Insanidade e decadência do imperialismo (Parte 2)

imagempor Daniel Vaz de Carvalho*

1 – A decadência econômica,social e militar

Os EUA não têm política industrial, nem de investimento público além da área militar. Tudo está nas mãos e em conformidade com os interesses da oligarquia, sendo posta em prática uma política financeira e monetária derivada das teses monetaristas.

Esta situação conduziu a uma dívida federal superior a 22 trilhões de dólares (105% do PIB), tendo crescido 1 trilhão por ano desde há mais de uma década, valor que se acelerou com Trump para 1,5 trilhões num ano. Sem incluir juros, se os EUA pagassem 100 milhões por dia, levariam 600 anos a pagar aquela dívida. A dívida total, incluindo empresas e particulares, é de 73,6 trilhões de dólares (224 mil dólares por habitante, incluindo crianças). O déficit comercial atinge 870 bilhões de dólares de dólares. O PIB encontra-se inflacionado com capital fictício, resultante das dívidas, dos produtos derivados, da especulação com ações e da apreciação do dólar.

Embora a UE siga obedientemente as decisões dos EUA quanto a política externa, alguma contestação existe no campo econômico. É o caso dos equipamentos da chinesa Huawei que a Alemanha e o Reino Unido se têm recusado a proibir. É o caso da Amazon obrigada ao pagamento de multas no valor de 5 bilhões de dólares na UE, por abuso de posição dominante. A UBER foi proibida em vários países da UE e noutros sujeita a regulamentações que lhe retiram parte da vantagem relativamente aos táxis tradicionais. Também a tentativa de boicotar o fornecimento de gás natural liquefeito pela Rússia, com o abandono pela Alemanha do projeto Nord Stream 2, adotando o fornecimentos dos EUA, teve de Berlim uma resposta negativa. [1]

Em termos sociais os EUA exibem um quadro disfuncional: apesar das imensas fortunas da oligarquia (os 0,1%) mais de 37 milhões de pessoas alimentam-se através de food stamps; quase 2 milhões de pessoas estão presas; 40 milhões sofrem de distúrbios psicológicos; a dependência de drogas tornou-se a principal causa de morte antes dos 50 anos.

Há duas décadas, poucos duvidavam que o mundo inteiro não ficasse ligado à globalização liderada pelos EUA. A recente reunião em Pequim sobre a “Nova Rota da Seda”, apoiada por 126 países e territórios, tornou evidente que um outro caminho está a ser construído. Trata-se de um imenso espaço económico eurasiático, para o qual os EUA não têm respostas, exceto as militares.

Em termos de venda de armamento, a Rússia mostra-se um sério competidor com vendas para países antes considerados aliados dos EUA como a Turquia ou a Índia. Contrariamente aos desejos dos EUA os países europeus da OTAN têm aumentado os seus gastos militares muito lentamente. Além disto, países como a Rússia, China, Irã desenvolveram os seus sistemas militares de forma acelerada tendo em vista contrariar os sistemas dos EUA, designadamente as forças navais. A Rússia dispõe inclusivamente misseis que poderiam atacar o território dos EUA pelo Sul, algo para o qual os EUA não dispõem neste momento de defesa.

2 – Os “valores” e a “voz do ocidente” entregues ao imperialismo

Os ideais da democracia, do socialismo e do comunismo são fruto da civilização ocidental, resultado de um processo que nasce (ou renasce) no Renascimento, prossegue com os ideais da Revolução Francesa nascidos no século XVIII, culmina no marxismo.

Estes ideais traduziram-se na luta das classes populares contra as oligarquias aristocráticas ou capitalistas. Aos ideais de paz, soberania e desenvolvimento independente, opôs-se o imperialismo e o neocolonialismo. Foi assim que, nomeadamente, Lumumba, Sukarno e Allende foram substituídos por Mobuto, Suharto e Pinochet.

Na África, conspirações e golpes transformaram um continente imensamente rico em recursos na zona mais pobre do planeta, levando à destruição países pacíficos e prósperos como a Líbia, Síria, etc.

Afirmou o ex-presidente Jimmy Carter que “os EUA são a nação mais belicosa da História”. “Os EUA apenas tiveram 16 anos de paz nos 242 anos da sua História”. “Os EUA desperdiçaram 3 trilhões de dólares em gastos militares. As intermináveis guerras norte-americanas impediram investimentos adequados em infraestruturas e produção industrial. Esta a razão pela qual a China ultrapassou os EUA”. [2]

Os EUA com 5% da população mundial assumem 45% das despesas militares mundiais, têm mais de 700 bases militares no exterior. As suas guerras, conspirações, golpes de Estado patrocinados, levaram à morte 20 milhões de pessoas desde o fim da II Guerra Mundial. Estas guerras e processos de desestabilização são, como disse Martin Luther King referindo-se à guerra do Vietnam, “um sintoma de uma doença do espírito americano cujos pilares são o racismo, o materialismo e o militarismo”. [3]

Um ex-especialista em direitos humanos e direito da ONU, Alfred de Zayas, criticou duramente a reportagem de um órgão internacional sobre a Venezuela, chamando-a de “não profissional”, politizada e injustamente inclinada a favor da oposição de direita do país: “Estamos mergulhados num oceano de mentiras” “Quando fui à Venezuela, estava predeterminado a encontrar uma crise humanitária”. “Eu andei pelas ruas, falei com pessoas de todos os tipos, e esse não foi o caso. Isso significa que eu fui manipulado, eu menti e arrependo-me disso. [4]

A visão da Rússia acerca das ações dos EUA veio pela porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, em resposta à declaração de que os EUA estavam a considerar opções militares na Venezuela. [5]

“Washington esconde o seu desdém pelas bases da legalidade internacional de há décadas, atrás da noção opaca de uma ordem mundial baseada em regras que impõe em todos os lugares.

“Em relação à ajuda humanitária à Venezuela, (…) gostaria de salientar que a melhor maneira de ajudar o povo da Venezuela é levantar as sanções ilegais e unilaterais que visam principalmente o povo da Venezuela. É isso que Washington busca, certificar-se que todo os venezuelanos sofrem, alterando a sua posição política. Washington testou essas táticas em muitas regiões do mundo.”

“(…) O efeito geral das sanções, segundo a Venezuela, é estimado em mais de 110 mil milhões de dólares. Se o pacote de medidas que é atualmente usado contra a Venezuela fosse aplicado a qualquer país chamado ocidental desenvolvido, sem falar em países em desenvolvimento, o país alvo entraria em colapso.”

O desprezo que os EUA mostram pelas resoluções da ONU está patente ao não cumprirem a resolução da Assembleia Geral da ONU que pede o fim do embargo contra Cuba ou nas resoluções sobre ações de Israel nos territórios palestinos.

A nova “voz do ocidente” está patente na parcialidade da desinformação relativa à Venezuela. Televisões passaram imagens de 2014, como se fossem atuais. Um “jornalista” relatou uma manifestação frente à embaixada da Venezuela em Washington, (um participante esclareceu ser o único venezuelano) referindo ser contra o “grupo que ocupa a embaixada em nome de Maduro”. Tristemente ridículo.

3 – O mundo perante os dilemas do imperialismo

Os dirigentes dos EUA perderam a cabeça porque veem ameaçados os interesses dos seus oligarcas, o domínio do dólar e a sua superioridade militar.

Os EUA estão perante um dilema para manter o “excepcionalismo” que lhe permitiria decidir como os povos devem ser governados e as economias geridas: ou concretizam as ameaças contra os que não seguem políticas que obtêm o seu “nihil obstat”, liquidando todo o poder que se lhe oponha ou procuram chegar a consensos, designadamente na base da Carta da ONU.

A questão é que quando se fazem escolhas tem de se aceitar as consequências. A via que os neoconservadores/neofascistas propalam conduz à confrontação direta com a Rússia. Isto é, estão comprando uma guerra com a Rússia e por arrasto com a China e não só.

Tal está a ser feito através de várias formas de ingerência e agressão a países terceiros em que os interesses russos ou chineses podem ser seriamente lesados.

O caso venezuelano tem para a Rússia mais um aspecto, por assim dizer, sistêmico do que ameaça direta. Porém, uma derrota da Venezuela, daria toda a força para os belicistas para avançarem contra Cuba, Irã, Coreia do Norte.

No Irão estão envolvidos interesses diretos da Rússia junto às suas fronteiras, além de se voltar contra as estratégias econômicas e de segurança de China. Seria uma guerra que alastraria de imediato a todo o Médio Oriente e Afeganistão, inviabilizaria a rota do estreito de Ormuz com gravíssimas consequências para a economia mundial. A Europa ver-se-ia desde logo envolvida, caso não garantisse de imediato a neutralidade e inoperacionalidade das bases EUA/OTAN nos seus territórios. A fragilidade da situação dos países europeus conduziria a uma destruição de proporções inimagináveis.

As novas armas russas tornam o aparelho naval e o próprio território dos EUA, altamente vulnerável. Neste momento, um ataque à Rússia contaria com uma resposta que poderia ser devastadora para os EUA e aliados. O novo armamento russo é em muitos casos superior aos EUA. Além disto foram desenvolvidas capacidades de “contra medidas eletrônicas” que já demonstraram poder paralisar os sistemas eletrônicos de navios de guerra e bombardeiros dos EUA. [6]

O papel da UE é neste cenário de uma irrelevância total. Os oligopólios dos EUA na comunicação comandam sem entraves nem critérios deontológicos os processos de intoxicação. Muito sintomático vai ser a posição dos países da UE perante o conflito que os EUA preparam contra o Irão.

A hipótese de um acordo com a Rússia corresponde ao abandono do unilateralismo. As consequências seriam o fim do dólar como moeda de referência – o que já vai acontecendo – arrastando o euro na sua queda e a um movimento centrifugo dos países – também já iniciado – em direção a relações preferenciais com a Rússia e com a China.

Será que os EUA o podem permitir? Altamente improvável. Seria o fim do dólar todo poderoso e o sistema monopolista transnacional, sem o apoio político e militar dos EUA, ficaria sujeito a uma competição para que não está preparado.

A queda do dólar levaria a um abaixamento brutal dos padrões de vida dos EUA (com 5% da população mundial, consome 20 a 25% dos recursos mundiais). Os EUA ver-se-iam sem recursos par manter o seu complexo militar industrial e aparelho militar no exterior. Dificilmente poderiam também manter o financiamento aos seus “Guaidós” (nova versão dos Quisling nazifascistas), golpes de Estado e contrarrevoluções.

Outras opções não passariam de acordos transitórios, que as realidades dos interesses prevalecentes iriam anular.

Poderão os EUA deixar passar o tempo? Dificilmente, o tempo está a jogar contra os seus objetivos. Os seus aliados principais estão em estagnação econômica, com fortes movimentos populares contra a guerra e de contestação às políticas seguidas. Vários dos seus aliados são dirigidos por gente corrupta e ignara, que se mantém pela força, pela mentira e corrupção do dólar, são Estados disfuncionais (como a Ucrânia e outros na América Latina) nos quais a população à primeira oportunidade enveredaria pela via revolucionária.

Os EUA, para além das vozes silenciadas de muitos dos seus mais distintos cidadãos – que este site tem dado a conhecer – vivem hoje entre a insanidade de Trump e a de Hillary Clinton, ambas sofrendo de esquizofrenia e esquizomania, acreditando fanaticamente nas falsidades construidas e propaladas pela sua clientela.

O mundo encontra-se à beira de uma catástrofe, dada a insanidade do centro imperialista. A questão é: que diálogo pode haver quando uma das partes se acha no direito de intervir onde quer que seja quando a sua ortodoxia é minimamente posta em causa, camuflando isso com a defesa da democracia e dos direitos humanos. A luta dos povos pela verdade e pela paz é uma prioridade.

1 – www.rt.com/news/455723-huawei-uber-amazon-eu-trump/ 2 – www.presstv.com/… 3 – Bruno Guigue, La chute de l’aigle est proche www.legrandsoir.info/la-chute-de-l-aigle-est-proche.html 4 – Norton, Ex-UN Human Rights Expert Blasts ‘Manipulation’ on Venezuela: ‘We Are Swimming in an Ocean of Lies’, thegrayzone.com/… expert-blasts-manipulation-on-venezuela-we-are-swimming-in-an-ocean-of-lies/amp/ 5 – www.informationclearinghouse.info/51432.htm 6 – “Losing American Supremacy. The myopia os American Strategic planning”, Ed. Clarity Press, 2018, resenha em resistir.info/v_carvalho/martyanov_resenha_2.html

A primeira parte deste artigo encontra-se em resistir.info/v_carvalho/insanidade_1.html

[*] Autor de Amanhecer em Porto Desejado , uma história de amor, união e resistência no cenário da América do Sul, www.facebook.com/EmporiumEditora/videos/1974035789374330/ e de O triunfo de Diana e outros Contos,

https://www.resistir.info/v_carvalho/insanidade_2.html