MEC segue servindo aos empresários da educação

Luana César – militante da UJC de Piracicaba

Viemos de fato de tempos sombrios em todos os Ministérios, e no da Educação não foi diferente. O grande número de troca de ministros devido a polêmicas é assustador. Após a posse de Lula, os setores progressistas estão emocionados com a representatividade na cerimônia e com os avanços que já começaram a acontecer desde então. No entanto, tudo está muito longe de ser o ideal para a classe trabalhadora, principalmente no campo da educação.

Antes de prosseguir, é importante retomar um pouco do histórico da educação nacional para compreender onde ela se encontra. Durante todo o descaso com a educação ao longo do governo de Bolsonaro, a esquerda liberal em muitos momentos se recusou a compor mobilizações contra todas as atrocidades e cortes de verba que aconteceram neste período, unindo forças em torno apenas da eleição de Lula, da derrota de Bolsonaro por meio exclusivo das urnas, limitando as forças da classe trabalhadora às normas da democracia burguesa.

Um breve histórico do MEC no governo Bolsonaro

Vélez, seu primeiro ministro, que propôs a revisão do ensino acerca da história da ditadura militar, ocupou o cargo por apenas quatro meses. Em seguida, Weintraub, um conhecido negacionista que participava de manifestações pelo fechamento do STF com a ala mais extremista e conspiracionista do bolsonarismo, ocupou o cargo por dois meses. Seu secretário-executivo, Vogel, assumiu temporariamente, passando pela indicação de Decotelli, que mal chegou a tomar posse, pois mentiu em seu currículo sobre a sua formação acadêmica e trajetória profissional.

O ministro a ocupar o cargo por mais tempo, de julho de 2020 a março de 2022, Milton Ribeiro, logo de início fez declarações homofóbicas e capacitistas, relacionando a homossexualidade a famílias desajustadas e afirmando que crianças com deficiência não poderiam ser incluídas na escola regular, debate já superado pela educação especial. Após episódio de crise no ENEM marcado pelo pedido de demissão em massa de funcionários do Inep devido a irregularidades e à péssima gestão do instituto, Ribeiro abandonou o MEC em março, após denúncias de que a pedido do presidente ele estaria favorecendo dois pastores, com liberação de recursos do FNDE.

Assumiu então Victor Godoy Veiga, secretário-executivo de Ribeiro, que seguiria o mesmo caminho que seu antecessor e que, em seu passado, ameaçou servidores que levassem para investigação as fraudes que aconteciam na Unifil de Londrina.

O novo MEC

Pois bem, educadores que a princípio apontavam as falhas nos governos petistas anteriores também passaram a alegar que não era hora de criticar as políticas educacionais petistas que entregavam recursos da educação pública para o sistema privado. Agora, após a posse de Lula, temos a composição do novo ministério da educação, e o cenário não é diferente.

À frente Camilo Santana, engenheiro agrônomo e ex-governador do Ceará, em seu discurso de posse extremamente desvinculado das lutas dos professores, menciona apenas os supostos sucessos da educação básica cearense. Cabe ainda ressaltar que seu discurso foi exaltado pela Federação Nacional das Escolas Particulares, que tem em vista até mesmo uma espécie de FIES para a Educação Básica com o novo MEC.

Tal crença no sucesso da educação cearense deve-se aos índices alcançados pelo estado no IDEB, instrumento extremamente falho para avaliar o ensino-aprendizagem, visto que basta que todo o processo educativo seja resumido em uma educação bancária, como diria Paulo Freire, em que os estudantes decoram as respostas das provas com o foco nelas próprias. Outro ponto ainda é que tal ferramenta é facilmente burlada, como apontado em matérias sobre o Ideb em Sobral, retirando da sala os alunos que não memorizam os conteúdos e promovendo os estudantes para o próximo ano independentemente de terem o conhecimento necessário para acompanhar a turma seguinte.

A nova secretária executiva, Izolda Cela, foi o principal nome indicado para ser ministra, mas o próprio PT apontou críticas (principalmente pelo fato de ela não ser do partido) que levaram à nomeação de Camilo Santana. Também ex-governadora do Ceará, compôs a Secretaria da Educação de Sobral, município que alcançou a maior nota no IDEB e que recebeu grande atenção de Jorge Paulo Lemann. O marido de Izolda, Veveu Arruda, foi convidado por Lemann para formar-se nos Estados Unidos com vistas a, futuramente, “sobralizar” a educação nacional.

Em parceria com Veveu, foi fundado o Centro Lemann, responsável pela formação de educadores e gestores para a formulação e implementação de políticas públicas visando os interesses próprios dos Aparelhos Privados de Hegemonia (APHs), como é o caso da própria Fundação Lemann.

A fim de esclarecer a respeito do termo acima mencionado:

As fundações, os institutos e as organizações empresariais compõem os aparelhos privados de hegemonia na concepção gramsciana que proliferaram nas primeiras décadas do século XXI para expandir, em larga escala e territorialmente, um certo tipo de sociabilidade burguesa que levou à mercantilização e mercadorização da educação escolar e seus sistemas de ensino, como estratégia de conformação da classe trabalhadora aos interesses do capital internacional. (FARIAS, 2021, p. 736)

O movimento Todos pela Educação, já vinculado à Fundação Lemann e outros APHs já é responsável pela formulação de políticas educacionais que ditam quais os conteúdos e metodologias a serem utilizados em sala de aula, como é o caso da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e da Reforma do Ensino Médio (que, apesar das pressões feitas pelos educadores, não será revogada pelo novo governo).

Tais APHs já se mobilizavam durante os governos petistas anteriores, continuando assim o projeto de inculcação da ideologia burguesa na educação básica pública, dos ideais necessários ao trabalhador, que deve sempre “saber fazer” e não por que saber, sem as ferramentas para compreender o mundo e o sistema em que está inserido.

Além disso, cabe apenas mencionar o grande repasse das verbas – que deveriam ser destinadas para a educação pública no ensino superior – às instituições privadas por meio do FIES e do Prouni. Alegam que estas foram grandes ferramentas para a inserção da classe trabalhadora no ensino superior, mas elas na verdade endividaram muitos trabalhadores e não propiciaram a aprendizagem de fato dos saberes em instituições à distância que pouco se preocupam com a qualidade do ensino proporcionado.

Prosseguindo, para além desses principais nomes, Kátia Schweickardt, reitora da UFRJ e ex-secretária da educação de Manaus, assume a Secretaria de Educação Básica. Esta foi responsável por programas para formação de educadores em parceria com a Fundação Lemann (por meio do Instituto Gesto) e por chamar de criminosos professores que se manifestavam pelo pagamento de verbas do Fundeb. No entanto, reportagens apontam o progresso da presença de uma mulher negra no MEC; para variar, a representatividade esvaziada de conteúdo de classe.

Para presidente do Inep, foi nomeado Manuel Palácios, ex-secretário da educação básica no governo Dilma, grande entusiasta do EaD e de avaliações externas já criticadas acima, além de ser um dos formuladores da BNCC, também com vistas à “sobralização” do ensino nacional.

Também de Sobral, Maurício Holanda assume a Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino. Os demais membros do Ministério foram anunciados no último dia 6. Para não tornar o artigo demasiado extenso, cabe apenas mencionar que é fácil encontrar vínculos entre muitos dos secretários nomeados para a pasta da educação com o Movimento Todos pela Educação e aparelhos privados de hegemonia como a Fundação Lemann.

Agora coloca-se o questionamento: as alas da esquerda liberal continuarão a dizer que não é hora de criticar e pressionar por mudanças? Continuaremos a entregar a educação pública e seus recursos para os oligopólios da educação? Deixaremos que o Novo Ensino Médio continue, visto que em nenhum momento o novo governo mencionou sua revogação? Enfim, com os nomes que temos até agora no MEC, vê-se apenas que os retrocessos no nosso campo terão continuidade, que temos todos os motivos para nos mobilizarmos e cobrarmos por mudanças radicais, por uma educação de qualidade, bem longe do sentido atribuído a este termo pelo Todos Pela Educação.