De pedalada em pedalada…
Finalmente a presidente Dilma saiu do armário e denunciou o “golpismo escancarado” da oposição. No dia seguinte, foi mais longe e criticou as “pedaladas políticas”, referência aos inúmeros pedidos de impeachment apresentados – a maioria já descartados – na Câmara.
A sua reação tem por base o impedimento que o STF impôs ao presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha. Mas não é só isso. Está claro o entendimento do governo com esse mesmo parlamentar, acusado de possuir contas secretas na Suíça, com algo em torno de US$ 5 milhões. Acuado por sistematicamente ter negado a existência de tais contas, o deputado Eduardo Cunha incorreu em falso testemunho, o que fere o Código de Ética da Câmara, abrindo a possibilidade de cassação de seu mandato. Era tudo que o governo precisava.
Da mesma maneira que já tinha fechado acordo com o presidente do Senado, Renan Calheiros, também alvo da Operação Lavo Jato, agora a presidente e o governo conseguem garantir o “apoio” do presidente da Câmara. Pronto, o cerco está fechado no Congresso. A possibilidade de impeachment, que já havia diminuído sensivelmente, tornou-se bastante improvável. Somente um fato novo significativo pode voltar a dar gás para a oposição.
Oposição essa, aliás, que de oposição não tem nada, a não ser o desejo de retornar ao poder, às benesses que o mesmo propicia e uma proposta de entregar o pré-sal de uma vez, ao contrário do governo, que adota doses homeopáticas para não magoar sua base entre os petroleiros e a CUT.
No campo político e econômico suas divergências são filigranas, vide manutenção do modelo de beneficiamento ao capital financeiro, ao latifúndio, às transnacionais etc. O Código Florestal, o de Mineração, as mudanças nas leis trabalhistas – com o acordado se sobrepondo ao legislado – os benefícios previdenciários, a lei “antiterror” e tantas outras são apoiadas pelos partidos de oposição de uma maneira em geral. Se Aécio tivesse sido eleito estaria fazendo a mesma coisa, talvez até menos para não “dar bandeira”.
A contrapartida a tantos benefícios para o capital, as chamadas políticas sociais, lembram Ademar de Barros, ex-governador de São Paulo, famoso por realizar inúmeras obras públicas naquele estado e por várias acusações de corrupção, tendo ficado conhecido como aquele que “rouba mas faz”.
Afirmar que reduziu a miséria é depreciar a inteligência alheia, particularmente quando os critérios das organizações internacionais são cada vez mais flexíveis. Se você recebe US$ 2 por dia está fora da miséria. Vá viver com R$ 9 por dia, R$ 270 por mês, e depois diga se isso não é miséria.
A única mudança estrutural realizada é o programa Minha Casa Minha Vida, mas cujos contratos podem ser alterados no futuro. Depois do que FHC e Lula fizeram o que fizeram com a Previdência, e Collor, com os depósitos bancários, tudo é possível.
Os investidores estrangeiros, tão propalados pela mídia empresarial, que “justificam” a imensa gama de recursos bueiro abaixo para beneficiá-los, é composta por basicamente quatro segmentos: investidores externos (grandes corporações), bancos, fundos de investimentos e de pensão. Todos integrantes do sistema financeiro. Isso é o que chamam de “mercado”. É o que está afundando a Europa, os Estados Unidos e o Brasil.
Curioso que ninguém lembra de olhar o balanço de pagamentos e verificar que os recursos que saem do país entre pagamentos de royalties, juros, remessas de lucros, amortizações etc. em muito superam os famosos “investimentos estrangeiros”.
É uma mera conta aritmética, digna de quem ainda usa velocípede.
Afonso Costa
Jornalista.