Syriza: Saqueio, pilhagem e prostração

imagem– Como a “esquerda” abraça políticas de direita

por James Petras

A Grécia tem estado nas manchetes da imprensa financeira internacional durante os últimos cinco meses, quando o partido de esquerda recém eleito, o Syriza, que se opunha ostensivamente às chamadas “medidas de austeridade”, confrontava directamente a Troika (Fundo Monetário Internacional, Comissão Europeia e Banco Central Europeu).

Inicialmente a liderança do Syriza, encabeçada por Alexis Tsipras, adoptouvários posicionamentos estratégicos com consequências fatais – em termos de implementação das suas promessas eleitorais de elevar padrões de vida, acabar com a vassalagem à Troika e seguir uma política externa independente.

Prosseguiremos esboçando os fracassos sistémicos iniciais do Syriza e as subsequentes concessões, corroendo mais uma vez padrões de vida gregos e aprofundando o papel da Grécia como um colaborador activo do imperialismo dos EUA e israelense.

Ganhar eleições e capitular ao poder

A esquerda norte-americana e europeia celebrou a vitória eleitoral do Syriza como uma ruptura com programas de austeridade neoliberais e como o lançamento de uma alternativa radical, a qual implementaria iniciativas populares para mudanças sociais básicas, incluindo medidas para gerar emprego, restabelecer pensões, reverter privatizações, reordenar prioridades do governo e favorecer pagamentos a empregados em relação a bancos estrangeiros. A “evidência” para a agenda de reforma radical estava contida no Manifesto de Salónica , o qual o Syriza prometeu que seria o programa condutor dos seus responsáveis recém eleitos.

Contudo, antes e imediatamente depois de serem eleitos, líderes do Syriza adoptaram três decisões básicas eliminando quaisquer mudanças significativas. Na verdade, estas decisões puseram em curso uma rota reaccionária .

Em primeiro lugar e acima de tudo, o Syriza aceitou como legítima a dívida externa de mais de 350 mil milhões de dólares, apesar de a maior parte ter sido assinada por anteriores governos cleptocratas, bancos, negócios, imobiliário e interesses financeiros corruptos. Virtualmente nada desta dívida foi utilizada para financiar actividade produtiva ou serviços vitais, os quais fortaleceriam a economia e a futura capacidade da Grécia para reembolsar os empréstimos.

Centenas de milhares de milhões de Euros foram escondidos longe através de contas em bancos e imobiliário estrangeiro ou investidos em acções e títulos além-mar. Depois de afirmar a “legitimidade” da dívida ilícita, o Syriza prosseguiu declarando sua “disposição” para pagar a dívida. A Troika imediatamente entendeu que o novo governo Syriza seria um refém receptivo a nova coerção, à chantagem e pagamentos da dívida.

Em segundo lugar, e relacionado com o acima, o Syriza declarou sua determinação de permanecer dentro da União Europeia e da Eurozona e portantoaceitou a rendição da sua soberania e da sua capacidade para moldar uma política independente. Declarou a sua disposição a submeter-se aos ditames da Troika. Uma vez sob a pata da Troika, a única política do Syriza seria “negociar”, “renegociar” e fazer novas concessões aos bancos da UE num processo totalmente unilateral. A rápida submissão do Syriza à Troika foi a sua segunda traição estratégica, mas não a última, ao seu programa eleitoral.

Uma vez que o Syriza demonstrou à Troika a sua disposição para trair seu programa popular, a Troika escalou suas exigências e endureceu sua intransigência. Bruxelas descontou a retórica de esquerda do Syriza e seus gestos radicais de teatro como um sopro de fumaça nos olhos do eleitorado grego. Os banqueiros da UE sabiam que quando chegasse o momento de negociar novos acordos de empréstimo, a liderança do Syriza capitularia. Enquanto isso, a esquerda euro-americana engoliu toda a retórica radical do Syriza sem olhar para sua prática real.

Em terceiro lugar, ao tomar posse, o Syriza negociou uma coligação com a extrema-direita do Partido dos Gregos Independentes, pró NATO (OTAN), xenófobo e anti-imigrantes, garantindo que a Grécia continuaria a apoiar políticas militares da NATO no Médio Oriente, na Ucrânia e a campanha brutal de Israel contra a Palestina.

Em quarto lugar, a maior parte dos nomeados para o gabinete do primeiro-ministro Tsipras não tinham experiência de luta de classe. Pior ainda, a maior parte eram académicos e antigos conselheiros do PASOK sem qualquer capacidade ou disposição para romper com os ditames da Troika. Sua “prática”académica consistia em grande parte de “combate” teórico, mal adaptado à confrontação no mundo real com potências imperiais agressivas.

De um arranhão à gangrena

Ao capitular à UE desde o início, incluindo a aceitação do pagamento da dívida ilegítima, enganchado à Extrema-direita e submisso aos ditames da Troika, o cenário estava pronto para que o Syriza traísse todas as suas promessas e agravasse o fardo económico dos seus apoiantes . As piores traições incluem: (1) não restabelecer pagamentos de pensões; (2) não restabelecer o salário mínimo; (3) não reverter privatizações; (4) não finalizar programas de austeridade; e (5) não aumentar fundos para educação, saúde, habitação e desenvolvimento local.

A Troika e seus publicistas na imprensa financeira estão a exigir que o Syriza corte ainda mais o sistema grego de pensões, empobrecendo 1,5 milhão de trabalhadores reformados. Ao contrário do que os media apresentaram como “exemplos” de pensões gordas desfrutadas por menos de 5% de pensionistas, os gregos sofreram as mais profundas reduções de pensões na Europa em mais de um século. Só nos últimos quatro anos a Troika cortou oito vezes as pensões gregas. A vasta maioria das pensões foi amputada em aproximadamente 50% desde 2010. A pensão média é de 700 Euros por mês mas 45% dos pensionistas gregos recebem menos de 665 Euros por mês – abaixo da linha de pobreza. Mas a Troika exige reduções ainda maiores. Estas incluem por fim a subsídios orçamentais a pensionistas que vivem em pobreza extrema, um aumento na idade de reforma para 67 anos, uma abolição de disposições de pensões ligadas a ocupações perigosas e para mães trabalhadoras. As medidas regressivas prévias, impostas pela Troika e implementadas pelo regime anterior da coligação de direita, esgotou gravemente o fundo de pensões grego. Em 2012, o programa de “reestruturação da dívida” da Troika levou à perdade 25 mil milhões de Euros de reservas possuídas pelo governo grego em títulos governamentais. As políticas de austeridade da Troika asseguraram que as reservas para pensões não seriam reabastecidas. As contribuições mergulharam quando o desemprego ascendeu a cerca de 30% ( Financial Times,6/5/15, p.4). Apesar do assalto frontal da Troika ao sistema de pensões grego, a “equipe económica” do Syriza manifestou sua disposição para elevar a idade de reforma, cortar pensões em 5% e negociar novas traições a pensionistas enfrentando privações. O Syriza não só fracassou em cumprir sua promessa de campanha de reverter as políticas regressivas anteriores como comprometeu-se nas suas próprias liquidações “pragmáticas” junto à Troika.

Pior ainda, o Syriza aprofundou e estendeu as políticas dos seus antecessores reaccionários. (1) O Syriza prometeu congelar privatizações: Agora ele promete estendê-las em 3,2 mil milhões de Euros e privatizar novos sectores públicos. (2) O Syriza concordou atribuir recursos públicos escassos aos militares, incluindo um investimento de 500 milhões de Euros para aperfeiçoar a Força Aérea Grega. (3) O Syriza pilhou o fundo nacional de pensões e tesourarias municipais em mais de mil milhões de euros para cumprir pagamentos de dívidas à Troika. (4) O Syriza está a cortar investimentos públicos em projectos de infraestrutura e criação de emprego para atender datas finais da Troika. (5) O Syriza concordou com um excedente orçamental de 0,6% no momento em que a Grécia está a incidir, neste ano, num défice de 0,7% – o que significa mais cortes depois deste ano. (6) O Syriza prometia reduzir o IVA sobre bens essenciais como alimentos; agora aceita uma taxa de 23%.

A política externa do Syriza imita a dos seus antecessores. O ministro da Defesa de extrema-direita do Syriza, Panos Kammenos, tem sido um apoiante ruidoso das sanções dos EUA e UE contra a Rússia – apesar da agitação habitual dos falsos “dissidentes” do Syriza a políticas da NATO, seguidas pela capitulação total – para permanecer nas boas graças da NATO. O regime Syriza tem permitido a todos os cleptocratas e evasores fiscais bem conhecidos areterem sua riqueza ilícita e aumentarem seus haveres além-mar com transferências maciças das suas actuais “poupanças” para fora do país. No fim de Maio de 2015, o primeiro-ministro Tsipras e o ministro das Finanças Varoufakis esvazi​aram o Tesouro para atender a pagamentos de dívida, aumentando as perspectivas de que pensionistas e trabalhadores do sector público não receberão os seus benefícios. Tendo esvaziado o Tesouro grego, o Syriza agora imporá a “Solução Troika” sobre as costas das empobrecidas massas gregas: ou aprovar um novo plano de “austeridade”, reduzindo pensões, aumentando a idade de reforma, eliminando leis de protecção à segurança de empregos dos trabalhadores e negociando direitos ou enfrentar um tesouro vazio, sem pensões, aumento do desemprego e aprofundamento da depressão económica. O Syriza deliberadamente esvaziou o Tesouro, pilhou fundos de pensão e haveres locais de municípios a fim de chantagear a população a aceitar como um facto consumado as políticas regressivas de banqueiros da UE – os chamados “programas de austeridade”.

Desde o princípio , o Syriza atendeu aos ditames da Troika, mesmo quando eles encenavam sua “resistência de princípio”. Primeiro mentiram ao público grego, chamando a Troika de “parceiros internacionais”. A seguir mentiram outra vez chamando o memorando da Troika para maior austeridade de “documento negocial”. Os enganos do Syriza pretendiam esconder a sua continuação do “quadro” altamente impopular imposto pelo anterior e desacreditado regime de extrema-direita.

Ao pilhar o país de recursos a fim de pagar os banqueiros, o Syriza escalou sua abjecção internacional. Seu ministro da Defesa ofereceu novas bases militares à NATO, incluindo uma base aérea-marítima na ilha grega de Carpatos. O Syriza escalou o apoio político e militar da Grécia à UE e aos EUA para intervenções militares e apoio a terroristas “moderados” no Médio Oriente, ridiculamente em nome da “protecção de cristãos”. A bajulação do Syriza a sionistas europeus e estado-unidenses, fortalecendo seus laços com Israel, evocando uma “aliança estratégica” com o estado do apartheid terrorista. Desde os seus primeiros dias no gabinete, o ministro de extrema-direita da Defesa, Kammenos, propôs a criação de um “espaço de defesa comum” incluindo Chipre e Israel – apoiando portanto o bloqueio aéreo e marítimo de Israel a Gaza.

Conclusão

A decisão política do Syriza de ” embutir-se ” na UE e na Eurozona, a todo custo, assinala que a Grécia continuará a ser um estado vassalo , traindo seu programa e adoptando políticas profundamente reaccionárias, mesmo enquanto trombeteia sua falsa retórica esquerdista e finge “resistência” à Troika. Apesar do facto de o Syriza ter pilhado pensões internas e tesourarias locais, muitos iludidos esquerdistas na Europa e nos EUA continuam a aceitar e racionalizar o que eles escolheram alcunhando-as como “compromissos realistas e pragmáticos”.

O Syriza enterrou a Grécia ainda mais fundo dentro da hierarquia dominada pelas finanças alemãs, ao capitular do seu poder soberano de impor uma moratória da dívida, abandonar a Eurozona, preservar seus recursos financeiros, restabelecer uma divisa nacional, impor controles de capitais, confiscar milhares de milhões de Euros em contas ilícitas além-mar, mobilizar fundos locais para financiar a recuperação económica e reactivar o sector público e privado. O falso “Sector de esquerda” dentro do Syriza repetidamente balbuciou “objecções” impotentes, enquanto Tsipras-Varoufakis prosseguiam a liquidação mistério até a capitulação final.

No final das contas, o Syriza aprofundou a pobreza e o desemprego, aumentou o controle estrangeiro sobre a economia, desgastou ainda mais o sector público, facilitou o despedimento de trabalhadores e cortou nas indemnizações por despedimento – enquanto aumentou o papel dos militares gregos ao aprofundar suas ligações à NATO e a Israel.

Igualmente importante, o Syriza esvaziou totalmente a fraseologia de esquerda de qualquer significado cognitivo: para eles, soberania nacional traduz-se em vassalagem internacional e anti-austeridade tornam-se capitulações pragmáticas a nova austeridade. Quando o acordo Tsipras-Troika for finalmente assinado e o terrível dano da austeridade durante as próximas décadas afundar-se dentro da consciência do público grego, a traição esperançosamente dará lugar à repulsa em massa. Talvez o Syriza venha ser dividido e a “esquerda” finalmente abandone seus confortáveis postos no gabinete e se junte aos milhões insatisfeitos para formar um partido alternativo.

15/Junho/2015

O original encontra-se em petras.lahaine.org/?p=2039

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

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