Por um feriado no Dia da Consciência Negra

Partido Comunista Brasileiro – Curitiba e Região Metropolitana

A cidade de Curitiba é a capital mais negra de todo o sul do país. De acordo com o IBGE, 24% da população curitibana se autodeclara negra, enquanto no estado do Paraná são 34% da população. Partindo desses números e a realidade vivenciada, nos deparamos com todos os esforços de apagamento e exclusão da população negra, que remontam desde os primórdios de nossa história.

Foram negras e negros que construíram essa cidade e seus arredores, através do trabalho escravo a que foram forçados pelos colonizadores portugueses, desde o porto de Paranaguá até a cidade de Curitiba, passando por aquela que foi, durante muitas décadas o seu único acesso para escoar a produção de mate e café, a estrada da Graciosa, na construção de igrejas, como a inacabada Igreja de São Francisco de Paula (atuais Ruínas de São Francisco, a Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos de São Benedito, e, também a Rua das Flores (hoje o Calçadão da XV) importante rua comercial de Curitiba. A autoria dessas e diversas outras obras realizadas pela população negra de Curitiba foram sistematicamente apagadas de nossa história, através de políticas e discursos eugenistas que negam até hoje a participação da população negra na formação sociocultural de Curitiba.

A sistematização eugenista pode ser constatada em documentos oficiais, como o primeiro e segundo Código de Posturas de Curitiba (1895 e 1919) em que se dividia a cidade em zonas habitacionais, onde o centro era exclusivamente destinado às famílias mais nobres e residenciais mais simples, de madeira, eram proibidas. Ou seja, a população negra, ex-escrava e recém liberta sem qualquer reparo pelos séculos de servidão a que foram forçados, eram empurrados para as margens da cidade, os únicos locais onde poderiam habitar com as condições em que se encontravam. E estas zonas marginalizadas eram ignoradas pelo poder público, enquanto as áreas centrais, habitadas por famílias de alta renda, recebiam os maiores investimentos públicos em saúde, cultura, educação, segurança e infra estruturas, o que aumentou ainda mais seu valor e as tornou inacessíveis à população preta e pobre. Muito parecido com o que vivemos atualmente, não?

Passam-se os anos e nós temos, ainda hoje, um prefeito que tem nojo de pobre, que enfeita muito o centro da cidade e seus pontos turísticos, mas que encarece os custos de vida, principalmente do transporte público (com o qual tem íntimas relações com os donos das empresas de transporte) e que, nos atos de resistência da população jovem (pobre e, em grande parte, negra) ao ocuparem os locais negados à eles para seu lazer respondem com a perseguição e a repressão da juventude negra e periférica.

Ainda traçando esse paralelo temporal, que na verdade pode ser lido como uma linha histórica contínua, foi na cidade de Curitiba que, em fevereiro de 2022, ao pedir justiça e lamentar a morte de mais um irmão negro, Moïse Kabagambe, no Rio de Janeiro, diversos militantes do movimento negro, das diversas organizações, coletivos e partidos, se uniram no Largo da Ordem em protesto, pedindo justiça e o fim das mortes e agressões a população negra brasileira. Durante o ato, que ocorria em frente a um local histórico citado anteriormente nesse texto, a Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, nós fomos hostilizados por alguns fiéis que lá estavam e, na sequência pudemos adentrar nessa igreja, com a permissão do padre presente, para falar com o restante dos fiéis que ali permaneciam e os eclesiásticos sobre a nossa dor e a nossa luta. Este episódio, que ocorreu de maneira ordeira, pacífica e permitida pelo próprio reverendo, foi imediatamente condenado pela mídia, direita, extrema direita e até setores da esquerda (como o próprio presidente Lula) como uma invasão! Uma grande mentira foi espalhada e, a partir dela, de forma odiosa o movimento negro de Curitiba foi duramente atacado, principalmente na perseguição a um ex-vereador (hoje deputado estadual) que estava presente, Renato Freitas, bem como todes demais presentes.

Feitas estas constatações, em um breve apanhado histórico, é que fundamentamos nossa compreensão sobre a importância de fortalecer e unificar o movimento negro e a luta antirracista em nossa cidade. E, como pauta unificadora de todo movimento negro comprometido com a superação do racismo é que conclamamos a imediata luta pelo decreto do feriado no Dia da Consciência Negra, em 20 de novembro.

Nós, Comunistas Brasileiros(as), fazemos a leitura de que o racismo é parte da estrutura capitalista vigente em nosso país, e essa compreensão não é uma mera palavra agitativa. Trata-se da compreensão de que o capitalismo, através de sua fase colonialista, só pôde ser implementado no Brasil através do recorte racial que condicionou pessoas negras e populações originárias a condição de “não-humanos”, com “embasamentos científicos”, como o Darwinismo Social, utilizando a ciência para tentarem justificar as barbáries do regime escravagista. Afinal, para conciliar a profunda contradição entre a luta na Europa, por direitos a liberdade, igualdade e fraternidade entre todos os homens e a subjugação de populações inteiras à escravidão, só mesmo convencendo o mundo de que estes escravizados não eram humanos. Dessa formação social brasileira para a atual constituição que temos hoje, é nítido como o racismo continua a ser peça fundamental para a manutenção do capitalismo e as exigências da burguesia. Pois, é a população negra e periférica que segue sendo a mais pobre em nosso país, o maior número de vítimas dos assassinatos por parte dos Aparelhos de Repressão do Estado, a maioria esmagadora de encarcerados(as) e, ainda, o maior número de vítimas durante a pandemia, o que explicita a grande desigualdade social, denunciada há anos pelo movimento negro.

E como a instituição de um feriado no Dia da Consciência Negra pode contribuir no fortalecimento e unificação da luta antirracista? O dia 20 de novembro marca o Dia da Consciência Negra, uma ocasião que relembra o falecimento de Zumbi dos Palmares, grande líder e símbolo das resistências quilombolas no Brasil. Esse dia simboliza o resultado de décadas de intensa luta promovida pelos Movimentos Negros que, ao contrário da celebração do 13 de Maio, historicamente promovida pelos governos burgueses, que erroneamente retrataram a princesa Isabel como redentora da população negra, a abolição da escravidão no Brasil não foi um presente da monarquia em declínio, mas o resultado de inúmeras batalhas e revoltas populares que, ao long da nossa história, contribuíram para o fim do sistema escravocrata.

E essa história de resistência negra é repleta de experiências valiosas que devem ser constantemente lembradas. Isso é essencial para que as atuais e futuras gerações possam se apropriar dos acúmulos dessas lutas e não caiam nas falsificações ideológicas impostas pela classe dominante. O desconhecimento ou a distorção da história do povo negro é um instrumento ideológico útil para a perpetuação da estrutura racista e para confundir aqueles que lutam contra o racismo e o capitalismo. Se a história de negras e negros está intimamente ligada à história das lutas sociais no Brasil, então ,colocar a questão racial no centro dos debates e das estratégias de luta é dever de todas as organizações políticas, revolucionárias e mesmo do campo progressista e democrático, compreendendo essa luta como parte fundamental das lutas da classe trabalhadora como um todo.
E é, nesse sentido, que defendemos a reivindicação de um Feriado do Dia da Consciência Negra como pauta imediata central, capaz de unificar nossos esforços e catalisar a luta pela real emancipação da população negra trabalhadora brasileira.

Pelo Poder Popular, no rumo do Socialismo.
Pretos e Vermelhos, venceremos!

Partido Comunista Brasileiro – Curitiba e RMC