“Os mercenários enviados pelos EUA são por eles chamados graciosamente de rebeldes”
10 DE SETEMBRE DE 2013
Assim assegurou a jornalista especializada em temas internacionais, Stella Calloni. “A situação é muito perigosa”.
Por Juan Ciucci
AGÊNCIA PACO URONDO: Como você analisa a situação pela qual passa a Síria?
Stella Calloni: Como era previsível, durante anos, os Estados Unidos tentaram enfraquecer o exército sírio. Por outro, com essas ondas de mercenários enviados, aos quais tão graciosamente chamam de rebeldes e que cometeram uma grande quantidade de atentados muito fortes, inclusive, contra universidades e hospitais, que não foram divulgados. Isto ocorreu em princípios de 2011, porém, sobretudo a partir do término do assunto “Líbia”, após nove meses de bombardeios sobre uma população de 100 milhões de habitantes.
Depois da onda de mercenários, um grupo fica na Líbia à frente da segurança do povo líbio, cujo dirigente encarregado é o Chefe do Al Qaeda. Todavia, é uma tragédia e, assim, começam a partir as ondas de mercenários para a Síria. Fazem uma espécie de comando em algumas zonas da Turquia e em outros lugares próximos e dali, começam a entrar as ondas de mercenários que estiveram todo este tempo, sequestrando gente. Mataram muita gente do governo, muita gente do exército que estava defendendo a Síria como o correto e, uma vez feita a trégua, os mercenários aproveitaram para atacar com tudo.
No início do ano passado, a constituição foi modificada e fez-se uma eleição em meio à guerra. Os partidos opositores nasseristas, socialistas, os cristãos e os comunistas que estão dentro do país e outros grupos, como os curdos e armênios, também estão defendendo a Síria, porque é um dos últimos estados não confessionais que permanecem nesta região. E esta situação permitia a convivência de vários setores, tanto é assim que algumas das provas atuais de que as armas químicas não foram disparadas por Bashar al-Assad, estão sendo apresentadas por freiras cristãs, freiras católicas, que estão intimamente ligadas à população. As populações cristãs sabem o que vem ocorrendo por conta dos mercenários, pois sua vida é matar, não salvar ninguém, não é levar a democracia a nenhum lugar.
Estamos diante de uma situação muito perigosa devido ao fato de que todo o mundo continua sem medir as consequências que pode ter a intervenção com as características que se quer fazer. Porém, o exército sírio demonstrou que tem uma grande preparação e uma grande capacidade de resistência, tem armas de defesa muito importantes. Além disso, a Rússia disse claramente que está apoiando e assim continuará, já que tudo o que se está sendo feito contra a Síria é ilegal. Vemos que é uma situação que abarca o mundo, não é um problema localizado numa região, cujo mapa, ao ser analisado, mostra que qualquer coisa que aconteça no lugar atinge a todos, pois a localização da Síria é, precisamente, muito estratégica.
Acredito que, até agora, tenham sido utilizados falsos argumentos para legitimar a entrada em todas as guerras e, sobretudo, nos últimos tempos, como as armas químicas, as armas de destruição massiva no Iraque que não existiam, o bombardeio de Kadafi a seu povo que nunca existiu. Isso sem esquecer fatos passados, como a lancha de artilharia, os ataques supostamente para entrar na guerra do Vietnã, tudo o mais que nós sabemos. Então, acredito que é importante deixar claro que se trata de uma invasão ilegal. Porque, por mais que o Congresso dos EUA a aprove, a comunidade mundial não a aprova em seu conjunto, quer dizer, que o Congresso de um país pode decidir entrar em outro lugar sem que ninguém possa impedi-lo. Isso é impossível! Nenhum país da região da América Latina pode aceitar este estado de coisas, porque isto é como assinar sua própria vontade de que os invadam em qualquer momento.
APU: Foi muito interessante o que disse explicitamente Putin no G20…
SC: Isto que aconteceu no G20 dá a noção do quanto ilegal é, já que estão dizendo e advertindo a situação, para que não sigam às cegas. É muito triste ver como se persiste na decisão de invadir, apesar de tudo estar mostrando o contrário. Se você ler Democracy Now e outras publicações da Europa, estão dizendo que existe uma porção de militares dos EUA que não querem isto, pois sabem que as consequências que acarretarão.
Hoje ninguém pode dizer que a consequência será um passeiozinho de ida e volta. Então, ante esta situação que ameaça o mundo, acredito que as posições que foram tomadas e a posição tomada pela Argentina são claras. Não existe nenhum país que esteja a salvo, caso permita que, legalmente, um dia o Presidente dos EUA diga que é necessário ir. Isto demonstra que não é assim. Estão testando. Os russos fizeram infinitos testes, agora também estão fazendo os setores cristãos, já que este também compromete ao Vaticano. O Vaticano não pode abandonar sua população na Síria – que é uma numerosa quantidade de cristãos. É um panorama muito complicado, um tempo em que os periódicos mentem muito, sem poder, ainda que seja por dissimular sobre qual era a posição do governo sírio, o que dizia Síria, o que estava demonstrando a Síria.
Quando as pessoas se inteiraram que aqui teve uma eleição, que teve uma mudança constitucional muito importante, na época, Hillary Clinton disse que não interessava a ela. A única coisa que estava disposta a discutir era que Al-Assad deixasse, entregasse o governo à coalizão que, como sabemos, foi armada fora do país. Os porta-vozes são velhos militantes das ONGs da CIA nos Estados Unidos, na França ou dos serviços de inteligência francesa ou do serviço de inteligência britânico.
Nós temos que ter clara a verdade, porque se não estamos com a verdade na mão, nossa situação se agrava muitíssimo. Creio que são momentos muito importantes para ter em conta tudo o que possa afetar esta América Latina. Creio que é muito importante estabelecer a verdade e saber como começou a crise na Síria, o que aconteceu ao longo deste tempo, se eram rebeldes ou como os lutadores da liberdade que eram os contra nicaraguenses para Reagan.
APU: Outra questão interessante no plano internacional foi o revés que sofreu Cameron…
SC: E a situação que está sendo vivenciada por Hollande, um montão de gente indo embora, gente de seu partido dando a volta, 80% da população na França não quer a guerra. Existe muita gente nos EUA, militares que não querem a guerra. Ou seja, há uma situação muito complexa e há uma situação econômica gravíssima. 20 cidades dos EUA declararam que estão à beira da falência. Eu asseguro que isto não terá salvação. Antes o militar salvava mais rapidamente porque eram armas construídas, que necessitavam de muita mão de obra. Agora isto está robotizado, é alta tecnologia.
Um míssil não precisa da mesma quantidade de pessoas. Então, existe um enorme desemprego que eles não podem solucionar de maneira alguma. Esta situação dá o que pensar. São muitos elementos que cercam a situação na Síria e tão grave que, inclusive, quatro personagens da velha inteligência israelense, disseram ao governo que o povo está sendo expondo, já que todos possuem fronteiras comuns. Ninguém pode salvar-se de uma situação semelhante e com semelhante grau de injustiça e ilegalidade de iniciar uma guerra e apropriar-se de países como tem feito.
Na Líbia não podem extrair todo o petróleo que queriam. A população está numa tragédia. Não tem água porque romperam todos os oleodutos e os que transportavam a água. Estamos vivendo um momento muito especial do mundo e, como tal, apenas a verdade salva e a mesma é contrária à ação dos EUA contra a Síria.
APU: Pensando nesse marco, como você vê a região, UNASUL, reagindo?
SC: Creio que agora, mais que nunca, a unidade pode nos salvar de uma tragédia semelhante a que estão vivendo esses países, a quem primeiro destruíram a unidade porque a Liga Árabe não é a mais a mesma. Hoje é, simplesmente, uma Liga Árabe tomada, como a SIP, por outros setores da sociedade interamericana de imprensa, alheios ao que é a imprensa. A Liga Árabe está nas mãos dos senhores sauditas, que de democráticos não possuem absolutamente nada e que, agora, possuem a grave responsabilidade de ter ajudado a destruir seus irmãos árabes.
Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)