Outra notícia dolorosa da Palestina ocupada

imagempor Carlos Aznárez

30 de junho de 2016 – Há vezes que é difícil para nós comunicadores populares escrever. Mais ainda, diria que nos indigna fazê-lo, sabendo que nossas palavras repercutirão em grandes sentimentos de indiferença. No entanto, me sinto obrigado a opinar sobre uma nova tragédia ocorrida na Palestina. A notícia da qual quero falar relata uma verdadeira tragédia, como tantas que há quase sete décadas vem acontecendo nos territórios ocupados por Israel.

Um adolescente palestino de 17 anos, Muhammad Nasser Tarayra, aparentemente, ingressou em um assentamento ilegal de Kiryat Arba, nos arredores de Hebron e, depois de entrar em uma das cômodas habitações que quase sempre possuem os colonos ocupantes, teria esfaqueado em seu dormitório outra adolescente de 13 anos, Hallel Yafa Ariel. A menina morreu pouco depois no hospital para onde foi levada, e o adolescente palestino foi morto a tiros, como se costuma fazer nestes casos, tenha ou não tenha uma faca em suas mãos.

Esses são os fatos contados friamente pelas agências internacionais, que não titubeiam em caracterizar o jovenzinho Tarayra como um “perigoso terrorista” e a menina judia-estadunidense como a “vítima de um assassinato cruel”, segundo limita em seu particular estilo o primeiro ministro sionista Benjamín Netanyahu.

Sem nenhuma dúvida é um horror que dois adolescentes que poderiam estar namorando, rindo em algum bar ou indo como bons amigos a um cinema ou a uma discoteca, estejam metidos, ambos, em uma situação pela qual nenhum dos dois é totalmente responsável.

Existem outros detalhes que não são contados pelas mídias e muito menos se são israelenses ou fieis a suas matrizes de opinião. O jovem Tarayra vivia em Bani Naim, Hebron, e isso já significa muito neste conflito onde a brutalidade de um exército ocupante se une com a provocação, muitas vezes assassina dos colonos e colonas sionistas. Hebron é, como Gaza, uma verdadeira prisão a céu aberto, com a diferença de que apesar de todas as bombas lançadas e a destruição gerada sobre o povo gazita, ali pelo menos, os habitantes não se cruzam diariamente com os soldados do exército israelense. Em compensação, em Hebron, os habitantes palestinos desse povoado vivem em constante tensão já que adultos e jovens colonos não param de atacá-los, provocá-los e humilhá-los.

Tanto é assim que das partes mais altas de seus departamentos não param de atirar seus excrementos, garrafas, pedras, ferros e todo tipo de objetos pontiagudos contra a parte baixa das casas de seus vizinhos palestinos. Estes têm que se rodear por completo de cancelas laterais e, inclusive, tetos alambrados para que seus meninos e meninas não sejam alcançados por tudo o que jogam coléricos colonos que repetem como uma ladainha: “árabes filhos da puta”, “vamos matá-los”, “vão embora”.

Quando os meninos de Hebron saem para as escolas da zona, ou quando as e os adolescentes palestinos fazem o mesmo para a Universidade, devem fazê-lo rodeados de seus familiares adultos para protegê-los dos ataques a golpes empreendidos por verdadeiras gangues de jovens sionistas. O mesmo ocorre quando eles e elas voltam de suas atividades à tarde. Ao mesmo tempo, os soldados riem ou aplaudem seus colonos, enquanto outros não demoram a somar-se para agredir ou prender os palestinos que optam por rebelar-se frente a tantas injúrias e violência cotidiana.

Estes ataques, é preciso recordar, ocorrem nos 365 dias do ano. Eu vi com meus próprios olhos quanto tive a oportunidade de visitar essa terra tão sacrificada, porém tão resistente. Existem dezenas de vídeos nas redes que mostram com detalhes estes eventos e a impunidade com que se produzem.

Como você acha que podem estar os ânimos daqueles que vivem nessa situação? Qual seria nosso próprio comportamento, não paro de me perguntar, se ocorresse algo assim em nosso bairro ou em nossas cidades? Não uma vez, não duas, mas centenas, milhares de dias. É difícil poder responder a isto à distância, porém, sem dúvida, são situações limites provocadas por algo que, a esta altura, é inegável. Trata-se de um território invadido, martirizado e abandonado a sua sorte pela hipocrisia da comunidade internacional.

Porém, existe algo mais e o digo a partir da dor de imaginar a visão dos cadáveres de duas crianças destroçadas por uma violência que começou em 1948 com a Nakba (a catástrofe) e que se estende durante 68 anos, gerada pelos falcões israelenses. Como ocorre habitualmente nestes casos, existindo mortos ou não, numerosos efetivos do exército isolaram a cidade natal do jovem palestino Tarayra, tiraram as permissões de trabalho dos membros de sua família e as escavadeiras procederam com a demolição da casa onde habitavam seus pais e tios.

De Tel Aviv, Netanyahu ameaçava a Autoridade Palestina para que condenasse imediatamente “o crime produzido por um de seus seguidores”, e advertia “o mundo para que pressionem os instigadores destes crimes contra nossos cidadãos”. O que não disse o primeiro ministro sionista é que desde outubro até hoje suas forças militares já assassinaram 220 palestinos, nem que foi precisamente nesse mês quando começou esta nova onda de rebeldia e desespero de palestinos e palestinas, ao ver que a Mesquita de Al Aqsa era ocupada por colonos e judeus ortodoxos em uma provocação de grande magnitude, algo que voltou a se repetir dias atrás durante o Ramadã. Nem tampouco o chefe israelense conta ao mundo que, como bem assinalam organizações palestinas e israelenses de direitos humanos, grande parte das mortes palestinas acontecem em consequência do estado de vingança, revanchismo, ódio e crise nervosa em que estão as tropas israelenses, que pisam com prepotência um território que não é deles.

Organizações não governamentais israelenses, como B’Tselem e Médicos pelos Direitos Humanos, denunciam que em múltiplas ocasiões os soldados balearam jovens desarmados “por prevenção ou por medo”, e que as medidas punitivas encaradas pelo governo sionista se converteram em um “castigo coletivo” e “vingança sancionada pela própria Corte israelense”, em clara violação do direito internacional.

Por outro lado, é verdade que muitos jovens palestinos, desesperados por conta da situação de opressão que vivem, fartos da agressão física e psicológica que abarca tanto a eles como a suas famílias, chocados por estarem separados por um muro gigantesco que cada vez mais se estende por seu território, golpeados pela falta de trabalho e de expectativas de futuro, ou por terem muitos de seus amigos, pais e irmãos em cárceres-tumbas por dezenas de anos, ou pelo sentimento de que muitos de seus dirigentes não estão à altura das circunstâncias ou diretamente traíram suas reivindicações históricas, um bom dia tomam a decisão de jogar-se com tudo em ações espontâneas e solitárias, nas quais, na grande maioria dos casos, morrem na tentativa.

Enquanto os cadáveres de Tarayra e Hallel são chorados por seus respectivos familiares, em Tel Aviv os hierarcas sionistas com Netanyahu e Avigdor Lieberman encabeçando, seguem prometendo mais e mais violência. Outros meninos e meninas, como Hallel, são educados com a ideia de que esses que estão na Palestina ocupada são os “inimigos” e, logo, quando esses meninos crescerem, portarão um fuzil, serão alistados no exército e se lançarão a caçar outros jovens como eles, a ocupar suas casas, a destruir suas oliveiras, a matar os suspeitos.

Uma última pergunta: Não chegará o momento que uma parte da sociedade israelense não ganha pela ideologia do terror de seus governantes, decida colocar-se de pé e enfrentar àqueles que estão dispostos a que Tarayra e Hallel continuem se multiplicando por dez, por cem, por mil, por toda a vida?

Fonte: http://www.resumenlatinoamericano.org/2016/06/30/otra-noticia-dolorosa-desde-palestina-ocupada-por-carlos-aznarez/

Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)