Sobre a Pátria Grande

imagemJones Manoel*

No século XIX a maior potência econômica, militar e geopolítica do mundo era a Inglaterra. Esse país estimulou os processos de independência nacional na América Espanhola, pois era necessário remodelar o rudimento de mercado mundial que existia para atender os interesses do capital inglês. Fim do monopólio colonial, da escravidão como base principal da produção na América e a criação de Estados-nacionais formalmente independentes no plano político, mas totalmente dependentes no plano econômico, eram necessidades imperiosas do capital inglês.

Era fundamental para os interesses do império impedir uma comunidade de nações unificadas como aconteceu com a independência das 13 colônias que formaram os Estados Unidos. Nesse sentido, a Inglaterra atuou em duas frentes estratégicas: garantir a independência deslocando Portugal e Espanha de qualquer protagonismo político e econômico na região, mas ao mesmo tempo, destruindo qualquer possibilidade de uma nação latino-americana unificada.

Os libertadores da América estavam plenamente conscientes da necessidade de unir o nosso continente para evitar uma escravização econômica e militar camuflada no manto da independência política formal. Simón Bolívar foi o principal líder e símbolo desse projeto da Pátria Grande. O Brasil, diferentemente dos países que surgiram com o fim da América Espanhola, não passou por um processo radical de independência e tornou-se, no século XIX, o principal instrumento da política externa imperial inglesa. O nosso país teve papel fundamental na destruição do Paraguai de Solano López e seu avançadíssimo projeto de soberania nacional, contribuiu com o desmembramento da Argentina com a criação do Uruguai e foi o principal cão de guarda do capital inglês.

Durante o século XX, especialmente após a Revolução Cubana, o projeto da Pátria Grande voltou a ganhar forte impulso e adesão de massas. Uma Pátria Grande soberana, forte, democrática, independente e socialista. Contudo, o ciclo de ditaduras militares do grande capital teve a função de enterrar, de novo, esse grande objetivo. O Brasil, mais uma vez, foi ponta de lança na contrarrevolução latino-americana e atuou como o principal cão de guarda do imperialismo estadunidense. A ditadura militar, dentre outras coisas, teve como função afastar de nossa cultura, política e produção teórica qualquer sentido sério de integração latino-americana e o debate sobre o bolivarianismo. Enquanto toda América do Sul estava debatendo com radicalidade a superação da dependência e do subdesenvolvimento, esse debate era proscrito no Brasil e o que se apresentava como “pensamento crítico”, a oposição consentida à ditadura, era o “marxismo” paulista produzido na USP e no Cebrap sobre o comando de monsieur Fernando Henrique Cardoso – a canonização do “Grupo de estudos O Capital” de São Paulo é parte indissociável dessa história.

Na abertura do século XXI, com a Revolução Bolivariana na Venezuela e, posteriormente, com os processos políticos na Bolívia e no Equador, o tema da Pátria Grande voltou com furor, mas, outra vez, esse tema foi ignorado no Brasil e nos anos do PT no governo a integração latino-americana era abordada quase que exclusivamente como a criação de mercado para os capitais atuantes no Brasil. No fantástico mundo do petismo, especialmente no segundo Governo Lula, não existia mais imperialismo, mas multilateralismo, os EUA tinham esquecido a América e estavam concentrados no Oriente Médio (o nível de falta de iniciativa de integração real dos governos do PT foi tal que o Governo Lula, quando da criação da Telesur, resolveu ficar de fora e não trouxe a emissora para o Brasil).

Ainda não será em 2018, infelizmente, que o tema da Pátria Grande terá destaque no projeto político da esquerda socialista brasileira. Fora do projeto da Pátria Grande Socialista não existe futuro para nosso continente. Seremos sempre países dependentes e subdesenvolvidos subordinados ao capital dominante do momento. Ou nos integramos ou morremos.

*Militante do PCB de Pernambuco

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