A burguesia bate continência para o General Mourão
Existe quem se deixe enganar pela fala mansa do General-Vice-Presidente Mourão, mesmo entre a autodeclarada “esquerda”. Em um surto de amnésia, todas suas declarações asquerosas durante a campanha eleitoral são esquecidas. Após a posse da chapa presidencial, ao melhor estilo “policial mau, policial bom”, Mourão passou a se maquiar com sensatez. A primeira manifestação dessa tática aconteceu já na primeira viagem presidencial: depois de semanas de hostilidade entre Bolsonaro e os jornais burgueses, Mourão assumiu a Presidência acenando ao diálogo, concedendo entrevistas e coletivas de imprensa. Vários outros episódios semelhantes aconteceram nas semanas seguintes.
Agora, o “Valor Econômico” (um dos órgãos jornalísticos mais completos e transparentes da burguesia brasileira) alardeia, em 28/03/2019: “Em jantar na casa de Skaf, Mourão agrada a empresários”.
Foi “um bate-papo informal sobre importantes questões de Estado”, informou ao Valor o próprio presidente da Cargill no Brasil, Luiz Pretti (que também preside a Câmara Americana de Comércio). Pretti não foi o único representante do agronegócio convidado para a reunião: entre os mais de 30 empresários e executivos, “participaram Rubens Ometto (Cosan), João Ometto (São Martinho), Marcelo Ometto (Unica), Fernando Galletti de Queiroz (Minerva), Pedro Parente (BRF) e Jacyr Costa Filho (Tereos)”.
“Também estavam presentes Frederico Curado [Grupo Ultra], Johnny Saad [Grupo Bandeirantes], José Osmar Medina [diretor do Hospital do Rim, aliado de Skaf], Ruy Baumer [presidente do Sindicato da Indústria de Artigos e Equipamentos Odontológicos, Médicos e Hospitalares do Estado de São Paulo], Josué Gomes da Silva [Coteminas, filho de José Alencar, vice presidente de Lula], Miled Khoury [Sawary Jeans], Paulo Moll [Rede D’Or], Salo Seibel [Grupo Ligna], Dan Ioshpe [Presidente do SindiPeças], Victorio de Marchi [AmBev] e Valdemar Verdi Júnior [RNI negócios imobiliários].” Também o “ex-presidente do STF e ex-ministro da Defesa de Dilma Rousseff, Nelson Jobim, hoje no banco BTG”, deu o ar de sua graça.
A pauta da discussão, naturalmente, passou pelas principais exigências burguesas: a reforma da previdência, redução de impostos para empresários, etc. Além disso, “na avaliação de um dos executivos, um dos temas foi a dificuldade de interlocução com Bolsonaro por conta da influência da família, principalmente de Carlos Bolsonaro.” Curiosamente, o jornalismo sempre tão direto do “Valor” derrapa aqui. Como assim, “na avaliação de um dos executivos”? Ou a questão foi tema da conversa, abordada por uma ou mais falas, ou não. Não se trata de uma mera _avaliação_, mas de uma _informação_. O que será que o “Valor” tenta dissimular?
Em outra passagem, mais uma pista: “Um dos presentes disse não enxergar um cenário em que Bolsonaro não consiga concluir o mandato.”
Ora, mas quem perguntou? Ou, como diria a sabedoria comercial, “quem desdenha quer comprar”. O empresário citado poderia muito bem ter acrescentado: “infelizmente…”. Ainda mais esclarecedor é o fato de essa afirmação vir de _apenas um_ dos mais de 30 presentes. O que será que passa na cabeça dos outros sobre essa mesma questão?
A verdade é que a coisa toda cheira a golpe, apesar de todas juras de lealdade e toda a “sintonia” com o governo que Mourão expressou na reunião, segundo o jornal. Como poderia ser diferente em um encontro cujo anfitrião é justamente Paulo Skaff, golpista profissional que esteve na vanguarda civil do Impeachment de Dilma? Ou como então interpretar as indiretas que saltam por toda a notícia, do tipo:
“Um executivo disse ter saído do encontro com boa impressão em relação ao vice-presidente”. Segundo ele, Mourão conversou com todos, foi simpático e acessível, além de muito ponderado, “um contraponto à postura de Bolsonaro”. Para ele, a impressão é que existe uma ala moderada e sensata no Planalto.”
Na mesma toada, logo no dia seguinte (29/03), o próprio “Valor Econômico” noticiou a declaração do renegado ex-PCdoBista Aldo Rebelo. Com o bom faro político que é requisito indispensável para todo oportunista bem-sucedido, Rebelo pega a coisa no ar: “É possível que já esteja em curso uma espécie de bolsonarismo sem Bolsonaro, uma espécie de bolsonarismo perfumado, de salão, mas com a mesma agenda”. Ainda assim, também como bom oportunista, Rebelo não se esquece de prestar continência aos militares, com o rabo entre as pernas, reafirmando contraditoriamente que “não vê germe golpista no ar”.
Bolsonaro pode até acreditar que sua tática está bem coordenada: ele joga para a massa de seus eleitores, Mourão para a burguesia liberal. Mas essa tática é tanto melhor para Mourão, que com isso pavimenta seu caminho para a Presidência.
Escolhendo Mourão como seu vice, Bolsonaro acreditava estar blindado: afinal, que esquerda iria querer depô-lo apenas para empossar um General? Esqueceu-se, no entanto, que a tradição golpista da burguesia brasileira é, infelizmente, muito mais consolidada do que a tradição revolucionária da classe trabalhadora brasileira. Agora, essa burguesia se prepara para armar a fogueira sob o carro-forte de Bolsonaro, à espera de que ele próprio bata em retirada de seu forno blindado. “A menos que Bolsonaro aprenda a governar, seu mandato será curto”, diz o jornal “Economist” (segundo Karl Marx, “o órgão europeu da aristocracia das finanças”).
Para a burguesia liberal e mesmo para partes da classe média “esclarecida”, parece ser suficiente essa substituição do Cabo chucro que fala a língua “do povão” conservador pelo General de fala mansa que desfere golpes com elegância. Mas se iludir com Mourão é absolutamente prejudicial para a classe trabalhadora: uma eventual ascensão do General apenas pode abrir o caminho para um governo ainda mais repressivo, conservador e alinhado aos grandes grupos empresariais. Por isso mesmo, é preciso desde já erguer a bandeira de uma oposição _integral_ ao governo Bolsonaro-Mourão, que, no fim das contas, está em sintonia ao menos naquilo que é essencial: roubar aos pobres para engordar os ricos.
Abaixo o governo Bolsonaro-Mourão! Nenhum direito a menos! Pelo Poder Popular e pelo Socialismo!
Ilustração: Divulgação: FIESP
*Militante do PCB de São Paulo