As hipócritas preleções dos EUA a Cuba

imagemMarjorie Cohn*

Antes da visita histórica do Presidente Barack Obama a Cuba, em 20 de março, especulou-se sobre se ele podia pressionar Cuba a melhorar os respectivos direitos humanos. Porém, uma comparação entre os direitos humanos em Cuba e nos Estados Unidos mostra que são os EUA que devem aprender com Cuba.

A Declaração Universal dos Direitos do Homem contém duas categorias diferentes de direitos humanos – direitos civis e políticos, por um lado; e direitos econômicos, sociais e culturais por outro. Direitos civis e políticos incluem os direitos à vida, liberdade de expressão, liberdade de religião, julgamento justo, autodeterminação, ser livre de tortura, tratamento cruel e detenções arbitrárias.

Direitos econômicos, sociais e culturais compreendem os direitos à educação, saúde, segurança social, seguro de desemprego, licença de maternidade paga, salário igual para trabalho igual, redução da mortalidade infantil; prevenção, tratamento e controle de doenças; liberdade de formar e aderir a sindicatos e fazer greve.

Estes direitos estão consagrados em dois tratados: o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Direitos Políticos (PIDCP) e o Pacto Internacional sobre Direitos Económicos, Sociais e Culturais (PIDESC). Os Estados Unidos ratificaram o PIDCP, mas recusam-se a ratificar o PIDESC.

Desde a administração Reagan, tem sido política dos EUA definir direitos humanos apenas como direitos civis e políticos. Direitos econômicos, sociais e culturais não são considerados, bem como os relativos ao bem-estar social ou o socialismo.

O governo dos EUA critica os direitos civis e políticos em Cuba enquanto ignora o acesso universal dos cubanos á habitação, a cuidados de saúde, à educação, à garantia da licença de maternidade paga e à igualdade de salários.

Enquanto isso, o governo dos EUA tem cometido violações graves dos direitos humanos em solo cubano, incluindo tortura, tratamento cruel e detenções arbitrárias em Guantanamo. Desde 1960, os Estados Unidos expressamente interferiram nos direitos econômicos de Cuba e no seu direito à autodeterminação, através da política de embargo econômico.

O embargo dos Estados Unidos a Cuba, agora um bloqueio, foi iniciado pelo presidente Dwight Eisenhower durante a guerra fria em resposta a um memorando de 1960, escrito por um alto funcionário do Departamento de Estado. O memorando propunha “uma linha de ação que produzirá os maiores danos, negando financiamentos e fornecimentos a Cuba, obrigando a diminuir os salários reais, para conduzir à fome, ao desespero e ao derrube do governo.” [de Fidel Castro].

Esse objetivo falhou, mas o bloqueio punitivo tornou a vida em Cuba difícil. No entanto, com um esforço mais que humano, Cuba garantiu ao seu povo um notável conjunto de direitos humanos.

Cuidados de saúde

Ao contrário dos Estados Unidos, os cuidados de saúde são considerados um direito em Cuba. O sistema de saúde é universal e livre para todos. Cuba tem o número mais elevado de médicos por doentes em todo mundo: 6,7 por 1.000 habitantes. A taxa de mortalidade infantil em 2014 foi de 4,2 por 1.000 nascidos vivos – uma das mais baixas do mundo.

Os cuidados de saúde em Cuba privilegiam a prevenção, em vez de fazer depender a saúde apenas de medicamentos, isto em parte devido ao acesso limitado a determinados medicamentos, ocasionado pelo bloqueio dos EUA. Em 2014, a revista Lancet disse: “se as realizações de Cuba pudessem ser reproduzidas num amplo conjunto de países pobres e de rendimento médio, a saúde da população mundial poderia ser transformada”.

Cuba tem um desenvolvimento pioneiro em medicamentos para tratar e prevenir o câncer de pulmão e evitar amputações diabéticas. Devido ao bloqueio, no entanto, nos Estados Unidos não é possível usufruir deles.

Educação

A educação gratuita é um direito universal incluindo o ensino superior. Cuba gasta uma proporção mais elevada do seu PIB em educação do que qualquer outro país no mundo. “Professores móveis” são implantados nas habitações de crianças incapacitadas de estarem presentes na escola. Muitas escolas providenciam cuidados durante manhãs livres e após o horário escolar para pais trabalhadores que não dispõem de alternativas familiares. É gratuito estudar para ser um médico em Cuba. Há 22 escolas de medicina em Cuba, apenas três em 1959, antes da revolução cubana.

Eleições

As eleições para o parlamento nacional cubano (Assembleia Nacional) têm lugar de cinco em cinco anos e as eleições para as Assembleias Municipais Regionais a cada 2,5 anos. Os delegados para a Assembleia Nacional, elegem o Conselho de Estado, que por sua vez, nomeia o Conselho de Ministros, do qual o Presidente é eleito.

A partir de 2018 (data da próxima eleição geral em Cuba), haverá um limite de não mais de dois mandatos de cinco anos para todos os lugares eleitos mais importantes, incluindo o de Presidente.

Qualquer um pode ser indicado para candidato. Não é necessário que seja um membro do partido comunista (PCC). Nenhum dinheiro pode ser gasto promovendo candidatos e não é permitido a partidos políticos (incluindo o PCC) campanha durante as eleições. Pessoal militar não está de serviço às mesas de voto; as urnas são guardadas por crianças em idade escolar.

Direitos laborais

A legislação cubana de direitos do trabalho garante o direito de livremente formar e se filiar em sindicatos. Os sindicatos são juridicamente independentes e financeiramente autônomos; independentes do PCC e do Estado, financiados por cotizações dos seus membros. Os direitos dos trabalhadores, protegidos pelos sindicatos incluem um contrato formal, uma semana de 40 a 44 horas e 30 dias anuais de férias remuneradas no setor estatal.

Os sindicatos têm o direito de parar trabalhos que considerem perigosos. Têm o direito de participar na gestão das empresas, receber informações da gestão, dispondo de gabinete próprio, materiais de escritório e tempo livre para os seus representantes nas empresas. Um acordo sindical é exigido para demissões, mudanças nos padrões de horário de trabalho, horas extras e o relatório anual de segurança. Os sindicatos têm um papel político em Cuba e o direito constitucional de serem consultados sobre leis do trabalho. Têm também o direito de propor novas leis à Assembleia Nacional.

Mulheres

As mulheres constituem a maioria dos cubanos juízes, procuradores, advogados, cientistas, trabalhadores técnicos, profissionais da saúde pública. Cuba é classificada em primeiro lugar no “Save the Children’s ‘Lesser Developed Countries’ Mother’s Index”. Com mais de 48% de deputados mulheres, Cuba tem a terceira mais alta percentagem de mulheres parlamentares do mundo. As mulheres recebem nove meses de salário completo durante o período de maternidade, seguido por três meses a 75% do salário completo. O governo subsidia a interrupção voluntária da gravidez e o planeamento familiar, atribui um alto valor aos cuidados de saúde pré-natais e oferece às mulheres “acolhimento de maternidade” antes do nascimento.

Esperança de vida

Em 2013, segundo a Organização Mundial de Saúde a esperança de vida das mulheres em Cuba era de 80 anos e 77 para os homens. A probabilidade de morte entre os 15 e os 60 anos por 1.000 pessoas foi de 115 para homens e 73 para as mulheres em Cuba. Durante o mesmo período, a esperança de vida para as mulheres nos Estados Unidos foi de 81 anos e de 76 para os homens. A probabilidade de morrer entre os 15 e os 60 anos por 1.000 pessoas era 128 para homens e 76 para mulheres nos Estados Unidos.

Pena de Morte

Um estudo da Faculdade de Direito de Cornell não encontrou ninguém condenado a pena de morte em Cuba e ninguém no corredor da morte em outubro de 2015. Em 28 de dezembro de 2010, o Supremo Tribunal Federal de Cuba comutou a sentença de morte do último remanescente condenado à morte em Cuba, um cubano-americano condenado por assassinato perpetrado durante uma invasão terrorista da ilha em 1994. Nenhumas novas condenações à morte são conhecidas desde aquela época.

Em contraste, nos EUA em 1 de janeiro de 2016 estavam 2.949 pessoas no corredor da morte em instalações estaduais; 62 no corredor da morte em instalações federais em 16 de março de 2016, de acordo com “Death Penalty Information”.

Desenvolvimento sustentável

Em 2006, o World Wildlife Fund (WWF), uma organização ambiental líder, reconhecia Cuba como o único país no mundo a ter alcançado desenvolvimento sustentável. Jonathan Loh, um dos autores do relatório do WWF, disse, “Cuba atingiu um bom nível de desenvolvimento, de acordo com os critérios da ONU, graças ao seu alto nível de alfabetização e a uma expectativa de vida muito alta, com uma pegada ecológica que não é grande, já que é um país com baixo consumo de energia.”

Parem de dar lições a Cuba e levantem o bloqueio

Quando Cuba e os Estados Unidos realizaram conferências sobre direitos humanos há um ano, Pedro Luís Pedroso, chefe da delegação cubana, disse, “Expressámos as nossas preocupações em relação a padrões de racismo e discriminação na sociedade dos Estados Unidos, ao agravamento da brutalidade policial, a atos de tortura e execuções extrajudiciais no combate ao terror e ao limbo jurídico dos prisioneiros no campo de detenção dos EUA em Guantanamo”.

É gritante a hipocrisia do governo dos EUA com preleções sobre os direitos humanos em Cuba, negando muitos direitos humanos básicos ao povo americano. Os Estados Unidos devem levantar o bloqueio. Obama deve fechar Guantanamo e devolvê-lo à Cuba.

*Professora na Faculdade de Direito Thomas Jefferson desde 1991.

Original encontra-se em marjoriecohn.com/human-rights-hypocrisy-us-criticizes-cuba/

e www.informationclearinghouse.info/article44480.htm . Tradução de DVC.

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