Delfim Netto diz desconhecer financiamento de empresários a órgãos de repressão

No centro, o ex-ministro Delfim Netto responde aos vereadores Gilberto Natalini (PV), Juliana Cardoso (PT) e Ricardo Young (PV)

O ex-ministro da Fazenda (1967-1974) e do Planejamento (1979-1985) Antonio Delfim Netto disse desconhecer a existência de um financiamento de empresários paulistas a órgãos de repressão da ditadura militar. Em depoimento à Comissão Municipal da Verdade de São Paulo nesta terça-feira (25/06), Delfim Netto classificou como “muito improvável” que grandes empresários tivessem feito doações para a realização de torturas.

“Duvido que tenha existido esse processo de arrecadação com empresariado”, afirmou.

Questionado sobre um trecho do livro Ditadura Escancarada, de Elio Gaspari, em que é relatado um almoço com cerca de 15 pessoas, no segundo semestre de 1969, organizado pelo banqueiro Gastão Bueno Vidigal, para conseguir fundos para reequipar as Forças Armadas e “enfrentar a subversão”, Delfim Netto confirmou presença no evento. “Elio Gaspari é um jornalista seríssimo e sua obra é a que melhor retrata essa época. Mas na verdade o que houve esse dia foi um jantar, com banqueiros mineiros, paulistas e paranaenses, em que discutimos apenas a taxa de juros.” No livro, Gaspari usa como fonte principal deste trecho uma entrevista com o próprio banqueiro.

“O empresariado não tinha nenhuma participação na política econômica nacional. O governo não obedecia aos empresários para fazer política, e acho até que foi por isso que houve crescimento no país”, acrescentou.

Empresário Paulo Sawaya

O ex-ministro Delfim Netto também negou que Paulo Henrique Sawaya Filho tivesse sido seu assessor no Ministério da Fazenda. Conforme explicou o presidente da comissão, vereador Gilberto Natalini (PV), Sawaya esteve nas dependências do Dops (Departamento de Ordem Política e Social) 47 vezes entre 1971 e 1979. Em uma das ocasiões, assinou o livro de entrada como representante do “Ministério da Fazenda”. Nas outras vezes, identificou-se ora como “delegado”, ora como integrante de outras instituições.

“Conheci Sawaya como um empresário de biotecnologia. Ele nunca foi funcionário público”, disse Delfim.

No relatório Brasil Nunca Mais, trabalho elaborado por uma equipe de pesquisadores coordenada pelo cardeal católico Dom Paulo Evaristo Arns e pelo pastor presbiteriano Jaime Wright que realizou suas pesquisas a partir de processos que tramitaram na Justiça Militar, Sawaya também é apontado como assessor do Ministério da Fazenda e um dos principais arrecadadores de fundos entre o empresariado para financiar o aparelho de repressão.

Acima, na segunda linha, Sawaya assina o livro de entrada do Dops, às 17h50 do dia 22 de março de 1974

Separação entre civis e militares

Durante os quase 80 minutos de duração de seu depoimento, o economista foi questionado diversas vezes sobre as práticas de tortura da ditadura militar. Delfim Netto respondeu a todas as perguntas dizendo que os ministérios civis eram totalmente independentes dos militares.

“Nunca apoiei a repressão. Nunca ouvi nada sobre tortura no governo. Certa vez perguntei ao Médici sobre isso e ele negou tudo, disse que a única coisa que existia eram os combates nas ruas. É nisso que acredito”.

Diferentemente do que conta a historiografia brasileira, Delfim Netto — que disse não se arrepender de ter assinado do AI-5 (Ato Institucional nº 5), considerado um marco no endurecimento do regime militar — afirma que a chamada linha dura das Forças Armadas nunca chegou ao poder no país. “A linha dura do Exército nunca esteve no governo. Se estivesse, ia ser o diabo. Era um bando de maluquetes. No meu gabinete nunca entrou um militar fardado ou armado.”