O VOTO DO STÉDILE

Pesquiso o movimento de trabalhadores do campo no Brasil há mais de 25 anos. Mais especificamente, pesquiso o MST há mais de 15 anos. Tenho livros, artigos científicos e artigos na imprensa. Porém, mais do que um pesquisador pretensamente “neutro”, sou um militante. Defendo o socialismo, a reforma agrária, a educação do campo e as lutas dos trabalhadores do campo e da cidade.

Admiro os lutadores desconhecidos e os conhecidos que a história registra ao longo do tempo. Desconhecidos como aqueles que, hoje, ocupam terras pelo direito ao seu trabalho, à sua cultura e à sua dignidade. E conhecidos como João Pedro Stedile e Plínio de Arruda Sampaio, dentre muitos outros, que passam suas vidas na luta por uma vida mais digna para o povo brasileiro e para o povo do campo. Abrem mão de cargos nos governos, privilégios e outras coisas mais para ficar ao lado das lutas populares.

Assim, é neste clima fraternal e companheiro que quero discordar da posição eleitoral do João Pedro Stedile, manifestada em diversos debates e edição do Brasil de Fato de 17/08/2010. Depois de criticar Serra, posição consensual na esquerda, ele diz: “E temos três candidaturas de partidos de esquerda, com companheiros de biografia respeitada de compromisso com o povo, mas que não conseguiram aglutinar forças sociais ao seu redor, e por isso o peso eleitoral será pequeno. Nesse cenário, nós achamos que a vitória da Dilma permitirá um cenário e correlação de forças mais favoráveis a avançarmos em conquistas sociais, inclusive em mudanças na política agrícola e agrária”.

Pergunto: como as três candidaturas de esquerda aglutinariam força e cresceriam se uma das principais lideranças, de um dos principais movimentos sociais do Brasil, já declara, sem nenhum empenho por estas candidaturas, que elas não decolam e vai direto pedir voto na Dilma? Não deveríamos nos empenhar para que estas candidaturas aglutinassem forças e tivessem maior peso eleitoral em vez de sairmos dizendo, sem discussão ou empenho por estas candidaturas, que elas não decolam? Mesmo que não ganhássemos, se os candidatos de esquerda conseguissem um peso eleitoral maior, não teríamos mais forças para o enfrentamento com o capital e o agronegócio?

Em segundo lugar, o seguinte: qual é este cenário favorável em que a vitória de Dilma permitirá uma correlação de forças favorável para a mudança na política agrícola e agrária? Se nos oito anos de governo Lula esta mudança não aconteceu, qual o “milagre” que faria com que a vitória de Dilma propiciasse tais mudanças? Aliás, na entrevista, Stedile diz que “nós achamos”. Nós, no caso, seria o MST? Creio que não foi esta a decisão do Movimento Sem Terra.

Por fim, analiso que o voto em Plínio, no Ivan Pinheiro ou no Zé Maria, comprometidos com as lutas dos trabalhadores, seria uma forma de aglutinar votos para a fragmentada esquerda brasileira. Não venceremos, mas podemos ter uma inserção maior nas lutas se demonstrarmos alguma força e unidade. Mas, para tanto, precisamos apoiar candidatos de esquerda, e não ficar defendendo voto útil que, na maior parte das vezes, se torna inútil. Aliás, útil para quem?

E aí, Stedile, o MST joga um papel fundamental para ajudar a reaglutinar as forças capazes de combater o capital e o agronegócio, pois possui o reconhecimento da esquerda brasileira.

Antonio Julio de Menezes Neto, cientista social, doutor em educação e professor na UFMG.

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