Argentina: se você luta, você pode!

Argentina: se você luta, você pode! Por Carlos Aznárez

Resumen Latinoamericano

Foi um dia de fúria da tirania institucional imposta por Mauricio Macri. Ameaçava sê-lo desde praticamente 72 horas antes, quando a Cidade de Buenos Aires foi invadida por milhares de gendarmes, militares navais e policiais de diversas forças, todos eles fortemente armados, especialmente ameaçadores. A desculpa era defender os interesses dos convidados da Organização Mundial do Comércio.

Na terça-feira houve a marcha contra essa entidade que assegura o saque pelos países mais ricos e seus seguidores. Resultado: repressão e vários detidos.

Na quarta-feira, 200 mil manifestantes de organizações sociais ocuparam o centro da cidade gritando contra a OMC, mas também contra as “reformas” do ajuste neoliberal, que abarca desde roubar o dinheiro dos aposentados até retroceder às leis trabalhistas da época da ditadura, quando o ministro da Economia, Martínez de Hoz, escrevia a cartilha que voltou a se repetir em 2001 (com o ministro Domingo Cavallo) e agora ressuscita novamente com Macri e seu combo direitista.

No final dessa grande manifestação, a Gendarmeria (a mesma força que assassinou Santiago Maldonado na Patagônia) carregou forte contra milhares de pessoas que tentaram chegar até o Congresso. Essa foi a prévia do que ocorreria na quinta-feira, no mesmo dia em que o Governo, em uma jogada vergonhosa, adiantou a convocatória parlamentar para sacar adiante, seja como for, a lei de reforma provisória que condena os mais velhos. Esses velhinhos e velhinhas que trabalharam a vida toda para obter uma aposentadoria miserável.

Desde a madrugada do Dia D, os arredores do Congresso davam conta de que a coalisão oficialista Cambiemos estava disposta a liderar uma guerra. Centenas de gendarmes, militares navais (os mesmos que assassinaram o mapuche Rafael Nahuel), policiais de uniforme e sem ele, luziam paramentados por trás de cercas metálicas, mostrando suas armas de maneira ameaçadora. O Parlamento resplandecia rigorosamente controlado por onde se olhasse. Essa casa que a democracia burguesa tanto pondera e apresenta como exemplo, parecia sequestrada pelas forças militares, fazendo recordar aqueles nefastos anos em que o Estado de Sítio era quase um costume. Tamanho foi o cerco armado que os próprios deputados que queriam entrar no recinto foram golpeados e atingidos com gás de pimenta, sem nenhum tipo de sutileza. À luz do dia e com total perfídia.

Frente a essa imposição de força bruta estava o povo. As mulheres e os homens de pé, trabalhadores, estudantes, milhares e milhares de militantes de movimentos sociais, defendendo com o corpo, frente à selvagem dupla da morte Macri-Bullrich (sua ministra de Segurança escolhida a dedo pela Embaixada norte-americana e pelo Mossad israelense), com a exigência de que a vergonhosa lei não passasse.

Por isso, fica claro que esta quinta-feira acrescentará outra página à história da resistência e da luta contra um governo que despreza seu povo. Deu-se novamente a luta histórica entre a vida e a morte, representada por este sistema capitalista que não se detém diante de nada em sua sanha para aumentar ainda mais suas riquezas surgidas dos espólios e da ação corrupta.

Frente a uma multidão que reclamava pacificamente, a resposta foi descomunalmente amedrontadora, tentando impor “disciplina” por meio das balas, tentando que ninguém se insubordinasse. Porém, não conhecem (porque vivem fechados em suas mansões de luxo) do que é capaz este povo que resistiu a uma das ditaduras mais brutais do continente e, depois, combateu contra o despojo das sucessivas democracias burguesas que terminaram de destruir o pouco que os militares deixaram de pé. Daí a força que só da ideia de lutar por uma causa justa é possível tirar os elementos de análise para entender como e quanto se aguentou a mais brutal repressão que se recorda desde aquelas jornadas históricas de 2001. Gendarmes convertidos em Robocops, transtornados pelo ódio, balearam durante horas a multidão provocando inúmeros feridos. Policiais que não ficavam atrás na investida e atacaram com ácido e pimenta todos aqueles que cruzavam o caminho de sua vergonhosa caçada. Eram os buldogues do macrismo totalmente enlouquecidos, golpeando mulheres e adolescentes, parando aleatoriamente transeuntes ou pessoas que vivem em situação de rua. Tinham impunidade para fazê-lo e pode-se dizer que desfrutavam prazer com a dor e o pânico que geravam seus repetidos ataques.

No entanto, a resistência popular deu outra mostra de coragem, e enquanto milhares de jovens se dispersavam e voltavam a se plantar estoicamente em frente às cercas em uma praça inundada pelos gases e a fumaça dos conteiners de lixo ardendo, portas adentro do Parlamento a oposição conseguiu o milagre de unir-se e, também, pressionar para que finalmente se suspendesse a sessão e a aprovação da lei ficasse, por ora, entre parênteses.

Quando a notícia correu de boca em boca, a praça estourou em júbilo. Milhares de vozes se uniram em um grito que define a necessidade que aflora nestas difíceis circunstâncias: “Unidade dos trabalhadores, e ao que não é justo, se fode, se fode”. Abraços fraternos e chorosos em meio a mais gases e balas de borracha, sorrisos de satisfação por ter dobrado o braço, ainda que seja momentaneamente, daqueles que representam o aspecto mais sinistro de uma sociedade que pretendem fascistizar lentamente. E é preciso reconhecer que em alguns setores a tentativa não vai tão mal, já que se escutam vozes de energúmenos que pedem mais repressão contra os pobres.

No final, um obrigado reconhecimento. De ninguém mais que não seja essa multidão que aguentou com pé firme na rua, é o mérito de ter conseguido esta pequena vitória em uma guerra declarada pelos poderosos e que continuará, sem dúvidas. A guarda prussiana do Governo, a partir de seu rancor e malignidade, seguiu durante várias horas mais seu particular “combate”, atropelando, golpeando com sanha e encarcerando aqueles que podiam atrapalhar. Esses tipos não têm arrego. São como os vistos recentemente em Honduras, no Brasil, em Barcelona ou na Palestina. Estão preparados para essa triste tarefa, incentivados e protegidos, neste caso por uma ministra que ultrapassou todos os limites em sua ação repressiva. Porém, desta vez todo seu armamento não serviu de nada. Em oposição, luzindo como escudo somente com a força moral que dá o fato de rebelar-se contra a injustiça, estava combatendo um povo que vai continuar demonstrando ao mundo que “aqui ninguém se rende”.

Portanto, esta quinta-feira foi um antes e um depois. O governo dos ricos sabe que, daqui em diante, não será tão fácil continuar com a subjugação de direitos e liberdades. Desta vez, os de baixo mostraram-lhe o cartão vermelho.

Fonte: http://www.resumenlatinoamericano.org/2017/12/15/argentina-si-se-lucha-se-puede-por-carlos-aznarez/

Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)