Tortura era praticada na ditadura militar antes da luta armada, diz Comissão da Verdade
Brasília, 21/05/2013 (Agência Brasil) – A Comissão Nacional da Verdade informou que a tortura passou a ser prática sistemática da ditadura militar logo após o golpe, em 1964. Durante o balanço de um ano de atividades, os integrantes da comissão desmentiram a versão de que a prática tenha sido efetivada em resposta à luta armada contra a ditadura, iniciada em 1969.
“A prática da tortura no Brasil como técnica de interrogatório nos quartéis é anterior ao período da luta armada, ela começa a ser praticada em 1964”, disse a historiadora Heloísa Starling, assessora da comissão. “O que é importante notar é que ao contrário do que supunha boa parte da nossa bibliografia, o que nós temos é a tortura sendo introduzida como padrão de interrogação nos quartéis em 64 e explodindo a partir de 69,” argumentou.
O balanço divulgado pela comissão considera que o uso da violência política permitiu ao regime construir um Estado sem limites repressivos. “Fez da tortura força motriz da repressão no Brasil. E levou a uma política sistemática de assassinatos, desaparecimentos e sequestros.”
A comissão revelou ainda que a Marinha ocultou informações sobre mortes na ditadura, quando foi questionada em 1993 pelo governo Itamar Franco.
De acordo com levantamentos da Comissão da Verdade, cerca de 50 mil pessoas foram presas só no ano de 1964, em operações nos estados da Guanabara (atual Rio de Janeiro), de Minas Gerais, de Pernambuco, do Rio Grande do Sul e de São Paulo. A comissão identificou prisões em massa em navios-presídios.
A comissão também relatou ter identificado 36 centros de tortura em sete estados, inclusive em duas universidades – na Universidade Federal do Recife e na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. “Nós identificamos que as pessoas foram presas dentro dos campus da universidade e as práticas de violência ocorreram dentro do campus”, disse Heloísa Starling.
A historiadora disse que a comissão está no caminho de desmontar a tese de que a tortura foi praticada sem o consentimento do alto escalão militar. Ela apresentou um organograma de 1970, ano de criação do Centro de Operações de Defesa Interna (Codi), que mostra que as informações sobre o que ocorria no órgão eram de conhecimento do alto escalão do Exército, da Marinha e da Aeronáutica.
Toda a bibliografia, segundo a assessora, mostra que a estrutura de comando vai até o segundo nível, onde está o Centro de Informações da Aeronáutica (Cisa), Centro de Informações do Exército (CIE) e o Centro de Informações da Marinha. “É muito pouco provável que o general Médici [presidente Emílio Garrastazu Médici] não recebesse informações do seu ministro mais importante, que era o ministro do Exército, Orlando Geisel”, disse.
Comissão da Verdade vai recomendar que agentes respondam na Justiça por crimes na ditadura
A Comissão Nacional da Verdade disse hoje (21) que irá recomendar que agentes suspeitos de terem cometido crimes durante a ditadura militar sejam responsabilizados judicialmente. A coordenadora da comissão, Rosa Cardoso, disse que o órgão vai seguir os tratados internacionais que classificam crimes de lesa-humanidade, tortura e assassinato por razões religiosas, raciais ou políticas.
“É da natureza da comissão aceitar os princípios internacionais dos direitos humanos e dentro destes princípios, os crimes de lesa-humanidade são imprescritíveis e vamos recomendar que estes casos sejam submetidos à uma jurisdição internacional”, disse Rosa Cardoso, que descartou a possibilidade de a comissão propor a revisão da Lei de Anistia. “Quem tem que propor isso é a sociedade civil”, argumentou.
Ao divulgar balanço de um ano de atividades, os integrantes da comissão desmentiram a versão de que a prática de tortura tenha sido efetivada em resposta à luta armada contra a ditadura, iniciada em 1969. “A prática da tortura no Brasil como técnica de interrogatório nos quartéis é anterior ao período da luta armada, ela começa a ser praticada em 1964”, disse a historiadora Heloísa Starling, assessora da comissão. “O que é importante notar é que ao contrário do que supunha boa parte da nossa bibliografia, o que nós temos é a tortura sendo introduzida como padrão de interrogação nos quartéis em 64 e explodindo a partir de 69,” argumentou.
Após investigação, a comissão revelou que a Marinha brasileira ocultou informações sobre mortes cometidas durante a ditadura militar.
Marinha ocultou da Presidência informações sobre mortes na ditadura, diz Comissão da Verdade
Ao apresentar o balanço de um ano de suas atividades, a Comissão Nacional da Verdade revelou que a Marinha Brasileira ocultou informações sobre mortes cometidas durante a ditadura militar.
Em 1993, o então presidente Itamar Franco determinou ao ministro da Justiça, Mauricio Correa, o levantamento de informações com a Marinha, o Exército e a Aeronáutica sobre desaparecidos na ditadura militar. A Comissão da Verdade conseguiu identificar 12.072 documentos do Centro de Informações da Marinha (Cenimar) sobre 11 desaparecidos e fez um cruzamento com as respostas prestadas pela Força Armada ao governo Itamar Franco.
Segundo a comissão, um dos documentos, de dezembro de 1972, tratava da morte do ex-deputado Rubens Paiva. Em 1993, a Marinha informou ao Congresso Nacional, ao Ministério da Justiça e à Presidência da República a versão oficial de que Paiva teria fugido quando estava sob custódia do Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) do 2º Exército, no Rio de Janeiro, e que seu paradeiro era desconhecido.
“O primeiro resultado parcial [da comissão] é o fato de que a Marinha Brasileira ocultou deliberadamente informações ao Estado brasileiro, já no período democrático. A importância desse documento é que indica que existem na Marinha Brasileira 12 mil páginas referentes aos 11 desaparecidos que apresentamos aqui”, disse a historiadora Heloísa Starling, responsável por sistematizar as informações levantadas pela comissão.
De acordo com a comissão, o cruzamento das respostas das Forças Armadas com os documentos obtidos durante a investigação apontou que a Marinha ocultou as mortes de pessoas. “O Cenimar foi um dos organismos mais ferozes de repressão da ditadura. É uma relação muito extensa das informações que a Marinha tinha sobre as pessoas. Ela sabia que estavam mortas”, disse.
Luciano Nascimento é repórter da Agência Brasil
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