Maria Alice Braz

Na madrugada da última sexta-feira, no dia 25 de maio de 2012, faleceu em Araruama a valorosa brasileira Maria Alice. Ela morreu aos setenta e sete anos de infarto no hospital público da cidade, na Unidade de Pronto Atendimento de Araruama – UPA, e seu enterro foi realizado no Cemitério Jardim da Saudade, no Rio de Janeiro, no final da tarde desta sexta. A bandeira do Brasil cobriu seu caixão. As falações revolucionárias não religiosas comoveram os presentes. Foram homenagens mais do que corretas.

A bonita nordestina Maria Alice, de belos traços ainda presentes, nasceu em 19 de março de 1935, no interior da Paraíba, no município de Sapé, terra do grande poeta Augusto dos Anjos. Aos dezenove anos, tentando melhorar de vida veio para a cidade do Rio de Janeiro, isto lá pelos idos de 1955. Era mais uma retirante das secas do Nordeste. Ainda muito jovem, em sua cidade natal, trabalhou no campo plantando e colhendo feijão, mandioca e milho. Na região urbana foi operária tecelã na fábrica de tecidos Tibiri.

Ela morou inicialmente em Vicente Carvalho e a seguir em bairros adjacentes, região localizada no subúrbio do Rio de Janeiro. Nessa localidade conheceu o cativante metalúrgico Sebastião Braz, companheiro de toda vida, união de quase sessenta anos, com quem teve quatro filhos: Olinda, já falecida, Iolanda, Marcel e Marcílio. O amor, a cumplicidade e o companheirismo do casal eram tanto, sempre juntos, que era difícil estar com apenas um dos dois. Os dois na realidade pareciam um só.

Maria Alice, ao lado de seu companheiro Sebastião Braz, participou das lutas contra a ditadura militar. Ela lutou bravamente, enfrentando as forças golpistas que derrubaram o governo constitucional de João Goulart, no dia 31 de março de 1964. Ela era uma militante comunista autêntica. Cidadã integra que jamais, em tempo algum, abandonou suas ideias revolucionárias. Lutou, até os momentos finais, pela construção de uma sociedade justa, fraterna, igualitária, libertária e solidária.

Maria Alice se desdobrou como mãe de quatro filhos, quando passou a ser provedora do lar, durante o período em que Sebastião Braz, também comunista, com marcante atuação sindical, foi preso pelo regime militar. Na quase clandestinidade em que viveu, nunca perdeu a dimensão humana de suas lutas, amparando e dando apoio aos que enfrentavam a brutalidade do regime opressor.

Muitos revolucionários de então receberam apoio e guarida em seu modesto lar. Maria Alice teve atuação destacada, durante a ditadura militar, quando abriu as portas de sua casa carinhosamente, corajosamente e conscientemente para acolher os importantes líderes guerrilheiros Stuart Angel e Carlos Lamarca.

Em 1975, participou da instalação do Núcleo Rio de Janeiro do Movimento Feminino pela Anistia, o qual era dirigido por Regina Von der Weid. Foi ao lado do professor Moraes, Clea Moraes. Cecília Coimbra, Flora Abreu e outras importantes lideranças políticas que, no ano de 1985, colaborou na criação do Grupo Tortura Nunca Mais. Também, teve atuação marcante na busca dos restos mortais dos desaparecidos políticos da ditadura militar.

O Brasil chora a perda inesperada de tão querida camarada. Estamos mergulhados numa imensa tristeza. A perda da querida Maria Alice é uma dor que irá doer por muito tempo, até virar uma doce e sublime saudade. Ela era alguém que brasileiros politizados recorriam para falar das lutas comunistas, dos enfrentamentos contra os poderosos donos do latifúndio, do sistema financeiro, da mídia e do congresso, e também para discutir estratégias de resistências às alucinadas e opressoras mensagens religiosas.

Maria Alice disse um não rotundo ao ópio das religiões e viveu como ateia convicta, desenvolvendo atuação caridosa, fraterna e solidária a todos que dela se aproximavam. Era um ser humano muito avançado. Ela estava sempre na frente, progressista naturalmente, revolucionária por natureza. Nos seus últimos momentos, quando dizia insistentemente que estava morrendo, em nenhum instante titubeou ou renegou seu ateísmo e o sonho de um mundo justo, onde fraternidade, igualdade e liberdade vingarão os humilhados e esquecidos pobres.

Maria Alice foi um exemplo de mulher guerreira, alcançando méritos semelhantes aos reconhecidos a famosas mulheres. Ela era rebelde, questionadora e revolucionária. Este maravilhoso ser humano deve ser lembrado e reconhecido pelas novas gerações.

Em Araruama, cidade que viveu seus últimos anos, já surge um Movimento encabeçado, principalmente, pela Associação de Moradores da Pontinha (AMOP), para que se crie o Centro de Memória Maria Alice. Inicialmente, caberia dar o nome de Maria Alice a um logradouro público da cidade. Outras atividades a seguir viriam, justificando assim o Memorial, cuja finalidade será identificar, coletar, tratar, preservar e disponibilizar para o público em geral a documentação e registros gerados sobre a heroica vida de Maria Alice.

Maria Alice! Viva Maria Alice!

Camarada Maria Alice!

Presente! Sempre Presente!