas correspondem a migrantes econômicos. A situação em que se encontram os venezuelanos no Peru tem sido avaliada – inclusivamente pela Defensoría del Pueblo num comunicado emitido a 25 de agosto de 2018 – como contrária aos direitos humanos, na medida em que os nossos compatriotas são discriminados e vítimas de atos xenofóbicos.

Ao analisar as causas pelas quais a emigração venezuelana se dirigiu para o Peru, parece importante recordar que, em setembro de 2017, Lima ofereceu aos profissionais venezuelanos outorgar-lhes uma licença temporária de permanência (PTP); agora serão também reconhecidos os seus títulos universitários sem necessidade de trâmites legais, o que constitui um evidente estímulo para a população universitária que espera obter maiores rendimentos econômicos.

Ao mesmo tempo que caía o governo de Pedro Pablo Kuczynski Godard, o tratamento mediático que tem vindo a ser dado à Venezuela no Peru é sumamente contrastante pois, na medida em que se insiste numa “crise humanitária” e política provocada pelo governo de Caracas, se associa abertamente a comunidade venezuelana que chega ao país com a delinquência. Sem dúvida que o ponto de ebulição disto se deu em Agosto do presente ano, quando foram detidos em Lima membros do grupo musical “El Tren de Aragua”.

Para estabelecer essa associação, a imprensa não poupa em historias fantasiosas tais como afirmar que “Nicolás Maduro estaria a incentivar a criminalidade venezuelana no Peru”, segundo a elucubração de Sabrina Martín em 31 de julho de 2018 para o meio Panam Post, ou as declarações de Mauro Medina, ministro do Interior peruano que em 8 de agosto afirmou que, através da solidariedade, “se infiltram por aí algumas pessoas que estão vinculadas a delitos”. Podendo ver-se como a imprensa recolhia já desde o início do ano opiniões que sustentam que “a crise do Peru piorou por causa dos venezuelanos”.

Neste contexto, o governo de Martín Vizcarra deu a conhecer em 25 de agosto de 2018 que exigiria passaporte aos venezolanos que chegam à sua fronteira, só exceptuando desse requisito casos que considere de caráter humanitário como crianças que estejam acompanhadas por seus pais, mulheres grávidas ou idosos. Justificando a medida com que está a receber uma massiva imigração que chega diariamente da Venezuela, com uma média de 3 mil chegadas diárias pelo posto fronteiriço de Tumbes, na fronteira com Equador.

Estes movimentos que agora fecham as portas contrastam com os actos de promoção do Peru, em especial como destino para crianças não acompanhadas como se deu durante o ano de 2017, de que recordaremos a denúncia realizada no sábado 16 de Dezembro por funcionários do Servicio Autónomo de Identificación, Migración y Extranjería (SAIME) e o Fiscal 1° do estado Vargas, de terem conseguido deter uma operação que pretendia extrair 130 crianças venezuelanas desde Maquieta com destino ao Aeroporto Internacional Jorge Chávez de Lima.

O corredor humanitário

Enquanto Equador e Peru adotam medidas que restringem a entrada e permanência de venezuelanos no seu território, puseram em marcha um “corredor humanitário” para acelerar a deslocação de venezuelanos que se dirigiam para o Peru.
Esta ação foi empreendida uma vez que foram publicadas as iniciativas tendentes a limitar a presença venezuelana no Equador e antes de serem endurecidos, horas depois, os requisitos no Peru, o que expõe os venezuelanos em trânsito a uma situação de uma gravidade sem precedentes, pois encontram-se de forma ilegal esperando chegar a outro Estado, no qual muitos não poderão tampouco ingressar.

Para que serve isto?

Uma leitura apressada desta situação poderia fazer-nos concluir que a população que ingressa é demasiado numerosa, o que não corresponde com os imigrantes a que estes países aspiravam quando tomaram medidas para facilitar o ingresso aos venezuelanos. Para isso serve-nos a leitura de Adela Cortina.

Poderíamos também observar que houve mudanças políticas nos países que modificaram a sua atitude, ainda que o Brasil nunca se tenha caracterizado por nos dar calorosas boas-vindas.

Contudo, considero que isto obviaria coisas especialmente relevantes, algumas das quais foram postas a claro por Serge Halimi, Dominique Vidal e Henri Male no ensaio “A opinião trabalha-se. Os meios de comunicação e as guerras “justas” de Kosovo, Afeganistão e Iraque”. Ali, quando analisam como se justificou a guerra de Kosovo, os autores afirmam que um dos recursos para demonstrar a necessidade de uma guerra foi a existência de deslocados desesperados.

Assim assinalam que para convencer o mundo da necessidade da guerra primeiro “mostraram uma mulher, um homem, um menino branco. Mostraram uma pequena menina de cinco anos que sofria. Na realidade, não era a cor da pele nem as lágrimas o que importava, mas sim captar o desespero. Necessitavam de projetar gente deportada sofrendo diante de nós, porque nós somos muito bondosos”.

Reações da Venezuela

A sorte de uma pessoa ao estabelecer-se num país estrangeiro dependerá de muitos factores. Por isso é particularmente perigoso fazer generalizações nesta matéria. Certamente, em todos estes países existem venezuelanos – geralmente com recursos econômicos, domínio de línguas estrangeiras e alta graduação profissional – que terão uma vida próspera, alheia a estes males que enfrentam aqueles que de forma extremadamente precária chegam a países com a esperança que a televisão lhes oferece ou o exemplo remoto de um conhecido a quem as coisas correram muito bem.

Existirão outros que, inclusivamente se este não é o seu caso e se deparam com trabalhos precários, sem cobertura hospitalar e algum grau de irregularidade, se sentirão mais tranquilos ou felizes do que estando na Venezuela, pois para eles o país tornou-se numa espécie de inferno. Relativamente a eles, as obrigações nacionais esgotam-se no estabelecido no quadro da proteção consular, onde vemos por exemplo que Caracas anunciou que está a remeter os passaportes que estavam em atraso.

Quanto ao resto, constituído principalmente por migrantes econômicos e vítimas desta guerra econômica que destruiu a capacidade aquisitiva do salario, arrastando com ela a auto-estima de muitos, o Governo Bolivariano elaborou o Plano de Regresso à Pátria para chamar a que regressem aqueles que saíram.

De igual forma, observa-se como o Executivo venezuelano está disposto a proteger as nossas populações emigrantes quando, pelo menos no caso dos que o solicitaram em Trinidad y Tobago e agora desde o Peru, tomou as medidas necessárias para que retornem a Venezuela.

Fonte:http://misionverdad.com/opinion/venezolanos-inmigrantes-capitulo-latinoamerica-mitos-propaganda-y-realidad-y-ii