Entrevista com Giovani Damico, pré-candidato do PCB ao governo da Bahia
Por Milton Pinheiro, via Jornal O MOMENTO – PCB da Bahia
“[O] Brasil se situa em uma conjuntura da qual emerge uma falsa polarização, de um lado o bolsonarismo, expressão da extrema direita, de um projeto neocolonial fascistizado, e do outro lado o petismo, uma expressão mal-acabada da social democracia tardia, que se exprime em um projeto de conciliação de classes, um programa social democrata que abdicou de sua característica reformista subsumindo a uma agenda neoliberal e programas sociais de compensação e mitigação […].”
*Giovani Damico – Mestre em Ciências Sociais (UFBA); professor da Rede Estadual de ensino no Estado da Bahia. Pré-candidato ao Governo do Estado da Bahia pelo PCB.
O Momento – Você é um dirigente do PCB, o que representa a política para os comunistas nesse processo eleitoral em curso?
Giovani Damico – Esta é uma pergunta de resposta complexa à qual tentei esboçar alguns elementos em um texto de contribuição ao Jornal O Momento. No entanto, naquela oportunidade apontávamos um debate mais geral sobre o papel dos comunistas nas eleições, aqui tal qual perguntado, devemos focar nosso ponto analítico no processo eleitoral em curso.
Nosso local de partida para pensar as eleições neste momento é tanto nossa base de atuação na Bahia e a conjuntura deste estado, quanto a atuação dos comunistas em sentido geral em todo território nacional, é importante afirmar que para nossa perspectiva de mediações táticas e estratégias não existe a possibilidade de separação destas esferas, embora as respostas políticas e organizativas se modifiquem parcialmente ao avaliarmos as conjunturas locais.
Dito isso, o Brasil se situa em uma conjuntura da qual emerge uma falsa polarização, de um lado o bolsonarismo, expressão da extrema direita, de um projeto neocolonial fascistizado, e do outro lado o petismo, uma expressão mal-acabada da social democracia tardia, que se exprime em um projeto de conciliação de classes, um programa social democrata que abdicou de sua característica reformista subsumindo a uma agenda neoliberal e programas sociais de compensação e mitigação, que podem ser desmanchados livremente sem grandes esforços por não promoverem sequer um arranhão nas estruturas que organizam e sustentam a sociedade capitalista brasileira. Diante de uma polarização, que não polariza opostos, mas sim diferentes lados de um mesmo projeto de governabilidade do capital, seja em sua face mais antipopular, seja na sua face de conciliação de classes, na qual em última análise a primazia da classe dominante segue completamente intocada. Diante de tal polarização, é tarefa dos comunistas fazer emergir a grande política, a política de quem acredita e defende suas pautas históricas, a política que coloca a luta de classes no centro das análises, que entende que nosso papel nas eleições é o papel da propaganda revolucionária, mas é também o papel de construir um programa que possibilite saldos políticos e organizativos para nossa classe, ao mesmo tempo em que se propõe a dar início a transformações de grande envergadura, que se iniciam com um conjunto de reformas estruturantes e que miram na transformação social geral.
Portanto, para nós do PCB, é nossa tarefa sair dessas eleições com nossa classe mais organizada do que ela entrou no processo, seja em seu arcabouço teórico, seja em sua capacidade política de dar respostas aos graves dilemas vividos por nosso povo. Nosso programa nestas eleições tocará na organização do Poder Popular, ao mesmo tempo em que pretende dar início a uma política de pleno emprego, de nacionalização e estatização de setores estratégicos, políticas de enfrentamento aos graves problemas ambientais, uma reversão da política de segurança pública, resgatar o papel central do estado no investimento, na geração de emprego e renda, otimizar e maximizar os serviços públicos dentre estes a educação, saúde, previdência e oferta de infraestruturas adequadas, estes serão nossos propósitos.
O Momento – Como candidato a governador pelo partido na Bahia, quais seriam os eixos centrais da sua campanha?
Giovani Damico – A Bahia possui alguns problemas estruturais graves que serão certamente ponta de lança em nossa campanha, o desemprego que tornou este o estado com maior proporção de desempregados, ostentando simultaneamente o título da capital com maior número de desempregados. Reverter a situação do emprego é um ponto fundamental para nossa política, que se desdobra para mais alguns eixos estruturantes.
A política de segurança pública certamente figura entre os eixos fundamentais, uma vez que a política de guerra às drogas vem tornando este um dos estados mais sangrentos do Brasil, e embora o estado com maior proporção de população negra é um estado onde o genocídio contra a juventude negra e periférica segue em curso como política de estado. A reversão da guerra às drogas, criando uma política que mescle a desmilitarização da polícia, a prevenção somada à redução de danos, medidas de compensação pelos danos sofridos pelas comunidades, associadas a um verdadeiro giro nos aparatos de segurança pública que deverão operar sobre bases de investigação, prevenção, com foco nos postos de produção de drogas, e fronteiras de entradas de drogas e armas, trabalhando para combater a origem dos problemas e não o final.
Junto a estes, nós teremos um eixo central no Serviço público, olhando especialmente para a ampliação da oferta e melhoria dos serviços públicos, com amplos concursos, retomada do investimento no SUS, com a reversão das privatizações e ampliação do serviço público em saúde. Na Educação pública, devemos trabalhar a associação entre escolas e universidades em políticas de aproximação da educação das demandas concretas da classe trabalhadora
O Momento – Quais são os campos de atuação na militância política aos quais você tem se dedicado?
Giovani Damico – Como militante comunista, iniciei minha trajetória na Juventude e no movimento estudantil universitário. Nunca me afastei de nenhuma dessas duas pautas, embora, ao passar do tempo, tenha me tornado professor e deslocado boa parte do eixo de gravidade de minha atuação para a Educação e as lutas dos servidores públicos, onde atuo enquanto militante do coletivo sindical Unidade Classista. No partido, temos um terreno fértil e amplo para inserção em diversas camadas e espaços de atuação, tendo alguns desses se tornado espaços prioritários de minha inserção, seja na educação popular, seja na pauta ambiental, associada à educação como na agroecologia.
O Momento – O PCB na Bahia terá outros/as candidatos/as nessas eleições?
Giovani Damico – Certamente o partido prepara terreno para constituir uma plataforma eleitoral, até a presente redação já lançamos duas pré-candidaturas de peso, a Camarada Inês Melgaço, artista plástica, atuante na atenção de saúde mental no CAPS, onde trabalha diversas esferas da terapia através da arte. Temos ainda a pré-candidatura de João Coimbra, advogado, militante da luta antirracista com um histórico nas lutas em torno dos direitos humanos, das comunidades tradicionais indígenas, quilombolas e ribeirinhas. Ambas candidaturas expressam a maturidade política que o partido vem obtendo nos últimos anos, e nos representarão para a disputa de deputado federal. Estão em curso alguns novos lançamentos e ainda temos mais nomes sendo examinados, cobrindo assim um vasto campo político em torno da saúde, dos movimentos populares, serviço público, educação e outras áreas diversas.
O Momento – O PCB tem mantido uma importante aliança política com o mandato do deputado estadual Hilton Coelho. A aliança continuará em 2022?
Giovani Damico – Certamente. Hilton vem construindo uma importante aliança com o PCB, da qual participo com muita dedicação. Encontramos nessa parceria uma importante aliança tática entre duas forças políticas diferentes, mas que conseguem olhar para os problemas e tarefas urgentes da Bahia e encontrar um terreno fértil para atuação conjunta, seja nos meios institucionais seja nas lutas quotidianas nas ruas.
Nosso partido decidiu de maneira unanime pela manutenção da aliança política com Hilton, apoiando sua pré-candidatura para reeleição como Deputado Estadual, de modo que abrimos mão de candidaturas para Deputado Estadual, e reforçando nosso apoio político a esta parceria.
O Momento – Como o PCB avalia o governo burgo-petista de Rui Costa?
Giovani Damico – O Governo Rui Costa é a expressão mais bem acabada, ou mais deformada do petismo a depender do ângulo de observação. Para os que acreditam que o PT ainda guarda elementos de um partido representativo da classe trabalhadora, Rui Costa figura como uma deformação, uma excrescência de direita no seio do Partido dos Trabalhadores. Do nosso ponto de vista, há muito tempo foi cruzado o Rubicão no processo de transformismo que tornou o PT naquilo que ele é hoje, um partido amalgamado com a ordem burguesa de forma irreversível, sendo Rui Costa a expressão clara de tal processo.
O Governo Rui Costa foi marcado pelos ataques diários aos servidores e ao serviço público, seja no SUS, seja na sua reforma da previdência, que conseguiu em muitos aspectos suplantar a reforma bolsonarista, seja no desmonte continuado da educação, com fechamento massivo de escolas, militarização de uma centena de escolas, exonerações, arrocho salarial e contingenciamento permanente do orçamento para a Educação incluídas as Universidades Estaduais que vem sofrendo duros ataques em seu Governo.
Avaliamos que este é um governo do Capital, é um Governo que fecha seu mandato com marcas deletérias como a aprovação da venda da Embasa, o fechamento da Bahia Pesca, da EBDA, na venda da EBAL, num verdadeiro desmonte do estado baiano.
O Momento – Haveria possibilidade do PCB conversar com forças descontentes com a situação interna ao Psol ou, até mesmo com a UP?
Giovani Damico – Estes diálogos estão em andamento e continuarão por todo o próximo período, existe um forte entendimento de que há terreno fértil para fazer avançar nossa política de alianças com os setores mais consequentes do PSOL, bem como a UP. A própria aliança com o Dep. Hilton Coelho é expressão deste cenário.
Com relação à Unidade Popular, acreditamos que este é também um partido importante, e que embora recém fundado, possui uma trajetória pautada nas lutas populares e com um histórico de luta no qual certamente encontramos companheiros de construção da luta política. No âmbito eleitoral, demos início a diálogos sobre uma eventual aliança incluída as eleições majoritárias, mas estão em curso avaliações da parte da UP, que possivelmente poderão culminar em uma aliança para além das ruas, chegando às eleições atuais.