A realidade mal contada da mídia
A mistaken case for Syrian regime change
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Aisling Byrne coordena projetos do Conflicts Forum em Beirute.
“A guerra contra o Irã já começou” – escreveu recentemente um conhecido analista israelense, sobre a “combinação de guerra clandestina e pressão internacional” contra o Irã.
Embora não mencionado, o “prêmio estratégico” do primeiro estágio dessa guerra contra o Irã é a Síria, primeira campanha de uma guerra sectária muito mais ampla. “Exceto o colapso da própria República Islâmica”, teria dito o rei Abdullah da Arábia Saudita, no verão passado, “nada enfraqueceria mais o Irã do que perder a Síria” [1].
Em dezembro, altos funcionários dos EUA falaram explicitamente sobre a agenda norte-americana para as mudanças na Síria: Tom Donilon, Conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, explicou que “o fim do regime [do presidente Bashar al-] Assad será a principal derrota do Irã na região – golpe estratégico que alterará, contra o Irã, o equilíbrio de poder na região.”
Pouco antes, outro alto funcionário, com função chave na operacionalização daquela política, o subsecretário de Estado para o Oriente Próximo, Jeffrey Feltman, já havia declarado, em audiência no Congresso, que os EUA “perseguiremos incansavelmente uma estratégia de dois braços, apoiando diplomaticamente a oposição e estrangulando financeiramente o regime [sírio], até conseguirmos que saia de lá” [2].
O que o mundo vê acontecer hoje na Síria é campanha deliberada, calculada, para derrubar o governo de Assad, para substituí-lo por outro, que seja “mais compatível” com os interesses dos EUA na região.
A “planta baixa” desse projeto foi produzida pelo Instituto Brookings, dos neoconservadores, com todo o plano para a “mudança de regime” no Irã em 2009. Esse trabalho – “Qual o Caminho até a Pérsia?” (orig. “Which Path to Persia?” [3]) – continua a ser a abordagem estratégica geral para o processo de mudar o regime no Irã, e processo a ser conduzido pelos EUA.
Uma releitura daquele projeto, e a leitura de outro projeto, mais recente – “Rumo à Síria pós-Assad” (orig. “Towards a Post-Assad Syria” [4], que adota a mesma linguagem e a mesma perspectiva, mas foca a Síria, não o Irã, recentemente produzido por dois think-tank neoconservadores), mostram com clareza como os desenvolvimentos na Síria foram modelados nos termos do plano “Caminhos até a Pérsia”, todos com o mesmo objetivo: derrubar o governo Assad.
Entre os autores desses estudos estão, além de outros, John Hannah e Martin Indyk, ambos neoconservadores de destaque nos governos George W Bush/Dick Cheney, e ambos dedicados advogados da derrubada do governo sírio [5].Não é a primeira vez que se vê parceria muito íntima de neoconservadores norte-americanos e britânicos, com islamistas (inclusive, como já se sabe [6], com islamistas muito ligados à al-Qaeda), todos trabalhando em associação, para derrubar governos de estados considerados “inimigos”.
Pode-se dizer que o componente mais importante nessa luta em busca do “prêmio estratégico” foi a deliberada construção de uma narrativa quase completamente falsa, em que manifestantes democráticos desarmados são mostrados como se estivessem sendo mortos às centenas e milhares, quando protestam pacificamente contra o governo opressor, violento, “a máquina de matar” [7] comandada por Assad, o “monstro” [8].
Ao mesmo tempo, na Líbia, a Organização do Tratado do Atlântico Norte, OTAN declarava que “não há baixas confirmadas entre os civis”, porque, como o New York Times explicou recentemente, “a OTAN criou definição própria para o adjetivo “confirmadas”: só se contam como “mortes confirmadas” os casos que a própria OTAN tenha investigado e comprovado”.
“Mas, uma vez que a OTAN absolutamente não investiga nenhuma denúncia de morte de civis” – completou o NYT–, “não há o que arranque do zero a lista da Aliança, de baixas entre os civis” [9].
No caso da Síria, vê-se exatamente o contrário: a maioria das imprensa-empresas ocidentais, praticamente todos os grandes veículos, e a imprensa-empresa nos países aliados dos EUA na região, especialmente a rede al-Jazeera e os canais al-Arabiya de televisão, propriedade dos sauditas, colaboram ativamente para repetir e distribuir a narrativa da “mudança de regime” e uma agenda pela qual absolutamente nenhum jornalista e nenhum veículo questiona ou examina os números ou qualquer tipo de informação distribuídos por outros veículos de imprensa-empresa e organizações que, ou são propriedade de estados aliados na aliança EUA/Europa/Golfo, ou são financiados por eles. A Aliança EUA/Europa/Golfo reúne exatamente os mesmos países que, desde o início, planejaram todo o golpe para derrubar o governo de Assad.
Só há notícias sobre “massacres”, “campanhas de estupro de mulheres e meninas, predominantemente nas cidades sunitas” [10], “tortura”, e, mesmo “estupro de crianças” [11] são notícias sempre presentes nos veículos internacionais, que só citam duas fontes: ou o Observatório Sírio de Direitos Humanos (que só existe em Londres) ou os Comitês Locais de Coordenação (orig. Local Co-ordination Committees, LCCs) –, com informações apenas repetidas, que nenhum jornal ou jornalista nem procura verificar nem procura confirmar.
Por trás do bordão jornalístico – “não há como confirmar esses números” –, o que se vê é a nenhuma confiança que merecem os grandes veículos da imprensa-empresa ocidental, o que já se via bem visível desde os primeiros eventos na Síria. Uma década depois da guerra do Iraque, ainda não se aprenderam nem as lições de 2003, da demonização frenética de Saddam Hussein e de inexistentes armas de destruição em massa.
As três principais fontes de todos os dados e números referentes a manifestantes mortos e a número de pessoas em manifestações públicas na Síria – pilares da narrativa jornalística – são, as três, organizações que participam da mesma aliança para “mudança de regime”.
Observatório Sírio de Direitos Humanos, especialmente, é mantido com recursos de um Fundo, com sede em Dubai, no qual se misturam – o suficiente para não serem rastreáveis – recursos do Ocidente-Golfo (segundo Elliot Abrams [12], só a Arábia Saudita alocou US$130 bilhões para “ajudar as massas” da Primavera Árabe).
Apresentado sempre como “organização de direitos humanos”, o Observatório Sírio de Direitos Humanos tem cumprido papel chave para manter ativa a narrativa das matanças sem fim, de milhares de manifestantes pacíficos assassinados, sempre distribuindo números inflados, “fatos” sem qualquer confirmação, “telegramas” sobre “massacres” e já falou, recentemente, de “genocídio”.
Embora declare que mantém sede na casa do atual diretor [13], o Observatório Sírio de Direitos Humanos tem sido denunciado como “fachada” de vasto esquema de propaganda montado pela oposição síria e seus financiadores. Recentemente, o ministro de Relações Exteriores da Rússia disse claramente [14]:
A agenda do conselho de transição [da Síria] é montada em Londres, pelo Observatório Sírio de Direitos Humanos (…). Ali se fazem também as imagens do “horror” na Síria, para difundir o ódio contra o regime de Assad.
O Observatório Sírio de Direitos Humanos não tem qualquer registro legal, nem como instituição de caridade no Reino Unido, e opera informalmente; não tem nem instalações de escritório, nem equipe e sabe-se que seu diretor administra quantidade considerável de dinheiro.
As informações que o Observatório Sírio de Direitos Humanos recebe, pelo que se sabe, vêm de uma rede de “ativistas” que opera dentro da Síria; o website, em inglês é uma única página, mas a rede al-Jazeera hospeda um blog do Observatório, atualizado a cada minuto, desde o início dos protestos [15].
A segunda fonte de “dados” que o Observatório Sírio de Direitos Humanos distribui, os Comitês Locais de Coordenação (orig. Local Co-ordination Committees, LCCs), são a face mais visível da infraestrutura de mídia da oposição; todos os dados distribuídos pelos LCCs são construídos e distribuídos no bojo da mesma narrativa [16] para a qual trabalha também o Observatório Sírio de Direitos Humanos: ao analisar relatórios diários dos LCCs, não encontrei sequer uma referência a opositores armados mortos; os mortos são sempre “mártires”, “desertores do exército de Assad”, gente morta em “manifestações pacíficas” e expressões equivalentes.
A terceira fonte de “dados” que chegam à imprensa-empresa ocidental é a rede al-Jazeera, cuja cobertura distorcida dos Levantes já está bem documentada. Descrita por um experiente analista de mídia [17] como “alto-falante sofisticado do estado do Qatar e de seu ambicioso emir”, a rede al-Jazeera é instrumento das “aspirações da política externa” do Qatar.
Al-Jazeera sempre ofereceu e continua a fornecer [18] apoio técnico, equipamento, hospedagem e “credibilidade” aos ativistas e às organizações da oposição ao governo de Assad na Síria. Análises já mostraram que desde março de 2011, a rede al-Jazeera tem dado apoio técnico e servido como instrumento de comunicação a exilados sírios ativos na oposição a Assad [19], os quais desde janeiro de 2010 coordenavam, através da al-Jazeera, os seus serviços de notícia, em Doha, Qatar.
Mas, apesar do trabalho de quase dez meses, e apesar do massacre promovido diariamente pelas redes noticiosas ocidentais, o projeto de derrubar Assad não parece estar saindo como o esperado: pesquisa que a Qatar Foundation encomendou a empresa YouGov [20] mostrou, semana passada, que 55% dos sírios não querem a saída de Assad; e que 68% dos sírios desaprovam as sanções impostas pela Liga Árabe à Síria.
Segundo essa pesquisa, o apoio a Assad tem, de fato, aumentado, desde o início dos atuais tumultos – 46% dos sírios sentiam que Assad foi “bom” presidente antes do início dos eventos recentes no país – dado que absolutamente não se encaixa na falsa narrativa que está sendo promovida.
Mas, como que para reafirmar o sucesso de sua própria campanha de propaganda, a pesquisa conclui, no sumário, que:
“A maioria dos árabes acreditava que o presidente sírio Basher al-Assad deveria renunciar logo que o regime começou a responder com brutalidade às manifestações (…) 81% dos árabes [desejam] que o presidente Assad renuncie. Acreditam que a Síria terá melhores resultados se se realizarem eleições democráticas, sob a supervisão do governo de transição”. [21]
Fica-se sem saber a quem o presidente Assad deve prestar contas – aos sírios ou “à maioria” dos árabes? Apagar as linhas demarcatórias e confundir grupos, talvez seja útil: os dois principais grupos de oposição na Síria já anunciaram [22] que, apesar de se oporem a qualquer intervenção militar estrangeira, não consideram estrangeira qualquer “intervenção árabe”.
Nenhum veículo da grande mídia, nenhum grande jornal e nenhuma rede de notícias comentou os resultados da pesquisa de YouGov – e que não se encaixam na narrativa que se dedicam a construir.
Na Grã-Bretanha, só o jornal amador, Muslim News [23] comentou a pesquisa de YouGov; apenas duas semanas antes, logo depois das explosões dos suicidas-bomba em Damasco, os dois Guardian [24], como vários outros jornais, poucas horas depois das explosões, já publicavam matérias sensacionalistas, sem qualquer informação aproveitável, recolhidas de blogueiros, entre os quais um, que dizia que “alguns dos cadáveres podem ser cadáveres de manifestantes”.
“Já aconteceu antes, de eles plantarem cadáveres” – dizia o blogueiro. “Trazem cadáveres de Dera [no sul] para exibi-los. E também mostraram cadáveres a jornalistas em Jisr al-Shughour [perto da fronteira turca]”.
Matérias recentes lançam sérias dúvidas sobre a confiabilidade da narrativa martelada todos os dias pela grande imprensa internacional, sobretudo quando só repetem informação distribuída pelo Observatório Sírio de Direitos Humanos e pelos Comitês Locais de Coordenação (orig. Local Co-ordination Committees, LCCs).
Em dezembro, o grupo Stratford, da inteligência dos EUA, alertava:
Já se sabe que grande parte das declarações da oposição [síria] não passam de exageros grosseiros ou são simplesmente falsas (…) revelando mais sobre as fraquezas da oposição, do que sobre o nível de instabilidade do governo sírio [25] [25a].
No nono mês dos tumultos, Stratfor recomendava cautela em contatos com a narrativa que se lia na grande mídia sobre a Síria; em setembro, o Instituto comentou que “todas as guerras têm dois lados (…) e a guerra de percepções sobre a Síria não é exceção” [26] [25a].
Relatórios do Observatório Sírio de Direitos Humanos e dos Comitês Locais de Coordenação (orig. Local Co-ordination Committees, LCCs), “como relatos distribuídos pelo governo sírio, devem, em todos os casos, ser tomados com cautela e ceticismo” – alerta Stratfor; “a oposição entende que carece de apoio externo, sobretudo de apoio financeiro, se quiser que o movimento cresça; e tem, portanto, todos os motivos para apresentar os fatos de modo que facilite o processo para obter financiamento estrangeiro.”
Como observou o Ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, “É claro que o objetivo é provocar uma catástrofe humanitária, que criará o pretexto para pedir interferência externa naquele conflito” [27]. Na mesma linha, em meados de dezembro, lia-se em American Conservative:
Analistas da CIA [Central Intelligence Agency, Agência Central de Inteligência dos EUA] não consideram garantido o avanço rumo à guerra. Relatório da ONU frequentemente citado, segundo o qual mais de 3.500 civis teriam sido mortos por soldados de Assad, praticamente só reproduz informação de fontes rebeldes e não foi jamais confirmado. A Agência ainda não confirmou nenhuma daquelas notícias.
O mesmo vale para notícias sobre deserção em massa de soldados do exército sírio, e sobre batalhas que estariam acontecendo entre desertores e legalistas, que também parecem ser ficção; até agora só se confirmaram, por fontes independentes, algumas poucas deserções. O que o governo sírio tem repetido (que está sendo atacado por rebeldes armados, treinados e financiados por governos estrangeiros) é mais verdadeiro que falso. [28]
Recentemente, em novembro, o Exército Síria Livre [orig. Free Syria Army] sugeriu que teria mais soldados do que realmente tem; de fato, como explicou um analista, “estão aconselhando os apoiadores a adiar a deserção”, à espera de que as condições regionais melhorem. [29]
Instruções para Derrubar Governos
Sobre a Síria, a Parte III de “Qual o caminho até Pérsia?” (orig. “Which Path to Persia?” [3]) é especialmente importante. Trata-se de um guia, passo a passo, de inúmeras maneiras para instigar e apoiar levante popular, criar “clima” que leve à insurgência e/ou provocar golpe de Estado. O guia completa-se com uma seção de “Prós e Contras”:
Em geral, é mais fácil instigar e apoiar insurgências rebeldes, se se está fora do país alvo (…). Sabe-se muito bem que é barato instigar e apoiar levantes em outros países (…) Os EUA sempre podem oferecer apoio a rebeldes em outros países, preservando para si condições de “negabilidade plausível” [29a] (…), [com menos] efeitos diplomáticos e políticos (…) do que se os EUA tivessem de empreender ação militar direta (…). Tão logo o regime esteja já suficientemente minado, surge a oportunidade para agir diretamente.
A “ação militar”, diz o documento, só será empreendida depois de tentadas várias outras opções que tenham fracassado, de modo que a “comunidade internacional” possa concluir, no caso de ataque, que “[o próprio governo atacado] condenou-se, ele mesmo, a ser atacado”, porque se recusou a aceitar as boas condições de rendição que lhe foram propostas.
Veem-se em plena operação na Síria vários itens da ‘receita’ para instigar levantes populares e para construir “situação de plena guerrilha” em país estrangeiro que se lê em [3], dentre os quais, por exemplo:
“Financiar e ajudar a organizar grupos locais da oposição ao governo [a ser “instabilizado”], inclusive grupos étnicos “infelizes”;“Construir capacidade na “oposição efetiva” com a qual podemos “trabalhar” para “criar liderança alternativa que possa assumir o poder”; Prover equipamento e apoio clandestino (direto ou indireto) aos grupos, inclusive armamento, além de “máquinas de fax (…) acesso à internet, dinheiro”. (Sobre o Iraque, o documento relata que “a CIA encarregou-se de parte significativa dos suprimentos e do treinamento dos grupos da oposição local, como fez ao longo de décadas, em todo o mundo”); Treinar agentes locais e facilitar os serviços de comunicação e produção de noticiário nos grupos de ativistas da exposição; Construir uma narrativa “com o apoio dos veículos de mídia nos EUA que reforce os traços negativos do regime local e dê destaque a críticas que, sem o reforço da nova narrativa, poderiam permanecer na obscuridade”; é crucial, para o colapso do regime, que ele seja desacreditado entre os “formadores de opinião”; Criar orçamento folgado para financiar grande número de iniciativas lideradas pela sociedade civil (o chamado “fundo de $75 milhões”, criado pela ex-secretária de Estado Condoleezza Rice, financiou vários grupos da sociedade civil, inclusive “um punhado de think-tanks e instituições no ‘Cinturão do Poder em Washington’ [orig. Beltway-based think-tanks and institutions] que se converteram em fonte de material a ser publicado sobre o Irã, em toda a imprensa”) [30]; e, dentre outros: Criar um corredor adjacente, em país vizinho “para ajudar a desenvolver a infraestrutura necessária para apoiar as operações para mudança de regime”.
“Além disso”, prossegue o relatório, “a pressão econômica feita pelos EUA (e às vezes também a pressão militar) contribui para desacreditar o governo local, e a população passa a tender na direção da oposição.”
Os EUA e seus aliados, especialmente a Grã-Bretanha [31] e a França, financiaram e ajudaram a “modelar” a oposição desde o início – em ações iniciadas pelos EUA em 2006, com o objetivo de construir uma frente de oposição contra o governo de Assad, retomadas depois do que foi definido como o “sucesso” do modelo do Conselho de Transição na Líbia [32].
Apesar dos meses de trabalho – predominantemente executado pelo ocidente –, na tentativa de reunir os vários grupos dissidentes e criar um movimento unido de oposição, os grupos continuaram “diversos e irreconciliáveis, como as muitas divisões ideológicas, sectárias e generacionais presentes no país”.
“Nunca houve nem há hoje [na Síria] nenhum tipo de tendência natural à unificação desses muitos grupos, porque há entre eles contextos ideológicos completamente diferentes uns dos outros e visões políticas divergentes, quando não antagônicas” – concluiu um analista [33].
Recentemente, em visita ao ministro britânico de Relações Exteriores, os vários grupos sequer aceitaram participar de reunião conjunta com William Hague, motivo pelo qual se realizaram várias reuniões, para que alguns grupos da ‘oposição’ síria sequer precisassem ver-se [34].
Mesmo assim, apesar da falta de coesão, de credibilidade interna e de legitimidade, essa oposição, reunida sob o guarda-chuva de um Conselho Nacional Sírio [ing. Syrian National Council (SNC), está sendo empurrada para ocupar o poder na Síria. O processo exige que se construam capacidades, como reconhece até o ex-embaixador da Síria aos EUA, Rafiq Juajati, atualmente na oposição.
Em meados de dezembro de 2011, em reunião fechada em Washington DC, Juajati confirmou que o Departamento de Estado dos EUA e o German Institute for International and Security Affairs (SWP) – think-tank que produz análises de política exterior para o governo alemão – estavam financiando um projeto administrado pelo US Institute for Peace e pelo SWP, e executado em parceria com o Conselho Nacional Sírio, de formação de governantes, preparando o Conselho Nacional Sírio para tomar o poder e governar a Síria.
Burhan Ghaliyoun, do Conselho Nacional Sírio, revelou (para “acelerar o processo” da queda de Assad) [35] as “competências” para governar que lhe estavam sendo “ensinadas”: “Nenhuma relação especial com o Irã; romper o relacionamento de exceção que há entre Síria e Irã implica quebrar aquela aliança militar estratégica”. E acrescentou: “depois da queda do regime sírio, o Hezbollah nunca mais será o mesmo” [36].
Descritos na revista Slate [37] como “a oposição mais liberal e de tendências mais claramente pró-ocidente de todos os levantes da Primavera árabe”, os grupos da oposição síria mostram-se tão cordatos e obedientes quanto a oposição líbia antes da queda de Muammar Gaddafi, que o New York Times descrevia como “profissionais seculares de cabeça aberta – advogados, professores, empresários – que falam de democracia, transparência, direitos humanos e obediência à lei” [38]. Talvez tenha sido tudo isso, mas só até entrarem em cena, na Líbia, o ex-comandante do Grupo de Combate Islâmico Líbio [orig. Libyan Islamist Fighting Group] Abdulhakim Belhaj, e seus soldados jihadis.
A entrada de armas, equipamento e força de trabalho (vindos predominantemente da Líbia) [39] e o treinamento oferecido pelos exércitos e outros grupos ligados aos EUA, à OTAN e seus aliados regionais, começaram na Síria em maio-abril de 2011 [40], segundo vários informes [41], e são coordenados a partir da base da Força Aérea dos EUA em Incirlik, sul da Turquia. Também a partir dessa base, uma força tarefa especializada coordena as comunicações com os serviços implantados na Síria, através do Exército Síria Livre. Toda essa operação clandestina de apoio continua ativada, como informava o American Conservative, em meados de dezembro.
Aviões de guerra da OTAN sem identificação na fuselagem estão chegando a bases militares turcas próximas de Iskenderum, na fronteira síria, desembarcando armas (…) e voluntários do Conselho Nacional Líbio de Transição (…) Em Iskenderum funciona também a sede do Exército Síria Livre, braço armado do Conselho Nacional Sírio. Instrutores das forças especiais britânicas e francesas estão estacionados naquela base, oferecendo assistência aos rebeldes; e agentes especialistas da CIA e das Forças Especiais dos EUA instalam e operam equipamentos de comunicação e inteligência, como contribuição à causa dos rebeldes, para que os combatentes evitem concentrações de soldados sírios [42].
Em abril de 2011, o Washington Post revelou que documentos recentemente vazados por WikiLeaks mostravam que o Departamento de Estado dos EUA, desde 2006, vinha repassando milhões de dólares a grupos de exilados sírios (inclusive, em Londres, ao Movimento por Justiça e Paz, afiliado da Fraternidade Muçulmana) e a indivíduos, servindo-se para isso, como intermediário, de uma “Iniciativa de Parceria para o Oriente Médio” [orig. Middle East Partnership Initiative] administrada por uma fundação dos EUA, conhecida como “Democracy Council” [43].
Telegramas vazados por WikiLeaks confirmaram que todo esse processo de financiamento continuava ativado ainda na segunda metade de 2010; e a mesma tendência está hoje muito reforçada e expandida, depois que os EUA optaram pelo “soft power” orientado para “mudança de regime” na Síria.
Enquanto esses discursos dos neoconservadores que exigem “mudança de regime” na Síria vão ganhando força dentro do governos dos EUA [44], a mesma política vai sendo institucionalizada também nos principais think-tanks a serviço da política exterior dos EUA – muitos dos quais organizaram “divisões sírias” ou “grupos de trabalho sobre a Síria” que, todos eles, operam em íntimo contato com diferentes grupos das oposições sírias (por exemplo o USIP [45] e a Foundation for the Defense of Democracy) [46], que já publicaram grande quantidade de artigos e análises, todos favoráveis à mudança de regime na Síria.
Na Grã-Bretanha, outro instituto dos neoconservadores, a Henry Jackson Society (que “apóia a manutenção de forte presença militar dos EUA, dos países da União Europeia e outros estados democráticos, armada e com capacidades expedicionárias de alcance global” e que acredita que “só os modernos estados democráticos liberais são realmente legítimos”) está, simultaneamente, promovendo a agenda da ‘mudança de regime’ na Síria [47].
Nesse caso, a Henry Jackson Society trabalha em parceria com várias figuras da oposição síria, dentre as quais Ausama Monajed [48], ex-líder dos exilados sírios, o Movimento por Justiça e Desenvolvimento, ligado à Fraternidade Muçulmana, fundado pelo Departamento de Estado dos EUA em 2006, como WikiLeaks informou.
Monajed, membro do Conselho Nacional Sírio, dirige hoje uma empresa de Relações Públicas [49] fundada recentemente em Londres; foi o primeiro a usar a palavras “genocídio” aplicada aos eventos na Síria, em press-release distribuído pelo Conselho Nacional Sírio [50].
Desde o início, a Turquia foi pressionada a criar um “corredor humanitário” ao longo da fronteira com a Síria. O objetivo, como se vê delineado em “Qual o Caminho até a Pérsia?” (orig. “Which Path to Persia?” [3], é criar uma base de lançamento e operações para a insurgência controlada e apoiada do exterior.
Esse “corredor humanitário” está sendo planejado para ser tão humanitário quanto as quatro semanas de bombardeio pela OTAN contra a cidade de Sirte, quando a OTAN cumpria o mandado do Conselho de Segurança da ONU, de “responsabilidade de proteger”.
Nada disso implica que não haja genuíno movimento popular na Síria contra a infraestrutura do governo dominada pelas forças da repressão, presente em todos os aspectos da vida das pessoas, sejam comandadas pelas forças do Estado sírio, pelos grupos armados da oposição e por misteriosos personagens que ninguém conhece, uma terceira força clandestina, que opera para alimentar a crise na Síria, composta de insurgentes [51], quase todos jihadis vindos dos vizinhos Iraque e Líbano (e mais recentemente também da Líbia) dentre outros.
Todas essas dificuldades são inevitáveis em conflitos de baixa intensidade. Críticos respeitados [52] que se têm manifestado contra o projeto de “mudança de regime” comandado na Síria por EUA-França-Reino Unido-monarquias do Golfo, clamam desde o início por transparência e exigem punição de todos os funcionários e militares (“inclusive os de alto escalão”) que sejam condenado por prática de abuso contra direitos humanos.
Ibrahim al-Amine escreve que membros do governo reconhecem “que o uso extremo da força como medida de segurança provocou graves danos em vários casos e regiões; que a resposta aos protestos populares interpretou mal aqueles protestos; e que, se os tivesse interpretado adequadamente, teria sido possível conter as agitações mediantes providências claras e firmes – como prender os responsáveis por tortura de crianças em Deraa”. Diz também que é vitalmente importante e urgente que se implante o pluralismo político e ponha-se fim a qualquer tipo de repressão não controlada [53].
Mas o que começou como protesto popular, focado inicialmente em questões e incidentes locais (como o caso de tortura de meninos em Dera, por agentes das forças de segurança) foi rapidamente “capturado” e posto a serviço do plano estratégico mais amplo para derrubar o governo de Assad (‘mudança de regime’).
Há cinco anos, eu trabalhava para a ONU, no norte da Síria, gerenciando um grande projeto de desenvolvimento comunitário. À noite, depois das reuniões na comunidade, não era raro encontrar agentes dos serviços de inteligência do exército (mukhabarat) à espera de que esvaziássemos a sala, para que pudessem filmar e examinar as anotações feitas nos flipcharts e cartazes que havia nas paredes. Praticamente todos os aspectos da vida diária das pessoas eram controlados por uma burocracia esclerosada e disfuncional da segurança e do Partido Ba’ath, sem qualquer ideologia política, além do nepotismo e da corrupção que acompanham inevitavelmente os poderes autoritários. O controle era visível em, de fato, todos os aspectos da vida das pessoas.
A 3ª-feira, 20/12, teria sido, segundo os noticiários, “o dia mais mortífero dos nove meses de protestos” na Síria, “com massacre organizado” e “deserção em massa” de soldados do exército regular, como informava a imprensa internacional, em Idlib, norte da Síria. O Conselho Nacional Sírio declarava que a Síria estaria “exposta a genocídio em grande escala”; e lamentava os “250 heróis tombados no período de 48 horas”, repetindo números divulgados pelo Observatório Sírio de Direitos Humanos [54]. Citando a mesma fonte, o Guardian noticiava que:
“O exército sírio… caça desertores, depois de soldados (…) terem assassinado cerca de 150 homens que tentavam desertar de suas bases militares. Começou a emergir um quadro (…) de deserção em massa (…) que parece ter levado a resultados trágicos (…), com soldados leais a Assad posicionados para matar os desertores que tentavam escapar de uma base militar. Os que conseguiram escapar foram depois selvagemente caçados nas montanhas próximas, como informam várias fontes. O Observatório Sírio de Direitos Humanos estima que 100 desertores foram sitiados e em seguida ou assassinados ou feridos. Soldados leais a Assad também caçaram e mataram moradores que haviam dado abrigo aos desertores. [55]
O blog atualizado ao vivo na página do jornal Guardian citava o grupo AVAAZ, que divulgara que “269 pessoas morreram nos confrontos” e reproduzia a estatística detalhada de AVAAZ: “163 revolucionários armados, 97 soldados do governo Assad e 9 civis” [56]. Mas o Guardian anotou diligentemente que “o grupo AVAAZ não oferece qualquer prova da correção daqueles números.”
O Washington Post só noticiou que mantivera contato com “um ativista do grupo AVAAZ [o qual] dissera que falara com ativistas locais e grupos médicos, e que falou de “269 mortos naquela área, na 3ª-feira”. [57]
Um dia depois das primeiras notícias sobre o massacre de desertores em fuga, porém, a história mudou. Dia 23/12, oTelegraph noticiou:
As primeiras notícias falavam de desertores do exército regular que estariam tentando fugir para a Turquia, para unir-se ao Exército Síria Livre. Agora, se diz que seriam civis desarmados, tentando fugir do exército regular, que tentava ocupar a área. Foram cercados por soldados e tanques e metralhados até não haver sobreviventes, segundo os últimos relatos. [58]
Dia 21/12, o New York Times noticiou que os “massacrados” eram “civis e manifestantes desarmados, entre os quais não havia desertores, como informa o grupo AVAAZ”. Citou a manchete do Observatory que falava de “massacre organizado”; e disse que esse relato confirmava as palavras de uma testemunha de Kfar Owaid: “As forças de segurança tinham lista de nomes dos que organizaram os manifestos contra o governo (…). As tropas abriram fogo, usando tanques, foguetes e metralhadoras pesadas [e] bombas de fragmentação, carregadas com pregos, para aumentar o número de baixas. [59]
O LA Times citou um ativista entrevistado na conexão por satélite, o qual, de onde estava (“escondendo-se entre a vegetação local”) comentou: “A palavra ‘massacre’ é fraca demais para contar o que aconteceu.” Simultaneamente, o governo sírio informava que, nos dias 19 e 20 de dezembro, matara “dezenas” de membros “de uma gangue de terroristas armados” nas cidades de Homs and Idlib fizera vários prisioneiros. [60]
Provavelmente, nunca se saberá a verdade sobre esses dois dias “mortíferos”. Os números noticiados (entre 10 e 163 insurgentes armados; entre 9-111 civis desarmados; e entre 0 e 97 soldados do governo Assad) diferem tão completamente, tanto no número de mortos quanto na descrição das vítimas, que é impossível inferir qualquer “verdade” desse tipo de informação.
Sobre outro “massacre” noticiado antes, investigação do Instituto Stratfor “não encontrou qualquer sinal de massacre”. A investigação concluiu que “forças da oposição têm interesse em manter em circulação a ideia de massacres sempre iminentes, na esperança de, com isso, reproduzir as condições que levaram à intervenção militar na Líbia”. [61]
Seja como for, o “massacre” dos dias 19-20/12 em Idlib foi noticiado como fato, e acrescentou-se à narrativa que se implantou sobre Assad e sua “máquina de matar”.
Dois relatórios recentemente divulgados, do Comissário da ONU para Direitos Humanos e um arquivo de dados [62] sobre mortos “no sangrento levante sírio” publicado num blog do Guardian (13/12) – duas tentativas para estabelecer a verdade sobre o número de mortos no conflito sírio – reproduzem, exclusivamente, dados divulgados por grupos da oposição: entrevistas com 233 supostos “desertores do exército” (no caso do relatório do Comissário da ONU); e números divulgados pelo Observatório Sírio de Direitos Humanos; pelos Comitês Locais de Coordenação (orig. Local Co-ordination Committees, LCCs); e pela rede al-Jazeera (no caso do Guardian).
O Guardian fala de um total de 1.414,5 pessoas (sic) assassinadas – entre as quais 144 agentes de segurança da Síria – entre janeiro e 21/11/2011. Reprodução, exclusivamente, de informações publicadas, essa matéria traz vários erros flagrantes (p.ex., o número de mortos total, não é a soma do número de mortos por locais, de que falam as fontes): nesse total foram somados 23 sírios mortos pelo exército de Israel em junho, nas colinas do Golan; e 25 noticiados como “feridos” também são somados como mortos, além de vários feridos a tiros.
O relatório jamais menciona os insurgentes armados mortos ao longo de dez meses: as vítimas sempre são “manifestantes desarmados”, “civis” ou “pessoas” – além de 144 agentes da segurança.
70% dos dados reproduzidos nessas matérias têm, como fonte, o Observatório Sírio de Direitos Humanos, os Comitês Locais de Coordenação (orig. Local Co-ordination Committees, LCCs) ou, então, “ativistas”; 38% de tudo que a mídia publicou é reprodução de matéria da rede al-Jazeera; 3% reproduz matéria da ONG Anistia Internacional; e 1,5% reproduz matéria de fontes oficiais sírias.
Em resposta ao relatório do Comissário da ONU, o embaixador na Síria à ONU comentou: “E por que alguém entrevistaria desertores, se quisesse ouvir testemunho confiável e isento? São desertores… Evidentemente falarão contra o governo sírio”.
No esforço para inflar o número de mortos, o grupo AVAAZ já superou até a ONU. O grupo AVAAZ já declarou publicamente, até, que está envolvido na atividade de “tirar clandestinamente manifestantes, do país”; que mantém “abrigos clandestinos seguros, usados para abrigar os manifestantes mais visados pelos terroristas do governo Assad”; e um “cidadão jornalista do AVAAZ” “descobriu uma cova clandestina, para esconder centenas de cadáveres”. [63]
O próprio grupo anunciou com orgulho que as redes BBC e CNN divulgaram que cerca de 30% do noticiário sobre os eventos da Síria, naquelas redes, é informação distribuída por AVAAZ. O jornal Guardian divulgou, há alguns dias, que AVAAZ teria encontrado “provas” de mais de 6.200 mortos na Síria (forças de segurança e 400 crianças); que o grupo poderia afirmar com certeza que 617 daqueles mortos morreram sob tortura [64]. A “prova” estaria na confirmação, de cada uma das mortes, que AVAAZ teria obtido de três pessoas, “entre as quais um parente do morto e um clérigo que cuidou do sepultamento”. É ‘prova’ que, para dizer o mínimo, nada prova.
A notícia que se lê num jornal de Homs, do assassinato de um general-brigadeiro e seus filhos, naquela cidade, em abril de 2010, ilustra a impossibilidade quase total de “provar” responsabilidades, antes de qualquer investigação séria, no auge de um conflito sectário e, menos ainda, no caso de o morto ser militar graduado e filhos:
Um general, que se acredita ser Abdu Tallawi, foi morto com seus filhos e um sobrinho, quando atravessavam, em veículo militar, um bairro muito agitado. Há dois relatos dos fatos, e divergem quanto à religião da vítima.
Os legalistas dizem que teria sido morto por takfiris – islamistas fanáticos, que acusam outros muçulmanos de heresia –, porque o morto seria islâmico alawita. A oposição a Assad insiste que o morto seria da família Tallawi de Homs, e que teria sido morto por forças de segurança, para acusar a oposição. Há quem diga, até, que teria sido morto porque se recusou a atirar contra os manifestantes, mas não se deve considerar essa terceira versão, dada a extrema polarização das opiniões em Homs.
O general-brigadeiro foi morto porque trafegava em veículo militar, embora levasse os filhos. Quem o matou não se interessava por diferenças religiosas e só pensava em atacar membro do governo, para provocar repressão ainda mais violenta, a qual, por sua vez, aprofundaria o movimento de protestos e o Estado, no mesmo ciclo de violência [65] .
Notas do autor (em inglês) no sítio: http://www.atimes.com/atimes/Middle_East/NA05Ak05.html
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21. ibid.
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29a. “Negabilidade plausível”: diz-se de acusação que não possa ser provada e cuja negação possa ser plausivelmente aceita. No jargão corrente das comunidades de espionagem, a expressão tem sido usada nos casos em que a ação é premeditada, para não deixar pistas ou rastros. Exemplos de casos em que a negabilidade (nem sempre plausível) pode vir a beneficiar criminosos são, por exemplo, meios de tortura como descargas elétricas e quase-afogamento, que não deixam marcas no corpo, o que impede que se comprove a tortura; chantagem, ameaças e intimidação de jornalistas e testemunhas também são meios com alta “capacidade de negabilidade”, dentre outros (21/9/2010, “Blackwater & Co. – A “negabilidade total”, nota 1, [NTs].
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Aisling Byrne é coordenador projectos com fórum de conflitos e baseia-se em Beirute.