Resolução sobre a conjuntura política brasileira

imagemDireção Nacional da Organização Comunista Arma da Crítica (OCAC)

13 de março de 2016

Diante dos recentes acontecimentos que aprofundaram a crise política como a “condução coercitiva” e o pedido de prisão preventiva de Lula, e com base em nossas resoluções anteriormente divulgadas, em especial a resolução da Direção Nacional de 31 de janeiro de 2016, consideramos que:

  1. As iniciativas sobre o afastamento de Dilma da presidência e as denúncias de corrupção contra o PT e Lula, com toda a polêmica que geram, se inserem na disputa entre as representações políticas e de setores do aparelho de Estado pelo gerenciamento do capitalismo brasileiro, expressando, em última instância, disputas entre as frações hegemônicas das classes dominantes. Os grandes monopólios disputam o apoio do Estado para garantir melhores condições na concorrência interburguesa.
  1. Os posicionamentos de setores do poder judiciário, da Polícia Federal com apoio da grande mídia, extrapolando alguns limites da legalidade burguesa, que têm um direcionamento maior contra PT, Dilma, Lula e aliados, são expressões dessas contradições.
  1. Em todo esse processo de crise política, em que estão em pauta a corrupção, a Lava-Jato e o afastamento de Dilma, não está em jogo uma disputa entre os interesses dos explorados/oprimidos, de um lado, e os das classes dominantes/imperialismo, do outro.
  1. Mesmo com nuances e pequenas diferenças entre setores que defendem o governo Dilma e setores da oposição, como o PSDB e seus aliados, quanto à política econômica e social, incluindo as “políticas públicas” e a proximidade com o imperialismo, qualquer que seja o desfecho desta disputa, o povo não sairá ganhando. O foco nesses enfrentamentos tem servido para nublar as causas de fundo da crescente deterioração das condições de vida e trabalho das massas populares: a exploração capitalista.
  1. Os ataques a Dilma e a Lula não se configuram em si numa tentativa de “golpe de Estado” no sentido de mudança de classes no poder. Pois as disputas em jogo se dão no campo dos setores que, essencialmente, gerenciam os interesses das frações hegemônicas das classes dominantes, dentre elas as frações do setor produtor de commodities para exportação, do setor financeiro que valoriza o capital principalmente na esfera financeiro-especulativa e das empreiteiras.
  1. No momento, no Brasil não existe um movimento de massas mobilizado por transformações sociais. Portanto, uma perspectiva “golpista” contra o movimento de massas não está colocada, como ocorreu em 1964. Naquele período, o governo de João Goulart, com apoio de expressivo movimento operário e popular às reformas de base, tomava medidas que contrariavam os interesses do capital estrangeiro, do imperialismo e de setores das classes dominantes, como a lei da remessa de lucros e da reforma agrária. Nesse sentido, é equivocada a comparação da atual conjuntura, em que o governo de Dilma se esmera em ajustar-se à política do grande capital nacional e internacional, à de 1964, no governo de Jango.
  1. Ajustar-se a essa política foi condição necessária para o PT chegar ao poder, vide a “Carta aos brasileiros” assinada por Lula em 2002. A “capacidade” de Lula, Dilma, dos governos do PT e aliados, controlarem e abafarem o movimento popular combativo criou melhores condições para o grande capital alcançar um alto grau de concentração de riqueza e se beneficiar sem escrúpulos da maioria dos recursos públicos. Nesse sentido, o PT e seus aliados ajudaram a barrar o crescimento da luta do proletariado, a desorganizar o movimento operário e popular classista, obstaculizando o desenvolvimento da luta revolucionária, a elevação do nível de consciência e organização das massas populares.
  1. Pode-se considerar “golpe” de um setor entre aqueles que disputam a gerência da acumulação capitalista. E gerenciar o capitalismo significa garantir a exploração, aumentar a taxa de mais-valia, como forma de aumentar a taxa de lucro. Essa é a lógica desse modo de produção. Não estão em jogo, portanto e no fundamental, os interesses populares.
  1. A corrupção é inerente às sociedades divididas em classe e em especial ao capitalismo, e será efetivamente combatida com a sua derrota. Hoje, com o desenvolvimento capitalista, o sistema imperialista, com alto grau de acumulação, concentração e centralização do capital, as cifras da corrupção no mundo e no Brasil também se tornaram astronômicas. Alguns poucos grandes monopólios, com seu grande poder econômico, organizam uma rede de influência, que é “corrupta”, no Estado e na sociedade, para garantir seus interesses de classe, a busca por altos lucros.
  1. O fato de ser inerente ao capitalismo não significa que não devemos denunciar e exigir a apuração, a punição para os corruptos e corruptores. No caso, tanto do esquema de corrupção do PT e aliados, como do PSDB e outros partidos. Mas a denúncia deve identificar o “responsável” principal: a burguesia enquanto classe. Devemos também denunciar as campanhas ideológicas, demagógicas, dos aparelhos de Estado da burguesia, da ideologia dominante, que colocam a corrupção como a “pauta” nacional principal a ser resolvida, do interesse de “todos”, naturalizando a verdadeira “pauta” nacional e popular: a violenta exploração capitalista.
  1. Notícias que escancaram a natureza de classe do capitalismo são abafadas, tem pequenos registros nos meios de comunicação da burguesia: A crise de desigualdade no mundo ‘saiu do controle’, diz a ONG Oxfam em relatório lançado hoje [16 de janeiro de 2016]. O intervalo entre ricos e pobres no mundo alcançou novos extremos. Em 2015, a riqueza de 62 indivíduos equivalia à de 3,6 bilhões de pessoas, a metade da população global. Em 2010, eram 388 pessoas com a mesma riqueza de metade da população mundial, e em 2014 eram 80 os milionários. A riqueza dos 62 mais ricos do mundo cresceu 44% em cinco anos, desde 2010. Trata-se de um crescimento de mais de US$ 542 bilhões. …. ‘Ocorreu uma aceleração na concentração de riqueza’, diz Katia Maia, diretora-executiva da Oxfam do Brasil, comentando a tendência de aumento da desigualdade no mundo.”
  1. Fechar os olhos para esse processo há muito denunciado por Marx e que hoje atinge contornos dramáticos e de barbárie – e que certamente não é contrarrestado por “políticas públicas” maiores ou menores do Banco Mundial – e colocar a corrupção no centro das questões nacionais é de interesse das classes dominantes. Estas ficam com o campo cada vez mais livre para fazer prevalecer a sua política de enfrentar a crise com a intensificação da exploração, ampliando a miséria e a pobreza no Brasil.
  1. Consideramos verdadeiros “golpes” contra o povo as medidas anti-crise do governo federal como o ajuste fiscal que implica em corte nos investimentos públicos das áreas sociais – saúde, saneamento, educação, transporte, moradia, etc; a restrição de direitos trabalhistas; as propostas de reformas na previdência; a ampliação da política de privatizações, nomeadas como parcerias público-privadas e concessões, e o avanço no entreguismo em relação ao pré-sal. Essas medidas também são aplicadas pelos governos estaduais e municipais.
  1. Existe no mundo e no Brasil o avanço do processo de fascistização, de criminalização dos movimentos populares combativos e revolucionários, com o objetivo de tentar impedir o crescimento da resistência às políticas anti-crise do capitalismo/imperialismo. Políticas que têm agravado o desemprego, o arrocho salarial, a pobreza e a barbárie.
  1. No Brasil, as repercussões da crise econômica do capitalismo mundial tornaram-se mais agudas no último período, principalmente a partir de 2015 e, nesse cenário, a tendência é aumentarem as lutas de resistência do povo. E, como contrapartida das classes dominantes, o crescimento da repressão e criminalização do movimento operário e popular.
  1. Em relação ao processo de fascistização no Brasil, não podemos deixar de denunciar as ações do Estado brasileiro e seu aparato policial e jurídico. Como exemplo, a lei antiterrorismo do governo federal aprovada pelo Congresso Nacional; os ataques e massacres aos povos indígenas; a ocupação pelas forças armadas e polícias militares estaduais de favelas; a repressão às manifestações e greves de professores, de estudantes, de funcionários públicos, de operários; a prisão e os processos jurídicos contra manifestantes no Rio de Janeiro durante a Copa do Mundo de Futebol em 2014.
  1. Por que caberia às forças populares e revolucionárias tomar partido numa disputa entre representações políticas que objetivamente defendem interesses de frações das classes dominantes? Porque uma delas, o PT, se apresenta com o rótulo de “esquerda”, porque os meios de comunicação, com seus interesses específicos, assim a denomina?
  1. Entrar nesse jogo – colocar como questão central da atual conjuntura a mobilização contra o “golpe de Estado”, a defesa da “legalidade burguesa”, a resposta a cada questão imediata da disputa política entre os setores que optaram pelo gerenciamento do capitalismo, é tirar o foco dos interesses das massas, da luta de classes. É tirar o foco da defesa dos interesses populares dentro da necessária visão estratégica, de acumulação de forças, em uma perspectiva de longo prazo, de construir uma alternativa popular e revolucionária. De construir as condições subjetivas para fazer a revolução, derrotar o capitalismo, colocar outro bloco de classes no poder – o proletariado e seus aliados – na perspectiva de construir o socialismo. Entrar nesse jogo é também se desgastar politicamente no mar de lama de corrupção em que o PT se envolveu, ao incorporar práticas dos partidos burgueses tradicionais. E a escolha do “menos pior” em geral acaba abrindo espaço para a escolha entre o mais ou menos corrupto…
  1. Nessa conjuntura é necessário dar continuidade ao trabalho de mobilizar e organizar as massas para resistir às investidas do capital, na luta concreta por melhores condições de vida e de trabalho, lutas que estão colocadas e estão em curso. E nesse processo, pela sua prática e experiência, as massas desenvolverem a consciência e organização necessárias para conquistar os seus objetivos estratégicos. Concentrar-se em construir e pavimentar o caminho próprio das lutas populares é a forma política de disputar as massas para a alternativa que lhe diz respeito, que lhe fortalece, que liberta e emancipa os explorados e oprimidos. E é a condição consequente de enfrentar as posições econômicas, políticas e ideológicas das classes dominantes, aí incluídas as correntes com viés fascista, de extrema-direita e anticomunistas.
  1. A denúncia de violações da legalidade democrática, na atual crise política e em outros casos, deve ser feita e tem sentido integrada à luta pela garantia das liberdades democráticas conquistadas, que possibilitem melhores condições políticas para atuação da classe operária e demais classes dominadas. Nesse processo, há que denunciar o caráter de classe da democracia burguesa que, essencialmente, garante ao proletariado o “direito” de ser explorado. Os setores mais oprimidos da população historicamente sentem na própria pele que não existe uma democracia no geral, sem caráter de classe, como também não existe uma justiça neutra. O Estado de direito na sociedade capitalista, em sua essência, existe para a garantia da dominação burguesa.
  1. Setores governistas denunciaram com veemência a condução coercitiva de Lula e a invasão do Instituto Lula e outras atitudes de juízes e da polícia que ganham enorme repercussão midiática. Mas tal veemência não é notada quando se trata da violência que a exploração e a barbárie capitalista impõem cotidianamente ao proletariado e setores oprimidos. Essa violência tem sido naturalizada. Invasões de casas nos bairros populares, com tortura e desaparecimento de moradores de favelas, como Amarildo na Rocinha, autos de resistência para camuflar execuções de jovens pobres e negros, são fatos que ocorrem no dia a dia e na maioria das vezes nem é noticiado.
  1. Há, portanto, outro caminho a ser trilhado – o que vem sendo pavimentado pelas lutas populares. Lutas dos trabalhadores da cidade e do campo, do proletariado nas greves contra arrocho salarial e o desemprego, de estudantes, funcionários públicos, professores, contra as remoções, por melhores condições de vida e trabalho, pelo passe-livre, em defesa da demarcação das terras indígenas, contra os gastos exorbitantes em mega eventos, contra a criminalização das lutas populares e a violência policial, entre outras.
  1. A crise política agrava a crise econômica, acelera o processo de regressão social, de deterioração das condições de vida da massa, paralisa o governo federal. Em meio à crescente insatisfação social, crescem também as posições de extrema-direita e anticomunistas. Mas há outro aspecto a ser destacado, como afirmamos na Resolução da II Conferência Nacional da Organização Comunista Arma da Crítica (OCAC) – “Sobre o partido leninista”, de dezembro de 2015:
  1. “[…] criam-se melhores perspectivas para o trabalho político comunista, revolucionário, na medida em que a crise do capitalismo mundial e brasileiro expõe mais abertamente as características inerentes ao capitalismo, aprofundando a exploração e a barbárie. Abrem-se melhores condições para esclarecer as massas sobre os interesses de classe, antagônicos, em jogo, a partir de suas experiências e lutas. Esse trabalho exige dedicação, paciência, perseverança, combatividade e disciplina, e tem o objetivo de acumular forças, se enraizar na massa e construir a linha política justa, em sintonia com a teoria científica do proletariado, os princípios revolucionários do marxismo-leninismo.”
  1. Para construir a alternativa popular e socialista enquanto estratégia, os comunistas e revolucionários brasileiros têm um desafio: “Na concepção leninista, e este é o ponto que ressaltamos, a construção do Partido é condição indispensável ao aumento do nível de consciência e organização política das massas populares com o objetivo de construir as condições subjetivas para a vitória da revolução, conquistar o poder, na perspectiva da construção do socialismo rumo ao comunismo, acabando com as sociedades divididas em classes.
  1. Nesse sentido, a tarefa principal dos comunistas na conjuntura brasileira é a reconstrução do Partido, do partido leninista, integrado ao processo de unificação dos comunistas, do fortalecimento da OCAC e das forças políticas que podem se somar e avançar para uma posição revolucionária, proletária. Essa tarefa não se constrói num piscar de olhos, apesar da urgência de concretizá-la. Dá-se no fogo da luta de classes. Estamos atrasados, mas cabe aos comunistas irem à luta. Essa é uma tarefa que se os comunistas não se debruçarem, não realizarem dentro de uma perspectiva revolucionária, nenhum outro setor, por mais combativo que seja, realizará.” (Resolução da II Conf. Nacional da OCAC).”

Direção Nacional da Organização Comunista Arma da Crítica (OCAC)

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