A equação da economia cubana
Foto: Miguel Febles Hernández
«Este tem sido um encontro que nos deixa lições; já havíamos diagnosticado suficientemente os temas que vocês trataram, mas agora estão consolidados com seus critérios», disse o primeiro secretário do Partido Comunista de Cuba, Miguel Díaz-Canel Bermúdez, a especialistas e estudantes das Ciências Econômicas com os quais fez intercâmbio, na quarta-feira, 4 de agosto, sobre a situação da economia cubana atual.
Autor: René Tamayo León | internet@granma.cu
«Os problemas levantados estão expostos no Relatório Central do 8º Congresso do PCC e no discurso de encerramento, e agora vocês os ratificam e apoiam» — reiterou o presidente da República, agradecendo a sinceridade dos participantes durante o debate — «mas também nos deram resultados com que podemos trabalhar e implementar, apoiando-nos em vocês mesmos e incorporando-os mais ao que estamos fazendo».
O encontro matinal na sede da Associação Nacional dos Economistas e Contadores de Cuba (ANEC) foi o início de um novo ciclo de intercâmbios regulares do presidente da República com diferentes setores sociais, que se prolongará nos próximos dias com os jovens, líderes religiosos e produtores agrícolas, entre outros.
Participaram representantes de centros de pesquisa econômica da capital, diretores da ANEC, membros da Universidade de Havana (professores das faculdades de Economia e Contabilidade e Finanças e estudantes) e especialistas nestas ciências de diversos organismos.
Díaz-Canel destacou que o objetivo é intercambiar sobre a situação no país, os problemas que temos, expor onde estão as ações que o Governo tem proposto e coletar propostas, ideias, contribuições que os diferentes setores podem nos dar.
Com a ajuda de Joel Queipo Ruiz, membro do Secretariado do Comitê Central do Partido e chefe do Departamento Econômico, o conclave foi moderado pelo primeiro vice-ministro e titular de Economia e Planejamento, Alejandro Gil Fernández.
«O bloqueio», disse o primeiro secretário, «está nos afetando em tudo, ainda mais depois da entrada em vigor do Título III da Lei Helms-Burton e da injustificada inclusão de Cuba na espúria lista de países patrocinadores do terrorismo».
«Nosso propósito» — acrescentou o primeiro vice-ministro — «é debater e fazer avançar propostas que nos permitam, no atual cenário da economia cubana, consolidar o que temos feito e nos projetar em outras ações».
«Troquemos abertamente entre todos, geraremos ideias, consensos, identificaremos oportunidades que temos, identificaremos reservas e todos nos alimentaremos de energia para poder seguir em frente e consolidar o que temos feito e quanto ainda temos para fazer», enfatizou.
CAPACITAR, FORMAR
Oscar Hung Pentón, presidente da ANEC, agradeceu aos economistas e contadores pela nova oportunidade «de continuar participando das tarefas empreendidas pelo país, como fizeram durante todos esses anos. A ANEC, como sempre, tem acompanhado a nação», disse.
Uma de suas propostas — e com a qual vários palestrantes concordaram — tinha como objetivo fortalecer a formação.
No debate, foi insistido que para as empresas avançarem precisam de uma contabilidade que apoie a transparência, o rigor profissional e a oportunidade.
«Diante dos desafios que se colocam à economia cubana, a capacitação se torna um tema estratégico para melhorar efetivamente o desempenho profissional dos atores econômicos, em particular dos especialistas em Ciências Econômicas», explicou.
O primeiro desafio que temos hoje — acrescentou — «é compreender a essência das medidas e políticas, que não são poucas, pelo contrário, são muitas; portanto, não basta conhecer o enquadramento legal, mas devemos compreender cada uma das particularidades que estas medidas têm e estar em condições de aplicá-las, por cada um dos atores econômicos, de forma sensível e com uma abordagem inovadora».
Salientou que, para atingir este objetivo, as empresas de serviços profissionais da área econômica têm de se associar com maior destaque, inclusive aos universitários, para ensinar fazendo e aprender fazendo, pela formação em empregos, no qual a ANEC tem muita experiência.
«São muitas regras e são muitos os desafios do trabalho diário, por isso nem sempre há clareza de como adaptá-las ao desempenho de cada um; depois temos que ajudar a desenvolver competências, ajudar as pessoas a usar os mecanismos econômicos e financeiros», reiterou.
Pentón analisou também o desempenho da Contabilidade nas entidades, nas quais — disse — «pouco se avançou, embora seu aperfeiçoamento esteja previsto nas Diretrizes Econômicas e Sociais e haja um acordo da Comissão Executiva».
«Para que as empresas avancem» — acrescentou — «elas precisam de uma contabilidade que apoie a transparência, o rigor profissional e as oportunidades. Por isso, para colocar a economia em condições de implementar as normas, políticas e medidas já adotadas e que estão sendo anunciadas, temos de enfrentar com grande rigor o reforço da Contabilidade».
FAZER, ERRAR, APRENDER, CRESCER
Carlos Manuel Pérez Cueva, economista, professor da Universidade de Havana há vários anos, pesquisador e dirigente, por um longo período, da unidade orçamentária daquele centro de estudos superiores, é atualmente o diretor-geral do Jardim Botânico Nacional (JBN), entre as maiores instituições do gênero no mundo e uma joia da cultura e da ciência cubana, como ele a descreveu.
Em sua intervenção no encontro com o presidente da República, apresentou os resultados obtidos no JBN a partir de uma gestão gerencial boa, constante e inovadora. «O centro (um investimento do país de cerca de 500 milhões de pesos) teve avanços significativos, apesar de sua complexidade e custos operacionais», disse.
«Durante 50 anos o JBN foi subsidiado pelo Estado, situação que começou a ser revertida desde 2019, a partir de um programa de governo que o favoreceu e que lhe permitiu iniciar o caminho da autossustentabilidade», relatou.
Pérez Cueva explicou que isto tem sido alcançado a partir de um programa de gastos próprios e crescentes, através, entre outras ações, de processos de investimento constantes antes de cada uma das oportunidades que se apresentam e graças ao fato de o Plano da economia nacional ser agora mais flexível. E deu como exemplo o canopi erguido ali, que custou 200.000 CUC, e em um ano poderia ser financiado.
Com a autoridade que emana do exemplo do JBN, o ainda jovem economista refletiu sobre a necessidade do Plano de Economia defender os investimentos estratégicos e se libertar daqueles que não são fundamentais, por mais que os recursos já sejam bastante limitados.
Nessa linha de pensamento, falou por permitir que os atores econômicos do Estado possam dirigir seus próprios empreendimentos («o JBN, que teve absoluta liberdade para fazê-lo» — afirmou) sem ter que enfrentar a baixa tolerância que o país possui em face dos erros.
«Diante dessa realidade, muitos atores econômicos do Estado — subsidiados e empresariais — antes de fazer as coisas e se arriscar, optam por não fazer nada», disse Pérez Cueva, que também criticou o excesso de controles existentes.
«O diretor de uma empresa busca mais como controlar o que fazer antes de fazer o que tem que fazer», disse. «As pessoas não querem correr riscos; Não se sabe o quanto se perde por não fazer nada», disse, e então sentenciou que os atores econômicos «não mudarão com os novos modelos se as velhas práticas continuarem».
LOCOMOTIVAS, LIMITES, OPORTUNIDADES…
Alfredo García Jiménez, diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Econômicas (INIE), vinculado ao Ministério da Economia e do Planejamento (MEP), refletiu sobre o desenvolvimento do turismo mundial e nacional nas condições atuais.
«As previsões dos organismos internacionais» — disse — «indicam que a recuperação do setor não será possível daqui a quatro ou cinco anos, e esta realidade, da qual Cuba não é alheia, deve impor uma revisão das estratégias de investimento, das capacidades disponíveis e sob demanda».
Carola Salas, diretora do Centro de Pesquisas em Economia Internacional da Universidade de Havana (UH), comentou, por sua vez, sobre a situação do investimento estrangeiro no país e a captura de fluxos de financiamento externo, entre outros temas.
«São questões que foram abordadas há mais de uma década em um livro da instituição sobre a inserção de Cuba na economia internacional, mas ainda não se viu a concretização de muitas propostas apresentadas naquele volume», disse.
«No financiamento externo, houve avanços, mas sem a rapidez que o país exige», afirmou. «O mesmo ocorre com o investimento estrangeiro, que, apesar do bloqueio econômico, comercial e financeiro do Governo dos Estados Unidos, continua sendo uma oportunidade não totalmente explorada».
«O processo para inserir em nossos regulamentos os requisitos necessários para incentivar os investidores estrangeiros a colocar seu capital em um país de muito risco, como Cuba, continua lento», denunciou. «E isso pode ser feito, mas requer a adoção de políticas mais atrativas, com incentivos direcionados e diferenciados para cada investidor».
Ela também falou do estabelecimento de vínculos entre o investimento estrangeiro e os projetos de desenvolvimento local, incluindo cubanos residentes no exterior; e criar alianças estratégicas em setores como biotecnologia e neurociências.
Carola Salas também falou por uma maior utilização de bônus, como o Bônus Soberano que já temos, mas também dando lugar aos títulos corporativos como mecanismo de financiamento. E o mesmo para remessas.
«As remessas» — especificou — «é um acesso a financiamentos ainda não desenvolvido e, além do bloqueio, é necessário um design de políticas para atraí-las e utilizá-las, incluindo a bancarização e o desenvolvimento dos fundos de investimento que tenham as remessas como componente básico».
A diretora do Centro de Pesquisa em Economia Internacional da UH defendeu a necessidade do investimento estrangeiro no turismo para contribuir com a infraestrutura, incentivando-o a fazê-lo; que a integração internacional, além da política, se baseia também na complementaridade com outras economias, o que abre uma nova janela de possibilidades para o país; e que a cooperação internacional encontre mais e novos mecanismos.
FORTALECENDO A GESTÃO DO GOVERNO
Nas conclusões do encontro com economistas, contadores e estudantes, em que mais de uma dezena de intervenções abordaram os mais díspares temas da economia cubana, o primeiro secretário do Partido Comunista, Miguel Díaz-Canel Bermúdez, fez o que ele mesmo definiu como uma «caracterização fria do momento em que estamos».
Há — disse — «atraso na administração pública e na gestão e administração empresarial do país; estamos atrasados em boas práticas e concepções nos setores de comércio, serviços, habitat, planejamento urbano; estamos atrasados na base industrial, na agricultura…».
Tudo isso, disse o presidente da República, «exige que fortaleçamos a gestão governamental, e a troca com vocês revela com mais clareza o que já levantamos antes em relação à necessidade de informatizar a sociedade, desenvolver a comunicação social e buscar as respostas na ciência e a inovação é a coisa certa a fazer».
«Tudo o que vocês levantaram tem a ver» — disse — «com comunicação; temos que aprender a nos comunicar. Se não nos comunicamos bem, estamos fraturando as essências daquilo que propusemos, e tudo isso deve ser sustentado com a participação, que para mim passa por vários momentos».
«Um momento é que as pessoas têm espaços para dizer, explicar, argumentar, propor e também dar critérios, mostrar insatisfação. Outro é a participação concreta, dizer a si mesmo: “Eu dei minha opinião, propus, e vou assumir a responsabilidade e vou ser ativo nesse tipo de proposta”. E outro momento é a transparência, como quem lidera é responsável e como quem fez uma proposta ou empreendimento e o executou são responsáveis».
É nesse caminho, explicou o primeiro secretário, «que temos que construir a melhoria da ação governamental ou da governança em nível de país, sem esquecer que há coisas que são urgentes e outras exigem trabalho a médio e longo prazo, embora todas elas devem ser feitas ao mesmo tempo».
Depois de explicar outras contradições da economia, Díaz-Canel referiu-se ao impacto avassalador que a intensificação do bloqueio econômico, comercial e financeiro do Governo dos Estados Unidos está tendo sobre a realidade cubana.
O bloqueio — disse — «nos afeta em tudo, ainda mais depois da entrada em vigor do Título III da Lei Helms-Burton e da injustificada inclusão de Cuba na espúria lista de países patrocinadores do terrorismo».
«E a isso se soma a Covid-19 e os enormes recursos que tivemos que dedicar para proteger a saúde de nosso povo. Temos lidado com a pandemia com mais eficiência do que quase todos, ou do que todos nós, mas Cuba é quem está sendo atacada».
Como podem ver — explicou o presidente da República aos economistas — «a equação da economia cubana é muito complexa, e o bloqueio faz parte dessas complexidades, independentemente de todos os nossos problemas e das contusões do processo socioeconômico».
No entanto — frisou — «o bloqueio vai continuar e não podemos continuar nos lamentando do bloqueio. O que temos que ver é como, com nosso esforço e nosso talento, superamos esse bloqueio e fazemos as coisas de forma diferente, sabendo que não é fácil, mas temos que encontrar os caminhos».
Mas nós — acrescentou — «também temos luzes». Assim, refletiu sobre as medidas recentemente adotadas e outras anteriores que terão — afirmou — um impacto, mais cedo ou mais tarde, no comportamento da economia nacional e no bem-estar da população».
Díaz-Canel detalhou a esse respeito as ações realizadas na agricultura; a abertura antecipada de micro, pequenas e médias empresas (MPMEs); investimentos no Sistema Elétrico Nacional, incluindo flexibilidade para importação, sem tarifas, de equipamentos que aproveitem fontes renováveis de energia; o desenvolvimento de vacinas contra a Covid-19 que irão beneficiar, em primeiro lugar, o nosso povo; e a esperada retomada da atividade econômica, tanto no setor estatal como no não estatal.
Os cubanos com sentido de responsabilidade, finalmente expressou o Presidente da República, «temos que encontrar uma solução diferente para que este país tenha o que merece depois de tantos anos de um bloqueio que é torturante, brutal, que é genocida».