O vale de San Quintín
Uma zona isolada no norte do México. Uma população de proletários rurais, brutalmente explorados e oprimidos, socialmente marginalizados. Mas há um vento de agitação que percorre o país, e os explorados levantam-se. Nada têm a perder senão as próprias cadeias.
Localizado a uns 300 quilómetros da fronteira norte, na Baixa Califórnia. Afastado de tudo, em que a sede do município, o porto de Ensenada, se situa a 170 quilómetros. O INEGI estima que tem uma população de 50 mil pessoas, das quais pelo menos 80% são jornaleiros originários do sul do México e 15% falam alguma língua indígena: mixteca, zapoteca ou náhuatl. Ali estão “A nova San Juan Copala”, “A Nova Juchitepec” e “Nova Juchitlan”, as colonias em que assentaram nesses lugares e que chamam como os lugares de onde são originários.
Abandonam a montanha em busca da terra prometida: San Quintín. Conta-se que desde a década de 80 do século passado corria o rumor de que lá no norte grandes companhias estado-unidenses pagavam salários como os dos Estados Unidos. A realidade é que nesta zona têm as suas sedes não mais de cinco empresas com capital nacional e parceiros comerciais estado-unidenses, principalmente da Califórnia, e pelo menos 20 campos agrícolas onde os jornaleiros que se atrevem a protestar são fichados e acabam vagueando pelas ruas.
Em todos estes campos a situação é similar: exploração laboral, assédio laboral, vexames e violações sexuais por parte dos capatazes do patronato. Situação encoberta por todos os níveis de governo: Local, Estatal e Federal. O angariador chamava-lhe “A Terra Prometida”: “Neste oásis no meio do deserto nada lhes faltaria, teriam salários como nos EUA” e acabam sendo um número nas estatísticas: as políticas de saúde pública são tão deploráveis como as laborais. Segundo o Plano de Desenvolvimento Regional 56.92% da população carece de cuidados médicos e grande parte dos jornaleiros não tem segurança social nem contratos de trabalho. Concluíam o seu sonho conformando-se apenas com alcançar a sua liberdade e escapar.
Esta é uma força laboral praticamente expulsa da sociedade e ultrajada, da qual já ninguém se recordava, onde as novas gerações nascem com malformações devido aos pesticidas. Aqui os trabalhadores podem ser roubados e as mulheres violadas sem que ninguém faça nada. Ninguém confia nem na comissão de Direitos Humanos, pois conhecem a cumplicidade que existe entre os empresários, deputados e governo. Aqui é onde se gera a rebelião de classe dos oprimidos contra os exploradores.
Hoje estes trabalhadores do campo foram contagiados pela situação agitada que se vive no México, aprenderam que nada alcançaram com lamentos e, de um momento para o outro, tomando todos de surpresa, levantam-se para se fazerem ouvir, recordando-nos a precarização laboral em que vivem milhões de assalariados do povo de México. Nada mais oportuno, pois arrancaram as grandes campanhas de demagogos peritos no engano e na mentira e ninguém quer comprometer-se com os exploradores, evidentemente, quando se trata da caça ao voto.
Aos trabalhadores agrícolas apenas lhes resta o caminho da organização, porque de outra forma os pesticidas acabarão com a sua saúde e ver-se-ão pedindo esmola pelas ruas como tantos outros, ou como prisioneiros do patronato, pois as lojas de fronteira mantêm-nos como verdadeiros reféns das dívidas contraídas. As mulheres acabariam como as demais, cobrindo o rosto, envergonhadas e humilhadas, caminhando com medo onde os seus homens nada podem fazer perante a ameaça do despedimento. Por isso é que, nada tendo a perder, arriscam hoje o tudo por tudo.
Publicado em El Comunista, órgão do Comité Central do Partido Comunista de México
*Membro do Comité Central do Partido Comunista do México
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