Bloqueio a Cuba é crime contra a humanidade
Joe Biden não pode ser deixado impune, porque sua promessa eleitoral de abandonar a hostilidade de Trump contra Cuba não foi cumprida.
Ken Livingstone | Morning Star
Tradução de André Marques para a Revista Opera, com revisão de Rebeca Ávila
Países ao redor do mundo novamente exigiram nas Nações Unidas que os Estados Unidos suspendam o bloqueio à Cuba, que impõem desde 1962.
Em 23 junho de 2021, na 29° votação da Assembleia Geral da ONU sobre a questão do bloqueio dos EUA, 184 países apoiaram a resolução cubana pedindo seu fim.
Somente os EUA e Israel votaram contra, enquanto três outros países — Brasil, Colômbia e Ucrânia — se abstiveram. Israel, Brasil, Colômbia e Ucrânia podem ser melhor descritos como Estados “fantoches” dos EUA quando se trata de questões internacionais.
O debate sobre a resolução permitiu ao Ministro de Relações Exteriores de Cuba, Bruno Rodriguez, expor às Nações Unidas qual tem sido o impacto do bloqueio ilegal dos EUA.
Desde seu início, Cuba sofreu perdas de 147 bilhões de dólares. O advento da pandemia de Covid-19 teve um efeito particularmente devastador na economia de Cuba, já que o turismo desapareceu, contribuindo para um déficit de 3.4 bilhões de dólares na receita e levando a críticos desabastecimentos de comida, medicamentos e outros produtos básicos.
O bloqueio, nas palavras de Rodriguez, só pode ser visto como um “foco deliberado dos EUA em punir a população cubana como um todo. É uma negação massiva, flagrante e sistemática dos direitos humanos do povo cubano”.
Apontando o objetivo do governo dos EUA como uma “mudança de regime”, ele argumentou: “Não é legal nem ético que um país poderoso sujeite uma nação pequena, por décadas, a uma incessante guerra econômica com o propósito de impor a ela um sistema político alienígena e um governo designado por ele […] assim como o vírus, o bloqueio sufoca e mata, e precisa parar”.
O bloqueio foi, é claro, intensificado nos últimos quatro anos como parte do objetivo do presidente Donald Trump de conquistar a “mudança de regime” em Cuba, mas a Venezuela e Nicarágua também estiveram sujeitas a um tratamento ilegal similar.
No caso de Cuba, durante a presidência de Trump, um total de 242 medidas coercitivas foram aplicadas contra o país para fortalecer o controle que os EUA podem exercer sobre suas atividades econômicas, comerciais e financeiras.
Nos últimos 10 dias de sua administração, Trump colocou Cuba em uma arbitrária lista de países que supostamente são patrocinadores do terrorismo.
A promessa do Presidente Joe Biden durante a campanha presidencial do ano passado de que iria reverter algumas das sanções de Trump, que ele disse terem “infligido danos ao povo cubano e não fizeram nada para avançar a democracia e os direitos humanos”, até agora não deu em nada.
Na verdade, Biden renovou em maio a resolução da administração Trump de que Cuba “não está cooperando completamente com os esforços anti-terrorismo dos Estados Unidos”.
Essa decisão pode servir para satisfazer os eleitores cubano-americanos reacionários na Flórida, mas ela indica pouco entusiasmo presidencial para uma abordagem mais esclarecida da política cubana.
Mas os cubano-americanos progressistas querem ver mudanças, organizando caravanas de bicicletas e de carros contra o bloqueio e pela reunificação familiar.
Muitas cidades dos EUA juntaram-se nesses atos de solidariedade perante a votação da ONU, assim como ativistas em Londres, Birmingham, Liverpool, Manchester e Sheffield fizeram parte da Caravana Mundial Contra o bloqueio dos EUA à Cuba.
Democratas no Congresso também estão fazendo lobby por uma mudança, variando entre moderada e basilar, na posição do governo dos EUA.
Em janeiro, o congressista dos EUA James McGovern, presidente do Comitê de Regras da Casa, pediu que Biden reverta as medidas de Trump e “imediatamente acabe com a aplicação de sanções contra alimentos, medicamentos e outras assistências humanitárias para Cuba”, mas não teve efeito.
No Senado, o senador democrata de Oregon Ron Wyden, junto a três co-patrocinadores, introduziu em fevereiro o seu “Tratado Comercial Estados Unidos-Cuba de 2021”, que acabaria com o bloqueio e estabeleceria relações comerciais normais com o país.
Além disso, uma carta para Biden de 80 democratas da Casa pediu em março um fim imediato às restrições de viagem e de remessas, mas não obteve resposta.
A situação de Cuba é urgente. O impacto do bloqueio nas vidas dos cubanos tem sido enorme ao longo dos anos, mas tem se acentuado como resultado da atual crise sanitária sem precedentes.
Cuba enfrenta enormes (e em alguns casos insuperáveis) dificuldades em assegurar a gama de equipamentos — ventiladores pulmonares mecânicos, máscaras faciais, kits de diagnóstico, óculos de proteção, trajes, luvas, reagentes e outros suprimentos — necessários para lidar com a pandemia da Covid-19.
Apesar da escassez de reagentes e materiais laboratoriais, o investimento de Cuba na sua indústria de biotecnologia desde os anos 80 foi recompensado com o desenvolvimento de cinco tipos de vacinas para a Covid-19, possibilitando o planejamento e o início de uma campanha de imunização.
No entanto, o país está sofrendo uma escassez crítica de seringas, com o bloqueio impedindo que elas sejam importadas.
Organizações de solidariedade buscam doações para comprar suprimentos e enviá-los para Cuba.
A Venezuela também está sofrendo o duro impacto do bloqueio dos EUA enquanto tenta enfrentar a pandemia. Ela é dependente da Covax, iniciativa de compartilhamento de vacinas apoiada pela Organização Mundial da Saúde para seu programa de imunização, mas o banco suíço UBS recentemente bloqueou os pagamentos para a Covax superiores a 4.5 milhões de dólares, requerendo uma “investigação”.
Agora, mais do que nunca, é vital intensificar as nossas expressões de solidariedade internacional em defesa da soberania nacional e deixar claro que as medidas coercitivas dos EUA contra Cuba — mas também contra a Venezuela e Nicarágua — não são somente ilegais, mas também injustificáveis e inaceitáveis.