Haaretz revela como o contribuinte estadunidense financia as colônias e o terrorismo israelense
Luc Delval/Resumen Medio Oriente/Pour la Palestine*, dezembro de 2015 – O Presidente dos EUA afirmou enfatica e claramente que a proliferação de colônias israelenses na Cisjordânia constitui um “obstáculo para a paz”. Porém, isso não impede que, segundo uma pesquisa do diário israelense Haaretz, em um artigo assinado por Uri Blau, a legislação fiscal estadunidense permita, ao mesmo tempo, que fundações privadas estadunidenses “financiem luxuosamente” essas mesmas colônias, com em torno de mais de 220 milhões de dólares em cinco anos e beneficiarem-se, assim, como isenções fiscais!
“Doadores privados estadunidenses financiam massivamente as colônias israelenses através de uma rede de organizações sem fins lucrativos e isentas de impostos, que canalizaram para as comunidades judias da Cisjordânia mais de 220 milhões de dólares durante o período de 2009/2013”, afirma o jornalista israelense.
Esses fundos se destinam a propósitos diferentes, como a aquisição de aparatos de ar condicionado ou a ajuda financeira às famílias de judeus condenados por atos de terrorismo, e procedem de doações dedutíveis de impostos feitas por mais de cinquenta grupos radicados nos EUA.
Graças a sua condição de organizações “sem fins lucrativos”, as receitas dessas organizações estão isentas de impostos e as doações que recebem são dedutíveis do imposto de renda dos doadores, o que significa que o governo dos EUA alenta estas doações e apoia, indiretamente, o movimento israelense de colonização da Palestina, ainda que no transcurso dos últimos 48 anos, as sucessivas administrações estadunidenses tenham afirmado opor-se a ele.
A investigação do Haaretz também revela que, embora a direita israelense critique violentamente as organizações de esquerda porque recebem fundos do estrangeiro e multiplicam suas tentativas de impedir esse tipo de financiamento que chega do exterior, os grupos que apoiam os colonos se beneficiam amplamente das grandes remessas financeiras que vem do estrangeiro. Enquanto as ONGs classificadas como de esquerda (1) e as organizações de defesa dos direitos humanos são financiadas por instituições e governos, os grupos que militam pela colonização judia na Cisjordânia são especialmente beneficiados pela generosidade de doações privadas através de organizações sem fins lucrativos.
Nem a legislação vigente nos EUA nem a de Israel contém maiores exigências de transparência, afirma Haaretz, e é difícil encontrar informação detalhada sobre os doadores, ainda que alguns desses “benfeitores” sejam conhecidos e entre eles se encontrem os que financiaram as campanhas eleitorais de Benjamin Netanyahu, que em alguns casos também são os mesmos que contribuem com as campanhas do Partido Republicano nos EUA.
Haaretz promete incluir informações mais detalhadas nas próximas semanas.
Uma ajuda jurídica aos terroristas judeus
Haaretz afirma que sua investigação, realizada ao logo de um ano, se baseou, sobretudo, em uma exaustiva análise de milhares de documentos oficiais fornecidos por dúzias de organizações sem fins lucrativos estadunidenses e israelenses. Isso permitiu colocar em evidência que pelo menos 50 organizações distribuídas por todos os EUA estão envolvidas na captação de fundos para as colônias e suas atividades nos territórios ocupados.
Suas receitas entre os anos 2009 e 2013 (último ano para o qual existem dados mais ou menos completos) alcançaram os 281 milhões de dólares procedentes em sua maioria de doações e, em menor medida, de recursos devidos a investimentos de capital. Cerca de 80% das receitas (em torno de 224 milhões de dólares) foi transferida aos territórios ocupados por Israel, em sua maioria sob a forma subvenções e através de associações israelenses sem fins lucrativos. Apenas no ano de 2013, essas organizações receberam 73 milhões de dólares e distribuíram subvenções por 54 milhões de dólares. Os dados disponíveis para 2014 fazem pensar que nesse ano o montante seria, todavia, maior.
A investigação do Haaretz mostra que uma parte dos fundos foi utilizada para fornecer apoio jurídico a judeus acusados ou condenados por atos de terrorismo e para auxiliar suas famílias através de uma associação israelense chamada Honenu.
O informe anual da dita associação às autoridades israelenses demonstra que, no ano passado, a Honenu recebeu 155.000 dólares (20% do total de seus recursos) dos EUA. Entre os beneficiários do apoio financeiro da Honenu figura a família Ami Popper, que assassinou sete trabalhadores palestinos em 1990, e alguns membros do grupo Bat Avin Underground, que tentou explodir uma bomba em uma escola de meninas em Jerusalém Oriental, em 2002.
A Honenu também reuniu fundos no passado para ajudar Ygal Amir, condenado à prisão perpétua pelo assassinato do Primeiro Ministro (israelense) Yitzhak Rabin. A associação afirma ser uma “organização legal” e ter “atuado sempre no marco da lei e de acordo com seus estatutos”, sobretudo outorgando ajuda a “milhares de suspeitos, muitos deles agentes da polícia israelense, soldados e civis”.
Uma das organizações estadunidenses mais importantes implicada no financiamento das comunidades judias da Cisjordânia é a “Hebron Fund” com sede no Brooklyn. Entre 2009 e 2014, transferiu aos colonos judeus de Hebron a soma de 5,7 milhões de dólares. Grande parte desses fundos se destinou à criação de parques, áreas de jogos, bibliotecas de acordo com os objetivos sociais de seus fundos, que são “melhorar a vida cotidiana dos residentes judeus de Hebron”. E é que, evidentemente, não faz falta dizer que os parques, as áreas de jogos e as bibliotecas estão estritamente reservados às centenas de judeus extremistas (muitas vezes de origem estadunidense), radicados na cidade com a proteção do exército de ocupação que reinam pelo terror entre os 130 mil habitantes palestinos.
Porém, os fundos do “Hebron Fund” também serviram para pagar um salário mensal para Menachem Livni, que foi dirigente da organização “Renewal of the Jewish Community in Hebron” (Renovação da Comunidade Judia de Hebron) entre 2010 e 2012. Livni, ex-líder do grupo “Jewish Underground”, que atuava nos territórios ocupados nos anos 80, é um assassino condenado pela justiça israelense pela morte de três estudantes palestinos e que também feriu gravemente dois prefeitos palestinos e um membro da polícia israelense das fronteiras.
Outro doador importante é o “Center Fund of Israel”, cujas atividades são, a princípio, dirigidas pelos escritórios de uma empresa do setor têxtil instalada na zona de Manhattan, onde se encontram muitas empresas do setor de vestuário e cujos proprietários são os irmãos Marcus. As rendas deste fundo chegaram aos 13 milhões de dólares em 2013 – um aumento de 3 milhões com relação ao ano anterior.
Entre as instituições que mais se beneficiaram com a generosidade do “Center Fund of Israel” se encontra a “Od Joset Chai yeshiva” (2), localizada na colônia Yitzhar, na Cisjordânia ocupada. Os dirigentes dessa yeshiva, os rabinos Yitzhak Shapira e Yosef Elitzur são os autores da “Torat Hamelech” (Torá do Rei), um livro no qual detalham as circunstâncias nas quais, segundo eles, é legítimo matar um não judeu.
Os dois rabinos foram interrogados pela polícia israelense e acusados de incitação ao racismo, porém não foram processados. No ano passado e como consequência dos violentos ataques contra o exército israelense, a polícia fronteiriça tomou, segundo Haaretz, o controle da yeshiva durante vários meses.
O diário recorda também que sobre a massiva contribuição financeira da qual se beneficiam as colônias judias dos territórios ocupados, são os contribuintes israelenses que continuam sendo os maiores provedores de fundos para a colonização. Tudo o que está relacionado à segurança, à construção de infraestruturas (separadas das usadas pelos palestinos), ao ensino, à cultura, à vida religiosa, etc., é financiado com os impostos dos israelenses, seja diretamente ou por meio dos municípios ou dos conselhos regionais, etc.
O dinheiro procedente dos EUA se destina mais a financiar “o luxo adicional”: as instituições de educação ao judaísmo, a melhoria do nível de vida (como, por exemplo, os condicionadores de ar no refeitório da escola Ohr Menachem, em Kiryat Arba), as atividades para recreação (a adequação de um passeio entre diferentes partes da colônia Etzion) e também para a aquisição de imóveis situados em Jerusalém Oriental, com o objetivo de continuar cada dia mais com a colonização da parte oriental da cidade ou fortalecer a presença judia nos lugares simbólicos (como, por exemplo, a aquisição de imóveis na proximidade da Tumba de Raquel, próximo de Belém).
A absoluta negativa da Casa Branca
Perguntada pelo Haaretz, a Casa Branca fez saber que a política dos EUA com relação às colônias israelenses é inflexível: desde 1967, sejam os Democratas ou os Republicanos que estejam no poder, não apoiam os estabelecimentos para além das “fronteiras de 1967”. Como as administrações anteriores, “a administração Obama nunca defendeu nem apoiou nenhuma atividade relacionada com as colônias. Não apoia nenhuma atividade destinada a legitimá-las”.
No entanto, a investigação do Haaretz demonstra que os EUA apoiam tacitamente, através das isenções fiscais, o crescimento das colônias judias na Cisjordânia, um processo que seu governo assegura firmemente condenar.
Notas:
(1) A classificação das ONGs em de esquerda ou de direita deve ser consideravelmente relativizada. A esse respeito, é recomendável a leitura do estudo de Julien Salingue, La Palestine des ONG – Entre résistance et collaboration, publicado por Éditions La Fabrique (ISBN : 9782358720755 – 12 €) (NDLR).
(2) Yeshiva: centro de estudos da Torá e do Talmud.
*Artigo publicado no portal Rebelion/Tradução do francês para o espanhol de Susana Merino
Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)