O 8 de janeiro um ano depois
No dia 8 de janeiro de 2023, uma semana após a posse de Lula à Presidência da República, a Praça dos Três Poderes foi palco de uma intentona golpista, numa caricata imitação da invasão do Capitólio dos Estados Unidos por apoiadores de Donald Trump no ano de 2021. Por meio da agitação fascista pela intervenção militar e da depredação do patrimônio público e histórico do país, tal movimento tentou desestabilizar o governo recém empossado e deslegitimar o processo eleitoral de 2022. Tudo isso com o financiamento da burguesia – em especial a do agronegócio – e com a leniência das forças de segurança, policiais e militares, que assistiram à invasão das sedes dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário complacentes e de sorriso no rosto.
Tal conivência não pode ser encarada como mero “equívoco” ou “descuido” das forças de segurança, como quis fazer parecer na ocasião o atual Ministro da Defesa, José Múcio, buscando minimizar, assim, a responsabilidade do alto escalão militar. É preciso lembrar que tal ministro chegou a declarar em entrevista à imprensa que Bolsonaro era um “democrata” e comparou a intentona golpista a um “piquenique”. No entanto, mesmo depois disso, Múcio continua no governo, cumprindo o papel de porta-voz dos desígnios do “Partido Fardado”.
É necessário lembrar que a intentona de 8 de janeiro não foi um raio em céu azul. Ela foi antecedida por meses de preparo das hostes fascistas, que fizeram acampamentos de vigília em frente aos quartéis militares pedindo “intervenção federal”, que bloquearam diversas rodovias importantes, que atacaram a sede da Polícia Federal e que chegaram até mesmo a planejar um atentado terrorista com explosivos em Brasília. Tudo isso ainda no final de 2022, como um claro prenúncio do que estaria por vir, demonstrando mais uma vez a apatia conivente das forças de segurança do Estado e o apoio financeiro de frações da burguesia para a manutenção dos acampamentos bolsonaristas por tanto tempo.
O alto comando militar não chegou a emitir ordens aos seus efetivos para que o golpe fosse de fato consumado naquele momento, mas a permissividade consciente das forças de segurança do Estado para o avanço da movimentação golpista serviu como uma mostra de poder frente ao governo recém empossado de modo a tentar intimidá-lo, caso pense em enfrentar a burocracia militar legada da ditadura e seus fiadores da burguesia. Em vez de dar o controle da situação para as Forças Armadas por meio de uma Garantia da Lei e da Ordem (GLO), Lula afastou o comandante da Polícia Militar (PM) do Distrito Federal (DF) e solicitou que Flávio Dino supervisionasse a prisão dos golpistas. Com isso, foi possível desarticular a movimentação golpista da direita naquele momento.
A partir disso, começou, então, um moroso e inefetivo processo de responsabilização aos envolvidos no ato golpista, em que até hoje só foram punidos alguns poucos elementos depredadores, enquanto os “cabeças” do movimento, os financiadores e os articuladores, sejam da burguesia, sejam das Forças Armadas, não foram sequer indiciados e seguem impunes. Recentemente, a Justiça Militar sugeriu que todos os militares investigados não teriam qualquer responsabilidade criminal, inocentando-os. Além disso, segue em tramitação no Senado o projeto de lei de autoria do general Hamilton Mourão que prevê a anistia aos golpistas do 8 de janeiro (PL 5064/23).
Ao invés de aproveitar o momento propício após a intentona, com o refluxo do movimento golpista, para avançar numa agenda reformulação das Forças Armadas e das estruturas do poder militar no país, expurgando seus elementos deletérios, eliminando os entulhos da ditadura de 1964 e suplantando em definitivo a doutrina de “Segurança Nacional” e sua submissão ao imperialismo estadunidense, o governo Lula opta por uma política de concessões aos comandantes militares. Basta lembrar que José Múcio segue no Ministério da Defesa, que o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), herança da ditadura que ressurgiu com Temer, foi mantido, e que o Exército, depois de um ano de suspensão, volta a controlar a emissão de autorizações para colecionadores de armas, atiradores desportivos e caçadores (CACs).
Um ano depois da intentona fascista de 8 de janeiro, as forças governistas, em conjunto com o Judiciário e alguns setores da direita, articularam um amplo ato em defesa da democracia burguesa, das instituições da República e pelo respeito aos resultados eleitorais, sob o mote “democracia inabalável”. Buscam, na prática, isolar os setores bolsonaristas, comprometidos com o projeto fascista, sem atacar, no entanto, as reais causas do crescimento do fascismo no Brasil.
Os limites dessa política conciliatória são claros: representa um rebaixamento político da social-democracia, que cada vez mais se conforma a aplicar e aprimorar um projeto burguês de desenvolvimento, sem contestar as bases do capitalismo brasileiro ou da autocracia burguesa. Essa postura não resulta em nenhum avanço político para a classe trabalhadora, seja em termos de liberdades democráticas, seja em termos de ampliação de seus direitos, mas antes resulta em seu contrário: cria um terreno fértil para uma nova ofensiva do fascismo, com a insatisfação crescente de setores da classe trabalhadora dado o fracasso das políticas neoliberais e com desmobilização e despolitização promovida durante anos pelos governos petistas.
Cabe, portanto, aos jovens comunistas tomar as ruas e continuar a campanha contra o pacto de esquecimento e pela punição de todos os golpistas, incluindo Bolsonaro, seus comparsas militares e a burguesia fiadora do golpe. Devemos pautar, além disso, reivindicações fundamentais para a classe trabalhadora – como o fim da austeridade fiscal, a reversão das privatizações e a revogação completa das contra-reformas trabalhista, da previdência e do ensino médio – no sentido da construção do Poder Popular, pois só este é capaz de derrotar de fato o fascismo e de construir o socialismo.
Iremos, pois, às ruas não em defesa do Estado burguês e de suas instituições, mas para enfrentar o fascismo e continuar a luta pela construção de uma alternativa popular e revolucionária para o Brasil. Conclamamos a toda a juventude que coloca em nós sua confiança a marchar conosco, pela punição de todos os golpistas e pelo avanço dos direitos da classe trabalhadora.
Sem anistia para os golpistas do 8 de janeiro!
Punição a todos financiadores e articuladores do golpe!
Punição aos militares golpistas!
Pelos direitos da classe trabalhadora!
União da Juventude Comunista
8 de janeiro de 2024